Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01194/15.6BEBRG
Data do Acordão:11/18/2020
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:SUZANA TAVARES DA SILVA
Descritores:MAIS VALIAS
INSOLVÊNCIA
IRS
Sumário:I - Os bens apreendidos e vendidos em processo de insolvência continuam a ser propriedade do insolvente até à venda.
II - A diferença entre o valor de aquisição e de venda dos bens imóveis, ainda que esta se faça em processo de insolvência e o respectivo produto fique afecto à satisfação dos credores da insolvência, não deixa de ser um rendimento obtido pelo insolvente.
Nº Convencional:JSTA000P26774
Nº do Documento:SA22020111801194/15
Data de Entrada:06/17/2019
Recorrente:DF BRAGA E OUTROS
Recorrido 1:A....... E OUTROS
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo

I - Relatório

1 – A Fazenda Pública vem interpor recurso da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, de 17 de Maio de 2017, que julgou procedente a impugnação judicial (impugnação decorrente da convolação da oposição à execução fiscal, por despacho de 4 de Junho de 2014, fls. 55ss SITAF) deduzida por A………. e B………., ambos com os sinais dos autos, contra a liquidação de IRS do ano de 2013, tendo apresentado, para tanto, alegações que concluiu do seguinte modo:
1.ª Salvo melhor entendimento, a douta sentença em recurso errou no julgamento de direito pois não podia o Tribunal a quo, em sede de impugnação judicial, afastar a legalidade do tributo impugnado (IRS, categoria G – mais valia decorrente da transmissão do direito de propriedade de bem imóvel, em sede de processo de insolvência de pessoa singular), e anular a respectiva liquidação com fundamento no artigo 59º, nº1, alínea c), do CIRE.
2.ª De harmonia com jurisprudência deste Tribunal:

a. – Os bens apreendidos e vendidos em processo de insolvência continuam a ser propriedade do insolvente até à venda.
b. – A diferença entre o valor da aquisição e da venda dos bens imóveis ainda que esta se faça em processo de insolvência e o respectivo produto fique afecte à satisfação dos credores da insolvência, não deixa de ser um rendimento obtido pelo insolvente, que está obrigado a declara-lo
c. – Em sede de impugnação judicial da liquidação de um imposto apenas pode conhecer-se da legalidade desse acto e já não da responsabilidade pelo pagamento da correspondente divida.

3.ª A douta sentença em recurso violou o artigo 10º, nº1, alínea a), do CIRS e o artigo 288.º, do CIRE (a contrario).

Nestes termos e nos mais de direito que serão doutamente supridos por Vs. Exas. deverá o presente recurso obter provimento e a douta sentença em recurso ser revogada.
Pede e Espera
Justiça!

2. Não foram produzidas contra-alegações.

3. O Excelentíssimo Procurador-Geral Adjunto junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de que o recurso deve ser julgado procedente.


II – Fundamentação


1. Dos factos
A decisão recorrida deu como provada a seguinte factualidade concreta:
1. Os Impugnantes foram declarados insolventes por decisão proferida em 07.11.2011 nos autos do processo de insolvência de pessoa singular que correu termos sob o nº 1230/11, no 1º Juízo, no Tribunal Judicial de Esposende – cfr. fls. 3 e 4 do processo administrativo apenso aos autos.
2. No âmbito do referido processo de insolvência, foi apreendido e, posteriormente, ordenada a venda, por meio de negociação particular, do prédio urbano pertencente aos impugnantes, sito na Rua ………., ………, freguesia ……….., do concelho de Esposende, inscrito na matriz predial da união de freguesia de …………., sob o artigo 2 805, urbano (anterior artigo 2 173, urbano, freguesia …………) – cfr. fls. 62/63 do suporte físico dos autos.
3. Por escritura pública celebrada em 07.11.2013, a Exma. Administradora da insolvência, C………….., vendeu o prédio identificado no ponto anterior, pelo preço de € 365 000,00 (trezentos e sessenta e cinco mil euros) – cfr. fls. 5 a 9 do processo administrativo apenso aos autos.
4. Na declaração de rendimentos do ano de 2013 (vulgo, modelo 3, do IRS), os Impugnantes não declararam quaisquer rendimentos a título de mais valias – cfr. fls. 64/67 do suporte físico dos autos.
5. A AT procedeu à correcção desta declaração de rendimentos pela inclusão do anexo G, para tributação das mais valias decorrentes da transmissão do referido bem imóvel – cfr. fls. 17 a 20 do processo administrativo apenso aos autos.
6. Em 04.12.2014, foi efectuada a liquidação de IRS do ano de 2011, à qual foi atribuído o n.º 2014 16233739, tendo sido apurado imposto no montante € 81 359,95 (oitenta e um mil, trezentos e cinquenta e nove euros e, noventa e cinco cêntimos) - cfr. fls. 29 e 30 do PA e fls. 68/69 do suporte físico dos autos
Factos não provados
Não há factos relevantes para a decisão da causa que não se tenham provado.

2. Questões a decidir
A questão que está subjacente ao presente recurso é a de saber se a sentença do TAF do Porto incorreu em erro de julgamento ao considerar que a mais-valia resultante da alienação, pelo administrador da insolvência, de um imóvel integrante da massa insolvente das pessoas singulares não pode ser integrada no rendimento tributável dos insolventes.


3. De direito
Sobre a imputação dos rendimentos de mais-valias resultantes da venda de bens apreendidos e vendidos em processo de insolvência já se pronunciou por diversas vezes este Supremo Tribunal Administrativo em jurisprudência pacífica e reiterada, como bem sublinha a AT nas suas alegações de recurso.
Para além do acórdão de 31 de Maio de 2017, proferido no processo n.º 01410/16, cujo sumário é transcrito nas alegações de recurso, a solução aí vertida foi também professada nos arestos de 30 de Maio de 2018 (Proc. 0144/17), 24 de Abril de 2019 (proc. 0260/15.2BEFUN) e 21 de Novembro de 2019 (proc. 0146/13.2BELRA), para referir apenas os mais recentes.
Em suma, e como tem sido repetido na jurisprudência precedente:
“I - Os bens apreendidos e vendidos em processo de insolvência continuam a ser propriedade do insolvente até à venda.
II - A diferença entre o valor de aquisição e de venda dos bens imóveis, ainda que esta se faça em processo de insolvência e o respectivo produto fique afecto à satisfação dos credores da insolvência, não deixa de ser um rendimento obtido pelo insolvente.”


III - Decisão

Pelo exposto, acordam os juízes que compõem esta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em conceder provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida e julgar improcedente a impugnação judicial.


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Custas pelos Recorridos [nos termos dos n.ºs 1 e 2 do artigo 527.º do Código de Processo Civil, aplicável ex vi a alínea e), do artigo 2.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário] em ambas as instâncias.
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Lisboa, 18 de Novembro de 2020. - Suzana Maria Calvo Loureiro Tavares da Silva (relatora) - Aníbal Augusto Ruivo Ferraz - Francisco António Pedrosa de Areal Rothes