Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01048/19.7BESNT
Data do Acordão:10/07/2021
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:JOSÉ VELOSO
Descritores:RECURSO DE REVISTA EXCEPCIONAL
APRECIAÇÃO PRELIMINAR
PROCESSO ARBITRAL
PROVIDÊNCIA CAUTELAR
CADUCIDADE
Sumário:É de admitir a revista relativa à caducidade de providência cautelar decretada no âmbito de um processo arbitral por dúvida justificada quanto ao momento inaugural deste processo.
Nº Convencional:JSTA000P28302
Nº do Documento:SA12021100701048/19
Data de Entrada:09/07/2021
Recorrente:A..............., S.A. E OUTROS
Recorrido 1:B.............., S.A. UNIPESSOAL
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam, em «apreciação preliminar», na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo:
1. A……./C………../D…………-OBRAS DE APROVEITAMENTO HIDROELÉCTRICO DO ………….., ACE; A……….., S.A.; C…………, S.A.; e D…………….., S.A., invocando o artigo 150º do CPTA, vêm pedir revista do acórdão do TCAS de 07.07.2021, que, no âmbito de processo cautelar, em que demandaram a sociedade B……………. e mais três contra-interessados, manteve a decisão sumária da Relatora - de 18.05.2021 - que declarou a caducidade da providência cautelar decretada pelo TAF de Sintra - 13.11.2019 - e, consequentemente, não conheceu do objecto da apelação interposta pela B………….., por inutilidade.

A providência cautelar decretada pelo TAF, a pedido das ora recorrentes, consistira na suspensão de eficácia do acto de aplicação de penalidades contratuais ao empreiteiro, e na intimação da B……………. a abster-se de qualquer acto de execução do mesmo, e de accionar e receber quaisquer montantes titulados por garantias bancárias.

Alegam que a questão jurídica suscitada relativamente aos fundamentos da caducidade das providências cautelares - artigo 123º, nº1, alíneas a) e b), do CPTA - se revestem de grande relevância, e que a sua apreciação, no caso, visa assegurar uma melhor aplicação do direito.

A recorrida B……………… defende que o recurso de revista não deve ser admitido, por a questão em litígio não revestir importância fundamental e se encontrar bem decidida no acórdão recorrido.

2. Dispõe o nº1, do artigo 150º, do CPTA, que «[d]as decisões proferidas em segunda instância pelo Tribunal Central Administrativo pode haver, excepcionalmente, revista para o Supremo Tribunal Administrativo quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental ou quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito».

Deste preceito extrai-se, assim, que as decisões proferidas pelos TCA’s, no uso dos poderes conferidos pelo artigo 149º do CPTA - conhecendo em segundo grau de jurisdição - não são, em regra, susceptíveis de recurso ordinário, dado a sua admissibilidade apenas poder ter lugar: i) Quando esteja em causa apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental; ou, ii) Quando o recurso revelar ser claramente necessário para uma melhor aplicação do direito.

3. O acórdão ora recorrido, em sede de reclamação para a conferência do despacho da Relatora, e confirmando o mesmo, «declarou a caducidade das providências cautelares decretadas nos autos» pela sentença de 1ª instância, datada de 13.11.2019. Para tal entendeu, em essência, que não foi cumprido o prazo legal de três meses para intentar o processo principal - no caso um processo arbitral - na medida em que dentro desse prazo deveria, no caso, ser intentada o «processo arbitral principal» e não, apenas, iniciado o «procedimento arbitral», e que a demora excessiva é imputável, no caso, a negligência das partes nesse procedimento arbitral, com sucessivos pedidos de suspensão da constituição do tribunal arbitral - artigo 123º, nº1 alíneas a) e b), do CPTA.

As ora recorrentes discordam deste acórdão, de 07.07.2021, e imputam-lhe ostensivo erro de julgamento de direito. Defendem que a distinção nele feita entre procedimento e processo arbitral - para efeitos da alínea a) do nº1 do artigo 123º do CPTA - viola o disposto no artigo 33º, nº1, da LAV, segundo o qual «Salvo convenção das partes em contrário, o processo arbitral relativo a determinado litígio tem início na data em que o pedido de submissão desse litígio a arbitragem é recebido pelo demandado», e fará ainda - para efeitos da alínea b) do nº1 do artigo 123º do CPTA -, uma incorrecta interpretação, no caso, do conceito de «negligência».

Prima facie afigura-se assistir base jurídica para a discordância das ora recorrentes, já que a interpretação das pertinentes normas da LAV não conduzem, ao menos de forma clara, à solução jurídica adoptada no acórdão. Merece, pois, ser revista essa decisão.

Ademais, trata-se de questão singular, carente de pronúncia por parte deste Supremo Tribunal, pois é certo que surge na área da justiça arbitral, cada vez mais frequente no âmbito da contratação pública, e, muito embora de natureza adjectiva, repercute-se na defesa de uma tutela jurisdicional efectiva.

Importa pois, quebrar no caso a regra da «excepcionalidade» do recurso de revista, e admiti-lo.

Nestes termos, e de harmonia com o disposto no artigo 150º do CPTA, acordam os juízes desta formação em admitir a revista.

Sem custas.

Lisboa, 7 de Outubro de 2021. – José Veloso (relator) – Teresa de Sousa – Carlos Carvalho.