Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01011/18.5BEAVR
Data do Acordão:09/16/2020
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:FRANCISCO ROTHES
Descritores:SEGURANÇA SOCIAL
CONTRIBUIÇÕES
Sumário:I - O anexo I do Decreto-Lei n.º 328/93, de 25 de Setembro, foi alterado pelo Decreto-Lei n.º 119/2005, de 22 de Julho, passando o 1.º escalão a corresponder a 150% da remuneração mínima mensal garantida.
II - A partir de 2007 os escalões constantes do anexo n.º 1 do Decreto-Lei n.º 328/93 deixaram de estar associados à remuneração mínima mensal garantida, enquanto referencial do cálculo das contribuições para a segurança social, passando a estar associados ao indexante dos apoios sociais (IAS), instituído pela Lei n.º 53-B/2006, de 29 de Dezembro.
III - Assim, no período compreendido entre Janeiro de 2007 e Novembro de 2010, no cálculo das contribuições de trabalhador independente devidas pelo ora recorrido, havia que multiplicar o valor do IAS fixado para cada ano por 150% (e, depois, aplicar ao resultado o valor da taxa em vigor à data).
Nº Convencional:JSTA000P26349
Nº do Documento:SA22020091601011/18
Data de Entrada:12/05/2019
Recorrente:IGFSS-INSTITUTO DE GESTÃO FINANCEIRA DA SEGURANÇA SOCIAL, I.P.
Recorrido 1:A............
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Recurso jurisdicional da sentença proferida no processo de oposição à execução fiscal com o n.º 1011/18.5BEAVR

1. RELATÓRIO

1.1 O “Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, I.P.” interpôs recurso para o Supremo Tribunal Administrativo da sentença por que o Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro julgou parcialmente procedente as oposições (apensadas) deduzidas pelo acima identificado Recorrido contra as execuções fiscais que contra ele foram instauradas para cobrança de contribuições para a Segurança Social de trabalhador independente, relativas aos períodos de Fevereiro de 2006 a Novembro de 2010 (oposição n.º 1011/18.5BEAVR) e de Dezembro de 2010 a Março de 2011 (oposição nº 1012/18.3BEAVR).

1.2 O recurso foi admitido, para subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo e o Recorrente apresentou a motivação do recurso, com conclusões do seguinte teor:

«1. O presente recurso visa reagir contra a douta sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro em 19/09/2019, que decidiu existir excesso de quantia exequenda e acrescidos no que respeita às contribuições de trabalhador independente do período compreendido entre 01/2007 e 11/2010, julgando a oposição parcialmente procedente “(…) na parte em que a pretensão executiva incorre em excesso da quantia exequenda e respectivos acréscimos legais, determinando-se a anulação da execução na parte correspondente (…)”.

2. O recorrido, enquanto trabalhador independente e nos termos do respectivo regime jurídico, ficou, nos anos de 2007 a 2010, enquadrado no 1.º escalão de entre os escalões indexados à remuneração mínima mensal mais elevada garantida por lei, constantes do anexo n.º 1 do Decreto-Lei n.º 328/93, como base de incidência para efeitos de cálculo do montante das contribuições de trabalhador independente a pagar ao sistema de segurança social.

3. O anexo n.º 1 do Decreto-Lei n.º 328/93, de 25 de Setembro, foi alterado pelo Decreto-Lei n.º 119/2005, de 22 de Julho, passando o 1.º escalão a corresponder a 150% da remuneração mínima mensal garantida.

4. A partir de 2007 os escalões constantes do anexo n.º 1 do Decreto-Lei n.º 328/93 deixaram de estar associados à remuneração mínima mensal garantida, enquanto referencial determinante do cálculo das contribuições para a segurança social, passando a estar associados ao indexante dos apoios sociais (IAS) instituído pela Lei n.º 53-B/2006, de 29 de Dezembro.

5. Assim, no período compreendido entre 01/2007 e 11/2010, as contribuições de trabalhador independente devidas pelo recorrido, teriam de ser calculadas da seguinte forma:
- multiplicando o valor do IAS fixado para cada ano por 150%;
- ao valor resultante dessa multiplicação seria aplicada a taxa de 25,4%, encontrando-se assim o valor da contribuição mensal para cada ano.

6. Assim feitos os cálculos, os valores das contribuições apurados para o referido período e que se encontram em dívida em execução fiscal estão correctos.

7. Porém, a sentença recorrida fez o cálculo dessas contribuições mediante a aplicação do anexo n.º 1 do Decreto-Lei nº 328/93, de 25 de Setembro, na redacção dada pelo Decreto-Lei n.º 240/96, de 14 de Dezembro, ou seja, considerando que o 1.º escalão do referido anexo correspondia a 100% do valor da remuneração mínima mensal garantida, tendo, por isso, apurado valores inferiores aos apurados pela entidade credora e, consequentemente, considerado existir excesso de dívida exequenda e acrescidos.

8. De todo o exposto resulta que a douta sentença recorrida enferma de erro de julgamento de direito por errada aplicação da lei.

Nestes termos, sempre com o mui douto suprimento de V. Exas., deverá ser dado provimento ao presente recurso e, em consequência, ser revogada a douta sentença recorrida, na parte em que julga a oposição parcialmente procedente por existir excesso de quantia exequenda e acrescidos no período compreendido entre 01/2007 e 11/2010, com as legais consequências».

1.3 Não foram apresentadas contra-alegações.

1.4 Recebidos os autos neste Supremo Tribunal Administrativo, o Procurador-Geral-Adjunto emitiu parecer no sentido de que seja concedido provimento ao recurso, revogada a sentença na parte recorrida e julgada a oposição totalmente improcedente. Isto, após enunciar o objecto do recurso e referir a fundamentação de facto e de direito da sentença, com a seguinte fundamentação:

«A questão que vem suscitada consiste em saber se a sentença recorrida padece do vício de erro de julgamento que lhe é assacado pelo Recorrente, o que passa por saber se no período de Janeiro de 2007 a Novembro de 2010, no cálculo das contribuições para a segurança social como trabalhador independente do Recorrido há que atender à percentagem de 100% ou 150%, correspondente ao 1.º escalão do anexo I do Dec.-Lei n.º 328/93, de 25 de Setembro.
Tanto a sentença recorrida como a Recorrente dão como assente que «O recorrido, enquanto trabalhador independente e nos termos do respectivo regime jurídico, ficou, nos anos de 2007 a 2010, enquadrado no 1.º escalão de entre os escalões indexados à remuneração mínima mensal mais elevada garantida por lei, constantes do anexo n.º 1 do Decreto-Lei n.º 328/93, como base de incidência para efeitos de cálculo do montante das contribuições de trabalhador independente a pagar ao sistema de segurança social».
Concordam igualmente no facto de «a partir de 2007 os escalões constantes do anexo n.º 1 do Decreto-Lei n.º 328/93 deixaram de estar associados à remuneração mínima mensal garantida, enquanto referencial determinante do cálculo das contribuições para a segurança social, passando a estar associados ao indexante dos apoios sociais (IAS) instituído pela Lei n.º 53-B/2006, de 29 de Dezembro».
A divergência assente no facto de a Recorrente considerar que «O anexo n.º 1 do Decreto-Lei n.º 328/93, de 25 de Setembro, foi alterado pelo Decreto-Lei n.º 119/2005, de 22 de Julho, passando o 1.º escalão a corresponder a 150% da remuneração mínima mensal garantida», enquanto na sentença o tribunal “a quo” considera nos cálculos da prestação devida que o 1.º escalão do anexo I correspondia «… a 100% do valor da remuneração mínima mensal garantida».
Ou seja, o Mmo. Juiz [do Tribunal] “a quo” embora tenha atendido às alterações introduzidas pelo Dec.-Lei n.º 119/2005 no que respeita à substituição do referente “rmmg” pelo “IAS”, não atendeu às alterações introduzidas aos escalões do Anexo I pelo artigo 3.º 2 [2 Artigo 3.º // Alteração ao anexo I do Decreto-Lei n.º 328/93, de 25 de Setembro // “O anexo I do Decreto-Lei n.º 328/93, de 25 de Setembro, passa a ter a redacção constante do anexo I ao presente diploma, que dele faz parte integrante”] desse diploma, em que a percentagem do 1.º escalão passou de 100% para 150%.
E como resulta do n.º 3 do artigo 4.º do Dec.-Lei n.º 119/2005, «O ajustamento dos escalões decorrente das alterações introduzidas no anexo I do Decreto-Lei n.º 328/93, de 25 de Setembro, é efectuado oficiosamente pelos serviços da segurança social, de acordo com a remuneração convencional que lhe está associada».
[…]».

1.5 Cumpre apreciar e decidir.


* * *

2. FUNDAMENTOS
2.1 DE FACTO

Na sentença recorrida estabeleceram-se os seguintes factos provados:

«1. O Oponente registou-se fiscalmente como trabalhador por conta própria, enquanto trabalhador independente no ramo da prestação de serviços de música, animação e espectáculos, tendo escolhido o escalão 1 do esquema de protecção e, por ter tido, em 2004, o rendimento anual ilíquido de € 5.900,00, em 21/10/2005 pediu o reenquadramento que foi deferido por despacho de 16/11/2005 - artigo 1.º p.i. do pp e pontos 2 e 3 das informações de fls. 3 de ambos os processos físicos das oposições agora apensadas e fls. 62 a 65 do suporte físico do processo principal ou pp;

2. Relativamente ao ano 2006 o agora oponente declarou para efeitos de IRS que o seu agregado familiar, incluindo a sua esposa B………… auferiu rendimento global de € 4.013,75, correspondente a rendimento bruto de categoria B do Oponente no montante de € 6.175,00, de que se apurou não haver IRS a pagar – artigo 13.º da p.i. e demonstração da liquidação de fls. 10 do suporte físico do pp;

3. Relativamente ao ano 2007 o agora oponente declarou para efeitos de IRS que o seu agregado familiar, incluindo a sua esposa B……………auferiu rendimento global de € 4.620,00, correspondente a rendimento bruto de categoria B do Oponente no montante de € 6.600,00, de que se apurou não haver IRS a pagar – artigo 13.º da p.i. e demonstração da liquidação de fls. 11 do suporte físico do pp;

4. Relativamente ao ano 2008 o agora oponente declarou para efeitos de IRS que o seu agregado familiar, incluindo a sua esposa B…………. auferiu rendimento global de € 3.998,40, correspondente a rendimento bruto de categoria B do Oponente no montante de € 5.712,00, de que se apurou não haver IRS a pagar – artigo 13.º da p.i. do processo principal e demonstração da liquidação de fls. 12 do suporte físico do pp e campo 1106 do quadro 11 do anexo B da declaração de rendimentos de fls. 9 a 11 do suporte físico do processo apenso ou pa;

5. Relativamente ao ano 2009 o agora oponente declarou para efeitos de IRS que o seu agregado familiar, incluindo a sua esposa B……………. auferiu rendimento global de € 4.235,00, correspondente a rendimento bruto de categoria B do Oponente no montante de € 6.050,00, de que se apurou não haver IRS a pagar – artigo 13.º da p.i. do processo principal e demonstração da liquidação de fls. 13 do suporte físico do pp e campo 1104 do quadro 11 do anexo B da declaração de rendimentos de fls. 9 a 11 do suporte físico do processo apenso ou pa;

6. Relativamente ao ano 2010 o agora oponente declarou para efeitos de IRS que que não obteve qualquer rendimento de categoria B – artigo 13.º da p.i. do processo principal e campos 1103, 1104 e 1108 do quadro 11 do anexo B da declaração de rendimentos de fls. 12 a 15 do suporte físico do processo apenso ou pa;

7. Em 8/3/2010 a Segurança Social certificou que C………., filho do agora Oponente, se encontrava nessa altura integrado no escalão 1 para efeitos de abono de família – fls. 9 e 14 do suporte físico do pp;

8. Em 4/1/2011 a Segurança Social certificou, para efeitos de atribuição do benefício de tarifa social de fornecimento de energia eléctrica a aplicar a clientes finais economicamente vulneráveis que o Oponente “é beneficiário de prestação social indicada no n.º 2 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 138-A/2010, de 28 de Dezembro” – fls. 15 do suporte físico do pp;

9. Na declaração de rendimentos relativa ao ano 2011, o agora Oponente declarou que não obteve rendimentos da categoria B e que cessou a actividade em 21/3/2011, e confirmou a cessão, em declaração prestada em 20/4/2011, perante a DGCI – fls. 12 a 17 do suporte físico do processo apenso ou pa;

10. Na Secção de Processo Executivo de Aveiro do Instituto de Gestão Financeira da segurança Social (SPEA-IGFSS) foram autuadas pelo menos as seguintes execuções fiscais contra o agora Oponente por falta de pagamento de contribuições como trabalhador independente:

PEF n.º
Data autuação
Período
Quantia Exequenda
0101201100115614
7/3/2011
2006/02-2007/08
2.577,22
0101201100115630
7/3/2011
2007/09-2010/11
6.130,74
0101201200456594
19/11/2012
2010/12-2011/03
718,11
– fls. 18 a 32 do suporte físico do processo principal e fls. 20 a 34 do suporte físico do processo apenso;

11. Por carta registada com aviso de recepção, assinado pelo agora Oponente em 25/3/2011 foi concretizada a citação relativa às execuções fiscais n.º 0101201100115614 e 0101201100115630, com quantia exequenda total de € 8.707,96 – acordo, artigo 3.º da pi e fls. 25 a 27 da oposição n.º 1011/18.5BEAVR e fls. 27 a 29 do suporte físico do processo apenso;

12. Por carta com registo postal n.º RN341147882PT com aviso de recepção, assinado pelo agora Oponente foi concretizada a citação relativa à execução fiscal n.º 0101201200456594, com quantia exequenda total de € 718,11 – fls. 31 do suporte físico do processo apenso e fls. 38 do suporte físico do processo principal;

13. A citação aludida no ponto anterior foi concretizada em 28/11/2012 – ponto 6 das informações de fls. 3 de ambos os suportes físicos das oposições apensas, não impugnado;

14. Em 26/4/2011 foi deduzida a oposição contra a execução fiscal n.º 0101201100115614 e ap. (0101201100115630) – ponto 7 da informação de fls. 3 e carimbo aposto no canto superior direito de fls.4 do suporte físico do processo principal;

15. Em 8/1/2013 foi deduzida a oposição contra a execução fiscal n.º 0101201200456594 – ponto 8 da informação de fls. 3 e carimbo aposto no canto superior direito de fls. 4 do suporte físico do processo apenso;

16. Por despacho de 19/12/2018 da Coordenadora da SPEA-IGFSS foi declarada a prescrição da dívida relativa ao período de 2006/02, no montante de € 124,88, que estava em cobrança no âmbito do PEF n.º 0101201100115614 – fls. 50 a 57 do suporte físico do pp».


*

2.2 DE FACTO E DE DIREITO

2.2.1 A QUESTÃO A APRECIAR E DECIDIR

O Recorrente assaca à sentença recorrida erro de julgamento na parte em que decidiu pela procedência da oposição à execução fiscal por excesso da quantia exequenda.
Para melhor compreendermos a questão a dirimir, vamos recordar o que a sentença decidiu a este propósito:

«[…] Da ilegalidade da liquidação das contribuições em causa por erro na quantificação (admitindo que é devedor, apenas, da quantia de € 2.624,84 e acréscimos legais),
O Oponente concorda que estava sujeito, desde Janeiro de 2006 até Dezembro de 2009, à taxa de 25,4% e, a partir de então, à taxa de 24,6% (artigo 15.º da p.i. do pp), pelo que conclui reconhecendo que é devedor da quantia de € 6.232,40 (artigo 16.º p.i.), mas devido à invocada caducidade, só é válida a dívida no montante de € 2.624,84.
Como se viu, não se reconhece a caducidade de qualquer porção da dívida. Por isso, o Tribunal considera que a situação dos autos tem enquadramento no artigo 204.º, n.º 1, al. h), do CPPT – isto é, é legítima a pretensão de discutir a legalidade do apuramento da dívida, na medida em que o sistema não forneceu qualquer ou meio para o exercício do direito de defesa.
No período em causa vigorava a Lei n.º 32/2002, de 20 de Dezembro, e, além do mais, o Decreto-Lei n.º 328/93, de 25 de Setembro, cujo artigo 33.º, n.º 2, dispunha o seguinte, na redacção dada pelo Decreto-Lei n.º 119/2005, de 22 de Julho: “2- Nos casos em que os trabalhadores independentes, obrigatoriamente abrangidos pelo regime regulado no presente diploma, aufiram, da actividade exercida por conta própria, em determinado ano civil, incluindo o imediatamente anterior àquele em que tenha tido início o enquadramento, rendimento ilíquido inferior a 18 vezes o valor da retribuição mínima mensal, podem os mesmos requerer que lhes seja considerado, como base de incidência, o valor do duodécimo daquele rendimento, com o limite mínimo de 50% da retribuição mínima mensal, nos termos e com os efeitos seguintes:
a) O requerimento, devidamente instruído por documento fiscal, é apresentado, anualmente, nos meses de Setembro e Outubro, reportando-se os respectivos efeitos ao ano civil subsequente;
b) Tratando-se de situação de enquadramento, o requerimento, ainda que não possa ser instruído por documento fiscal, é apresentado no prazo fixado para a declaração do exercício de actividade e os seus efeitos reportam-se ao ano civil em que o enquadramento tem lugar
Por sua vez, o artigo 4.º do referido Decreto-Lei n.º 119/2005, tem o seguinte teor: “

Artigo 4.º - Disposições finais e transitórias
1- Os trabalhadores independentes que se encontrem à data de entrada em vigor do presente diploma a descontar pelo 1.º escalão do anexo I do Decreto-Lei n.º 328/93, de 25 de Setembro, sobre o valor da retribuição mínima mensal e que estejam abrangidos pela situação prevista no n.º 2 do artigo 33.º do Decreto-Lei n.º 328/93, de 25 de Setembro, na redacção conferida pelo presente diploma, devem apresentar o respectivo requerimento no prazo de 90 dias a contar da data de entrada em vigor do presente diploma.
2- Até ao decurso do prazo previsto no número anterior, ou até que seja proferida decisão por parte dos serviços da segurança social competentes sobre o requerimento referido no número anterior, mantém-se a base de incidência contributiva correspondente ao valor da retribuição mínima mensal pela qual os trabalhadores independentes se encontram a descontar à data de entrada em vigor do presente diploma.
3 - O ajustamento dos escalões decorrente das alterações introduzidas no anexo I do Decreto-Lei n.º 328/93, de 25 de Setembro, é efectuado oficiosamente pelos serviços da segurança social, de acordo com a remuneração convencional que lhe está associada.
Em 21/10/2005 o Oponente cumpriu o referido dever declarativo (artigo 4.º do DL 119/2005) com vista a obter aquele benefício – fls. 63 do suporte físico do pp.
Quer dizer que a contribuição devida pelo Oponente no ano 2006 incidia sobre o valor do duodécimo do rendimento ilíquido, uma vez que, em 2004, era inferior a 18 vezes o valor da remuneração mínima mensal (RMM).
Nesta situação, a taxa aplicável era 25,4%, nos termos do artigo 37.º, n.º 1, al. a), do Decreto-Lei n.º 328/93, na redacção dada pelo Decreto-Lei n.º 240/96, ambos acima referidos.
Uma vez que o Oponente declarou, e a Segurança Social não se opôs, que no ano 2004 obteve rendimento anual ilíquido de € 5.900,00 (facto 1 de 3.1 e fls. 62 vº do suporte físico do pp) e que ocorreu o reenquadramento da sua actividade em 2005 (facto 1 de 3.1 supra e fls. 63 do suporte físico do pp), tem de se concluir que a Segurança Social andou bem ao considerar que, sendo o RMM de 2006 igual a € 385,90 (DL 238/2005, de 30 de Dezembro), então 385,90 x 18 = € 6.946,20, pelo que, sendo este valor superior ao rendimento ilíquido obtido em 2004 (€ 5.900,00), aquela taxa deverá incidir sobre o duodécimo deste rendimento.
Ou seja: Base de incidência = € 5.900,00/ 12 = € 491,66.
Pelo que a contribuição mensal seria igual a € 124,88 (ou € 491,66 x 25,4%).
Ora, é esse o valor considerado pela Segurança Social nas certidões de dívida referentes aos meses do ano 2006.
Nessa medida não se reconhece qualquer erro relativo às contribuições do ano 2006.
Não consta dos autos que o Oponente tivesse requerido a continuação da tributação por duodécimos, designadamente quanto ao ano 2007, nem declarou o escalão de remuneração convencional escolhido para base de incidência (artigo 34.º da Decreto-Lei n.º 328/93 e tabela anexa, na redacção dada pelo DL n.º 240/96). Por isso, crê-se que o oponente ficou enquadrado no 1.º escalão da tabela prevista no artigo 34.º do Decreto-Lei n.º 328/93, correspondente à situação anterior e ao nível dos rendimentos declarados.
Sucede que no ano 2007 foi instituído o “indexante de apoios sociais” ou IAS, criado pela Lei n.º 53-B/2006, de 29 de Dezembro, como referência para o cálculo de diversas prestações sociais e para cálculo das contribuições dos trabalhadores para o sistema de segurança social, em substituição do RMM.
Para 2007 o IAS foi fixado em € 397,86, (Portaria n.º 106/2007, de 23 de Janeiro).
Assim, base de incidência = € 397,86 x 100% (1.º escalão, cfr. anexo I do artigo 34.º do DL n.º 328/93, na redacção dada pelo DL n.º 240/96) = € 397,86;
Logo, o valor da contribuição a pagar seria: € 397,86 x 25,4% = € 101,05.
Ora, verifica-se que da certidão consta o valor da contribuição em dívida é € 147, 03 (meses 2007.01 e 2007.02) e € 151,58 (restantes meses, como se o cálculo tivesse incidido sobre o 2.º escalão da Tabela I acima referida, equivalente a 150% do IAS, ou seja: 397,86 x 150% = € 596,79 x 25,4% = € 151, 58 (valor da contribuição em execução fiscal).
Pelo que nesta parte, o Tribunal reconhece o invocado erro.
Quanto ao ano 2008, o IAS foi fixado em € 407,41 (Portaria n.º 9/2008, de 3 de Janeiro).
A base de incidência seria: € 407,41 x 100% (1.º escalão) = €407,41.
E a contribuição devida seria: € 407,41x 25,4% = € 103,47.
Uma vez que da certidão de dívidas consta a contribuição de € 151,58 e € 155, 22 (este último valor corresponde à utilização do 2.º escalão para determinação da base de incidência, já que € 407,41 x 150% = € 611,12 x 25,4% = € 155,22).
Pelo que se afigura que, nesta parte, também se verifica o invocado erro.
Para o ano 2009 o IAS foi fixado em € 419,22 (Portaria n.º 1514/2008, de 24 de Dezembro).
A base de incidência seria: € 419,22 x 100% (1.º escalão) = € 419,22; pelo que a contribuição seria: € 419,22 x 25,4% = €106,48.
Verifica-se que a certidão de dívida quantifica a Contribuição em € 155,22 e € 159,72 (este último valor parece corresponder à utilização do 2.º escalão para determinação da base de incidência, em termos idênticos aos acima explicitados). Para 2010 manteve-se o valor do IAS (Decreto-Lei n.º 323/2009, de 24 de Dezembro), pelo que a situação é absolutamente idêntica à referida quanto ao ano 2009.
Por tudo o exposto, o Tribunal reconhece a existência do invocado erro, que cumpre à segurança social reparar, anulando (parcialmente) os valores em excesso».
O Recorrente considera, em síntese, que o Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro incorreu em erro ao ter considerado no cálculo da prestação devida pelo ora Recorrido a título de contribuição o montante de 100% do IAS, quando deveria ter sido 150%.
Isto porque, apesar de ter atendido às alterações introduzidas pela Lei n.º 53-B/2006, de 29 de Dezembro ((ELI: https://data.dre.pt/eli/lei/53-b/2006/12/29/p/dre/pt/html.)), no que respeita à substituição do referente “retribuição mínima mensal” pelo “IAS”, já não atendeu às alterações introduzidas aos escalões do Anexo I pelo art. 3.º do Decreto-Lei n.º 119/2005, de 22 de Julho ((ELI: https://data.dre.pt/eli/dec-lei/119/2005/07/22/p/dre/pt/html.)), nos termos do qual a percentagem do 1.º escalão passou de 100 para 150.
Assim, a única questão a apreciar e decidir é, pois, a de saber se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento ao considerar que havia excesso na liquidação das contribuições em causa, na medida em que foram calculadas com a base 150%, ao invés de o terem sido com a base 100%.

2.2.2 DO ERRO DE JULGAMENTO NA QUANTIFICAÇÃO DAS CONTRIBUIÇÕES

Como bem salientou o Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, estamos perante um dos raros casos em que se permite a discussão da legalidade da liquidação que deu origem à dívida exequenda ao abrigo do disposto na alínea h) do n.º 1 do art. 204.º do CPPT, ou seja, uma situação em que a lei não assegura meio judicial de impugnação ou recurso contra o acto de liquidação.
Salvo o devido respeito, a sentença incorreu em lapso, na medida em que considerou aplicável o anexo I do art. 34.º do Decreto-Lei n.º 328/93, de 25 de Setembro, na redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 240/96, de 14 de Dezembro ((ELI: https://data.dre.pt/eli/dec-lei/240/1996/12/14/p/dre/pt/html.)), quando deveria ter considerado a redacção desse anexo na redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 119/2005, de 22 de Julho.
O que significa, como bem alegaram o Recorrente e o Procurador-Geral-Adjunto neste Supremo Tribunal, que a base para cálculo das contribuições era de 150% do IAS e, consequentemente, que a liquidação não enferma do vício por que a sentença determinou a sua parcial anulação.

2.2.3 CONCLUSÕES

O recurso será, pois, provido e, preparando a decisão, formulamos as seguintes conclusões:
I - O anexo I do Decreto-Lei n.º 328/93, de 25 de Setembro, foi alterado pelo Decreto-Lei n.º 119/2005, de 22 de Julho, passando o 1.º escalão a corresponder a 150% da remuneração mínima mensal garantida.
II - A partir de 2007 os escalões constantes do anexo n.º 1 do Decreto-Lei n.º 328/93 deixaram de estar associados à remuneração mínima mensal garantida, enquanto referencial do cálculo das contribuições para a segurança social, passando a estar associados ao indexante dos apoios sociais (IAS), instituído pela Lei n.º 53-B/2006, de 29 de Dezembro.
III - Assim, no período compreendido entre Janeiro de 2007 e Novembro de 2010, no cálculo das contribuições de trabalhador independente devidas pelo ora recorrido, havia que multiplicar o valor do IAS fixado para cada ano por 150% (e, depois, aplicar ao resultado o valor da taxa em vigor à data).

* * *

3. DECISÃO

Em face do exposto, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo, em conferência, acordam em conceder provimento ao recurso, revogar a sentença na parte recorrida e, em consequência, julgar a oposição improcedente nessa parte.

Custas pelo Recorrido, que não suporta taxa de justiça neste Supremo Tribunal, uma vez que não contra-alegou o recurso [cfr. art. 527.º, n.ºs 1 e 2, do CPC, aplicável ex vi da alínea e) do art. 2.º do CPPT].


*
Lisboa, 16 de Setembro de 2020. – Francisco António Pedrosa de Areal Rothes (relator) – Joaquim Manuel Charneca Condesso – Paulo José Rodrigues Antunes.