Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0520/18
Data do Acordão:09/12/2018
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:DULCE NETO
Sumário:
Nº Convencional:JSTA000P23562
Nº do Documento:SA2201809120520
Data de Entrada:05/22/2018
Recorrente:AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Recorrido 1:PARQUE EÓLICO ............., SA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo

1. A Fazenda Pública recorre da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga que julgou parcialmente procedente a impugnação judicial que a sociedade Parque Eólico ............, S.A., instaurou contra a liquidação de Imposto Municipal sobre Imóveis referente ao ano de 2015, anulando-a na parte em que fez incidir a tributação sobre o valor patrimonial tributário atribuído a aerogeradores que integram um Parque Eólico e que foram objecto de inscrição oficiosa na matriz predial urbana.

1.1. Rematou as alegações de recurso com as seguintes conclusões:

A. Vem o presente recurso interposto da douta sentença, datada de 15.11.2017, que julgou procedente a Impugnação Judicial e, em consequência, anulou a liquidação ora impugnada.

B. A impugnação judicial teve por fundamento e causa de pedir a ilegalidade imputada quer à inscrição oficiosa da realidade física (aerogerador(es) na matriz como um prédio urbano, quer à sua avaliação, quer à sua própria tributação, no entendimento de que os parques eólicos não se enquadram no conceito de "prédio".

C. Para uma melhor compreensão da questão propriamente dita, importa que se transcreva o probatório da douta sentença.

Assim,

D. O ato tributário impugnado diz respeito a liquidação de Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI) do ano de 2015, identificada sob o número 2015294575803, no valor de € 59.423,04, entretanto reduzida para € 30.098,53, identificada sob o nº 2015607267805 - correspondente aos prédios urbanos inscritos na matriz predial urbana sob os artigos 1670, 1671, 1672 da freguesia de S. Gens; 48, 49, 50, 51, 52, 53, 54, 55 e 5 da freguesia de Aboim; 1011,1012, 1013, 1014, 1015, 1016, 1017 da freguesia de Monte e 1735, 1736, 1740, 1741, 1742, 1743, 1744, 1745, 1746, 1747, 1748, 1749, 1750, 1751, 1752, 1753, 1754, 1755, 1756, 1757, 1758, 1759, 1760, 1761, 1762, 1763, 1764, 1765, 1766 da freguesia de Moreira do Rei.

E. Os prédios urbanos acima identificados resultaram da inscrição oficiosa na matriz de 48 artigos matriciais urbanos-que correspondem a 47 aerogeradores e 1 subestação (artigo 1736 de Moreira de Rei).

F. Em resultado da 2ª avaliação (com excepção do artigo matricial 1736 de Moreira de Rei e Várzea Cova) o valor tributável dos aerogeradores (prédios urbanos) foi de € 421.440,00.

Da subsunção dos factos ao Direito

G. A primeira questão, ou antes, a única e primordial questão apreciada na douta sentença foi o vício de violação da lei, por inexistência de prédio urbano para efeitos de IMI.

H. Com efeito, a questão foi a de saber se os aerogeradores podem ou não ser classificados como prédio urbano da categoria "Outros", nos termos e para efeitos de inscrição na respectiva matriz e, consequentemente, para efeitos de incidência de IMI.

I. Serviu como fundamentação da douta decisão a argumentação jurídica expressa na jurisprudência recente do TCA Sul, no Acórdão de 26.01.2017, proferido no âmbito do processo nº 516/15, que (resumidamente) assim se transcreve: [...].

J. Tendo por base a fundamentação que serviu de base ao citado aresto, a douta sentença do tribunal a quo concluiu: assim, e acolhendo aqui, a jurisprudência reiterada e constante dos Tribunais Superiores, (...), impõem-se concluir pela procedência presente impugnação, no que concerne à liquidação de IMI que é objecto de impugnação nos presentes autos, e uma vez que os 48 artigos matriciais referentes ao parque eólico ………… não se poderão manter, porquanto realidades físicas que, por essa via, foram objecto de inscrição (47 aerogeradores e 1 subestação) não poderem ser qualificados como prédios para efeitos de CIMI, circunstância que implica, nesta parte, a ilegalidade da liquidação que se mostra impugnada nos presentes autos.

K. E, assim, sustentando-se a douta sentença na fundamentação que acabámos de citar, foi a seguinte a decisão proferida: "julgar procedente a presente Impugnação Judicial, anulando a liquidação impugnada, na parte em que fez incidir a tributação sobre o valor patrimonial das partes do Parque Eólico ………… que foram objecto de inscrição oficiosa na respectiva matriz predial urbana, com todas as consequências legais".

L. Ora, salvo sempre o devido respeito e melhor opinião, a Fazenda Pública discorda da fundamentação tida em linha de conta para a decisão proferida, pelos motivos que adiante se passam a expor,

Assim,

M. Para efeitos de IMI, o conceito de prédio consta do artigo 2º, nº 1, do CIMI, normativo que nos dá a seguinte noção: "prédio é toda a fracção de território, abrangendo as águas, plantações, edifícios e construções de qualquer natureza nela incorporados ou assentes, com caracter de permanência, desde que faça parte do património de uma pessoa singular ou colectiva e, em circunstâncias normais, tenha valor económico, bem como as águas, plantações, edifícios ou construções, embora situados numa fracção de território que constitua parte integrante de um património diverso ou não tenha natureza patrimonial".

N. Antes de mais, convém referir que é consensual o entendimento de que para uma determinada realidade física seja classificada como prédio, terá de, cumulativamente, reunir três elementos:

1º "Elemento" de natureza física: a fracção de território, onde se incluem os edifícios e construções de qualquer natureza nela incorporados (através de alicerces) com carácter de permanência (...);

2º "Elemento" de natureza jurídica - que resulta da necessidade da fracção do território fazer parte do património de uma pessoa singular ou colectiva;

3º "Elemento" de natureza económica: que exige que a fracção de território tenha, em circunstâncias normais, valor económico.

O. Ora, se é verdade que na douta sentença não foram colocados em crise o 1º e 2º elementos (natureza física e natureza jurídica), considerou, no entanto, o Mº Juiz do Tribunal a quo que àquelas realidades físicas lhes faltava, ou não reuniam um terceiro elemento (natureza económica/valor económico) vital, aliás, para que cada um dos aerogeradores pudesse ser classificado como prédio para efeitos fiscais;

P. E foi, com base nesse pressuposto, ou seja, na falta do terceiro elemento (cumulativo) que o Mº Juiz do Tribunal a quo, considerou que não estavam reunidos os pressupostos para que as realidades inscritas na matriz (aerogeradores) pudessem ser qualificados/classificados como prédios e, por tal motivo, inexistia pressuposto legal para a tributação em IMI.

Ou seja,

Q. Segundo o entendimento vertido na douta sentença, só com a confluência dos três elementos se pode qualificar determinada realidade como prédio para efeitos de enquadramento em sede de IMI.

R. No caso em apreço, conforme já o referimos, considerou o Mº Juiz do Tribunal a quo que não estavam reunidos os três elementos, em virtude de lhe faltar o terceiro elemento - valor económico,

S. Valor que, segundo o Mº Juiz, se mostra de importância vital para que a fracção de território, por si só, possa ser qualificado como "prédio", para efeitos de incidência objectiva de IMI, uma vez que o requisito da existência do valor económico não se verifica em relação a cada um dos aerogeradores ou de qualquer outro elemento que compõe o parque eólico (porque individualmente nenhum deles é, por si só, em circunstâncias normais, idóneo para produzir e projectar e injectar a energia na rede pública), mas apenas em relação a este (o parque eólico), na sua unidade, atenta a sua finalidade.

T. Em suma, a douta sentença, seguindo de perto o entendimento expressamente defendido pelo Tribunal Central Administrativo Sul, em 26.02.2017, no Acórdão prolatado no processo nº 516/15, apenas o Parque Eólico (integrante de todos os aerogeradores, subestações, postos de transformação, etc.) é passível de ser qualificado como um prédio, e não cada um dos aerogeradores, porque, é apenas naquele que se encontra a manifestação de capacidade contributiva que revela a existência de tal valor (económico).

U. Ora, salvo o devido respeito, não pode a Fazenda Pública concordar com tal decisão, pois, dela ressalta que a mesma se afastou do conceito normativo que estabelece e define o conceito de prédio, conforme artigo 2º, nº 1, do CIMI;

Sendo que,

V. Do entendimento vertido pela Direcção de Serviços do Imposto Municipal sobre Imóveis na Circular nº 8/2013, emitida em 04 de Outubro de 2013, à qual a Fazenda Pública incumbe aderir, cujo objetivo foi o da interpretação e harmonização da actuação da AT acerca da avaliação e tributação em sede de IMI dos prédios que compõem os designados parques eólicos, foi ali estabelecido o seguinte:

1. A realidade designada por eólico é composta por aerogeradores assíncronos (torres eólicas), subestações (edifícios de comando), redes de cabos que ligam os primeiros aos segundos e respectivos acessos.
2. Cada aerogerador (torre eólica) e cada subestação são unidades independentes em termos funcionais, pelo que constituem prédios para efeitos do disposto no artigo 2º do IMI (CIMI).
3. Os prédios em causa são classificados como urbanos, nos termos do disposto no artigo 4º do mesmo Código.
4. Atenta a sua natureza, os aerogeradores e as subestações são, nos termos do disposto no artigo 6º do CIMI, qualificados como prédios urbanos do tipo "Outros", por não se subsumirem às outras espécies definidas de prédios habitacionais, comerciais, industriais ou para serviços ou terrenos para construção.
5. Os aerogeradores e as subestações são construções dotadas de independência funcional, e são avaliados de acordo com as regras tipificadas no nº 2, do artigo 46º do CIMI.

W. Logo, retira-se do teor da mencionada circular, a que aderimos, o inverso do que ficou assente e decidido na douta sentença, a qual teve por base a fundamentação assente em jurisprudência recente para preparar a douta decisão a quo.

X. Na douta sentença ficou assente que o aerogerador ou uma subestação pertencente a um parque eólico não constitui prédio para efeitos de IMI, uma vez que lhe falta o terceiro elemento, o valor económico - requisito que, segundo o entendimento do Tribunal a quo, não se verifica em relação a cada um dos aerogeradores ou de qualquer outro elemento que compõem o parque eólico; e,

Y. Por conseguinte, ao contrário do entendimento da AT, entendeu o Mº Juiz do Tribunal a quo que, no caso em apreço, não estavam reunidas as condições para que cada um dos aerogeradores, individualmente, por si só, fosse capaz de produzir e injectar energia na rede pública, mas apenas integrado na unidade (parque eólico).

Z. Ora, tal como acima já o referimos, a Fazenda Pública, adere ao entendimento vertido na sobredita Circular 8/2013, no sentido em que a sapata de betão e a estrutura tubular metálica são dotados de autonomia funcional (sublinhados nossos) e, como tal,

AA. Deve ser entendido que cada um dos aerogeradores constitui(em) unidades autónomas que fazem parte do Parque Eólico, podendo ser inscritos na respectiva matriz por serem realidades tributadas na acepção do conceito de prédio, previsto no artigo 2º do CIMI, mantendo-se, em consequência, a inscrição oficiosa na matriz daquelas realidades físicas.

BB. Sendo, então, com base nesse entendimento que a Fazenda Pública vem requerer a V/Exs. que a sentença seja substituída por douto Acórdão no qual venha a ser entendido que cada um dos aerogeradores constitui(em) unidades autónomas que fazem parte do Parque Eólico, podendo ser inscritos na respectiva matriz por serem realidades tributadas na acepção do conceito de prédio, previsto no artigo 2° do CIMI, mantendo-se, em consequência, a inscrição oficiosa na matriz daquelas realidades físicas.

1.2. A Recorrida apresentou contra-alegações para sustentar que a sentença não merece reparo ao ter julgado que as realidades inscritas na matriz não preenchem o conceito fiscal de prédio para efeitos de tributação em sede de IMI, tendo procedido a uma adequada interpretação jurídica dos factos, em linha, aliás, com a jurisprudência reiterada do STA e que se firmou no sentido de que não é aceitável a inscrição oficiosa na matriz de cada aerogerador como um prédio urbano da espécie "outros", porquanto o valor económico não se verifica em relação a cada um dos aerogeradores ou de qualquer outro elemento que compõe o parque eólico (porque individualmente nenhum deles é, por si só, em circunstâncias normais, idóneo para produzir e injetar a energia na rede pública), mas apenas em relação a este, na sua unidade, atenta a sua finalidade.

1.3. A Exm.ª Magistrado do Ministério Público emitiu douto parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso, argumentando, no essencial, o seguinte:

«(...) o julgador do TAF de Braga, para decidir como decidiu, estribou-se na doutrina que emana do douto Acórdão do Venerando TCA Sul, tirado em 26/01/2017, no âmbito do Processo nº 516/15.4BELLE Aresto disponível in www.dgsi.pt, tal como os demais que iremos citar adiante, sem que lhes seja aposta a menção à respetiva fonte. , que firmou o entendimento segundo o qual "Em circunstâncias normais, um aerogerador integrado (enquanto parte componente) num parque eólico destinado à injeção de energia elétrica na rede pública, não tem valor económico próprio. Pelo contrário, é no próprio parque eólico que se encontra a manifestação de capacidade contributiva que revela a existência de tal valor, motivo pelo qual é o parque eólico, que não o aerogerador, que é remunerado pela mencionada produção de energia elétrica. Pelo que, à míngua do terceiro pressuposto (valor económico), não se pode concluir que um aerogerador pertencente a um parque eólico destinado à injeção de energia elétrica na rede pública se possa autonomizar como um prédio para efeitos de IMI.".
Ademais, como enfatizou o M. Juiz do tribunal a quo, esta solução mostra-se atualmente assente e consolidada, como resulta dos doutos arestos deste Colendo STA É o caso, nomeadamente, dos doutos Acórdãos de 15/03/2017, no Processo n° 0140/15, de 07/06/2017, no Processo nº 01417/16 e de 11/10/2017, no Processo n° 0360/17., facto que determinou a não admissão do recurso de revista, nos termos do douto Acórdão do STA, de 13/09/2017, no Processo nº 0543/17 Idêntico entendimento foi firmado no douto aresto de 20/12/2017, no âmbito do Processo nº 01210/17, em que foi acordado em não admitir o recurso de revista excecional, por se considerar que não estão preenchidos os pressupostos a que se refere o nº 1 do artigo 150º do CPTA.
, que decidiu que "Não se justifica admitir o recurso de revista excecional relativamente à questão de saber se um aerogerador integra o conceito de prédio urbano nos termos e para os efeitos previstos no artigo 2º do CIMI tendo em conta a pronúncia já emitida pelo STA sobre a matéria.
(...)
Ora, na perspetiva do Ministério Público, a interpretação efetuada, na sentença em crise, adequa-se à letra e ao espírito da lei e conforta-se na corrente jurisprudencial uniforme e pacífica dos tribunais superiores desta jurisdição, razão pela qual merece o nosso inteiro aplauso. (...)».

1.4. Com a dispensa de vistos legais, cumpre apreciar e decidir em conferência

2. A sentença recorrida julgou como provada a seguinte matéria de facto:

1. A Impugnante instalou nas freguesias de Moreira do Rei, Monte, S. Gens, Gontim, Várzea Cova, Aboim e Pedraído um conjunto de aerogeradores e uma subestação que fazem parte do Parque Eólico ………… - (matéria não controvertida).

2. Devido à reorganização administrativa das freguesias, a AT alterou o número dos artigos que tinha inscrito oficiosamente na matriz nas freguesias de Moreira do Rei, Monte, S. Gens, Gontim, Várzea Cova, Aboim e Pedraído, passando a imputar à Impugnante a titularidade do mesmo número de artigos mas apenas das freguesias de S. Gens, Aboim/Felgueiras, Monte e Moreira do Rei - (matéria não controvertida).

3. A Administração Tributária procedeu à inscrição e avaliação oficiosa de 48 artigos matriciais urbanos que correspondem a 47 aerogeradores e 1 subestação (artigo 1736 de Moreira do Rei) - fls. 1 e ss. do processo administrativo apenso aos autos.

4. Em 29/07/2014, foi apresentado pedido de 2.ª avaliação de todos os prédios, com excepção do artigo 624 de Várzea Cova, actualmente art.º 1736 da União de freguesias de Moreira de Rei e Várzea Cova, tendo os mesmos sido avaliados em € 421.440,00 - (informação inserta no processo administrativo apenso aos autos).

5. O artigo 624 de Várzea Cova, actualmente art.º 1736 da União de freguesias de Moreira de Rei e Várzea Cova, foi objecto de avaliação, tendo sido fixado um VPT de € 96.690,00 - (informação inserta no processo administrativo apenso aos autos).

6. O prédio inscrito sob o artigo 479 da matriz predial urbana da freguesia de Medelo, corresponde a um terreno para construção, localizado Rua ……… (coordenadas X e Y 198180 e 499327), tendo sido objecto de avaliação da qual resultou a fixação de um VPT de € 32.311,75 - (fls. 01 do PA);

7. Mediante deliberação da Assembleia Municipal do Município de Fafe, tomada em sessão ordinária realizada no dia 05.12.2014, foi deliberado: "fixar, nos termos do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI) artigo 112º, n.º 1, alínea c), as taxas do Imposto Municipal sobre Imóveis para o ano de 2015 (a liquidar em 2016) em 0,3% para os prédios urbanos avaliados nos termos do CIMI, aplicando a taxa prevista na alínea a) do referido artigo para os prédios rústicos" - doc. de fls. 116 a 118 do suporte físico dos autos;

8. Em reunião camarária realizada em 18.12.2014, a Câmara Municipal de Fafe tomou conhecimento das deliberações tomadas pela respectiva Assembleia Municipal em 05.12.2014, tendo deliberado "dar execução" - doc. de fls. 122 do suporte físico dos autos;

9. A deliberação camarária foi publicitada mediante edital afixado em 18.12.2014 - fIs. 120 ss do suporte físico dos autos;

10. A taxa de IMI fixada para o ano de 2015, foi publicitada através da página institucional do Município de Fafe na internet bem como através do portal das finanças - docs. de fls. 127 e 128 do suporte físico dos autos;

11. Em 26.02.2016, foi emitida a liquidação de Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI) do ano de 2015, com o nº 2015 294575803, no valor global de € 59.810,05 – cfr. fls. 26 do suporte físico dos autos;

12. No seguimento de procedimento de revisão oficiosa da liquidação de IMI para o ano de 201 foi efectuada uma nova (re)liquidação em 01.04.2016, com o n.º 2015 60919203, no valor global de € 30.098,53 - cfr. fls. 27 do suporte físico dos autos;

13. A petição inicial foi apresentada, através do SITAF, em 31.08.2016 - fls. 02 do suporte físico dos autos.

3. Como se viu, o presente recurso jurisdicional vem interposto da sentença que julgou parcialmente procedente a impugnação judicial instaurada contra a liquidação de Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI) referente ao ano de 2015, anulando-a na parte em que fez incidir a tributação sobre o valor patrimonial tributário que atribuiu a cada um dos aerogeradores de Parque Eólico e que oficiosamente haviam sido inscritos na matriz predial urbana.

Segundo a Fazenda Pública, ora Recorrente, a sentença padece de erro de julgamento, por errada interpretação e aplicação do direito, ao não ter decidido que cada um dos aerogeradores constitui uma unidade autónoma de um parque eólico e que, como tal, pode ser inscrito na matriz predial por constituir uma realidade tributada na acepção do conceito de prédio previsto no art.º 2º do Código do IMI.

Em suma, a Fazenda Pública continua a insistir no entendimento vertido na Circular nº 8/2013, no sentido de que os aerogeradores são dotados de autonomia funcional e, como tal, cada um deles constitui um "prédio" à luz do conceito definido no art.º 2º do Código do IMI.

Tal questão foi já inúmeras vezes colocada a este Supremo Tribunal, tendo sido sufragado, de modo reiterado e uniforme, o entendimento de que os elementos constitutivos de um parque eólico, mais precisamente os aerogeradores, não se subsumem ao conceito fiscal de "prédio" tal como definido nos arts. 2º, 3º, 4º e 6º do CIMI - cfr., entre outros, os acórdãos de 15.03.2017, proc. 0140/15, de 07.06.2017, proc. 01417/16, de 11.10.2017, proc. 0360/17, de 15.11.2017, proc. 01105/17, de 15.11.2017, proc. 01074/17, de 22.11.2017, proc. 0661/17, de 17.01.2018, proc. 01285/17, de 07.02.2018, proc. 01108/17, de 31.01.2018, proc. 01447/17, de 28.02.2018, proc. 01160/17, e de 11.04.2018, proc. 01328/17.

Razão por que nos limitaremos a transcrever a fundamentação contida naquele primeiro acórdão sobre a matéria, proferido no proc. nº 0140/15:
«(...) A primeira questão que importa analisar é a de saber se um parque eólico (e, em particular, um dos seus subparques) pode subsumir-se à figura de "prédio”, tendo em conta que, como se viu, os serviços de finanças consideraram como tal o Subparque da Bezerreira, que faz parte integrante do Parque Eólico do Caramulo (e não cada um dos seus aerogeradores, como passou a ser prática dos serviços da administração tributária após a Circular nº 8/2013 da Direção de Serviços do Imposto Municipal sobre Imóveis). Segundo o entendimento vertido na sentença, o conceito fiscal de "prédio", para efeitos de incidência do IMI, afasta-se da noção civilística contida no art.º 204º do Código Civil, corporizando um conceito mais amplo, «porquanto prevê a existência de um elemento de natureza física (o território, o qual deve ser autónomo e ter um carácter de permanência); um elemento de natureza jurídica (resultante da necessidade do prédio fazer parte do património de uma pessoa física ou jurídica) e um elemento de natureza económica (traduzido na exigência de possuir um valor económico em circunstâncias normais), sendo «que só com a confluência dos três elementos podemos qualificar determinada realidade como prédio para efeitos de enquadramento em sede de IMI».
Entendimento que se mostra correto, na medida em que o art.º 2º do CIMI define o conceito de prédio do seguinte modo:
«1 - Para efeitos do presente Código, prédio é toda a fracção de território, abrangendo as águas, plantações, edifícios e construções de qualquer natureza nela incorporados ou assentes, com carácter de permanência, desde que faça parte do património de uma pessoa singular ou colectiva e, em circunstâncias normais, tenha valor económico, bem como as águas, plantações, edifícios ou construções, nas circunstâncias anteriores, dotados de autonomia económica em relação ao terreno onde se encontrem implantados, embora situados numa fracção de território que constitua parte integrante de um património diverso ou não tenha natureza patrimonial.
2 - Os edifícios ou construções, ainda que móveis por natureza, são havidos como tendo carácter de permanência quando afectos a fins não transitórios.
3 - Presume-se o carácter de permanência quando os edifícios ou construções estiverem assentes no mesmo local por um período superior a um ano.».
Temos, assim, que para efeitos deste imposto, "prédio" é toda a fracção de território (elemento físico), abrangendo águas, plantações, edifícios e construções de qualquer natureza nela incorporados ou assentes com carácter de permanência, que faça parte do património de pessoa singular ou coletiva (elemento jurídico) e que em circunstâncias normais tenha valor económico (elemento económico).
Posto isto, e vista a importância vital do elemento de natureza económica, traduzido na necessidade de a fracção de território em causa possuir, por si só, valor económico para poder ser qualificado como "prédio" para efeitos de incidência objectiva de IMI, a problemática reside, desde logo, em saber se, à luz desta norma, um "parque eólico" pode ser classificado como "prédio" nos termos e para os efeitos da inscrição na matriz predial e consequente avaliação e tributação neste imposto municipal sobre o património imobiliário.
O que passa, necessariamente, por saber o que é um parque eólico.
Da leitura de obras técnicas da especialidade (Cfr., entre outras, a dissertação de mestrado de YESMARY CAROLINA DA SILVA GOUVEIA, no Instituto Superior de Engenharia de Lisboa - Área Departamental de Engenharia Civil, intitulado "Construção de um Parque Eólico Industrial" e bibliografia aí citada.) decorre, de forma clara, que o objetivo final de um parque eólico consiste no aproveitamento da velocidade do vento para a produção de energia elétrica, sendo que, para que tal aconteça, é necessário que o parque seja constituído por alguns elementos essenciais, nomeadamente por um conjunto de aerogeradores que são interligados por cabos de média tensão e cabos de comunicação ligados a uma subestação e a um edifício de comando, que se liga a uma (habitualmente aérea) rede elétrica de transporte.
Deste modo, um parque eólico é constituído por um conjunto obrigatório e interligado de bens, equipamentos e infraestruturas - aerogeradores (Cada um composto por uma sapata de betão ou "fundação", uma estrutura metálica ou "torre", uma naceile, um rotor, e três pás.), postos de transformação, edifícios de comando e de subestação, rede elétrica de cabos subterrâneos com ligação entre os aerogeradores e o edifício de comando/subestação e, no caso de existência de várias subestações, linhas elétricas de ligação destas, bem como caminhos de acesso - tudo com vista a converter a energia cinética do vento em energia elétrica e a injetá-la no sistema eléctrico de potência, sendo que os grandes parques eólicos exigem a construção de várias subestações e de linhas de transmissão para a conexão ao sistema elétrico de potência, sendo esta injeção ou conexão ao sistema elétrico um dos principais parâmetros de um parque eólico.
Em suma, um parque eólico é uma fracção de território (terrestre ou marítimo) organizado e estruturado com variados e interligados elementos constituintes e partes componentes - onde se destacam os aerogeradores conectados em paralelo (no mínimo cinco), um ou mais edifícios onde se localizam a(s) subestação(ões) e o centro de operação e manutenção - com ligação ao solo e com carácter de permanência, sendo todo esse conjunto de bens e equipamentos imprescindível à atividade económica em questão: atividade de transformação da energia eólica em energia elétrica, sua injeção no sistema elétrico de potência e consequente venda desta eletricidade à rede elétrica de acordo com a tarifa regulada em Portugal para o sector eólico em geral.
O que significa que cada um desses elementos constituintes e partes componentes de um parque eólico não pode, de per si, ser considerado um prédio urbano ("outros"), na medida em que não constitui uma parte economicamente independente, isto é, não tem aptidão suficiente para, por si só, desenvolver a aludida atividade económica (A mesma razão leva a que não possam ser considerados como "prédios" (nem a AT ousa considerá-los como tal) os diversos elementos e estruturas que integram um estádio de futebol (as balizas, as bancadas, a estrutura coberta, os balneários, etc.) ou que integram um campo de golfe (o green, o tee, o fairway, os obstáculos, o edifício de atendimento, etc.), já que cada uma dessas estruturas e elementos, que se encontram interligados e conexionados com vista ao mesmo objetivo e finalidade económica, não possuem autonomia económica em relação à fração de território ocupada, pese embora seja incontroverso que tanto o estádio de futebol como o campo de golfe constituem, à luz do mencionado preceito do CIMI, prédios urbanos para efeitos de incidência objetiva de IMI.)
Por conseguinte, e em suma, caracterizando-se como elementos ad integrandum domum, sem autonomia económica relativamente ao todo de que fazem parte, fica afastada a possibilidade de classificar como "prédios" autónomos cada um dos diversos elementos constituintes e partes componentes de um parque eólico, não só porque o seu destino normal não é diferente de todo o prédio, como, também, porque não é possível avaliá-los separadamente, na medida em que não são partes economicamente independentes.
Razão por que consideramos inteiramente correta a posição expressa pelo Tribunal Central Administrativo Sul em 26/02/2017, no acórdão prolatado no processo nº 516/15 (onde se discutia a legalidade da inscrição e avaliação como prédio urbano de um aerogerador), segundo o qual «Em circunstâncias normais, um aerogerador integrado num parque eólico destinado à injecção de energia eléctrica na rede pública, não tem valor económico próprio. Pelo contrário, é no próprio parque eólico que se encontra a manifestação de capacidade contributiva que revela a existência de tal valor, motivo pelo qual é o parque eólico, que não o aerogerador, que é remunerado (...).
Pelo que à míngua do terceiro pressuposto, não se pode concluir que um aerogerador pertencente a um parque eólico destinado à injecção de energia eléctrica na rede pública seja um prédio para efeitos de I.M.I., uma vez que o requisito da existência, em circunstâncias normais, do valor económico, não se verifica em relação a cada um dos aerogeradores ou de qualquer outro elemento que compõe o parque eólico (porque individualmente nenhum deles é, por si só, em circunstâncias normais, idóneo para produzir e injectar a energia na rede pública), mas apenas em relação a este (o parque eólico), na sua unidade, atenta a sua finalidade.».
Assiste, pois, razão à impugnante, ora recorrente, quando advoga que os elementos constitutivos de um parque eólico (os aerogeradores, os elementos de ligação, a estação de comando e a subestação) não se subsumem à figura de "prédio" de acordo com a definição constante no CIMI, atenta a falta de valor económico próprio.
O que faz soçobrar o entendimento vertido pela Direção de Serviços do Imposto Municipal sobre Imóveis na Circular nº 8/2013, onde se veiculou o entendimento de que cada aerogerador e cada subestação são unidades independentes em termos funcionais, devendo, por isso, ser considerados como prédios autónomos e qualificados como prédios urbanos do tipo "outros".».

Termos em que, sem necessidade de outras considerações, se impõe negar provimento ao recurso.

4. Face ao exposto, acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em negar provimento ao recurso.
Custas pela Recorrente.

Lisboa, 12 de Setembro de 2018. – Dulce Neto (relatora) – Pedro Delgado – Isabel Marques da Silva.