Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01167/12
Data do Acordão:11/22/2012
Tribunal:1 SUBSECÇÃO DO CA
Relator:RUI BOTELHO
Descritores:INTIMAÇÃO PARA PROTECÇÃO DE DIREITOS LIBERDADES E GARANTIAS
PRAZO
Sumário:De acordo com o disposto no art. 109º, n.º 1, do CPTA improcede necessariamente a intimação para a protecção de direitos, liberdades e garantias que vise assegurar o exercício de um direito se o prazo para o exercer já está esgotado no momento da apresentação em tribunal da petição inicial.
Nº Convencional:JSTA00067959
Nº do Documento:SA12012112201167
Data de Entrada:10/30/2012
Recorrente:MUNICÍPIO DE SINTRA
Recorrido 1:AR
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:INTIMAÇÃO
Objecto:CM SINTRA
Decisão:INDEFERIMENTO
Área Temática 1:DIR ADM CONT - INTIMAÇÃO DIR LIB GAR
Legislação Nacional:CPTA02 ART109 N1 A.
LEI 22/2012 DE 30/05 ART11 ART12.
Aditamento:
Texto Integral: I Relatório

Acordam na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo:

O Município de Sintra veio deduzir a presente intimação para Protecção de Direitos, Liberdades e Garantias contra a Assembleia da República e a sua Presidente “Com vista à obtenção da efectiva prolação do esclarecimento/parecer técnico pela Unidade Técnica para a Reorganização do Território, criada pela Assembleia da República ao abrigo da Lei nº 22/2012, de 30 de Maio, relativamente ao pedido oportunamente formulado pelo Município de Sintra (cfr. cópias que agora se juntam como Documentos n°s 1 e 2 e se dão como integralmente reproduzidas), com a subsequente atribuição aos Órgãos do Município de um prazo adicional de pronúncia, cujo inicio deverá ficar reportado à data da tomada de conhecimento do esclarecimento/parecer técnico que vier a ser efectivamente proferido”

Alegou, resumidamente que:
a) O Município de Sintra, na sequência das deliberações tomadas no dia 10 de Outubro de 2012 pelos seus Órgãos, requereu à Unidade Técnica para a Reorganização do Território (UT) a emissão de esclarecimento/parecer técnico relativo à metodologia a conferir à reorganização das freguesias compreendidas na circunscrição territorial do Município, nos termos do expediente oportunamente remetido para tal efeito (cfr. Documentos n°s 1 e 2 e as cópias que agora se juntam como Documentos n°s 3 e 4, as quais passam a ser tidas como integralmente reproduzidas).
b) No mesmo requerimento foi ainda solicitado que se sobrestasse, até a prestação dos esclarecimentos solicitados à UT, a contagem do prazo para a emissão de pronúncia definitiva da Assembleia Municipal prevista no n° 11 da Lei n° 22/2012 (cfr. Documentos n°s 1 a 4).
c) O requerimento formulado à UT ficou a dever-se à necessidade de obtenção do esclarecimento de algumas questões oportunamente suscitadas, cuja resolução é marcadamente condicionadora da pronúncia dos Órgãos do Município, porquanto intrínseca dos respectivos pressupostos de partida para tal efeito.
d) Perante o requerimento apresentado pelo Município de Sintra no cumprimento das deliberações dos respectivos Órgãos, a UT veio referir que não lhe compete prestar apoio técnico-jurídico às autarquias locais na elaboração da pronúncia prevista no artigo 11º da lei n° 22/2012 (cfr. notificação cuja cópia agora se junta como Documento n° 5, a qual se dá como integralmente reproduzida).
e) Ainda assim, a UT veio referir que inexiste qualquer impossibilidade técnica ou jurídica de a Assembleia Municipal de Sintra deliberar sobre a reorganização administrativa do território das freguesias situadas no território do Município, ante a natureza indicativa do disposto no artigo 8°, alínea c), da Lei nº 22/2012.
f) A comunicação da UT envolve a significação de uma não resposta, porquanto, na prática, recusa o esclarecimento das questões oportunamente apresentadas pelo Município de Sintra, nada tendo adiantado quanto à metodologia a adoptar em face das especificidades das freguesias situadas no respectivo território.
g) A conduta omissiva da UT, ao não fornecer as orientações técnicas de enquadramento perante as dúvidas concretamente colocadas pelo Município impediu a concretização da pronúncia da Assembleia Municipal.
h) O que vale por dizer que a UT deve prestar os esclarecimentos oportunamente solicitados pelo Município,
i) Devendo ser concedido um prazo adicional para a emissão de pronúncia por parte da Assembleia Municipal, após a sua tomada de conhecimento de tais esclarecimentos.
j) A não pronúncia formal da Assembleia Municipal de Sintra resulta de motivos completamente alheios à vontade da Autarquia, cujos Órgãos adoptaram a conduta diligente que se lhes impunha, e coloca o Município de Sintra, as diversas freguesias compreendidas no seu território, assim como os cidadãos nelas residentes numa situação de desigualdade face aos cidadãos dos outros municípios e freguesias.
l) O que importa numa injustificável violação ao disposto nos artigos 13° e 48° da Constituição da República.
m) A missão da UT não envolve o exercício de qualquer função político-legislativa, porquanto corresponde a um procedimento material não integrado na Mera actuação da Assembleia da República, esta sim, no âmbito da respectiva actividade legiferante.
n) O Município de Sintra pretende, assim, obter a conduta positiva consubstanciada no esclarecimento/parecer técnico da UT, porquanto só após a obtenção deste contributo é que os Órgãos do Município poderão emitir a pronúncia formal prevista na Lei n° 22/2012.

A Assembleia da República e a sua Presidente vieram responder referindo, muito resumidamente, o seguinte:
(i) Os tribunais administrativos são incompetentes para apreciar o pedido por estarem em causa actos praticados no exercício da função política e legislativa (pontos 1. a 61.)
(ii) A acção não teria qualquer viabilidade por estar já transcorrido o prazo para a requerente se pronunciar (o que já acontecia no momento da sua entrada em juízo) e, além disso, os pareceres emitidos pela UT estarem dirigidos, exclusivamente, à Assembleia da República não possuindo qualquer eficácia externa.

II Direito

1. Olhemos a questão da competência. O presente expediente processual visa intimar as entidades requeridas a forçarem a Unidade Técnica (UT) prevista na Lei n.º 22/2012 a emitir o parecer/esclarecimento que lhe foi solicitado uma vez que esse órgão se encontra na sua dependência. Portanto, aquilo que a requerente pretende é que essas entidades exerçam os seus poderes de direcção sobre o referido órgão, os seus poderes enquanto entidades administrativas. Como a competência de um tribunal se determina pela forma como o autor configura a acção, definida pelo pedido e esclarecida pela causa de pedir, isto é, pelos objectivos com ela prosseguidos entendemos que os tribunais competentes são os tribunais administrativos, cabendo a acção a este STA (art. 24, a), ii) do ETAF).
2. Vejamos então. De acordo com o disposto no art. 109º, n.º 1, do CPTA “A intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias pode ser requerida quando a célere emissão de uma decisão de mérito que imponha à Administração a adopção de uma conduta positiva ou negativa que se revele indispensável para assegurar o exercício, em tempo útil, de um direito, liberdade ou garantia…”.
Ora, é o próprio requerente quem afirma que o direito que pretende fazer valer é o direito a pronunciar-se nos termos dos art.s 11º e 12º da Lei n.º 22/2012, de 30 de Maio (que veio estabelecer o Regime Jurídico da Reorganização Administrativa Territorial Autárquica e introduzir na ordem jurídica nacional a obrigatoriedade da reorganização administrativa do território das freguesias estabelecendo os respectivos parâmetros, assim como os procedimentos inerentes à prévia participação das autarquias locais) e que o “prazo legalmente concedido para a pronúncia das Assembleias Municipais terá terminado no dia 15 do corrente mês de Outubro” (artigo 62 da petição).
Portanto, o objectivo visado por este expediente processual, permitir o exercício, em tempo útil, de um direito, não é já possível por se ter esgotado (em momento anterior, até, à sua entrada em juízo, que ocorreu a 30.10.12) o prazo para o exercer. Só por esta razão o pedido já teria de ser indeferido. Mas, para além disso, a unidade técnica que a requerente pretendia se pronunciasse nos termos por si pretendidos não estava obrigada a fazê-lo pois apenas foi criada para apoiar a Assembleia da República (art.s 13º e 14º da Lei) e, na sua relação com as Autarquias Locais, só tinha, de acordo com as alíneas c) e d) do art. 14º, respectivamente, “Elaborar parecer sobre a conformidade ou desconformidade das pronúncias das assembleias municipais com o disposto nos artigos 6.º e 7.º da presente lei e apresentá-lo à Assembleia da República” e “Propor às assembleias municipais, no caso de desconformidade da respetiva pronúncia, projetos de reorganização administrativa do território das freguesias”. Nada mais. O que demonstra, igualmente, a inviabilidade da sua pretensão.


III Decisão

Nos termos e com os fundamentos expostos, acordam em indeferir o pedido de intimação deduzido nos autos.

Sem custas.

Lisboa, 22 de Novembro de 2012. – Rui Manuel Pires Ferreira Botelho (relator) – Luís Pais Borges – Jorge Artur Madeira dos Santos.


Segue acórdão de 19 de Dezembro de 2012

O Município recorrente veio interpor recurso para o Pleno da Secção do acórdão de fls., invocando para o efeito o preceituado no art. 144º, n.º 2, do CPTA. Nas suas alegações suscitou a nulidade do acórdão recorrido, por omissão de pronúncia, referente à circunstância de ali se ter omitido a pronúncia respeitante ao pedido formulado de concessão de um prazo adicional (ao fixado na lei) para se pronunciar.
Cumpre emitir a apreciação prevista no art. 670º, n.º 5, do CPC.
No acórdão recorrido concluiu-se que o prazo para o Município se pronunciar, estabelecido na lei, já estava esgotado quando o procedimento deu entrada no tribunal e que, nos termos da lei, a Unidade Técnica fora criada, apenas, para apoiar a Assembleia da República e não para dar pareceres aos Municípios. Não podendo olvidar-se que entre nós vigora o princípio da legalidade (com primeira consagração no art. 3º da CRP).
Com o assim decidido é evidente que o conhecimento das restantes questões colocadas pelo requerente ficou prejudicado, não sendo questões que o tribunal “devesse apreciar” (art. 668º, n.º 1, d), do CPC). Por força de um princípio geral do processo civil cuja consagração se vê no art. 660º, n.º 2, do CPC.

Nos termos e com os fundamentos expostos, acordam em
a) dar como inverificada a suscitada nulidade;
b) em admitir o recurso, que é de apelação e tem efeito suspensivo.
Lisboa, 19 de Dezembro de 2012. – Rui Manuel Pires Ferreira Botelho (relator) – Luís Pais Borges – Jorge Artur Madeira dos Santos.