Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0721/19.4BECBR
Data do Acordão:06/09/2021
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:FRANCISCO ROTHES
Descritores:MANIFESTAÇÕES DE FORTUNA
CALCULO DA MATERIA COLECTAVEL
Sumário:I - Evidenciada a aquisição pelo sujeito passivo de imóveis de valor de aquisição igual ou superior a € 250.000,00 quando no ano da aquisição declarou rendimentos líquidos inferiores em 30% relativamente ao rendimento padrão, fixado pelo legislador em 20% do valor da aquisição (cf. tabela constante do n.º 4 do art. 89.º-A da LGT), consideram-se verificados os pressupostos legais para a avaliação indirecta do seu rendimento tributável desse ano ao abrigo do disposto na alínea d) do art. 87.º da LGT.
II - A justificação (comprovação a que alude o n.º 3 do art. 89.º-A da LGT) meramente parcial não afasta a aplicabilidade da determinação indirecta dos rendimentos que permitiram a manifestação de fortuna, mas não pode deixar de ser relevada na quantificação do rendimento tributável que vai ser determinado por esse método.
III - Resultando essa justificação parcial de empréstimos a que o sujeito passivo recorreu para adquirir os imóveis cujo valor determinou a avaliação indirecta dos seus rendimentos à luz daquele artigo 89.º-A da LGT, a quantificação do rendimento tributável deve ser igual a 20% do valor de aquisição dos imóveis mas deduzido do montante desses empréstimos, já que o montante destes não está nem pode ficar sujeito a IRS; ou seja, ao valor de aquisição deduz-se o montante justificado, calculando-se o rendimento padrão sobre o remanescente.
Nº Convencional:JSTA000P27815
Nº do Documento:SA2202106090721/19
Data de Entrada:04/26/2021
Recorrente:B........ E OUTROS
Recorrido 1:AT-AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Recurso jurisdicional da sentença proferida no processo de recurso judicial da decisão de avaliação da matéria colectável por métodos indirectos com o n.º 721/19.4BECBR

1. RELATÓRIO

1.1 Os acima identificados sujeitos passivos, notificados da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra e não se conformando com a decisão da mesma, vêm interpor recurso para a Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, apresentando com o requerimento de interposição do recurso a respectiva motivação, que resumiram em conclusões do seguinte teor:

«i) Vem o presente recurso apresentado da decisão que julgou parcialmente procedente o Recurso e, em consequência, anulou em parte a decisão de avaliação da matéria colectável dos ora Recorrentes por métodos indirectos, proferida pelo Director de Finanças de Coimbra em 08.11.2019, na parte que considerou um rendimento tributável em sede de IRS, a enquadrar na Categoria G, excedente a € 19.940,90.

ii) O Tribunal em vez de avaliar a legalidade ou a ilegalidade do acto de acordo com os pressupostos de facto e de direito convocados pela ATA, resolveu ele próprio fazer de administração tributária activa: “Mas não era o n.º 4 do artigo 89.º-A da LGT que deveria ter sido aplicado porquanto, como tivemos ocasião de expor acima, estamos perante um caso de verificação simultânea dos pressupostos de aplicação da alínea d) e da alínea f) do n.º 1 do artigo 87.º da LGT, pelo que a avaliação indirecta deveria ter sido efectuada nos termos dos n.ºs 3 e 5 do artigo 89.º-A da LGT, e não nos termos do n.º 4 do mesmo artigo, tal como prevê o n.º 2 do artigo 87.º da LGT”.

iii) Não sendo o tribunal fiscal um órgão de administração activa dos impostos, mas antes um órgão para dirimir os litígios emergentes das relações jurídicas fiscais (art. 212.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa), não lhe cabe praticar o acto tributário que, como título formal e abstracto, declara constituídos na Ordem Jurídica os efeitos jurídicos próprios de uma obrigação pecuniária.

iv) A tanto se opõe o princípio da separação de poderes entre os tribunais e o executivo ou a administração, consagrado como princípio estruturante do sistema de poderes no artigo 111.º da Constituição.

v) Na verdade, o que o Tribunal fez corresponde a efectuar uma aplicação directa da lei tributária aos factos tributários e isso corresponde ao desempenho da função tributária da AT, o que é ilegal. A aceitar-se a posição do Tribunal, nunca o acto tributário poderia ser anulado com base em erro nos pressupostos de direito, aplicados pela AT, caso os factos considerados pudessem preencher outra norma tributária material.

vi) O que há, é outra norma que, se fosse aplicada, mas não foi, permitiria à AT efectuar uma liquidação legal, ainda que parcial.

vii) O art. 89.º-A da LGT não pode ser interpretado de forma isolada devendo chamar-se à colação, desde logo, outras normas legais que estabelecem regras informadoras de todo o sistema fiscal, designadamente o art. 73.º da LGT, segundo o qual «as presunções consagradas nas normas de incidência tributária admitem sempre prova em contrário» e, bem assim, os princípios constitucionais da igualdade, da capacidade contributiva e da tributação dos rendimentos reais.

viii) Evidenciada a aquisição pela recorrida de um imóvel com valor de aquisição superior a € 250.000,00, quando declara rendimentos líquidos que mostram uma desproporção superior a 50%, para menos, em relação ao rendimento padrão (que foi fixado pelo legislador em 20% do valor da aquisição, em conformidade com a tabela constante do n.º 4 do art. 89.º-A da LGT), consideram-se verificados os pressupostos legais para a avaliação indirecta do seu rendimento tributável.

ix) Para prova da ilegitimidade deste acto de avaliação indirecta só deve dar-se relevância à justificação total do montante que permitiu a “manifestação de fortuna”, pelo que a justificação meramente parcial não afasta a aplicabilidade da determinação indirecta dos rendimentos que permitiram tal manifestação de fortuna.

x) Já assim não será no que respeita à fixação do rendimento sujeito a tributação como “incremento patrimonial” em sede de IRS, onde a justificação parcial há-de relevar para a fixação presuntiva do montante do “acréscimo patrimonial não justificado” sujeito a imposto, por força do disposto no art. 73.º da LGT e, bem assim, dos princípios constitucionais da igualdade, da capacidade contributiva e da tributação dos rendimentos reais.

xi) Embora a justificação parcial da manifestação de fortuna não afaste a aplicação do método de avaliação indirecta previsto no artigo 89.º-A da LGT, não pode deixar de ser considerada na quantificação do rendimento tributável que vai ser determinado por esse método, entendendo-se que a quantificação do rendimento tributável da recorrida deve ser igual a 20% do valor de aquisição deduzindo-se a este valor de aquisição o montante do empréstimo bancário que a recorrida demonstrou ter efectuado para a aquisição do imóvel, uma vez que esse montante não está nem pode estar sujeito a IRS, não podendo, consequentemente, ser presumido ou considerado como rendimento sujeito a tributação, sob pena de estarmos perante uma tributação em que estaria de todo ausente o critério da capacidade contributiva

xii) No caso em apreço, não tendo a Administração Tributária efectuado a dedução relativa ao empréstimo bancário na avaliação do rendimento tributável dos recorrentes, há manifesto excesso na quantificação, o que fere de ilegalidade o acto que lhe fixou o rendimento tributável de € 144.000,00 com recurso a avaliação indirecta.

xiii) Acrescendo que, considerando-se os empréstimos particulares dados como assentes, se constata inexistir qualquer situação que possibilite qualquer acréscimo.

xiv) Mesmo considerando-se a existência de uma situação de anulação parcial, ainda assim verifica-se existir erro na quantificação efectuada, porquanto o rendimento a acrescer ao declarado é de 3.988.18 € (19.940.90 € x 20%) e não de 19.940.90 €.

xv) Normas jurídicas violadas: 111.º da CRP; 73.º e 89.º-A da LGT.

Termos em que e nos mais de direito, no provimento do presente recurso, deve a sentença recorrida ser revogada, julgando-se inteiramente procedente o recurso apresentado contra a decisão que fixou aos ora recorrentes o rendimento de € 144.000,00 a título de manifestação de fortuna ou, subsidiariamente, parcialmente procedente, porquanto o rendimento a acrescer ao declarado é de 3.988.18 € (19.940.90 € x 20%) e não de 19.940.90 €, assim se fazendo JUSTIÇA».

1.2 A AT, representada pelo Director de Finanças de Coimbra, apresentou contra-alegações, pugnando pela manutenção da sentença.

1.3 O recurso foi admitido a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.

1.4 Recebidos os autos neste Supremo Tribunal Administrativo, foi dada vista ao Ministério Público e a Procuradora-Geral-Adjunta emitiu parecer «no sentido da improcedência do presente recurso com a manutenção da decisão recorrida nos seus precisos termos», com a seguinte fundamentação: «[…]

Da análise da matéria controvertida entendemos que o presente recurso deverá improceder e tendo em conta a parte afectada pelo mesmo.
A douta decisão mostra-se, quanto a nós, correcta. Fez correcta interpretação dos factos e correcta se mostra a sua subsunção jurídica, mostrando-se devidamente fundamentada, apoiada em abundante jurisprudência e pertinente doutrina, que cita, não sendo passível de quaisquer censuras.
Pois, não se mostra violado nenhum dos preceitos legais invocados pelos RR. Por um lado, não foi violado o princípio da separação de poderes, como bem decorre da sentença. Antes, nesta unicamente foram interpretados, à luz do direito vigente, os factos decorrentes dos autos e assentes no probatório, não posto em causa, e aplicada a respectiva norma. Por outro lado, na douta sentença não foi julgada como totalmente acertada a conduta da A.T., tanto assim, que os agora RR obtiveram êxito em parte, tendo sido aplicadas as disposições legais que agora os mesmos vêm invocar, a saber o disposto no artigo 89.º-A, n.ºs 3 e 5, da LGT, em vez do n.º 4 do mesmo preceito legal aplicado pela A.T. aquando da avaliação da matéria colectável».

1.5 Cumpre apreciar e decidir se a sentença recorrida padece do erro de julgamento que lhe vem assacado pelos Recorrentes, qual seja o de violação do princípio da separação de poderes, consagrado no art. 111.º da Constituição da República Portuguesa (CRP), por alegadamente ter mantido, ainda que parcialmente, o acto impugnado – decisão de avaliação da matéria colectável por métodos indirectos nos termos dos arts. 89.º-A da LGT e 39.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (CIRS) – com fundamento jurídico diverso do que foi invocado pela AT, ou seja, se o Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, na parte em que manteve o acto impugnado, o fez substituindo a fundamentação jurídica utilizada pela AT por outra, por ele julgada mais adequada (cf. conclusões i) a vi)).
Subsidiariamente, cumpre apreciar e decidir se a sentença fez errado julgamento quando, em face dos comprovados empréstimos bancário e efectuados por familiares e amigos dos sujeitos passivos não deu por justificado, não relevou o respectivo montante na quantificação da matéria tributável, de que resultaria que a correcção a efectuar se deveria situar em € 3.988,18 (cf. conclusões vii) a xiv)).


* * *

2. FUNDAMENTAÇÃO
2.1 DE FACTO

A sentença recorrida deu como provados os seguintes factos:

«1. Em 07.09.2017 foi outorgada no Cartório Notarial do Lic. …………, sito em Aveiro, e exarada no Livro 280-G, a fls. 132 e ss., escritura pública de «compra e venda e mútuo com hipoteca», entre ……………….. como primeiro outorgante, na qualidade de sócio gerente e em representação da sociedade C……………, Lda., os ora Recorrentes como segundos outorgantes, e ………………. como terceira outorgante, na qualidade de procuradora e em representação do Novo Banco, S.A., através da qual o primeiro outorgante declarou vender e os segundos outorgantes declaram comprar, pelo preço global de € 720.000,00, dois imóveis, mormente «Um: - Por quatrocentos e trinta e cinco mil euros, urbano, fracção autónoma designada pela letra "A", o primeiro andar, destinado a armazém e / ou comércio, e um anexo para garagem, situado, no logradouro, com o valor patrimonial IMT de 788.641,86 €; Dois: - Por duzentos e oitenta e cinco mil euros, urbano, fracção autónoma designada pela letra "B", o rés - do - chão a poente com entrada pelo lado norte, destinado a armazém e / ou comércio, com o valor patrimonial IMT de 400.935,29 €; Ambas do prédio em regime de propriedade horizontal sito na Estrada ……………….., União das Freguesias de Eiras e São Paulo de Frades, concelho de Coimbra, inscrito na matriz sob o artigo ……….., descrito na Conservatória do Registo Predial de Coimbra sob o número dois mil quatrocentos e noventa e quatro, da freguesia de Eiras», mais tendo os segundos e terceira outorgantes declarado que para aquisição dos visados imóveis foi solicitado ao Novo Banco, S.A., «um empréstimo no montante de quinhentos mil euros, que neste acto recebem e que nesta data lhe é concedido pelo prazo de cento e oitenta meses»;
Cfr. demonstrações das liquidações de IRS dos anos de 2013 a 2017, presentes a fls. 11 e ss. do PAT apensado aos autos em 17.12.2020 - fls. 526 e ss. dos autos em suporte electrónico - SITAF.

2. Os ora Recorrentes declararam junto da Administração Tributária e Aduaneira rendimentos globais do agregado familiar na ordem dos € 11.640,00 no ano de 2013, € 13.970,00 no ano de 2014, € 14.820,00 no ano de 2015 e no ano de 2016 e € 17.277,50 no ano de 2017, a que corresponderam rendimentos líquidos nos aludidos anos de € 3.432,00, € 5.762,00, € 6.612,00, € 6.612,00 e € 9.069,50, respectivamente, bem como a existência de um dependente;
Cfr. demonstrações das liquidações de IRS dos anos de 2013 a 2017, presentes a fls. 11 e ss. do PAT apensado aos autos em 17.12.2020 - fls. 526 e ss. dos autos em suporte electrónico - SITAF.

3. Em 07.11.2018 o Chefe da Divisão de Inspecção Tributária II dos Serviços de Inspecção Tributária da Direcção de Finanças de Coimbra proferiu o despacho de inspecção n.º DI201804130 «nos termos dos n.ºs 4 e 5 art. 46.º do RCPITA», ordenando a realização de acção de inspecção com o objectivo de «consulta, recolha e cruzamento de elementos» por referência aos anos de 2017 e 2018 e ao ora Recorrente marido, A……., que assinou cópia do visado despacho naquele mesmo dia, declarando ter tomado conhecimento do mesmo;
Cfr. visado despacho presente a fls. 1 do PAT apensado aos autos em 17.12.2020 - fls. 516 dos autos em suporte electrónico - SITAF.

4. Em 12.11.2018 o ora Recorrente marido A……… assinou notificação pessoal emitida pela aludida Divisão de Inspecção Tributária II (equipa 12) dirigida ao próprio e à sua mulher «nos termos do disposto no artigo 63.º da Lei Geral Tributária (…), nos arts. 28.º e 29.º, ambos do Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária e Aduaneira (…) e art. 89.º-A da Lei Geral Tributária para no dia 2018/11/22, pelas 16h30 horas, na Direcção de Finanças de Coimbra, na morada em rodapé, comparecerem eles ou seus representantes, com vista a apresentarem justificação para a origem dos fundos financeiros na base da aquisição por ambos, no dia 2017-09-07, de (…) 2 fracções autónomas do prédio urbano inscrito na matriz predial respectiva com o n.º …….., da freguesia de Eiras e S. Paulo de Frades do Concelho de Coimbra, pelo valor declarado de € 720.000,00, para além do contrato de mútuo assinado nesse dia pelo valor de € 500.000,00. A falta de cumprimento desta notificação, no dia, hora e local mencionados, constitui violação do dever de colaboração, infracção penalizável nos termos do art. 117.º do Regime Geral das Infracções Tributárias (…), e enquanto recusa de apresentação, conduta punível nos termos do art. 113.º daquele Regime Geral, podendo também constituir fundamento à eventual fixação da Matéria Tributável por métodos indirectos em conformidade com o disposto na alínea b) do art. 88.º da Lei Geral Tributária»;
Cfr. visada notificação, presente a fls. 19 do PAT apensado aos autos em 17.12.2020 - fls. 534 dos autos em suporte electrónico - SITAF.

5. No dia e hora referidos na notificação aludida no ponto anterior para comparência dos ora Recorridos na Direcção de Finanças de Coimbra, os mesmos ali não se apresentaram, tendo sido lavrado auto da visada ocorrência no dia em causa;
Cfr. visado auto de ocorrência, presente a fls. 20 do PAT apensado aos autos em 17.12.2020 - fls. 535 dos autos em suporte electrónico - SITAF.

6. Em 08.03.2019 lavrou-se nota de diligência dando-se por concluída a acção inspectiva aludida em 3., enviando-se cópia da mesma em anexo a ofício com a mesma data, dirigido ao ora Recorrente marido e ao seu domicílio fiscal, o qual, tendo sido enviado por correio postal registado, veio devolvido com indicação de «mudou-se»;
Cfr. visado ofício, nota de diligência, talão de aceitação de correio postal registado e envelope devolvido com a aludida menção nele aposta, presentes a fls. 22-26 do PAT apensado aos autos em 17.12.2020 - fls. 537, 538, 541-543 dos autos em suporte electrónico - SITAF.

7. Também em 08.03.2019 foi prestada informação pela Divisão de Inspecção Tributária II (equipa 12), no âmbito da aludida acção inspectiva, com o seguinte teor:
«1. Credencial e período em que decorreu a acção
Em cumprimento do Despacho de Inspecção de 2018.11.07, foi a acção iniciada em 2018.11.07 e terminada em 2019.03.08.
2. Objectivos
O procedimento insere-se numa acção de recolha de elementos, no âmbito do código PNAIT «101-01 -Recolha e cruzamentos de elementos» e resulta do facto de no decurso de um procedimento de inspecção a uma empresa de que o sp é sócio-gerente - …………., LDA, com o NIPC ……… , se ter tido conhecimento que o sócio adquiriu, em 2017, à empresa C……… LDA, com o NIPC …………, o imóvel onde funciona o estabelecimento daquela sociedade - uma «loja chinesa», até então alugado àquela empresa. O valor total declarado das aquisições feitas na altura foi de € 720.000,00, quantia significativamente superior aos valores declarados anualmente em sede de IRS pelo agregado familiar.
3. Os factos
A. Os prédios
No dia 2017.09.07 o sp, em conjunto com sua esposa, procedeu à aquisição das seguintes fracções autónomas do prédio inscrito na matriz predial da freguesia de Eiras e S. Paulo de Frades, com o n.º …………, pelo preço declarado de € 720.000,00 - vide escritura pública em Anexo 1:
- fracção «A» com o VP de € 788.641,86. pelo valor de aquisição declarado de € 435.000,00; e
- fracção «B» com o VP de € 400.935,29, peio valor de aquisição declarado de € 285.000,00.
B. O financiamento
1.º) - empréstimo
Na escritura de aquisição foi também contraído pelo casal um empréstimo junto do Novo Banco, com hipoteca dos Imóveis, no valor de € 500.000,00 - vide Anexo 1;
2.º) - rendimentos anuais declarados
Constata-se que, em sede de IRS, os rendimentos colectáveis declarados pelo casal, nos últimos 5 anos, são de € 3.432,00; € 5.762.00; € 6.612.00; € 6.612,00 e € 9.069,50. respectivamente nos anos de 2013 a 2017 - vide Anexo 2,
3.º) - outras fontes - notificação
Considerando que os níveis de rendimentos declarados pelo casal em sede de IRS estão ao nível do mínimo de existência previsto no art. 70.º do Código do IRS e que o empréstimo contraído deixa em aberto € 220.000,00, foi o contribuinte notificado, para conjuntamente com a sua esposa, proceder à identificação/explicação da origem daquele montante utilizado para pagamento dos imóveis adquiridos em 2017 - vide notificação em Anexo 3.
Contudo na data, local e hora constantes da notificação para a comparência dos sp’s, verificou-se que ninguém compareceu - vide auto de ocorrência em Anexo 4, nem fez qualquer outra diligência que tenha chegado ao conhecimento da inspecção.
C. Enquadramento tributário
Os valores destas aquisições de imóveis, por montantes superiores a € 250.000.00, é desde logo passível de enquadramento no art. 89.º-A, da LGT, atento um dos limites previstos na tabela do n.º 4, daquela disposição legal e caso os contribuintes, grosso modo, não façam prova da origem dos fluxos financeiros cujos valores extravasam os rendimentos declarados.
Constata-se pois que o rendimento líquido declarado pelo casal mostra claramente uma desproporção superior a 30%, para menos, em relação ao rendimento padrão resultante da referida tabela, que é de € 144.000,00 (720.000,00 x 20%), pelo que, em face do anteriormente descrito e considerando a não explicação dada pelos contribuintes para a origem dos € 220.000,00, há assim motivos para ter lugar a avaliação indirecta da matéria colectável, prevista no n.º 1, do art. 89.º-A, da LGT, considerando-se então como rendimento tributável em sede de IRS, a enquadrar na categoria G, no ano de 2017, o valor de € 144.000.00, nos termos do n.º 4, daquele art. 89.º-A, da LGT.
4. Conclusão
Face ao exposto, propõe-se que este procedimento dê lugar a uma Ordem de Serviço em sede de IRS ao ano de 2017, aos sujeitos passivos adquirentes, os quais optaram neste ano pela tributação conjunta, nos termos do n.º 2, do art. 13.º, do Código do IRS.
5. Resumo dos Anexos
N.º de folhas
1. Escritura pública de compra e venda e mútuo com hipoteca … … … … 06
2. Demonstrações das liquidações de IRS dos anos de 2013 a 2017 … … 08
3. Notificação para apresentar elementos … … … … … … … … … 01
4. Auto de ocorrência … … … … … … … … … … … … … … … … 02
TOTAL DE FOLHAS EM ANEXO……………………………………… 17
É tudo quanto nos cumpre informar e se submete à consideração superior»;
Cfr. visada informação presente a fls. 2 e ss. do PAT apensado aos autos em 17.12.2020 - fls. 517 e ss. dos autos em suporte electrónico - SITAF.

8. No mesmo dia o coordenador da aludida Divisão de Inspecção Tributária apôs parecer na visada informação, propondo «a abertura de OI no sentido de melhor analisar e desenvolver os procedimentos necessários à clarificação da situação tributária do contribuinte»;
Cfr. aludida proposta inserta no campo “parecer” da referida informação, presente a fls. 2 do PAT apensado aos autos em 17.12.2020 - fls. 517 dos autos em suporte electrónico - SITAF.

9. Em 15.03.2019 o Chefe da Divisão de Inspecção Tributária I dos Serviços de Inspecção Tributária da Direcção de Finanças de Coimbra, no uso de competências delegadas pelo Director de Finanças de Coimbra, emitiu a ordem de serviço n.º OI201900396, com vista à inspecção interna parcial, em sede de IRS por referência ao ano de 2017, dos ora Recorrentes, não tendo sido enviada a estes ofício tendente à notificação da visada ordem de serviço;
Cfr. visada ordem de serviço presente a fls. 27 do PAT apensado aos autos em 17.12.2020 - fls. 544 dos autos em suporte electrónico - SITAF, a qual não se encontra assinada pelos Recorrentes, nada existindo no PAT que nos leve a crer que foi dado conhecimento aos Recorrentes da prolação da visada ordem, sendo o primeiro acto notificado o referente ao facto provado no ponto seguinte.
10. Em 24.05.2019 foram emitidos pela Divisão de Inspecção Tributária I - Equipa 22 da Direcção de Finanças de Coimbra os ofícios n.ºs 422-4018 e 422-4019, dirigidos aos ora Recorrentes, e a estes enviados para os respectivos domicílios fiscais, por correio postal registado, e aí recebidos, com o seguinte teor:
«ASSUNTO: Notificação para a comprovação prevista no n.º 3, do art. 89.º-A, da Lei Geral Tributária
Atendendo a que V. Ex.as, no dia 2017.09.07, procederam à aquisição das fracções autónomas «A» e «B» do prédio inscrito na matriz predial da freguesia de Eiras e S. Paulo de Frades, com o n.º ………, pelo preço total declarado de € 720.000,00 e que na mesma escritura de aquisição foi contraído um empréstimo hipotecário de apenas € 500.000,00. Considerando ainda que os níveis de rendimentos declarados por V. Ex.as em sede de IRS estão ao nível do mínimo de existência previsto no art. 70.º do Código do IRS e que o empréstimo contraído deixa em aberto o montante de € 220.000,00, ficam assim V. Ex.as, por este meio, notificados, nos termos dos arts. 9.º, 28.º, 29.º e 37.º, todos do Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária e Aduaneira e dos arts. 59.º, 63.º e 89.º-A, todos da Lei Geral Tributária, para, no prazo de 10 dias, procederem à identificação, de forma clara e inequívoca e com a respectiva comprovação documental, da origem dos meios monetários utilizados, adicionalmente àquele empréstimo hipotecário, para o pagamento integral daqueles Imóveis adquiridos no ano de 2017, remetendo os elementos solicitados a esta Direcção de Finanças (para a morada, para o mail ou por fax, todos abaixo indicados, e ao cuidado do técnico notificante).
Mais ficam cientes de que a falta de cumprimento desta notificação, dará lugar à avaliação indirecta da matéria colectável do IRS, nos termos das disposições dos n.ºs 1, 3 e 4, do já referido art. 89.º-A, da Lei Geral Tributária, sem prejuízo da aplicação da coima a que alude o art. 117.º do Regime Geral das Infracções Tributárias, por violação do dever de colaboração.»;
Cfr. visados ofícios, talões de aceitação de correio postal registado com os registos n.ºs RH339485983PT e RH339485997PT e prints do sítio on-line dos CTT por referência à pesquisa dos respectivos registos postais, presentes a fls. 67-68 e 28-31 do PAT apensado aos autos em 17.12.2020 - fls. 586-587 e 545-548 dos autos em suporte electrónico - SITAF. Pese embora os ofícios contenha a menção do envio com aviso de recepção, nenhum aviso de recepção se encontra no PA por referência aos aludidos ofícios, não suscitando dúvidas, no entanto, que foram efectivamente recepcionados pelos Recorrentes, porquanto a eles responderam, conforme facto provado sob o ponto seguinte.

11. Em 07.06.2019 deu entrada na Direcção de Finanças de Coimbra requerimento dos ora Recorrentes, em resposta aos ofícios aludidos no ponto anterior, com o seguinte teor:
«B……… e A………., respectivamente, com NIF n.º ……….. e ………., com domicílio sito na Rua …………, n.º ……………, 3020-…… Coimbra, vêm, em resposta ao ofício supra identificado, informar, comprovar e justificar de forma clara e inequívoca a origem do montante de 220.000,00 € utilizados na compra do imóvel em causa, para além do empréstimo hipotecário no montante de 500.000,00 € já previamente, comprovado e justificado.
Assim, o montante de 220.000,00 € provém de um conjunto de empréstimos obtidos junto de familiares e amigos, designadamente:
- 109.989,60 € correspondem a um empréstimo de D………..;
- 40.000,00 € correspondem a um empréstimo de …………..;
- 30.000,00 € correspondem a poupanças do sujeito passivo B………..;
- 4.000,00 € correspondem a um empréstimo de E……….;
- 40.000,00 € correspondem a um empréstimo de F……….;
- 2.000,00 € correspondem a um empréstimo de G………..
Pelo que, tais empréstimos pessoais correspondem ao montante global de 226.000,00 €, os quais se encontram devidamente documentados pelo documento em anexo e justificam plenamente a origem de tal montante»;
Cfr. visada resposta/requerimento com carimbo aposto de entrada na DF de Coimbra, presente a fls. 32 e ss. do PAT apensado aos autos em 17.12.2020 - fls. 549 e ss. dos autos em suporte electrónico - SITAF.

12. Anexo ao aludido requerimento foi junto extracto bancário emitido em 05.09.2017, com o n.º 1/2017, por referência ao período de 26.06.2017 a 05.09.2017, com 4 páginas, referente à conta bancária à ordem n.º 000367216490 titulada pela ora Recorrente mulher no Novo Banco, S.A., com o IBAN………………….., do qual consta um saldo bancário de € 237.989,60 e os seguintes movimentos de conta e avisos de lançamento por referência a transferências electrónicas interbancárias:

[segue imagem, aqui dada por reproduzida]

Cfr. visado extracto bancário presente a fls. 37-40 do PAT apensado aos autos em 17.12.2020 - fls. 554 e ss. dos autos em suporte electrónico - SITAF.

13. Em 11.06.2019 foi emitido pela Divisão de Inspecção Tributária I - Equipa 22 da Direcção de Finanças de Coimbra o ofício n.º 422-4401, dirigido ao mandatário constituído pelos ora Recorrentes, e nessa qualidade, enviado por correio postal registado para o seu domicílio profissional no mesmo dia, com o seguinte teor:
«ASSUNTO: Notificação para a comprovação do n.º 3, do art. 89.º-A, da Lei Geral Tributária
Atendendo a que na sequência da notificação em 2019.05.24 de A………… com o NIF ……….. e de B……….. com o NIF ………., para a comprovação prevista no n.º 3, do art. 89.º-A, da Lei Geral Tributária - LGT, V. Ex.ª, deu conhecimento a estes serviços da sua qualidade de procurador de ambos os contribuintes, fica assim V. Ex.ª, por este meio, notificado, nos termos dos arts. 9.º, 28.º, 29.º e 37.º, todos do Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária e Aduaneira e dos arts. 59.º, 63.º e 89.º-A, todos da LGT, para, no prazo de 10 dias, proceder ao envio de cópias dos alegados contratos de mútuo, invocados na resposta dada àquela notificação de 2019.05.24. em cumprimento do disposto no art. 1143.º do Código Civil, remetendo os elementos solicitados a esta Direcção de Finanças (para a morada, para o mail ou por fax, todos abaixo indicados, e ao cuidado do técnico notificante).
Mais fica ciente de que a falta de cumprimento desta notificação, dará lugar à avaliação indirecta da matéria colectável do IRS, nos termos das disposições dos n.ºs 1, 3 e 4, do já referido art. 89.º-A, da Lei Geral Tributária, sem prejuízo da aplicação da coima a que alude o art. 117.º do Regime Geral das Infracções Tributárias, por violação do dever de colaboração.»;
Cfr. visado ofício, talão de aceitação de correio postal registado com o registo n.º RH339486025PT e print do sítio on-line dos CTT por referência à pesquisa do respectivo registo postal, presentes a fls. 77 e 42-43 do PAT apensado aos autos em 17.12.2020 - fls. 598 e 559-560 dos autos em suporte electrónico - SITAF.

14. Em 04.09.2019 foi elaborado projecto de correcções, enviado em 06.09.2010 ao mandatário constituído pelos ora Recorrentes, e nessa qualidade, por correio postal registado para o seu domicílio profissional, para efeitos de exercício do direito de audição no prazo de 15 dias;
Cfr. visado projecto de correcções, ofício n.º 422-5462, talão de aceitação de correio postal registado com o registo n.º RH377961731PT e print do sítio on-line dos CTT por referência à pesquisa do respectivo registo postal, presentes a fls. 44 e ss., 78-80 do PAT apensado aos autos em 17.12.2020 - fls. 561 e ss. e 601-603 dos autos em suporte electrónico - SITAF.

15. Em 01.10.2019 foi elaborado relatório de inspecção tributária, em que se propunha a correcção ao rendimento colectável declarado pelos ora Recorrentes por referência ao ano de 2017, em sede de IRS - categoria G, no valor de € 134.930,50, o qual obteve despacho de concordância da Directora de Finanças Adjunta de Coimbra de 07.10.2019, invocando competências delegadas pelo Director de Finanças de Coimbra;
Cfr. visado relatório a fls. 81 e ss. do PAT apensado aos autos em 17.12.2020 - fls. 604 e ss. dos autos em suporte electrónico - SITAF.

16. Relatório no qual se pode ler, entre o mais, o seguinte:
«I.3. Descrição sucinta das conclusões da acção de inspecção
A. Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Singulares
Tendo em conta o descrito nos pontos IV e V e para efeitos da respectiva liquidação adicional, propõe-se que o rendimento global líquido do agregado, do ano de 2017, excluindo os rendimentos da categoria F sujeitos a tributação autónoma, seja fixado em € 144.000,00, a tributar na categoria G, conforme quadro que se segue, o qual nele evidencia a distribuição do rendimento corrigido pelos sujeitos passivos A e B.

Sujeitos Passivos
A
B
Total
Rendimento global declarado no ano de 2017
4.166,00
4.903,50
9.069,50
Correcções ao rendimento global líquido declarado
67.834,00
67.096,50
134.930,50
Rendimento global líquido corrigido do ano de 2017*
72.000,00
72.000,00
144.000,00
* rendimento padrão a considerar na categoria G

B. Infracções
Pelas infracções adiante descritas em VII vai ser levantado o respectivo auto de notícia.
II. Objectivos, âmbito e extensão da acção de inspecção
A. Credencial e período em que decorreu a acção
Pela ordem de serviço OI201900396 de 2019.03.15 foi iniciada a acção interna ao casal constituído pelos contribuintes A……….. com o NIF …… e residente fiscal em Coimbra na R …………… . LOTE …… e B……… com o NIF ……….. e residente fiscal em Coimbra na R ………, ………….º, ambos na área do 2.º SLF de Coimbra.
B. Motivo, âmbito e incidência temporal
Em consequência da emissão da Ordem de Serviço Interna - OI201900396, o procedimento insere-se no âmbito do IRS e abrange o ano de 2017.
C. Outras situações
não aplicável
III. Descrição dos factos e fundamentos das correcções quantitativas à matéria tributável
não aplicável
IV. Motivo e exposição dos factos que implicam o recurso a métodos indirectos
1. No dia 2017.09.07 os sp’s A (A………..) e B (B………….), em conjunto procederam à aquisição das seguintes fracções autónomas do prédio inscrito na matriz predial da freguesia de Eiras e S. Paulo de Frades, com o n.º …….., pelo preço declarado de € 720.000,00 - vide escritura pública em Anexo 1:
- fracção «A» com o VP de € 788.641,86. pelo valor de aquisição declarado de € 435.000,00; e
- fracção «B» com o VP de € 400.935,29, peio valor de aquisição declarado de € 285.000,00.
2. O valor destas aquisições de imóveis, por montantes superiores a € 250.000,00, é desde logo passível de enquadramento no art. 89.º-A, da LGT, atento o limite previsto na tabela do n.º 4, daquela disposição legal, quando o rendimento líquido declarado num dado ano mostre uma desproporção superior a 30 %, para menos, em relação ao rendimento padrão resultante daquela tabela e caso os contribuintes, grosso modo, não façam prova da origem dos fluxos financeiros cujos valores extravasam os rendimentos por si declarados nesse ano à AT.
3. Uma vez que naquela escritura de aquisição foi contraído pelo casal um empréstimo bancário no valor de € 500.000,00 e que se constata que, em sede de IRS, os rendimentos colectáveis declarados pelo casal, nos últimos 5 anos, são de € 3.432,00; € 5.762,00; € 6.612,00; € 6.612,00 e € 9.069,50 respectivamente nos anos de 2013 a 2017 - vide Anexo 2, estando estes ao nível do mínimo de existência previsto no art. 70.º do Código do IRS, ficam assim em aberto € 220.000,00, utilizados para o pagamento daqueles imóveis, que não “cabem” nos rendimentos declarados pelos sp's à AT nos últimos anos, operando assim nesta situação a desproporção face ao rendimento padrão, a que se aludiu no ponto anterior
4. Atento o disposto no n.º 3, daquele art. 89.º-A, da LGT, a saber:
«Verificadas as situações previstas no n.º 1 deste artigo, bem como na alínea f) do n.º 1 do artigo 87.º cabe ao sujeito passivo a comprovação de que correspondem à realidade os rendimentos declarados e de que é outra a fonte das manifestações de fortuna ou do acréscimo de património ou da despesa efectuada.» foram os adquirentes os contribuintes A (A………….) e B (B……….) notificados, para procederem à Identificação/explicação da fonte das manifestações de fortuna - vide notificações em Anexo 3.
4.1. Na sequência das notificações o mandatário dos sp’s o advogado …………, com escritório em Coimbra com morada na Rua Dr. ………., n.º 35 - 1.º 3000-………… COIMBRA, veio alegar em suma que os meios monetários em causa foram obtidos pelo contribuinte B (B……….), uma parte - € 195.989,60 por empréstimos obtidos junto de familiares e amigos, e outra parte - € 30.000,00 de poupanças do próprio, juntando para corroborar o alegado fotocópias de extractos bancários de uma conta bancária de B………. no Novo Banco - vide resposta em Anexo 4.
5. Atendendo a que quanto aos invocados contratos de mútuo, dos alegados mutuantes nada se conheça ou possa conhecer, além de um nome num extracto bancário, pois não foram aqueles sequer identificados quer civil quer fiscalmente, e que aqueles (contratos de mútuo) só são reconhecidos juridicamente se estiverem de acordo com o estipulado no art. 1143.º, do Código Civil, e ainda que são também fiscalmente relevantes para efeitos de Imposto de Selo, foram assim de novo notificados os contribuintes objecto deste procedimento, desta feita na pessoa do seu procurador para procederem ao envio de cópias dos mesmos - vide notificação em anexo 5. Verificou-se contudo que até à presente data os contribuintes ou o seu mandatário nada disseram a este respeito.
6. Em suma, considerando por um lado que, sendo os contribuintes casados em regime de separação de bens, nada foi esclarecido quanto aos meios monetários no montante de € 110.000,00 por justificar referentes as partes dos prédios adquiridas pelo contribuinte A (A………), apesar de notificado para tal, e por outro que, o contribuinte B (B……….) não logrou comprovar de forma clara e inequívoca o motivo/origem das entradas de dinheiro na sua conta bancária no Novo Banco constantes daqueles extractos, apesar de a isso ter sido instado pela AT, conforme antes referido, fica assim por esclarecer a real origem dos € 220.000,00 de fundos utilizados para pagamento das aquisições daqueles prédios, para além do empréstimo bancário contraído pelo casal no valor de € 500.000,00, não tendo então sido possível comprovar que correspondem à realidade os rendimentos declarados à AT e de que é outra a fonte das manifestações de fortuna, conforme previsto no n.º 3, do art. 89.º-A, da LGT.
7. Face ao exposto e uma vez que, conforme já antes referido em IV.2, o rendimento líquido declarado mostra claramente uma desproporção superior a 30%, para menos, relativamente ao rendimento padrão resultante da aplicação do n.º 1 da tabela constante do n.º 4, do art. 89.º-A, da LGT, o qual é de € 144.000,00 (720.000,00 x 20%), há assim motivos para ter lugar a tributação por avaliação indirecta prevista no n.º 1, daquele art. 89.º-A, da LGT.
V. Critérios de cálculo dos valores corrigidos com recurso a métodos indirectos
O n.º 4 do art. 89.º-A da LGT determina a consideração como rendimento tributável em sede de IRS, a enquadrar na categoria G, do rendimento padrão que, no caso do seu n.º 1 para imóveis de valor de aquisição igual ou superior a € 250.000,00, é de 20% do valor de aquisição, pelo que no caso em apreciação, atentos os rendimentos líquidos já declarados no montante de € 9.069,50 e o rendimento padrão correspondente que é de € 144.000,00 (720.000,00 x 20%), sendo imputável em partes iguais a cada um dos sujeitos passivos A e B, pelo que o valor total da correcção, no ano de 2017, é de € 134.930,50.
VI. Regularizações efectuadas pelo S.P. no decurso da acção de inspecção
não aplicável
VII. Infracções verificadas
1. Da não prestação de esclarecimentos, após notificação, conforme descrito no ponto IV.6, resulta uma conduta de falta de colaboração que deve ser punida pelo art. 117.º do Regime Geral das Infracções Tributárias - RGIT.
2. Da situação descrita no ponto IV.1 e seguintes, resultaram omissões/inexactidões na DM3 do IRS, do ano de 2017, de que resultou a não declaração de rendimentos líquidos da categoria G, devidos fiscalmente, em infracção designadamente aos arts. 1.º, 9.º, 13.º, 15.º e 57.º, todos do CIRS, e ainda o art. 89.º-A da LGT, conduta punível pelo art. 119.º do RGIT.
VIII. Outros elementos relevantes
não aplicável
IX. Direito de Audição
Notificados na pessoa do seu procurador pelo ofício 5462 registado em 2019.09.06, para exercerem o respectivo direito no prazo de 15 dias, verificou-se que os contribuintes até à data nada disseram.
X. Resumo dos ANEXOS
N.º de folhas
1. Escritura pública de compra e venda e mútuo com hipoteca……………...…………… 06
2. Demonstrações das liquidações de IRS dos anos de 2013 a 2017…………….……… 08
3. Notificações para justificação da origem dos rendimentos ……….………..………… 02
4. Resposta do mandatário dos contribuintes à notificação……………………………… 08
5. Notificação para envio de cópias dos alegados contratos de mútuo……….……… 01
TOTAL DE FOLHAS EM ANEXO…… ……………………………25»;
Cfr. visado relatório a fls. 81 e ss. do PAT apensado aos autos em 17.12.2020 - fls. 604 e ss. dos autos em suporte electrónico - SITAF.

17. Em 09.10.2019 foi emitido ofício pela Directora de Finanças Adjunta de Coimbra e enviado por correio postal registado com aviso de recepção para o domicílio profissional do mandatário dos ora Recorrentes, e aí recebido no dia seguinte, com o seguinte teor:
«Assunto: Notificação do Relatório de Inspecção Tributária (Arts. 87.º n.º 1 f) e 89.º-A, ambos da Lei Geral Tributária e art. 62.º do Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária e Aduaneira - Art. 40.º do CPPT - OI201900396

Exm.os Srs.
Ficam, por este meio notificados os contribuintes “A………… e B………”, NIF’s ………. e …………., na pessoa de V. Ex.ªs, na qualidade de mandatários, nos termos do art. 77.º da LGT e do art. 62.º do RCPITA, do Relatório de Inspecção Tributária e do teor do(s) despacho(s) que sobre ele recaiu(iram), que se anexa(m) como parte integrante da presente notificação, relativamente às situações abaixo indicadas:
Da fixação do rendimento colectável de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS) por métodos indirectos, nos termos dos artigos 87.º a 90.º da Lei Geral Tributária (LGT), por remissão do artigo 39.º do Código do IRS, no(s) seguinte(s) ano(s).

Ano Rendimento Líquido Fixado
2017 € 144.000,00

As decisões tomadas referidas nos pontos anteriores têm por base os factos, motivos e fundamentos e, bem assim como, os critérios e cálculos que originaram os valores acima referidos, expressamente desenvolvidos no Relatório da Inspecção Tributária.
Contra a fixação ora notificada, poderá apresentar recurso judicial, para o Tribunal Administrativo e Fiscal da área do domicílio, nos termos dos n.ºs 7 e 8 do citado art. 89.º-A da Lei Geral Tributária, no prazo de 10 (dez) dias a contar da data da assinatura do aviso de recepção que acompanha a presente notificação, nos termos previstos no art. 146.º-B do Código de Procedimento e de Processo Tributário.
Junta-se fotocópia do relatório e anexos, num total de dezoito folhas.»;
Cfr. visado ofício n.º 7111, talão de aceitação de correio postal registado com o registo n.º RH286167779PT e aviso de recepção, presentes a fls. 115-117 do PAT apensado aos autos em 17.12.2020 - fls. 642-644 dos autos em suporte electrónico - SITAF.

18. No mesmo dia foi emitido e enviado ofício dirigido directamente aos ora Recorrentes, por correio postal registado, tendente a dar-lhes conhecimento do envio do ofício aludido no ponto anterior;
Cfr. visado ofício n.º 7118 e talão de aceitação de correio postal registado com o registo n.º RH286167765PT, presentes a fls. 118-119 do PAT apensado aos autos em 17.12.2020 - fls. 645-646 dos autos em suporte electrónico - SITAF.

19. Em 21.10.2019 foi enviado ao presente Tribunal p.i. de recurso judicial do despacho aludido em 15., o qual aqui correu termos sob o n.º 668/19.4BECBR;
Cfr. resulta da troca de mensagens, primeira folha da p.i. e despacho ali proferido, constantes de fls. 120 e ss. do PAT apensado aos autos em 17.12.2020 - fls. 647 e ss. dos autos em suporte electrónico - SITAF. Conforme ainda consulta dos aludidos autos, via SITAF.

20. Em 07.11.2019 o Director de Finanças de Coimbra revogou o despacho recorrido no recurso aludido no ponto anterior, proferido pela Directora de Finanças Adjunta de Coimbra, através da prolação de despacho com o seguinte teor:
«Assunto: - Revogação do sancionamento de procedimento de avaliação indirecta por manifestação de fortuna e outros acréscimos patrimoniais não justificados
Sujeitos passivos: NIF - ……………., Nome: A………..
NIF - ………., Nome: B………..
Morada: R ……….. ….. LOTE ……….- COIMBRA
Ordem de serviço N.º OI 201900396
Por despacho de 2019.10.07, a senhora Directora Adjunta desta Direcção de Finanças de Coimbra, sancionou as conclusões do relatório de Inspecção Tributária que procedia, relativamente aos sujeitos passivos acima identificados, à avaliação indirecta da matéria colectável por manifestações de fortuna e outros acréscimos patrimoniais, ao abrigo do artigo 89.º-A da Lei Geral Tributária.
Fê-lo, invocando a delegação de competências constante do Despacho n.º 17462/201, publicada no Diário da República II Série n.º 249, de 29 de Dezembro de 2011.
Porém,
Daquele despacho não consta a delegação da decisão de avaliação da matéria colectável pelo método indirecto constante do artigo 89.º-A da LGT, nem poderia constar, dado que se trata de uma competência do director de finanças da área do domicílio fiscal do sujeito passivo, sem possibilidade de delegação, conforme prescreve o n.º 6 daquele artigo.
Assim,
Por se tratar de acto inválido, revogo-o ao abrigo das disposições constantes do artigo 79.º da LGT e 165.º e 167.º do Código de Procedimento Administrativo.
Notifique-se»;
Cfr. visado despacho, presente a fls. 131 do PAT apensado aos autos em 17.12.2020 - fls. 658 dos autos em suporte electrónico - SITAF.

21. Em 08.11.2019 o Director de Finanças de Coimbra proferiu despacho com o seguinte teor:
«Assunto: - Decisão de procedimento de avaliação indirecta por manifestação de fortuna e outros acréscimos patrimoniais não justificados
Sujeitos passivos: NIF - ……….., Nome: A……….
NIF - ……….., Nome: B…………
Morada: R ………….. LOTE ……………. - COIMBRA
Ordem de serviço N.º OI 201900396
Relativamente aos sujeitos passivos acima identificados, revoguei pelo meu despacho de 7 de Novembro de 2019, o despacho da senhora Directora de Finanças Adjunta desta Direcção de Finanças de Coimbra, que validou a decisão de avaliação indirecta da matéria colectável, por manifestações de fortuna e outros acréscimos patrimoniais, ao abrigo do artigo 89.º-A da Lei Geral Tributária.
A razão de ser da revogação prendeu-se com a incompetência em razão da matéria, por se tratar de decisão da competência do director de finanças da área do domicílio fiscal do sujeito passivo, sem faculdade de delegação.
Analisado agora o relatório e suas conclusões, verifico que, nos termos e com os fundamentos que do mesmo constam, estão reunidos os pressupostos para a avaliação indirecta da matéria colectável por manifestações de fortuna e outros acréscimos patrimoniais, ao abrigo do artigo 89.º-A da Lei Geral Tributária.
Nestes termos:
Tomo a decisão de que, relativamente ao exercício de 2017, os sujeitos passivos com os NIFs ……….. – A………. e ………… – B……….., residentes na R …………. LOTE …………..- COIMBRA, a avaliação da matéria colectável seja efectuada pelo método indirecto constante do artigo 89.º-A da Lei Geral Tributária – “manifestações de fortuna e outros acréscimos patrimoniais”.
Tendo em consideração que não foram justificados pelos sujeitos passivos os acréscimos patrimoniais ocorridos em 2017, concordo com os valores apurados e respectivos fundamentos que constam do relatório da inspecção tributária.
Notifique-se»;
Cfr. visado despacho, presente a fls. 132 do PAT apensado aos autos em 17.12.2020 - fls. 659 e ss. dos autos em suporte electrónico - SITAF.

22. Em 08.11.2019 foi emitido ofício pela Director de Finanças de Coimbra e enviado por correio postal registado com aviso de recepção para o mandatário dos oras Recorrentes, nessa qualidade, com o seguinte teor:
«Assunto: Notificação do Relatório de Inspecção Tributária (Arts. 87.º n.º 1 d) e 89.º-A, ambos da Lei Geral Tributária e art. 62.º do Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária e Aduaneira - Art. 40.º do CPPT - OI201900396
Exm.os Srs.
Ficam, por este meio notificados o contribuinte “A………. e B………..”, NIF's ………. e ………., na pessoa de V. Ex.ªs, na qualidade de mandatários, nos termos do art. 77.º da LGT e do art. 62.º do RCPITA, do Relatório de Inspecção Tributária e do teor do(s) despacho(s) que sobre ele recaiu(iram), que se anexa(m) como parte integrante da presente notificação, relativamente às situações abaixo indicadas:
Da fixação do rendimento colectável de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS) por métodos indirectos, nos termos dos artigos 87.º a 90.º da Lei Geral Tributária (LGT), por remissão do artigo 39.º do código do IRS, nos seguintes anos.
Ano Rendimento Líquido Fixado
2017 € 144.000,00
As decisões tomadas referidas nos pontos anteriores têm por base os factos, motivos e fundamentos e, bem assim como, os critérios e cálculos que originaram os valores acima referidos, expressamente desenvolvidos no Relatório da Inspecção Tributária.
Contra a fixação ora notificada, poderá apresentar recurso judicial, para o Tribunal Administrativo e Fiscal da área do domicílio, nos termos dos n.ºs 7 e 8 do citado art. 89.º-A da Lei Geral Tributária, no prazo de 10 (dez) dias a contar da data da assinatura do aviso de recepção que acompanha a presente notificação, nos termos previstos no art.º 146.º-B do Código de Procedimento e de Processo Tributário.
Junta-se fotocópia do relatório e anexos, num total de trinta e seis folhas»;
Cfr. visado ofício n.º 8043, talão de aceitação de correio postal registado com o registo n.º RH286167629PT e aviso de recepção, presentes a fls. 133-135 do PAT apensado aos autos em 17.12.2020 - fls. 662-664 dos autos em suporte electrónico - SITAF.

23. No mesmo dia foi emitido e enviado ofício dirigido directamente aos ora Recorrentes, por correio postal registado, tendente a dar-lhes conhecimento do envio do ofício aludido no ponto anterior;
Cfr. visado ofício n.º 8047 e talão de aceitação de correio postal registado com o registo n.º RH286167615PT, presentes a fls. 171-172 do PAT apensado aos autos em 17.12.2020 - fls. 702-703 dos autos em suporte electrónico - SITAF.

24. Em 15.11.2019 foi proferida decisão final no processo n.º 668/19.4BECBR, aludido em 19., julgando extinta a instância por inutilidade superveniente da lide, decisão transitada entretanto em julgado;
Cfr. consulta dos aludidos autos, via SITAF.

25. Em 18.11.2019 deu entrada em juízo o recurso que deu origem aos presentes autos, enviado que foi por correio postal registado de 15.11.2019;
Cfr. registo SITAF, com aposição de etiqueta de correio postal registado, a fls. 2 dos autos em suporte electrónico - SITAF.

Mais se provou que:

26. Em 16.02.2017 D………., nascido em 11.10.1952, realizou uma remessa de dinheiro da República Popular da China para Portugal, no valor de € 30.000,00, com origem no Banco de Construção da China e destino na conta bancária da ora Recorrente mulher com o IBAN PT………………………;
Cfr. documentos originais, certificados e traduzidos, juntos pelos Recorrentes aos autos em 06.02.2020, apensos por linha, constando as respectivas cópias a fls. 277-281 dos autos em suporte electrónico - SITAF. Trata-se de facto instrumental que decorreu da instrução da causa - art.º 5.º, n.º 2, al. a) do NCPC, aplicável ex vi art.º 2.º, al. e) do CPPT, até porque apenas foi alegado pelos Recorrentes no seu requerimento de 06.01.2020. Embora D………, testemunha nos autos, tenha declarado que o único dinheiro que enviou à sua filha, ora Recorrente, fosse o referente ao empréstimo por si pedido junto de Entidade Bancária da República Popular da China, não há como não valorar a visada prova documental produzida.

27. Em 22.02.2017 H…….., nascida em 27.11.1982, realizou uma remessa de dinheiro da República Popular da China para Portugal, no valor de € 45.000,00, com origem no Banco de Construção da China e destino na conta bancária do ora Recorrente marido com o IBAN …………………;
Cfr. documentos originais, certificados e traduzidos, juntos pelos Recorrentes aos autos em 06.02.2020, apensos por linha, constando as respectivas cópias a fls. 287-291 dos autos em suporte electrónico - SITAF.

28. Em 13.07.2017 D………., nascido em 11.10.1952, solicitou ao Banco Comercial Rural Co. Lda. de Zhejiang Qingtian, República Popular da China, um empréstimo em moeda estrangeira de € 110.000,00, que remessou para a conta bancária da ora Recorrente mulher com o IBAN PT………………………., a que corresponderam € 109.989,60 por pagamento de taxas bancárias;
Cfr. documentos originais, certificados e traduzidos, juntos pelos Recorrentes aos autos em 06.02.2020, apensos por linha, constando as respectivas cópias a fls. 282-286 dos autos em suporte electrónico - SITAF; cfr. ainda documento n.º 3 junto pelos Recorrentes com o seu articulado inicial, cuja tradução certificada foi junta aos autos em 17.01.2020, presentes, respectivamente, a fls. 182-184 e 314-323 dos autos em suporte electrónico - SITAF; e atento ainda extracto bancário levado ao probatório sob o ponto 12., do qual consta transferência bancária no valor de € 109.989,60 nessa mesma data.

29. O empréstimo referido no ponto anterior foi contratualizado com a obrigação do pagamento da taxa de juros mensal de 3,262500% sobre o montante mutuado, sem data para o respectivo vencimento;
Cfr. 3.ª folha do documento n.º 3 junto pelos Recorrentes com o seu articulado inicial - “Recibo de Empréstimo”, cuja tradução certificada foi junta aos autos em 17.01.2020, presente, respectivamente, a fls. 184 e 316-323 dos autos em suporte electrónico - SITAF. Cfr. ainda depoimento da 3.ª testemunha dos Recorrentes, que é o visado mutuário.

30. Em 25.07.2017 I………., nascida em 23.03.1954, realizou uma remessa de dinheiro da República Popular da China para Portugal, no valor de €40.000,00, com origem no Banco Comercial Rural Co. Lda. de Zhejiang Qingtian, República Popular da China, e destino na conta bancária de F…………….. com o IBAN PT……………..;
Cfr. documentos originais, certificados e traduzidos, juntos pelos Recorrentes aos autos em 06.02.2020, apensos por linha, constando as respectivas cópias a fls. 292-296 dos autos em suporte electrónico - SITAF.

31. A ora Recorrente mulher foi dando dinheiro ao seu pai, D………, desde ano indeterminado, e os € 30.000,00 que este lhe enviou a partir da China, aludidos em 26., não são para devolver;
Cfr. declarações da ora Recorrente mulher. Trata-se de facto instrumental que decorreu da instrução da causa - art. 5.º, n.º 2, al. a) do NCPC, aplicável ex vi art. 2.º, al. e) do CPPT.

32. A remessa dos € 45.000,00 aludidos em 27. decorre de um pedido de empréstimo de dinheiro do ora Recorrente marido junto da sua irmã, H……….., com o fito de comprar uma loja em Portugal;
Cfr. declarações dos ora Recorrentes. Trata-se de facto que é complemento/concretização do que alegaram no artigo 194.º do articulado inicial, tendo resultado da instrução da causa - art. 5.º, n.º 2, al. b) do NCPC, aplicável ex vi art. 2.º, al. e) do CPPT.

33. A ora Recorrente mulher pediu dinheiro emprestado à sua amiga E………., com o fito de comprar uma loja em Portugal, a qual lhe emprestou em 14.08.2017 e 15.08.2017, um total de € 4.000,00;
Cfr. declarações da ora Recorrente mulher, complementando/concretizando o que havia alegado no artigo 195.º do articulado inicial, tendo resultado da instrução da causa - art. 5.º, n.º 2, al. b) do NCPC, aplicável ex vi art. 2.º, al. e) do CPPT. Cfr. ainda extracto bancário levado ao probatório sob o ponto 12., do qual resultam duas transferências de € 2.000,00 cada, em 14.08.2017 e 15.08.2017, respectivamente, provenientes de transferências electrónicas interbancárias da conta bancária com o IBAN PT…………….. titulada pela referida E……… para a conta bancária da ora Recorrente mulher titulada no Novo Banco, S.A. ali identificada.

34. A ora Recorrente mulher pediu dinheiro emprestado ao seu amigo F…………, que conhece desde criança, com o fito de comprar uma loja em Portugal, tendo este lhe transferido para a sua conta bancária, no dia 25.08.2017, o montante de € 40.000,00, que lhe foi remetido, por seu turno, pela sua mãe, I…………, aludida em 30.;
Cfr. declarações da ora Recorrente mulher e depoimento da 2.ª testemunha dos Recorrentes, o aludido F…………, sendo factualidade que constitui, complemento / concretização do que havia sido alegado no artigo 196.º do articulado inicial, tendo resultado da instrução da causa - art. 5.º, n.º 2, al. b) do NCPC, aplicável ex vi art. 2.º, al. e) do CPPT; cfr. ainda extracto bancário levado ao probatório sob o ponto 12., do qual resulta a aludida transferência electrónica interbancária da conta bancária com o IBAN PT……………….. titulada pelo referido F………. para a conta bancária da ora Recorrente mulher titulada no Novo Banco, S.A. ali identificada.

35. A ora Recorrente mulher pediu dinheiro emprestado ao seu amigo G…………., com o fito de comprar uma loja em Portugal, o qual lhe emprestou € 2.000,00 em 05.09.2017;
Cfr. declarações da ora Recorrente mulher, complementando/concretizando o que havia alegado no artigo 197.º do articulado inicial, tendo resultado da instrução da causa - art. 5.º, n.º 2, al. b) do NCPC, aplicável ex vi art. 2.º, al. e) do CPPT; depoimento do próprio G…………, última testemunha dos Recorrentes inquirida, que o confirmou; e extracto bancário levado ao probatório sob o ponto 12., do qual resulta a visada transferência bancária.

36. J………… emprestou € 5.000,00 aos ora Recorrentes, no ano de 2007, na qualidade de amigo, com o fito destes comprarem um armazém, transferindo tal dinheiro para conta bancária do ora Recorrente marido, tendo-lhe sido devolvido tal montante, em duas tranches, entre finais de 2017 e início de 2018».


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2.2 DE DIREITO

2.2.1 A QUESTÃO A APRECIAR E DECIDIR

2.2.1.1 A AT, verificando que os ora Recorrentes no ano de 2017 compraram 2 imóveis, pelo valor declarado de € 720.000, a que corresponde um rendimento padrão de € 144.000 (€ 720.000 x 20%), tal como definido no n.º 4 do art. 89.º-A da LGT (à qual se referirão todos os artigos adiante mencionados sem expressa menção do diploma de origem), e que, nesse ano, os rendimentos líquidos (() O n.º 1 do art. 89.º-A da LGT, assim o determina, no caso do sujeito passivo ter entregue declaração de rendimentos.) por eles declarados para efeitos de IRS foram de € 9.069,50, evidenciando uma desproporção, relativamente àquele rendimento padrão, para menos, superior a 30%, considerou verificados os pressupostos para recorrer à avaliação indirecta da matéria tributável, de acordo com a previsão do n.º 1 do referido art. 89.º-A e da alínea c) do n.º 1 do art. 87.º.
No âmbito do procedimento de fixação da matéria tributável por método indirecto previsto no art. 89.º-A, verificou que os sujeitos passivos, em ordem à referida aquisição, contraíram um empréstimo bancário, com garantia hipotecária, no montante de € 500.000, pelo que ficavam por justificar (leia-se, demonstrar a origem ou fonte dos valores aplicados na aquisição e a não obrigatoriedade da declaração desses valores como rendimentos para efeitos de tributação em IRS, cf. n.º 3 do art. 89.º-A) € 220.000, cuja proveniência considerou que os sujeitos passivos, apesar de alegarem que resultam de empréstimos particulares, não conseguiram demonstrar.
Consequentemente, considerando que os sujeitos passivos não lograram comprovar, como lho impunha o n.º 3 do art. 89.º-A, que correspondem à realidade os rendimentos que declararam à AT no ano de 2017 e que os rendimentos que lhe permitiram a referida manifestação de fortuna (na parte que excederam o montante do empréstimo bancário) não estavam sujeitos a declaração (designadamente, que provinham dos alegados empréstimos particulares), a AT, de acordo com o disposto no n.º 4 do art. 89.º-A, corrigiu-lhes a matéria tributável declarada para o ano de 2017, de € 9.069,50, para € 144.000, assim operando uma correcção do montante de € 134.930,50.

2.2.1.2 Os sujeitos passivos reagiram judicialmente – mediante a interposição do recurso judicial previsto no art. 89.º-A, n.ºs 7 e 8 –, considerando, para além do mais e no que ora nos interessa, que para pagamento do valor da aquisição dos imóveis, para além do empréstimo bancário que contraíram para o efeito, usaram o dinheiro proveniente de empréstimos que lhe foram efectuados por familiares e amigos, motivo por que se devem ter como justificados na totalidade os rendimentos que deram origem à manifestação de fortuna evidenciada.

2.2.1.3 A Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, em face da prova produzida no processo judicial, considerou provado que, para a aquisição dos imóveis que constitui a manifestação de fortuna de que nos ocupamos, os sujeitos passivos, para além do referido empréstimo bancário de € 500.000, obtiveram empréstimos particulares – de familiares e amigos – do montante de 190.989,63 €, motivo por que apenas ficam por justificar € 29.010,40, motivo por que a correcção a efectuar pela AT ascende a apenas € 19.940,90, diferença entre o valor não justificado e os rendimentos líquidos declarados no ano de 2017 (€ 29.010,40 - € 9.069,50).
Em consequência, considerou a manifestação de fortuna justificada em parte e, em consequência, mantendo embora a decisão administrativa de fixação da matéria tributável por métodos indirectos, anulou a respectiva quantificação na parte em que excede o referido montante de € 19.940,90.
Porque releva para a economia do presente recurso, atentas as alegações dos Recorrentes e respectivas conclusões, há ainda que ter presente que a Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, apreciando a questão da “errónea quantificação” do rendimento tributável, considerou que a AT não tinha incorrido em excesso de quantificação, «mas antes no inverso». Isto porque, a seu ver, no caso verificam-se os pressupostos de aplicação da alínea d) e da alínea f) do n.º 1 do art. 87.º, motivo por que, nos termos do n.º 2 desse artigo (() «No caso de verificação simultânea dos pressupostos de aplicação da alínea d) e da alínea f) do número anterior, a avaliação indirecta deve ser efectuada nos termos dos n.ºs 3 e 5 do artigo 89.º-A».), a avaliação indirecta deveria ter sido efectuada nos termos dos n.ºs 3 e 5 do art. 89.º-A, e não nos termos do n.º 4 (() Segundo o qual, quando o sujeito passivo não faça a prova prevista no n.º 3 do art. 89.º-A, o rendimento tributável a fixar em sede de IRS, a enquadrar na categoria G, no ano em causa, é o rendimento padrão previsto na tabela, ou seja, para os «imóveis de valor de aquisição superior a € 250.000» é de «20% do valor de aquisição». ). Ou seja, se bem interpretamos a sentença, nesta considera-se que a quantificação da matéria tributável deveria ter sido fixada, não em € 144.000, como foi, mas em € 210.930,50 (€ 720.000 - € 500.000 - € 9.069,56), nos termos do n.º 5 do art. 89.º-A, aplicável por força do n.º 2 do art. 87.º (() Note-se que a norma constante do art. 87.º, n.º 2, da LGT, não tem aplicação quando nos encontramos perante manifestação de fortuna derivada da aquisição de imóveis, assim devendo sempre aplicar-se o regime previsto no art. 89.º-A, n.ºs 1 a 4, da LGT, contrariamente ao que defende o Tribunal a quo - cf. JOSÉ MARIA FERNANDES PIRES et alia, Lei Geral Tributária Comentada e Anotada, Almedina, 2015, pág. 906.).

2.2.1.4 Inconformados com essa sentença, os sujeitos passivos dela recorrem para este Supremo Tribunal Administrativo.
Começam por invocar a violação do princípio da separação de poderes, na medida em que consideram que o Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, ao invés de apreciar a legalidade do acto tributário recorrido de acordo com os pressupostos de direito convocados pela AT, apreciou-o à luz de um enquadramento jurídico diverso, que entendeu mais ajustado à situação fáctica, assim se substituindo à AT, violando o princípio da separação de poderes, consagrado na CRP.
Mais argumentam que a sentença fez errado julgamento quanto à quantificação da matéria tributável, pois não relevou para o efeito que a quantificação do rendimento tributável «deve ser igual a 20% do valor de aquisição deduzindo-se a este valor de aquisição» os valores dos empréstimos, de onde resulta que a correcção a efectuar se deveria situar em € 3.988,18 (cf. conclusões vii) a xiv)).
Assim, as questões que ora cumpre apreciar são as que deixámos enunciadas em 1.5.

2.2.2 DA VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DE PODERES

Embora, em abstracto, a tese dos Recorrentes mereça a nossa concordância – tendo, aliás, este Supremo Tribunal por várias vezes salientado que a legalidade do acto tributário não pode ser sindicada judicialmente senão com os fundamentos ao abrigo dos quais a AT o praticou e que externou (Vide, por mais recente, o acórdão de 28 de Outubro de 2020, proferido no processo com o n.º 2887/13.8BEPRT, disponível em http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/-/e0c207951f49818680258616004427dc.) –, a situação dos autos afigura-se-nos não recair nessa situação.
Na verdade, a Juíza não questiona que a AT estivesse legitimada a recorrer aos métodos indirectos ao abrigo do disposto na alínea d) do n.º 1 do art. 87.º.
É apenas no que respeita à quantificação da matéria tributável – onde surge a sustentar a posição de que «a Administração Tributária não teria incorrido em excesso de quantificação, mas antes no inverso», ou seja, em défice de quantificação, que a Juíza do Tribunal a quo defende a tese de que «não era o n.º 4 do artigo 89.º-A da LGT que deveria ter sido aplicado porquanto, como tivemos ocasião de expor acima, estamos perante um caso de verificação simultânea dos pressupostos de aplicação da alínea d) e da alínea f) do n.º 1 do artigo 87.º da LGT, pelo que a avaliação indirecta deveria ter sido efectuada nos termos dos n.ºs 3 e 5 do artigo 89.º-A da LGT, e não nos termos do n.º 4 do mesmo artigo, tal como prevê o n.º 2 do artigo 87.º da LGT».
Concluímos, pois, que o recurso não pode ser provido com este fundamento porque essa tese sustentada na sentença não relevou para efeitos de aferir da legitimação do recurso ao método indirecto na determinação da matéria tributável, mas apenas quanto à quantificação desta matéria, questão diversa e da qual cuidaremos de seguida.

2.2.3 DO ERRO NA QUANTIFICAÇÃO DA MATÉRIA TRIBUTÁVEL

A nosso ver, têm razão os Recorrentes.
Vejamos:
Antes do mais, há que ter presente que a quantificação foi efectuada ao abrigo do disposto no n.º 4 do art. 89.º-A e, como bem salientam os Recorrentes, é ao abrigo desta disposição legal, que foi a convocada pela AT, que há-de aferir-se a sua legalidade.
Não questionam os Recorrentes, antes aceitam expressamente, que apenas a justificação (comprovação a que alude o n.º 3 do art. 89.º-A da LGT) total – e já não a parcial – afasta a aplicabilidade da determinação indirecta dos rendimentos que permitiram tal manifestação de fortuna.
No entanto, sustentam – aliás em total sintonia com a sentença recorrida –, e em consonância com a jurisprudência deste Supremo Tribunal (Vide, por todos, o acórdão do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo de 5 de Julho de 2012, proferido no processo com o n.º 358/12, disponível em http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/-/839c24d49624f9b480257a3a00577455.), que a sentença cita, que a justificação parcial não pode deixar de ser relevada na quantificação do rendimento tributável que vai ser determinado por esse método.
De acordo com essa jurisprudência, e tendo a sentença dado como assente que os ora Recorrentes lograram justificar o montante de € 500.000, proveniente de empréstimo bancário, e de € 190.989,60, proveniente de empréstimos particulares, ficou por justificar apenas o montante de € 29.010,40, a que corresponde um rendimento-padrão de 20% desse valor, uma vez que «a matéria tributável é apurada com recurso ao rendimento padrão, calculado apenas sobre a manifestação de fortuna não justificada», como bem resulta explicado na jurisprudência deste Supremo Tribunal (Para além do referido acórdão do Pleno, vide o acórdão de 15 de Maio de 2013, proferido no processo com o n.º 664/13, disponível em http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/-/df8378eede7904af80257b81002f1a81.), ou seja, de € 5.802,08.
É nesse montante, e apenas nele, que o rendimento tributável pode ser corrigido, devendo o acto impugnado ser anulado na parte em que excede aquele montante.
O recurso será, pois, provido nesta medida.

2.2.4 CONCLUSÕES

Preparando a decisão, formulamos as seguintes conclusões:

I - Evidenciada a aquisição pelo sujeito passivo de imóveis de valor de aquisição igual ou superior a € 250.000,00 quando no ano da aquisição declarou rendimentos líquidos inferiores em 30% relativamente ao rendimento padrão, fixado pelo legislador em 20% do valor da aquisição (cf. tabela constante do n.º 4 do art. 89.º-A da LGT), consideram-se verificados os pressupostos legais para a avaliação indirecta do seu rendimento tributável desse ano ao abrigo do disposto na alínea d) do art. 87.º da LGT.

II - A justificação (comprovação a que alude o n.º 3 do art. 89.º-A da LGT) meramente parcial não afasta a aplicabilidade da determinação indirecta dos rendimentos que permitiram a manifestação de fortuna, mas não pode deixar de ser relevada na quantificação do rendimento tributável que vai ser determinado por esse método.

III - Resultando essa justificação parcial de empréstimos a que o sujeito passivo recorreu para adquirir os imóveis cujo valor determinou a avaliação indirecta dos seus rendimentos à luz daquele artigo 89.º-A da LGT, a quantificação do rendimento tributável deve ser igual a 20% do valor de aquisição dos imóveis mas deduzido do montante desses empréstimos, já que o montante destes não está nem pode ficar sujeito a IRS; ou seja, ao valor de aquisição deduz-se o montante justificado, calculando-se o rendimento padrão sobre o remanescente.


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3. DECISÃO

Em face do exposto, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo acordam, em conferência, em conceder provimento ao recurso jurisdicional, revogar a sentença recorrida, e anular o acto de fixação da matéria tributável na parte em que excede o acima referido montante de € 5.802,08.

Custas pelos Recorrentes e pela Recorrida, na proporção do decaimento, em 1.ª instância e neste Supremo Tribunal [cf. art. 527.º, n.ºs 1 e 2, do CPC, aplicável ex vi do art. 281.º do CPPT].


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Assinado digitalmente pelo relator, que consigna e atesta que, nos termos do disposto no art. 15.º-A do Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13 de Março, aditado pelo art. 3.º do Decreto-Lei n.º 20/2020, de 1 de Maio, têm voto de conformidade com o presente acórdão os Conselheiros que integram a formação de julgamento.

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Lisboa, 9 de Junho de 2021. - Francisco António Pedrosa de Areal Rothes (relator) - Joaquim Manuel Charneca Condesso - Paulo José Rodrigues Antunes.