Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01508/17
Data do Acordão:02/21/2018
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:CASIMIRO GONÇALVES
Descritores:RECURSO DE REVISTA EXCEPCIONAL
PRESSUPOSTOS
Sumário:Atenta a natureza excepcional do recurso de revista previsto no art. 150º do CPTA, (quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental ou quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito), não se verificam os respectivos pressupostos se as questões suscitadas não revestem tal relevância e tais características e se, além disso, o alegado se reconduz à invocação de erro na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais da causa.
Nº Convencional:JSTA000P22918
Nº do Documento:SA22018022101508
Data de Entrada:12/29/2017
Recorrente:B..............., S.A.
Recorrido 1:AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, na formação a que se refere o actual nº 6 do art. 150º do CPTA:

RELATÓRIO
1.1. «B……………………, S.A.», com os demais sinais dos autos, vem interpor recurso de revista excepcional, nos termos do art. 150º do CPTA, do acórdão que, proferido pelo Tribunal Central Administrativo Norte em 29/06/2017, no processo que aí correu termos sob o nº 895/10.0BEBRG, negou provimento ao recurso que a mesma havia interposto da sentença proferida em 15/09/2016, no TAF de Braga, que julgara improcedente a impugnação judicial das liquidações adicionais de IVA e juros compensatórios relativas a 2005 e 2006, no montante global de € 337.758,00 (n° 09192677, no montante de € 2.293,20; nº 09192678, no montante de € 279,71; n° 09192675, no montante de € 4.675,65; n° 09192676, no montante de € 587,21; nº 09192663, no montante de € 65.288,22; n° 09192664, no montante de € 9.422,97; n° 09192673, no montante de € 17.948,10; n° 09192674, no montante de € 2.315,06; n° 09192669, no montante de € 19.250,98; n° 09192670, no montante de € 2.611,80; n° 09192667, no montante de € 8.780,73; nº 09192668, no montante de € 1.220,16; n° 09192665, no montante de € 6.523,65; n° 09192666, no montante de € 928,68; n° 09192659, no montante de € 59.613,36; n° 09192660, no montante de € 9.832,12; n° 09192683, no montante de € 890,43; n° 09192684, no montante de € 96,90; n° 09192661, no montante de € 23.720,05; n° 09192662, no montante de € 3.667,83; n° 09192657, no montante de € 82.907,53; n° 09192658, no montante de € 14.373,67).

1.2. Alegou e formulou, a final, as Conclusões seguintes:
I – No caso concretamente em apreço verifica-se o preenchimento do conceito relevância jurídica fundamental na medida em que, pese embora a situação sub judice verse sobre matéria que tem sido amplamente discutida nos nossos tribunais, juridicamente, a douta decisão aqui em crise “abre caminho” para que a alínea a) do nº 2 do art. 75º da LGT possa ser interpretada de forma tão extensiva, que nunca o escrupuloso cumprimento de todas as obrigações contabilísticas — facturas, guias de remessa, inventários, contabilização de receitas e despesas, etc... — financeiras — cheques, transferências bancárias, letras e extractos bancários —, e documentais — facturas, guias de remessa, documentos de transportadores e de alfândegas — permitirá a um contribuinte estar a salvo de liquidações adicionais de imposto, podendo ser sempre penalizado com base em incumprimentos de obrigações contabilísticas e fiscais de terceiros com quem se relacione comercialmente.
II - Para além disso, fica também limitado, em violação do disposto no art. 74º da LGT, o ónus probatório da AT, na medida em que a mesma poderá, a seu bel prazer, colocar em causa a veracidade das declarações contabilísticas de um contribuinte sem sequer ter necessidade de o inspeccionar, na medida em que, mesmo que o faça e todas as obrigações contabilísticas estejam dentro dos parâmetros legal, e fiscalmente, exigíveis, e ainda que existam também todos os meios probatórios documentais necessários à comprovação das transacções — cheques, extractos bancários, documentos de transporte, facturas de compra e de venda, comprovativos da saída da mercadoria do país, comprovativos bancários, do pagamento das entidades compradoras, etc... —, sempre poderá a AT desconsiderar todos esses elementos com base em inspecções efectuadas a terceiros.
III - A douta sentença dá, indirectamente, um enquadramento ao disposto no art. 63º-C da LGT, que não permite que a existência de cheques, frente e verso, e de extractos bancários comprovativos do levantamento dos mesmos da conta bancária da emitente, sejam adequados a prova de pagamento, mesmo quando inexiste um só elemento indiciador — facto expressamente reconhecido pela AT — de que o dinheiro relativo a tais pagamento retornou a quem emitiu o chegue ou a alguém directa ou indirectamente relacionado com o emitente.
IV - Na situação em apreço, a tese sustentada pela douta decisão do Venerando Tribunal a quo permite que, a montante, a AT recolha indícios em contabilidades de terceiros para penalizar um determinado contribuinte, sem ter que demonstrar, a jusante, ainda que indiciariamente, qualquer falha na contabilidade deste, nos casos em que é imputado ao mesmo a participação num carrossel do IVA e parte das vendas alegadamente fictícias é efectuada em Portugal, a empresas nacionais.
V - In casu, a AT no seu Relatório de Inspecção Tributária imputou, expressamente à recorrente a participação naquilo que se normalmente se designa por “fraude carrossel” sendo que as mercadorias compradas pela recorrente à C……………… e à A…………… foram em grande parte vendidas a empresas portuguesas, encontrando- se esse facto devidamente demonstrado e provado nos autos — cfr. ponto 25 dos factos provados.
VI - Só com a demonstração cabal e completa de que as vendas da recorrente não correspondiam à realidade, pelo menos no que concerne àquelas que foram feitas em território nacional, seria possível concluir-se pela alegada existência da “fraude carrossel”, uma vez que tendo ocorrido as vendas documentadas nos autos a empresas portuguesas — com factura, cheques, documentos e transporte, etc... — a “vantagem indevida” da recorrente seria nula, na medida em que deduziria o IVA na compra e entregaria o mesmo ao Estado na venda.
VII – Para isso, teria que ser feita prova da inexistência dessas vendas em território nacional ou, pelo menos, a demonstração indiciária dessa inexistência, incumbindo à AT esse ónus — cfr. art. 74º da LGT. Acontece que na situação sub judice a AT aceitou expressamente como válidas todas as vendas da recorrente, quer as que tiveram como destino a exportação, quer as que foram efectuadas em território nacional.
VIII - O supra exposto nada tem a ver com erro na apreciação das provas ou na fixação dos factos materiais — cfr. nº 4 do art. 150º do CPTA — mas sim, no modesto entender da recorrente, numa errada interpretação e aplicação do disposto nos arts. 74º e 75º, nº 2, alínea a) da LGT, conjugados com o disposto nos arts. 58º e 99º, também da LGT e art. 113º do CPPT, na medida em que no caso em apreço se reduziu de forma quase arbitrária as obrigações probatórias da AT na concretização dos factos-índice que permitem afastar a presunção do nº 1 do art. 75º da LGT não se tendo tido em conta todos os factos alegados pelas partes.
IX - A descrição sintética da conduta imputada à recorrente pela AT consta de págs. 6 e 7 do Relatório de Inspecção Tributária, e consta do ponto 19 e respectivos subpontos, sendo o teor dos mesmos o seguinte:





X - A págs.16 do Relatório de Inspecção Tributária — cujo teor foi dado como reproduzido no facto provado sob o n -, a AT referiu o seguinte:





XI - A AT dirigiu todo o seu procedimento no sentido de demonstrar que a recorrente terá adquirido a terceiros não identificados mercadoria, tendo a A…………. e a C………….. emitido as respectivas facturas para permitirem a dedução do IVA correspondente a cada uma, sendo que, posteriormente, a recorrente exportou a mercadoria “facturada” por aqueles para países comunitários, com vista a obter o reembolso indevido do IVA relativa a cada uma das facturas de exportação.
XII - Na descrição constante dos factos provados, não resulta claro qual a alegada, e, repita-se, hipotética, vantagem patrimonial da recorrente em “simular” compras para obter uma vantagem traduzida numa dedução de IVA que sempre teria de ser entregue ao Estado no momento da venda. Só não seria assim em duas situações: 1 - Se toda a mercadoria alegadamente objecto de compra simulada tivesse sido exportada; II - Se todas as vendas da referida mercadorias que não fossem de exportação tivessem sido também “simuladas”.
XIII - Dos próprios autos resulta que não se verifica nem uma coisa nem outra.
XIV - No ponto 25 dos factos provados refere-se o seguinte:





XV - Nos 51 anexos cujo teor foi dado como provado consta documentação comprovativa de todas as vendas dos artigos comprados pela recorrente à A……….. e à C……………. com identificação de todas as entidades compradoras, que nacionais, quer estrangeiras.
XVI - Resulta da documentação junta aos autos, dada como reproduzida no ponto 25 da matéria de facto considerada como provada e aceite pela própria AT, mais de € 900.000,00 (novecentos mil euros) de total dos artigos objecto das referidas compras foi vendido em Portugal a empresas portuguesas, o que significa que, neste caso, a vantagem patrimonial da recorrente seria nula e totalmente inexistente, na medida em que foi obrigada a entregar o IVA recebido dos seus clientes.
XVII – Todas as vendas efectuadas pela recorrente nos anos de 2005 e 2006 não foram colocadas em causa pela AT, a qual não fez qualquer tipo de correcção às mesmas, sendo que a mesma foi notificada dos 51 anexos, e não só não impugnou o teor dos mesmos, como também não carreou para o processo qualquer materialidade susceptível de integrar factos-índice passíveis de colocar em causa a veracidade da documentação constante dos mesmos.
XVIII - Esta posição da AT é contraditória com a afirmação constante do ponto 19, e respectivos subpontos, segundo a qual o “ganho” da recorrente com as alegadas compras fictícias à A………. e à C………. tinham por fim a exportação para deste modo aquela poder pedir o reembolso do respectivo IVA.
XIX - Para que a posição da AT pudesse ser sustentável, a mesma teria não só que colocar em causa as compras efectuadas pela recorrente às duas sociedades atrás referidas, como também, no cumprimento do disposto nos arts. 58º e 74º da LGT averiguar se as vendas em Portugal, eram, ou não, verdadeiras, o que não fez.
XX - Lendo a douta decisão recorrida, verifica-se que a mesma, tal como a douta decisão de 1ª instância, versa toda ela sobre a questão da inexistência de compras, inexistindo qualquer referência a uma eventual inexistência das vendas feitas em Portugal e/ou no estrangeiro, mesmo aquelas que foram feitas fora da UE.
XXI - Sendo certo que o nº 3 do art. 19º do CIVA refere que os negócios simulados não são passíveis de dedução do IVA, a verdade é que o objecto do processo é delimitado pela fundamentação do acto administrativo da liquidação feita pela AT, e nessa refere-se expressamente que, in casu, todas as vendas desconsideradas tiveram como origem não só a sua inexistência como também a intenção de obtenção de vantagem patrimonial por parte da recorrente através da exportação dos bens alegadamente adquiridos por esta a terceiros, apesar de na materialidade dada como provada inexistir uma única referência a esse facto.
XXII - Por isso, verifica-se na situação sub judice que a douta decisão recorrida fez uma errada interpretação e aplicação do disposto nos arts. 58º, 74º e 75º nº 1 e 2, alínea a), todos da LGT, e também do art. 100º do CPPT que teria de ser aqui aplicado, pelo menos na parte relativa às vendas ocorridas em território nacional a entidades portuguesas.
XXIII - Face ao teor do acto administrativo da AT, qualquer pessoa colocada em posição similar à da recorrente concluiria que aquilo que estava em causa era a desconsideração de compras efectuadas pela recorrente, por virtude de, alegadamente, as mesmas terem por único fim a obtenção de documentação que permitisse conseguir uma vantagem económica indevida, em sede de IVA, através de vendas efectuadas ao estrangeiro e ao subsequente pedido de reembolso do IVA — cfr. ponto 19, e respectivos subpontos do Relatório de Inspecção Tributária.
XXIV - Para justificar que as compras existiram e foram reais a recorrente carreou para o processo todo o suporte documental das suas compras à A………e à C…………… e das vendas aos seus clientes de mercadoria adquirida àquelas, a saber:
a) Cópia das guias de remessa e das facturas;
b) Cópia, frente e verso, de todos os cheques entregues para pagamento das mercadorias;
c) Cópia dos extractos bancários onde estão reflectivos os movimentos dos cheques supra referidos, sem qualquer truncagem, ou seja, as cópias são integrais e não têm qualquer risco a ocultar qualquer movimento;
d) Cópia dos meios de pagamento dos clientes;
e) Cópia dos comprovativos das empresas de transporte das mercadorias.
XXV - Não há um só pagamento, ou recebimento da recorrente que seja em numerário, excepto no que se refere às suas vendas para Angola, cujas empresas pagavam em numerário, que era sempre depositado na conta da recorrente, em cumprimento do disposto no art. 63º-C da LGT.
XXVI - Conforme se refere na douta decisão recorrida, não há qualquer deficiência a apontar à contabilidade da recorrente, sendo que todos os indícios quanto à inexistência das compras se prendem com circunstância específicas das sociedades A………… e C…………., uma vez que não se fez qualquer prova de que as mesmas tenham devolvido à recorrente qualquer valor pago por esta, nem foi feita prova de que a mesma teria qualquer ligação com as entidades referidas no Relatório de Inspecção como emitentes das facturas de compras daquelas duas sociedades.
XXVII - Por si só, as incongruências contabilísticas e fiscais de terceiras entidades, e também o facto de as mesmas recorrerem à emissão de facturas falsas não pode ser passível de ter consequências jurídicas na esfera de um contribuinte que com elas contrata e que tem todos os comprovativos supra referidos.
XXVIII - Assim sendo, a interpretação conjugada dos arts. 58º, 74º e 75º, nº 1 e 2 alínea a) da LGT no sentido de que basta haver factos-índice relativos a uma determinada entidade para, independentemente do total cumprimento de todas as regras impostas pela lei quanto ao funcionamento de uma sociedade comercial — a nível contabilístico, documental, fiscal e financeiro —, qualquer entidade que se relacione com a mesma possa ser objecto de liquidações adicionais de imposto é inconstitucional, por violação do disposto no nº 2 do art. 18º da CRP.
Termina pedindo que o recurso seja recebido e julgado procedente e, por via disso, seja revogada a decisão recorrida, sendo substituída por outra que contemple as conclusões atrás aduzidas, tudo com as legais consequências.

1.3. Não foram apresentadas contra-alegações.

1.4. O Ministério Público emite Parecer, nos termos seguintes:
«I. Objecto do recurso
1. O presente recurso vem interposto ao abrigo do artigo 150° do CPTA, com o fundamento de que a questão, pela sua relevância jurídica e social, se reveste de importância fundamental, e que o recurso se justifica para melhor aplicação do Direito.
Alega a Recorrente que o acórdão recorrido «“abre caminho” para que a alínea a) do n° 2 do art. 75° da LGT possa ser interpretada de forma tão extensiva, que nunca o escrupuloso cumprimento de todas as obrigações contabilísticas (...) permitirá a um contribuinte estar a salvo de liquidações adicionais de imposto, podendo ser sempre penalizado com base em incumprimento de obrigações contabilísticas e fiscais de terceiros com quem se relacione».
Considera a Recorrente o «interesse de grande relevância social prende-se com o facto de se saber se num conjunto de actos de comércio, quando não se demonstra qualquer tipo de ligação entre os intervenientes nas transações, é possível afastar a presunção do art. 75°, n° 2, alínea a) da LGT relativamente a somente parte dos intervenientes na cadeia de actos — compras e vendas — que termina no consumidor final, sem que todos os intervenientes nessa cadeia transacional, que sejam contribuintes nacionais, tenham sido inspecionados pela AT».
Considera igualmente a Recorrente que o recurso se justifica para melhoria na aplicação do direito atento que «a tese sustentada pela douta decisão do Venerando Tribunal a quo permite que, a montante, a AT recolha indícios em contabilidades de terceiros para penalizar um determinado contribuinte, sem ter que demonstrar, a jusante, ainda que indiciariamente, qualquer falha na contabilidade deste, nos casos em que é imputado ao mesmo a participação num carrossel do IVA e parte das vendas alegadamente fictícias é efectuada em Portugal, a empresas nacionais».
Considera a Recorrente que o acórdão recorrido fez uma errada interpretação e aplicação do disposto nos artigos 74° e 75°, nº 2 da alínea a) da LGT conjugados com o disposto nos arts. 58° e 99° da LGT, e art. 113° do CPPT «na medida em que no caso em apreço se reduziu de forma quase arbitrária as obrigações probatórias da AT na concretização dos factos-índice que permitem afastar a presunção do n° 1 do art. 75° da LGT não se tendo tido em conta todos os factos alegados pelas partes».
2. No acórdão recorrido — acórdão do TCA Norte de 29/06/2017 — considerou-se que embora a contabilidade do sujeito passivo não tenha merecido reparo por parte da AT, esta logrou recolher elementos indiciários que puseram em causa a sua credibilidade e que se traduzem numa probabilidade elevada de as operações referidas nas faturas serem simuladas.
Mais se considerou, invocando-se a jurisprudência do acórdão do mesmo tribunal de 28/02/2013 (proc. n° 00383/08.4BEBRG) que «a prova indiciária que recai sobre a AT não tem que advir de elementos do próprio contribuinte fiscalizado, podendo nessa tarefa lançar mão de elementos obtidos com recurso a fiscalização cruzada junto de outros contribuintes»
Por outro lado considerou-se que a impugnante/Recorrente não tinha satisfeito o seu ónus de prova, tendo para o efeito sido desconsiderados os depoimentos das testemunhas arroladas pela impugnante, por não terem oferecido credibilidade na pronúncia sobre os factos e terem sido desmentidos pelas testemunhas oferecidas pela FP. Daí que se tenha concluído: «... é forçoso concluir que a impugnante não provou a materialidade das transações desconsideradas pela Administração Tributária, posto que os depoimentos recolhidos não se mostram credíveis».
Mais considerou o tribunal “a quo”: «Mas como sabemos, a adequação formal da contabilidade não é garantia nem indício seguro da existência das operações documentadas, porque uma coisa é a aparência formal que se retira da documentação, outra muito diferente é a materialidade das operações que lhe subjazem.
E quanto a estas, manifestamente não podem ter sido efetuadas porque os “fornecedores” também não adquiriram as mercadorias faturadas, como nos parece resultar claro de toda a prova produzida». (...)
«Isso não quer dizer que a Impugnante/Recorrente não tenha vendido a mercadoria aos seus clientes e recebido o respetivo preço. O que se quer dizer tão-somente é que a mercadoria em causa não foi (não pode ter sido) adquirida a estes fornecedores, pelo que a respetiva faturação é falsa».
Resulta, assim, que o tribunal assentou o seu juízo sobre a legalidade das correções efetuadas pela AT nos indícios por esta recolhidos junto dos emitentes das faturas contabilizadas pela impugnante e que foram considerados suficientes para pôr em causa a sua veracidade e a credibilidade da contabilidade desta última.
Por outro lado entendeu o tribunal que a impugnante/Recorrente não logrou fazer prova da materialidade das operações tituladas pelas referidas faturas, não cumpriu o ónus que sobre si recaía.
3. Nos termos do art. 150º n° 1, do CPTA, das decisões proferidas em 2ª instância pelo Tribunal Central Administrativo pode haver, excecionalmente, recurso de revista para o Supremo Tribunal Administrativo, “quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental” ou “quando a admissão do recurso seja claramente necessária uma melhor aplicação do direito”.
A jurisprudência do STA tem assinalado os seguintes requisitos do recurso de revista:
Ocorrerá o 1° requisito quando se verificar uma relevância prática que tenha como ponto obrigatório de referência, o interesse objetivo, isto é, a utilidade jurídica da revista e esta, em termos de capacidade de expansão da controvérsia de modo a ultrapassar os limites da situação singular e não uma mera relevância teórica medida pelo exercício intelectual, mais ou menos complexo, que seja possível praticar sobre as normas discutidas.
Exige-se, assim, que a questão a apreciar seja de complexidade jurídica superior ao comum em razão da dificuldade das operações exegéticas que cumpra efetuar, quando se esteja perante um enquadramento normativo particularmente complexo ou quando se verifique a necessidade de compatibilizar diferentes regimes potencialmente aplicáveis ou se exija ao intérprete e ao julgador complexas operações de natureza lógica e jurídica indispensáveis à resolução das questões suscitadas. E tal relevância jurídica não pode ser meramente teórica, medida pelo exercício intelectual que seja possível praticar sobre as normas discutidas, mas uma relevância prática, com interesse e utilidade objetiva.
Já a relevância social fundamental verificar-se-á nas situações em que esteja em causa uma questão que revele especial capacidade de repercussão social ou de controvérsia relativamente a futuros casos do mesmo tipo, em que a utilidade da decisão extravasa os limites do caso concreto das partes envolvidas no litígio, ou nas situações em que se possa entrever, ainda que reflexamente, a existência de interesses comunitários especialmente relevantes ou em que esteja em causa matéria particularmente sensível em termos do seu impacto comunitário.
A jurisprudência do STA tem igualmente sublinhado a excepcionalidade deste recurso, referindo que o mesmo só pode ser admitido nos estritos limites fixados neste preceito. E como a mesma jurisprudência tem realçado, trata-se não de um recurso ordinário de revista, mas antes, como de resto o legislador cuidou de sublinhar na Exposição de Motivos das Propostas de Lei n.ºs 92/VIII e 93/VIII, de uma «válvula de segurança do sistema» que apenas deve ser accionada naqueles precisos termos.
3.1 Ora, a Recorrente, embora assente o seu recurso na relevância social da questão que pretende ver apreciada pelo tribunal de revista e na necessidade de uma melhor aplicação do direito certo é que temos alguma dificuldade em identificar essa questão de acordo com tais parâmetros e supra enunciados.
Com efeito e embora a Recorrente centre a sua questão no âmbito das regras do ónus da prova à luz do disposto nos artigos 74° e 75°, n° 2, alínea a) da LGT, não logra densificar o entendimento adotado pelo acórdão recorrido e que na sua visão viola os referidos normativos.
A Recorrente insurge-se contra o modo como o tribunal relevou os indícios recolhidos junto dos seus fornecedores e não atendeu às vendas por si efetuadas; Ou seja, para a Recorrente, na avaliação da materialidade das operações tituladas pelas faturas também há que atender às vendas por si efetuadas, pois estas não poderiam ser realizadas sem que tivesse ocorrido a montante a aquisição dos produtos ou mercadorias. Por outro lado, considera a Recorrente, tendo ficado provadas as vendas da mercadoria, não há lugar a qualquer vantagem por si obtida, uma vez que o imposto por si faturado foi entregue ao Estado.
Ora com estas considerações a Recorrente não logra identificar qualquer questão de direito que reúna as caraterísticas supra enunciadas, uma vez que se traduzem apenas numa crítica casuística à apreciação que as instâncias fizeram da prova.
Entendemos, assim, que não se mostram reunidos os requisitos previstos no artigo 150° do CPTA, motivo pelo qual se nos afigura que o recurso não deve ser admitido.»

1.5. Corridos os vistos legais, cabe decidir.

FUNDAMENTOS
2. No acórdão recorrido julgou-se provada e não provada a factualidade seguinte:
2.1. FACTOS PROVADOS
1. A Impugnante, “B………………, S.A.”, Contribuinte Fiscal nº ………….., com domicílio fiscal no …………. – ……….. - Vizela, exerce a actividade de fabricação de artigos têxteis confeccionados excepto vestuário (CAE 013920) desde 2/4/2001.
2. Na sequência de acção inspectiva efectuada à Impugnante relativa aos exercícios de 2005 a 2008, credenciada pelas Ordens de Serviço nº OI200900357 e nº OI200900358, que decorreu entre 31/3/2009 e 17/8/2009, foram emitidas as liquidações adicionais de IVA e juros compensatórios nº 09192677, no montante de € 2.293,20; nº 09192678, no montante de € 279,71; nº 09192675, no montante de € 4.675,65; nº 09192676, no montante de € 587,21; nº 09192663, no montante de € 65.288,22; nº 09192664, no montante de € 9.422,97; nº 09192673, no montante de € 17.948,10; nº 09192674, no montante de € 2.315,06; nº 09192669, no montante de € 19.250,98; nº 09192670, no montante de € 2.611,80; nº 09192667, no montante de € 8.780,73; nº 09192668, no montante de € 1.220,16; nº 09192665, no montante de € 6.523,65; nº 09192666, no montante de € 928,68; nº 09192659, no montante de € 59.613,36; nº 09192660, no montante de € 9.832,12; nº 09192683, no montante de € 890,43; nº 09192684, no montante de € 96,90; nº 09192661, no montante de € 23.720,05; nº 09192662, no montante de € 3.667,83; nº 09192657, no montante de € 82.907,53; nº 09192658, no montante de € 14.373,67; relativas a 2005 e 2006, no montante global de € 337.758,00, conforme documentação de fls. 87/108 dos autos que se dá por reproduzida.
3. As liquidações identificadas em 2 decorreram de correcções técnicas efectuadas na sequência da acção inspectiva aludida em 2 e assentaram na dedução indevida de IVA no montante de € 231.529,16, relativo ao exercício de 2005, e IVA no montante de € 106.228,84, relativo ao exercício de 2006, contabilizado com base em facturas emitidas pelas sociedades comerciais “A………………, Lda.” e “C……………, Lda.”, que a Administração Tributária considerou fictícias, emitidas nas datas e montantes enunciados no quadro de fls. 27 do processo administrativo que se dá por reproduzido.
4. A Administração Tributária remeteu à Impugnante, sob registo postal, o ofício que se encontra a fls. 1 do processo administrativo apenso, datado de 21/8/2009, com vista à notificação do Projecto de Relatório de Inspecção Tributária que consta a fls. 4/28 do processo administrativo apenso, documentação que se dá por reproduzida e da qual se extracta “PROJECTO RELATÓRIO DA INSPECÇÃO TRIBUTÁRIA – ARTIGO 60º LEI GERAL TRIBUTÁRIA (LGT) E ARTIGO 60º DO REGIME COMPLEMENTAR DO PROCEDIMENTO DE INSPECÇÃO TRIBUTÁRIA (RCPIT) (…) no prazo de 10 dias poderá(ão), querendo, exercer o direito de audição, por escrito ou oralmente, sobre o Projecto de Relatório de Inspecção Tributária, que se anexa, nos termos previstos no artigo 60º da LGT e 60º do RCPIT”.
5. A Impugnante, em 10/9/2009, apresentou na Direcção de Finanças de Braga o requerimento que se encontra a fls. 29/49 do processo administrativo apenso, no exercício do direito de audição prévia em relação ao projecto de relatório de inspecção, documento que se dá por reproduzido no qual, além do mais, invocou a nulidade decorrente da Administração Tributária, na notificação para exercício do direito de audição, não ter indicado as horas e local onde o processo poderia ser consultado, o que cerceou o exercício do direito de audição pois “ainda que o processo enferme de vícios passíveis de colocar em causa a sua legalidade tal só será possível conhecer posteriormente”; requereu a inquirição do Dr. …………………, e esclarecimentos em relação a eventuais processos similares instaurados contra as sociedades “A…………” e “C…………..”.
6. A Administração Tributária remeteu ao mandatário da Impugnante, sob registo postal, o ofício que se encontra a fls. 69 do processo administrativo apenso, datado de 21/10/2009, com vista à notificação do Relatório Final de Inspecção Tributária que consta a fls. 73/103 do processo administrativo apenso, bem como das correcções efectuadas à matéria tributável, documento do qual consta o despacho lavrado em 16/10/2009, “Sanciono as conclusões do relatório, bem como as correcções propostas. Procedimentos necessários”, documentação que se dá por reproduzida.
7. O aviso de recepção relativo ao ofício mencionado em 6 foi assinado em 23/10/2009, em conformidade com o documento de fls. 71 do processo administrativo apenso que se dá por reproduzido.
8. A Administração Tributária remeteu à Impugnante, sob registo postal, o ofício que se encontra a fls. 72 do processo administrativo apenso, datado de 21/10/2009, com vista à notificação do Relatório Final de Inspecção Tributária e das correcções efectuadas à matéria tributável, documento do qual consta o despacho lavrado em 16/10/2009, “Sanciono as conclusões do relatório, bem como as correcções propostas. Procedimentos necessários”, documentação que se dá por reproduzida.
9. No Relatório Final de Inspecção Tributária mencionado em 6 e 8, documento que se dá por integralmente reproduzido, consta, “(…) Relativamente ao SP A………… (…) foi possível verificar que alguns dos maiores fornecedores do SP estavam em situações irregulares perante a administração fiscal, pelo seguintes motivos:
18.1.1.Por se encontrarem cessados;
18.1.2. Por não existirem no cadastro da DGCI;
18.1.3.Por terem efectuado vendas de grande valor quando são prestadores de serviços e isentos de IVA ao abrigo do artº 53º do CIVA;
18.1.4. Por estarem em situação de incumprimento declarativo perante a Administração fiscal.
18.2. Perante os factos evidenciados e constantes do processo do SP A………… verificaram-se indícios seguros de estarmos perante a prática de uma actividade fraudulenta, a saber:
18.2.1.A contabilização de compras fictícias;
18.2.2.A não identificação nos documentos dos locais de carga e descarga, bem como da viatura de transporte e onde “foram” colocados à disposição do adquirente os respectivos bens;
18.2.3 A contabilização de documentos extraviados por outros SP;
18.2.4.A caligrafia semelhante nas diferentes facturas, de fornecedores distintos, o que pressupôs a respectiva emissão pela mesma pessoa.
(…)
18.4 Por outro lado, os factos evidenciados nos extractos bancários (conforme extractos bancários fornecidos pelo SP, para os anos de 2006 e 2007, no anexo 4 do processo de inspecção) que o SP forneceu, provaram que:
18.4.1. Não efectuou os pagamentos que a sua contabilidade traduzia;
18.4.2 A emissão de falsos recibos de pagamentos, de valores elevados e no final do ano, quando os seus movimentos bancários não revelavam esses pagamentos, nem tal lhe permitiriam pois não teria saldo para os pagar;
18.4.3. Mais, os pagamentos não se encontram evidenciados nos seus extractos bancários;
18.4.4. As compras não ocorreram e as facturas eram “falsas”.
18.5. Mais, procedemos à visita às instalações do SP, e pudemos verificar que o mesmo, em função do volume de negócios e transacções comerciais evidenciados na sua contabilidade, aparentava não dispor de um armazém que lhe permitisse praticar as operações comerciais que as suas declarações fiscais reflectem.
(…)
25.1.1. No dia 2006-01-10, o SP A………. procedeu ao depósito de valores no montante de € 16.225,50. No dia 2006-01-11, levantou o montante atrás depositado através de um cheque de caixa de igual montante.
25.1.2. No dia 2006-01-17, o SP A…………. procedeu ao depósito de valores no montante de € 52.579,03. No dia 2006-01-20, levantou o montante atrás depositado através de um cheque de caixa de € 52.580,00.
25.1.3. No dia 2006-01-26, o SP A………… procedeu ao depósito de valores no montante de € 56.400,00. No dia 2006-01-27, levantou o montante atrás depositado através de um cheque de caixa de igual montante.
25.1.4. No dia 2006-01-31, o SP A………. procedeu ao depósito de valores no montante de € 52.235,30. No dia 2006-02-02, levantou o montante atrás depositado através de um cheque de caixa de € 52.235,00.
25.2. Podemos verificar que, relativamente a alguns pagamentos efectuados por cheque pelo SP B……………… ao SP A…………, são endossados pelo último ao seu sócio-gerente, ………………….
27.Relativamente ao SP C…………… (…)
27.1.1 O SP C…………. era utilizadora de facturas falsas emitidas pelo sujeito passivo ………….. (NIF ……………….)
27.1.2.A empresa A……………. já tinha “saído” do local declarado como sede e que funcionava sem instalações fixas;
27.1.3.A sócia-gerente da empresa, ……………………., com o NIF ……………. “não tem bancos” e levanta os cheques emitidos pelos clientes à “boca da caixa”;
27.1.4.O modo de pagamento mais utilizado pela C………….. foi o numerário.
27.2. Dos fornecedores da empresa é de referir a situação do SP ……………. (NIF …………….), pelo peso que tem nos inventários do SP.
Verificou-se no exercício de 2006 que:
27.2.1. Do total das compras de 435.254,20€ efectuados pelo SP C……….., 359.450,00€ (aproximadamente 83% do volume total) correspondem a compras que lhe foram efectuadas;
(…) Para além disso foi possível constatar que
27.2.3.1.É um SP “indigente e toxicodependente”;
27.2.3.2.A sua morada é desconhecida ou inexistente;
27.2.3.3.Não possui quaisquer instalações;
27.2.3.4.Não foi encontrada qualquer compra de mercadoria;
27.2.3.5.Não possui uma estrutura empresarial adequada susceptível de desenvolvimento da actividade declarada”.
(…)
27.3.4 Os restantes cheques foram endossados pela C………….. e levantados pela sócia-gerente da C…………, ……………………….
10. Em 2005 e 2006, os fornecedores mencionados na contabilidade da sociedade comercial “A……………….., Lda.”, Contribuinte Fiscal nº ……….., designadamente a sociedade comercial “D……….., Lda.” tinha cessado actividade, ou não constavam no cadastro da DGCI, ou declararam ter efectuado vendas de montante superior ao legal apesar de se tratar de entidades isentas de IVA ao abrigo do artigo 53º do CIVA, ou estavam em situação de incumprimento declarativo perante a Administração Fiscal.
11. Em 2005 e 2006, na contabilidade da sociedade comercial “A……………, Lda.”, Contribuinte Fiscal nº ……………., encontravam-se documentos (facturas) que não identificavam os locais de carga e descarga, não mencionavam a viatura de transporte nem o local onde foram colocados à disposição do adquirente os respectivos bens; foram contabilizados documentos extraviados por outros SP; e existiam documentos de caligrafia semelhante em facturas de fornecedores distintos.
12. Em 2005 e 2006, os extractos bancários da sociedade comercial “A…………….., Lda.”, Contribuinte Fiscal nº ……………, não correspondiam aos pagamentos evidenciados na sua contabilidade, nem tinham saldo que permitisse efectuar tais pagamentos.
13. Em 2005 e 2006, a sociedade comercial “A……………, Lda.”, Contribuinte Fiscal nº ………, não dispunha de armazém que possibilitasse a compra e venda das mercadorias evidenciadas na sua contabilidade.
14. Nos extractos bancários da sociedade comercial “A…………….., Lda.”, Contribuinte Fiscal nº …………….., constam os seguintes movimentos bancários: No dia 2006-01-10 procedeu ao depósito de valores no montante de € 16.225,50, e no dia 2006-01-11 levantou o mesmo montante através de um cheque de caixa; No dia 2006-01-17 procedeu ao depósito de valores no montante de € 52.579,03, e no dia 2006-01-20, levantou € 52.580,00 através de um cheque de caixa; No dia 2006-01-26 procedeu ao depósito de valores no montante de € 56.400,00, e no dia 2006-01-27 levantou o mesmo montante através de um cheque de caixa; No dia 2006-01-31 procedeu ao depósito de valores no montante de € 52.235,30 e no dia 2006-02-02, levantou € 52.235,00 através de um cheque de caixa.
15. Em 2005 e 2006, a Impugnante emitiu e entregou cheques à sociedade comercial “A…………….., Lda.”, Contribuinte Fiscal nº ……………, que foram endossados ao seu sócio-gerente, ………………….
16. Em 2005 e 2006, a sociedade comercial “C…………., Lda.”, Contribuinte Fiscal nº …………., utilizou facturas emitidas pelo sujeito passivo …………….., Contribuinte Fiscal ………………., que a Administração Tributária considerou falsas por se tratar de um conhecido “indigente e toxicodependente”, sem morada conhecida, sem instalações para desenvolver actividade, nem estrutura empresarial, e por não ter declarado qualquer compra de mercadorias.
17. No exercício de 2006, o total das compras de declaradas pela sociedade comercial “C………………, Lda.”, Contribuinte Fiscal nº …………., ascendeu a € 435.254,20, sendo que € 359.450,00€ (aproximadamente 83% do volume total) correspondem a compras que declarou ter efectuado a ………………, Contribuinte Fiscal ………………..
18. Em 2005 e 2006, a sociedade comercial “C……………., Lda.”, Contribuinte Fiscal nº ……………, não tinha instalações nem laborava no local mencionado como sendo a sua sede social, e a sua sócia-gerente, ………………, Contribuinte Fiscal nº …………….., não possuía contas bancárias e levantava os cheques emitidos pelos clientes à “boca da caixa”.
19. A Administração Tributária levou a cabo uma acção inspectiva à sociedade comercial “A…………….., Lda.”, Contribuinte Fiscal nº ..........., credenciada pela Ordem de Serviço nº OI200801024, relativa ao período 200403T, 200406T, 200409T e 200412T, da qual resultou o Relatório de Inspecção que consta a fls. 368/419 dos autos, documento que se dá por reproduzido, e do qual consta que aquela sociedade contabilizou aquisições à sociedade comercial “D……….., Lda.” consideradas fictícias pela análise da sua caligrafia e por terem ocorrido quando esta já tinha cessado actividade, por resultar dos extractos bancários que não foram efectuados os correspondentes pagamentos, e por não terem sido apresentados os respectivos documentos contabilísticos, e os demais fornecedores estarem cessados ou não constarem do cadastro da DGCI.
20. A Administração Tributária levou a cabo uma acção inspectiva à sociedade comercial “C……………, Lda.”, Contribuinte Fiscal nº ………….., credenciada pela Ordem de Serviço nº OI200900059, relativa aos exercícios de 2006 a 2008, da qual resultou o Relatório de Inspecção que consta a fls. 338/348 dos autos, documento que se dá por reproduzido, e do qual consta que a sua contabilidade se encontrava em atraso e não foi regularizada, que constam como seus fornecedores: ………………., conhecido indigente e toxicodependente, sem instalações e estrutura empresarial, que apesar disso, em 2006, 2007 e 2008, emitiu facturas para aquela sociedade respectivamente nos montantes de € 359.450,00, € 40.906,00 e € 31.935,94, que ascendem respectivamente a 83%, 26% e 50% do total das suas aquisições; e ………….., colectado para o comércio de retalho mobiliário e artigos de iluminação, que não entregou o IVA referente às facturas emitidas. Apurou-se ainda que a sócia gerente da “C………..”, ……………., “não tem bancos” e levanta os cheques passados pelos clientes à “boca da caixa”.
21. Dá-se por reproduzido o documento de fls. 170/171 dos autos que constitui cópia de um “print” de um extracto contabilístico da Impugnante relativo ao período compreendido entre 31/12/2004 e 31/8/2008.
22. Dá-se por reproduzido o documento de fls. 172/176 dos autos que constitui cópia do despacho de acusação proferido no Processo nº 232/08.3IDBRG que correu termos nos Serviços do Ministério Público de Guimarães, no qual figura como arguida ………………., à qual foi imputado o crime de abuso de confiança fiscal.
23. Dá-se por reproduzido o documento de fls. 177/179 dos autos que constitui cópia de um “print” de um extracto contabilístico da sociedade comercial “A……………, Lda.”, relativo ao período compreendido entre 31/12/2005 e 30/4/2007.
24. Dá-se por reproduzido o documento de fls. 180/181 dos autos que constitui cópia de um “print” de um extracto contabilístico da sociedade comercial “C…………….., Lda.”, relativo ao período compreendido entre 31/1/2005 e 30/9/2006.
25. Dá-se por reproduzida a documentação mencionada a fls. 203/217, constituída por 51 anexos, que se encontram apensos aos autos em 3 cadernos de argolas, relativa a mercadorias alegadamente adquiridas às sociedades comerciais “A…………….., Lda.” e “C………………, Lda.”, e posterior venda às entidades aí mencionadas.
26. Dá-se por reproduzida a documentação de fls. 514/750 dos autos, constituída por cópias das notas da contabilidade da Impugnante e respectivos extractos bancários e cheques relativos a pagamentos alegadamente efectuados às sociedades comerciais “A………………, Lda.” e “C……………… Lda.”.
27. Dá-se por reproduzido o documento de fls. 751/784 dos autos que constitui cópia de uma informação prestada pelo Serviço de Finanças de Guimarães-2 relativa aos processos fiscais instaurados contra as sociedades comerciais “A………………………, Lda.” e “C……………….. Lda.”.
28. Dá-se por reproduzida a documentação de fls. 797/932 relativa à sociedade comercial “E…………, S.L.U.”, com sede em ………., Ourense.
29. Dá-se por reproduzida a documentação de fls. 951/961 remetida pela Direcção de Serviços de Investigação da Fraude e de Acções Especiais relativa à Impugnante.
30. Dá-se por reproduzida a documentação de fls. 1011/1164 dos autos, constituída por cópias das notas da contabilidade da Impugnante e respectivos extractos bancários e cheques relativos a pagamentos alegadamente efectuados às sociedades comerciais “A…….…….. Lda.” e “C………………, Lda.”.
31. Dá-se por reproduzido o documento de fls. 1177/1178 que constitui cópia de uma informação prestada pela Divisão de Prevenção e Inspecção Tributária à Administração Fiscal Espanhola relativa a aquisições intracomunitárias efectuadas à Impugnante pela sociedade comercial “E………………, S.L.U.”.
32. A presente impugnação foi apresentada em 30/4/2010.

2.2. Quanto a FACTOS NÃO PROVADOS, o acórdão recorrido exarou o seguinte:
«Nada mais se provou com interesse para o conhecimento do mérito, designadamente não se provou que as sociedades comerciais “A……………, Lda.” e “C……………, Lda.” tivessem fornecido à Impugnante as mercadorias constantes das facturas aludidas no probatório em 3, emitidas nos montantes e períodos enunciados no quadro de fls. 27 do processo administrativo, nem que a Impugnante tivesse efectuado os correspondentes pagamentos.»

3. O acórdão recorrido começou por apreciar as invocadas nulidades da sentença [i) por nesta se ter dado como provado o teor de documentos, sem que em sede de fundamentação de direito se tenham indicado as razões porque o fez; (ii) por nela não se ter considerado o valor probatório dos ditos documentos, em face da não impugnação do seu teor por parte da AT, o que se impunha atentas as regras probatórias constantes do art. 376 do CCivil, "ex vi" art. 115º/1 do CPPT], bem como por omissão de pronúncia quanto ao requerimento apresentado a fls. 1188 e 1190, julgando esta extemporânea e aquelas improcedentes.
E apreciou, em seguida os invocados erros de julgamento de facto e de direito, tendo considerado, em síntese:
— embora a contabilidade do sujeito passivo não tenha merecido reparo por parte da AT, esta logrou recolher elementos indiciários que puseram em causa a respectiva credibilidade, elementos esses que traduzem uma probabilidade elevada de as operações referidas nas facturas serem simuladas;
— conforme jurisprudência do próprio TCAN (no acórdão de 28/2/2013, proc. nº 00383/08.4BEBRG) a prova indiciária que recai sobre a AT não tem que advir de elementos do próprio contribuinte fiscalizado, podendo nessa tarefa lançar mão de elementos obtidos com recurso a fiscalização cruzada junto de outros contribuintes.
— em termos de prova, não são de relevar os depoimentos das testemunhas arroladas pela impugnante, por não terem oferecido credibilidade na pronúncia sobre os factos e terem sido desmentidos pelas testemunhas oferecidas pela FP, pelo que «... é forçoso concluir que a impugnante não provou a materialidade das transações desconsideradas pela Administração Tributária, posto que os depoimentos recolhidos não se mostram credíveis», ou seja, é de concluir que a impugnante não satisfez o ónus de prova que sobre ela impende.
— «O facto de a contabilidade da impugnante não merecer qualquer reparo significa apenas que estava tecnicamente bem organizada e em conformidade formal com as normas contabilísticas» mas «... a adequação formal da contabilidade não é garantia nem indício seguro da existência das operações documentadas, porque uma coisa é a aparência formal que se retira da documentação, outra muito diferente é a materialidade das operações que lhe subjazem.
E quanto a estas, manifestamente não podem ter sido efectuadas porque os “fornecedores” também não adquiriram as mercadorias faturadas, como nos parece resultar claro de toda a prova produzida».
— «A prova recolhida pela AT é suficientemente forte e credível para indiciar a faturação falsa destes fornecedores. Assim sendo, cabia à Impugnante/Recorrente o encargo de provar a veracidade das operações faturadas, o que de modo algum conseguiu, como resulta patente da análise conjugada de toda a prova.
Isso não quer dizer que a Impugnante/Recorrente não tenha vendido a mercadoria aos seus clientes e recebido o respetivo preço. O que se quer dizer tão-somente é que a mercadoria em causa não foi (não pode ter sido) adquirida a estes fornecedores, pelo que a respetiva faturação é falsa».
— Resulta, assim, que o tribunal assentou o seu juízo sobre a legalidade das correcções efetuadas pela AT nos indícios por esta recolhidos junto dos emitentes das facturas contabilizadas pela impugnante e que foram considerados suficientes para pôr em causa a sua veracidade e a credibilidade da contabilidade desta última.
Por outro lado, analisando o Relatório de Inspecção, os elementos documentais nele referenciados e os factos que a recorrente questionara no recurso e valorando os depoimentos de cada uma das testemunhas, o acórdão conclui que a impugnante não logrou fazer prova da materialidade das operações tituladas pelas referidas faturas, não cumprindo o ónus que sobre si recaía.

4.1. É do assim decidido pelo TCA Norte que a recorrente interpõe o presente recurso de revista excepcional.
Havendo, então, que apreciar se o recurso é admissível face aos pressupostos de admissibilidade contidos no próprio art. 150º do CPTA, em cujos nºs. 1 e 5 se estabelece:
«1 - Das decisões proferidas em segunda instância pelo Tribunal Central Administrativo pode haver, excepcionalmente, revista para o Supremo Tribunal Administrativo quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental ou quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito.
(…)
5 - A decisão quanto à questão de saber se, no caso concreto, se preenchem os pressupostos do nº 1 compete ao Supremo Tribunal Administrativo, devendo ser objecto de apreciação preliminar sumária, a cargo de uma formação constituída por três juízes de entre os mais antigos da Secção de Contencioso Administrativo».

4.2. Interpretando este nº 1, o STA tem vindo a acentuar a excepcionalidade deste recurso (cfr., por exemplo o ac. de 29/6/2011, rec. nº 0569/11) no sentido de que o mesmo «quer pela sua estrutura, quer pelos requisitos que condicionam a sua admissibilidade quer, ainda e principalmente, pela nota de excepcionalidade expressamente estabelecida na lei, não deve ser entendido como um recurso generalizado de revista mas como um recurso que apenas poderá ser admitido num número limitado de casos previstos naquele preceito interpretado a uma luz fortemente restritiva», reconduzindo-se como o próprio legislador sublinha na Exposição de Motivos das Propostas de Lei nº 92/VII e 93/VIII, a uma “válvula de segurança do sistema” a utilizar apenas e só nos estritos pressupostos que definiu: quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental ou quando a admissão do recurso seja claramente necessária para a melhor aplicação do direito.
Na mesma linha de orientação Mário Aroso de Almeida pondera que «não se pretende generalizar o recurso de revista, com o óbvio inconveniente de dar causa a uma acrescida morosidade na resolução final dos litígios», cabendo ao STA «dosear a sua intervenção, por forma a permitir que esta via funcione como uma válvula de segurança do sistema». (Cfr. O Novo Regime do Processo nos Tribunais Administrativos, 2ª ed., p. 323 e Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, 2005, p. 150 e ss..)
E no preenchimento dos conceitos indeterminados acolhidos no normativo em causa (relevância jurídica ou social de importância fundamental da questão suscitada e a clara necessidade da admissão do recurso para uma melhor aplicação do direito (Sobre esta matéria, cfr. Miguel Ângelo Oliveira Crespo, O Recurso de Revista no Contencioso Administrativo, Almedina, 2007, pp. 248 a 296.), também a jurisprudência deste STA vem sublinhando que «…constitui questão jurídica de importância fundamental aquela – que tanto pode incidir sobre direito substantivo como adjectivo – que apresente especial complexidade, seja porque a sua solução envolva a aplicação e concatenação de diversos regimes legais e institutos jurídicos, seja porque o seu tratamento tenha suscitado dúvidas sérias, ao nível da jurisprudência, ou da doutrina.
E, tem-se considerado de relevância social fundamental questão que apresente contornos indiciadores de que a solução pode corresponder a um paradigma ou contribuir para a elaboração de um padrão de apreciação de casos similares, ou que tenha particular repercussão na comunidade.
A admissão para uma melhor aplicação do direito justifica-se quando questões relevantes sejam tratadas pelas instâncias de forma pouco consistente ou contraditória, com recurso a interpretações insólitas, ou por aplicação de critérios que aparentem erro ostensivo, de tal modo que seja manifesto que a intervenção do órgão de cúpula da justiça administrativa é reclamada para dissipar dúvidas acerca da determinação, interpretação ou aplicação do quadro legal que regula certa situação.» (ac. do STA - Secção do Contencioso Administrativo - de 9/10/2014, proc. nº 01013/14).
Ou seja,
- (i) só se verifica a dita relevância jurídica ou social quando a questão a apreciar for de complexidade superior ao comum em razão da dificuldade das operações exegéticas a efectuar, de enquadramento normativo especialmente complexo, ou da necessidade de compatibilizar diferentes regimes potencialmente aplicáveis, ou quando esteja em causa questão que revele especial capacidade de repercussão social, em que a utilidade da decisão extravasa os limites do caso concreto das partes envolvidas no litígio.
- e (ii) só ocorre clara necessidade da admissão deste recurso para a melhor aplicação do direito quando se verifique capacidade de expansão da controvérsia de modo a ultrapassar os limites da situação singular, designadamente quando o caso concreto revele seguramente a possibilidade de ser visto como um tipo, contendo uma questão bem caracterizada, passível de se repetir em casos futuros e cuja decisão nas instâncias seja ostensivamente errada ou juridicamente insustentável, ou suscite fundadas dúvidas, nomeadamente por se verificar divisão de correntes jurisprudenciais ou doutrinais, gerando incerteza e instabilidade na resolução dos litígios.
Não se trata, portanto, de uma relevância teórica medida pelo exercício intelectual, mais ou menos complexo, que seja possível praticar sobre as normas discutidas, mas de uma relevância prática que deve ter como ponto obrigatório de referência, o interesse objectivo, isto é, a utilidade jurídica da revista e esta, em termos de capacidade de expansão da controvérsia de modo a ultrapassar os limites da situação singular (a «melhor aplicação do direito» deva resultar da possibilidade de repetição num número indeterminado de casos futuros, em termos de garantia de uniformização do direito: «o que em primeira linha está em causa no recurso excepcional de revista não é a solução concreta do caso subjacente, não é a eliminação da nulidade ou do erro de julgamento em que porventura caíram as instâncias, de modo a que o direito ou interesse do recorrente obtenha adequada tutela jurisdicional. Para isso existem os demais recursos, ditos ordinários. Aqui, estamos no campo de um recurso excepcional, que só mediatamente serve para melhor tutelar os referidos direitos e interesses») - cfr. o ac. desta Secção do STA, de 16/6/2010, rec. nº 296/10, bem como, entre muitos outros, os acs. de 30/5/2007, rec. nº 0357/07; de 20/5/09, rec. nº 295/09, de 29/6/2011, rec. nº 0568/11, de 7/3/2012, rec. nº 1108/11, de 14/3/12, rec. nº 1110/11, de 21/3/12, rec. nº 84/12, e de 26/4/12, recs. nºs. 1140/11, 237/12 e 284/12.
E igualmente se vem entendendo caber, em princípio, ao recorrente alegar e intentar demonstrar a verificação dos ditos requisitos legais de admissibilidade da revista, alegação e demonstração a levar necessariamente ao requerimento inicial ou de interposição – cfr. arts. 627º, nº 2, 635º, nºs. 1 e 2, e 639º, nºs. 1 e 2 do novo CPC (Correspondentes aos arts. 676º, nº 2, 684º, nºs. 1 e 2, e 685º-A, nºs. 1 e 2, do anterior CPC.) - neste sentido, entre outros, os acórdãos do STA de 2/3/2006, 27/4/2006 e 30/4/2013, proferidos, respectivamente, nos processos nºs. 183/06, 333/06 e 0309/13.

4.3. No caso, afigura-se-nos que não estão verificados os apontados requisitos de admissibilidade do recurso de revista excepcional.
Com efeito, o que a recorrente pretende é, no essencial, ver reexaminado o próprio julgamento de facto operado no acórdão recorrido e com base no qual ali se conclui pela legalidade das correcções resultantes da desconsideração das facturas em causa: e embora a recorrente sustente que são de importância fundamental pela sua relevância jurídica e social as questões que suscita [as quais se reportam quer aos requisitos e condições em que se pode dar a inversão do ónus da prova, quer à alegação de que a decisão recorrida “abre caminho” a uma extensiva e ilegal interpretação do disposto no art. 74º e na al. a) do nº 2 do art. 75º, ambos da LGT, na medida em que a AT poderá, discricionariamente, colocar em causa a veracidade das declarações contabilísticas de um contribuinte sem sequer ter necessidade de o inspeccionar, e em termos de o contribuinte poder ser penalizado com base em incumprimentos de obrigações contabilísticas e fiscais de terceiros com quem se relacione comercialmente] essas questões acabam por se reconduzir a divergências quanto à matéria de facto julgada provada e não provada pelo acórdão recorrido, visando apenas e no essencial, a sua reapreciação, do que resulta, igualmente, que se pretende tão só uma apreciação singular e específica do caso concreto, não se preenchendo, portanto, as características de generalidade, complexidade e susceptibilidade de generalização da controvérsia que são inerentes às questões que legitimam a interposição do recurso previsto no art. 150º do CPTA.
Em suma, a recorrente acaba por assentar a alegação na discordância com a factualidade julgada provada e com as ilações factuais relevadas pelo acórdão (e pela sentença de 1ª instância) no âmbito da valoração probatória da prova (documental e testemunhal), bem como na forma como o TCAS valorou os factos julgados provados, designadamente o juízo que formulou sobre a realidade das operações constantes das facturas questionadas e sobre a veracidade dos respectivos lançamentos na escrita: ou seja, a recorrente não se insurge contra uma eventual incorreção ou ilegal aplicação dos invocados normativos da LGT e do CPPT: pretende, antes, discutir a matéria de facto e juízos de facto formulados no acórdão recorrido e que conduziram à improcedência da impugnação.
Não se trata, portanto, de apreciar a norma legal no campo apenas da estatuição relativa à presunção de veracidade da contabilidade ou da também alegada inversão do ónus da prova dessa veracidade, ou, sequer, no campo da estatuição relativa aos pressupostos legais legitimadores das correcções operadas pela AT, ou da aplicação do respectivo regime jurídico: trata-se, antes, de apreciar a prova efectuada e os juízos valorativos sobre ela produzidos nas instâncias (nomeadamente quanto à questão de saber se a factualidade evidenciada pela AT constitui ou não indício suficiente de que as facturas em causa não correspondem às operações nelas descritas) mas que não são sindicáveis pelo STA;
Daí que não colha o alegado na Conclusão VIII, no sentido de que a invocada discordância nada tem a ver com erro na apreciação das provas ou na fixação dos factos materiais (nº 4 do art. 150º do CPTA), mas sim, com a errada interpretação e aplicação do disposto nos supra referidos arts. 74º e 75º, nº 2, al. a) da LGT, em conjugação com o também disposto nos arts. 58º e 99º da LGT e no art. 113º do CPPT.
Acrescendo que a solução de direito a que chegou o tribunal recorrido se mostra absolutamente plausível, seguindo, aliás, jurisprudência dos tribunais superiores (cfr., entre outros, o acórdão do Pleno do STA, de 16/11/2016, no proc. nº 0600/15), no sentido de que compete à AT provar a factualidade que a levou a desconsiderar os custos, factualidade essa susceptível de abalar a presunção de veracidade das operações constantes da escrita do contribuinte e dos respectivos documentos de suporte, passando, então, a caber ao contribuinte o ónus da prova do direito de deduzir os custos ao lucro tributável.
Estamos, em suma, perante uma situação singular e com contornos factuais específicos, o que basta para afastar a excepcionalidade e, por conseguinte, a admissibilidade, da requerida revista,
E por outro lado e como se deixou exarado no acórdão do STA, de 28/5/2014, proc. nº 067/14, «…nas questões decididas pelo TCA com fundamento em matéria de facto que compromete inexoravelmente a análise das questões de direito e o sentido da decisão, está ultrapassado o interesse na discussão das questões jurídicas intrinsecamente ligadas àquela matéria de facto» (cfr., no mesmo sentido, também o acórdão do STA, de 4/9/2013, proc. nº 0995/13).

DECISÃO
Nestes termos, acorda-se em não admitir o presente recurso, por se considerar que não estão preenchidos os pressupostos a que se refere o nº 1 do artigo 150º do CPTA.
Custas pela recorrente.

Lisboa, 21 de Fevereiro de 2018. – Casimiro Gonçalves (relator) – Dulce Neto – António Pimpão.