Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01729/18.2BELRS
Data do Acordão:04/10/2019
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ISABEL MARQUES DA SILVA
Descritores:EXECUÇÃO FISCAL
PAGAMENTO EM PRESTAÇÕES
DÍVIDA FISCAL
IVA
Sumário:O disposto no n.º 5 do artigo 196.º do CPPT – que permite, em casos excepcionais, o alargamento até 5 anos do número de prestações autorizadas para pagamento de dívidas exequendas de valor superior a 500 UCs -, é inaplicável às dívidas a que se refere o n.º 2 do artigo 196.º do CPPT, designadamente às resultantes de impostos repercutidos a terceiros.
Nº Convencional:JSTA000P24455
Nº do Documento:SA22019041001729/18
Data de Entrada:02/25/2019
Recorrente:A... SA
Recorrido 1:AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
- Relatório -

1 – A…………, SA, com os sinais dos autos recorre para este Supremo Tribunal da sentença do Tribunal Tributário de Lisboa de 21 de Dezembro de 2018, que julgou improcedente a reclamação judicial por si deduzida do despacho do Director-Adjunto da Direcção de Finanças de Lisboa que lhe indeferiu parcialmente o pedido de pagamento em prestações da dívida exequenda de IVA formulado no processo de execução fiscal n.º 3247201801118552 e apensos (permitindo o pagamento fraccionado daquela dívida em 24 prestações ao invés das peticionadas 60 prestações).

A recorrente termina as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões:

- QUESTÃO PRÉVIA: DO EFEITO SUSPENSIVO DO RECURSO

A) Tendo à reclamação judicial sido atribuído o regime de subida imediata, com efeito suspensivo, o presente recurso deve ser tramitado nos mesmos moldes, uma vez que mantêm plena acuidade os motivos que conduziriam à aplicação desse regime, os quais se dão por integralmente reproduzidos neste âmbito;

B) Em consequência, ao presente recurso deverá ser atribuída subida imediata, nos próprios autos, com efeito suspensivo, nos termos dos artigos 278.º, n.º 3, alínea a) e 286.º n.º 2, in fine, do CPPT, o que desde já se requer para os devidos efeitos legais.

- DO ERRO DE JULGAMENTO DA SENTENÇA RECORRIDA

C) O Douto Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento ao não ter reconhecido a ilegalidade que a afeta o despacho do órgão de execução fiscal, cuja apreciação judicial foi requerida, em torno do âmbito de aplicação do regime previsto no n.º 5 do artigo 196.º do CPPT;

D) O erro de julgamento em causa fundou-se no facto de não ter sido tida em devida conta quer a natureza e ratio subjacentes ao artigo 196.º n.º 5 do CPPT, quer os demais corolários que norteiam a interpretação normativa;

E) Ora, como visto supra, o preceito em causa consiste num regime excecional de pagamento em prestações, o qual vem complementar os demais regimes contidos nos números anteriores do artigo 196.º do CPPT, sendo aplicável apenas a situações em que o montante da dívida exequenda, independentemente da sua génese, exceda as 500 unidades de conta;

F) A razão de ser dessa excecionalidade prende-se com o facto de o n.º 5 do artigo 196.º do CPPT, contrariamente aos regimes de pagamento a prestações contidos nos n.ºs anteriores do preceito em questão – os quais são erigidos tendo em conta a génese das dívidas exequendas – estabelecer pressupostos de aplicação única e exclusiva assentes na situação patrimonial do devedor e no montante da dívida exequenda;

G) Assim, e conforme prescreve a respetiva previsão normativa, este regime deverá ser aplicável sempre que: i) se demonstre notória dificuldade e previsíveis consequências económicas para os devedores; desde que ii) a dívida exequenda exceda 500 unidades de conta no momento da autorização;

H) Em virtude desta ”ratio” própria, bem como atendendo aos corolários interpretativos estabelecidos no artigo 9.º do Código Civil, demonstra-se carecer de provimento a “correcção interpretativa” defendida pelo Tribunal a quo, atendendo a um pretenso elemento de interpretação sistemática que não se justifica in casu e que introduz uma restrição/distinção no âmbito de aplicação do n.º 5 do artigo 196.º do CPPT que não tem suporte na letra da lei;

I) Consequentemente, deverá ser reconhecido que o despacho do órgão de execução fiscal subjacente à presente contenda se revela ilegal por violação do n.º 5 do artigo 196.º do CPPT e que, ao não ter reconhecido isso, incorreu o Tribunal a quo em erro de julgamento, o qual sempre deverá ser corrigido através da revogação da sentença em causa por parte do Douto Tribunal ad quem;

J) O exposto também em conformidade com o entendimento doutrinário existente quanto ao presente tema, vertido por vários autores, nomeadamente por Jorge Lopes de Sousa, Serena Cabrita Neto e Carla Castelo Trindade.

Nestes termos e nos demais de Direito que V. Exas. doutamente suprirão, requer-se a esse Douto Tribunal a quo que admita o presente recurso, atribuindo-lhe subida imediata, nos próprios autos, e efeito suspensivo, em conformidade com os artigos 278.º n.º 3, alínea a), e 286.º, n.º 2, in fine, do CPPT.

Mais se requer ao Douto Tribunal ad quem que julgue totalmente procedente o presente recurso, revogando a sentença recorrida, por se encontrar ferida de ilegalidade ao não pôr cobro à violação do disposto no n.º 5 do artigo 196.º do CPPT, confirmando a aplicação do mesmo também às dívidas exequendas cuja origem subjacente seja de IVA, tudo com as demais consequências legais.

2 – Não foram apresentadas contra-alegações.

3 - O Excelentíssimo Magistrado do Ministério público junto deste Supremo Tribunal emitiu douto parecer no sentido do não provimento do recurso.

Com dispensa dos vistos legais, dada a natureza urgente do processo, vêm os autos à Conferência.


- Fundamentação -

4 – Questão a decidir

É a de saber se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento ao julgar improcedente a reclamação, no entendimento de que o disposto no n.º 5 do artigo 196.º do CPPT é inaplicável a dívidas exequendas resultantes de impostos repercutidos a terceiros.

5 – Matéria de facto

Na sentença objecto de recurso foram fixados os seguintes factos:

a) Em 25/05/2018, no serviço de finanças de Lisboa-2, foi instaurado contra a sociedade A…………, S.A., o PEF n.º 3247201801118552 para cobrança coerciva de uma dívida de IRC, relativa ao ano de 2014, no montante de €77.148,55 (setenta e sete mil, cento e quarenta e oito mil e cinquenta e cinco cêntimos) – autuação de fls. 1 e certidão de dívida de fls. 2 e 3 do PEF, apenso aos autos, cujo teor aqui se dá por reproduzido para todos os legais efeitos.

b) Posteriormente foram apensados ao PEF, identificado na alínea antecedente, outros processos de execução fiscal, para cobrança coerciva de dívidas de IVA, referentes aos anos de 2014, 2015, 2016 e 2017, totalizando a quantia exequenda, referente a IVA, o montante global de €89.930,31 (oitenta e seis mil, novecentos e trinta euros e trinta e um cêntimos) e a dívida exequenda global, à data da citação da executada (11/06/2018), a quantia de €165.056,22 – ofício de citação de fls. 187 do PEF e documentos de identificação das dívidas exequendas, a este apensos e juntos a fls. 188 e segs. do PEF, cujo conteúdo aqui se dá por reproduzido.

c) Em 08/06/2018, a ora Reclamante, invocando que o valor da dívida exequenda é superior a 500 UCs e alegando notória dificuldade financeira e previsíveis consequências económicas, peticionou, ao serviço de finanças de Lisboa-2, além do mais, que lhe fosse permitido proceder ao pagamento da dívida exequenda, com origem em IVA e com origem em IRC, em 60 prestações mensais, de acordo com o disposto no n.º 5 do artigo 196.º do CPPT – requerimento junto com a douta p.i., como doc. n.º 2, cujo conteúdo aqui se dá por reproduzido.

d) Com interesse para os autos, a ora Reclamante fundamentou o pedido, id. na alínea antecedente, esgrimindo, designadamente, os seguintes argumentos:

(…) Desde 2012, a grande custo e, essencialmente, através da aposta em mercados de países emergentes, a Requerente foi mantendo a situação financeira que, apesar de débil, é minimamente estável e que, gradualmente, tem vindo a registar pequenos sinais de evolução positiva.

“No desempenho da sua actividade a Requerente tem de incorrer em consideráveis custos fixos com material e pessoal qualificado, o que implica a manifesta compressão das suas margens de lucro – documentação contabilística dos exercícios de 2013 a 2016 (doc. 6).

Considerando os documentos contabilísticos em referência, a Requerente nota que, em 2013, a sua margem de rendibilidade foi de uns meros 3,55%.

Por outro lado, e igualmente a título ilustrativo do risco operacional que envolve a actividade da Requerente, refira-se que, de 2014 para 2015, o seu volume de vendas e prestação de serviços decresceu de €562.900,52 para €306.558,24.

Como evidenciam as demostrações financeiras em anexo, de maneira a, sobretudo, assegurar liquidez para o pontual pagamento dos compromissos assumidos, a Requerente dispõe de níveis de endividamento consideravelmente elevados, sempre a rondar valores próximos dos 40% do seu património, o que, atento o risco operacional que sobre si impende, se assume como um valor avultado.

Pelas razões expostas e sobejamente provadas, não é possível à Requerente solver a dívida, de valor bastante elevado, acrescida de eventuais juros de mora, de uma só vez (…) e a mera tentativa de pagamento integral dos montantes em causa faria impender sobre a Requerente o sério risco de ver cair por terra as ténues melhorias que conseguiu registar na sua situação financeira.

Já para não falar que comprometeria a sua capacidade para fazer face aos seus custos fixos, nomeadamente os custos com os salários dos seus trabalhadores dependentes.

Sendo que as próprias instituições de crédito perante as quais a Requerente procurou obter financiamento/garantia para suspender a execução fiscal, o reconhecem (docs. 7 e 8).

Como foi alegado e provado, em virtude da situação financeira absolutamente periclitante da Requerente, está por demais demonstrado que, o pagamento integral do montante devido, a título de IVA, é completamente incomportável do ponto de vista financeiro, tendo em conta as notórias dificuldades financeiras sentidas pela Requerente.

Sendo que, as consequências económicas daí resultantes, mais do que gravosas, seriam mesmo ruinosas, resultando muito provavelmente, na insolvência da Requerente.

Por outro lado, a dívida exequenda referente a IVA é superior ao montante de 500 unidades de conta.

Em virtude disso, e considerando o quadro legal aplicável, resulta claro que outra decisão não poderá haver a não ser a admissão do pagamento a prestações da dívida exequenda referente a IVA, nos termos previstos no n.º 5 do artigo 196.º do CPPT. (…)” – citado doc. n.º 2 com a p.i.

e) Sobre o pedido, identificado na alínea antecedente, recaiu o despacho reclamado, proferido a 12/07/2018, por Director Adjunto da Direcção de Finanças de Lisboa, que deferiu o pedido, relativamente à dívida exequenda de IRC e indeferiu parcialmente o peticionado, relativamente à dívida exequenda de IVA – ofício junto com a p.i., como doc. n.º 1, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido.

f) Em síntese, aquele despacho sancionou a sua concordância relativamente à informação e parecer internos prestados pelos Técnicos e Chefes de Divisão da Direcção de Finanças, ids. Em sede do citado doc. n.º 1, constando do despacho reclamado o seguinte:

“Concordo. Face à Informação e parecer prestados e com os fundamentos neles aduzidos, defiro o pedido de pagamento em 60 prestações mensais, iguais e sucessivas, para o processo n.º 3247201801118552. No que respeita aos restantes processos executivos, indefiro o pedido de pagamento em 60 prestações por não se mostrarem preenchidos os requisitos legais para tal. Nessa conformidade reduzo o pedido e defiro-o em 24 prestações mensais, iguais e sucessivas. Indefiro ainda o pedido de dispensa de garantia (…)” – citado doc. n.º 1, junto com a p.i.

g) Em síntese, na Informação, subjacente ao despacho Reclamado, reconhecendo-se que se encontravam preenchidos os pressupostos excepcionais, a que alude o artigo 196.º n.º 5 do CPPT, propôs-se o deferimento do pedido de pagamento em 60 prestações, quanto à dívida exequenda relativa a IRC, não podendo o valor de cada uma das prestações ser inferior a 10 UCs.

Relativamente à dívida exequenda proveniente de IVA, exarou-se que aquele tributo não tinha enquadramento legal no n.º 5 do artigo 196.º do CPPT. Contudo, atendendo ao disposto na alínea b) do n.º 3, conjugado com o disposto no n.º 4 do artigo 196.º, uma vez que se encontravam demonstradas dificuldades financeiras excepcionais e previsíveis consequências económicas gravosas, seria de fraccionar a dívida exequenda respeitante a IVA em 24 prestações mensais, não podendo qualquer uma delas ser inferior a 1 UC. – citada informação contida no citado n.º 1.

6 – Apreciando

6.1 Do alegado erro de julgamento da sentença recorrida ao julgar que o disposto no n.º 5 do artigo 196.º do CPPT é inaplicável a dívidas exequendas resultantes de impostos repercutidos a terceiros

A sentença recorrida julgou improcedente a reclamação judicial deduzida contra despacho que indeferiu pedido de pagamento da dívida exequenda de IVA em prestações 60 prestações, ao abrigo do disposto no n.º 5 do artigo 196.º do CPPT, deferindo-o apenas em 24 prestações, ao abrigo da alínea b) do n.º 3 do mesmo artigo, no entendimento de que, estando em causa imposto repercutido a terceiros apenas este regime, e não aquele, é aplicável.

Para assim decidir, considerou a sentença recorrida que o pagamento em prestações só pode ser autorizado nos casos específicos previstos na Lei, por consubstanciar uma moratória, que só é admissível nos termos da Lei (…), que a regra é a de que não podem ser objecto de pagamento em prestações as dívidas de recursos próprios, as que provenham de “retenção na fonte” e as “legalmente repercutidas a terceiros – artigo 42.º n.º 2 da LGT – admitindo-se excepcionalmente o pagamento em prestações de tais dívidas no processo executivo, mas apenas nos casos previstos na parte final do n.º 2 do artigo 196.º do CPPT (falecimento do executado) e do seu n.º 3, mas não, como requerido, nos termos do seu n.º 5. Citou e transcreveu em abono desta sua posição o decidido por Acórdão deste STA de 4 de Julho de 2018, rec. n.º 0580/18 e pelo TCA Sul em 22 de Janeiro de 2015, proc. 08320/15. Fazendo, embora, menção de que a interpretação que sufraga não é, porém, isenta de dúvidas, havendo doutrina qualificada a sustentar a aplicabilidade do regime contido no n.º 5 do artigo 196.º a dívidas resultantes da falta de entrega de imposto retido na fonte ou legalmente repercutido a terceiros, consigna não perfilhar tal entendimento, antes aderir à tese jurisprudencial supra identificada, que analisando as razões de ser do regime excepcional de pagamento em prestações das dívidas repercutidas a terceiros, bem como a sistemática do preceito em apreço (artigo 196.º do CPPT), interpreta aquele preceito no sentido das excepções à regra da impossibilidade do pagamento em prestações de impostos legalmente repercutidos em terceiros serem apenas as consagradas no n.º 3 do referido preceito legal, daí que tenha concluído não sofrer o despacho reclamado das ilegalidades que lhe foram assacadas.

Não se conforma com este entendimento a recorrente, imputando à sentença recorrida erro de julgamento, alegando que também o disposto no n.º 5 do artigo 196.º do CPPT consubstancia um regime excecional de pagamento em prestações, o qual vem complementar os demais regimes contidos nos números anteriores do artigo 196.º do CPPT, sendo aplicável apenas a situações em que o montante da dívida exequenda, independentemente da sua génese, exceda as 500 unidades de conta e que a razão de ser dessa excecionalidade prende-se com o facto de o n.º 5 do artigo 196.º do CPPT, contrariamente aos regimes de pagamento a prestações contidos nos n.ºs anteriores do preceito em questão – os quais são erigidos tendo em conta a génese das dívidas exequendas – estabelecer pressupostos de aplicação única e exclusiva assentes na situação patrimonial do devedor e no montante da dívida exequenda, tendo a norma uma “ratio própria”, alega carecer de provimento a “correcção interpretativa” defendida pelo Tribunal a quo, atendendo a um pretenso elemento de interpretação sistemática que não se justifica in casu e que introduz uma restrição/distinção no âmbito de aplicação do n.º 5 do artigo 196.º do CPPT que não tem suporte na letra da lei. Cita, em abono da sua posição, o entendimento doutrinário existente quanto ao presente tema, vertido por vários autores, nomeadamente por Jorge Lopes de Sousa, Serena Cabrita Neto e Carla Castelo Trindade.

O Excelentíssimo Magistrado do Ministério Público junto deste STA, no seu douto parecer, pronuncia-se no sentido do que deve negar-se provimento ao recurso e manter-se a sentença recorrida na ordem jurídica, pois que, as dívidas de impostos repercutidos a terceiros, verificados os pressupostos da situação excecional do artigo 196.º/3/b) do CPPT, têm de ser pagas no máximo de 24 meses e não de acordo com o regime geral de pagamento em prestações das dívidas tributárias em execução (Neste sentido, acórdãos do STA de 20/12/2011- P. 01704/11 e de 04/07/2018 – P. 0580/18) (…) parecendo-lhe lógico que o legislador não quis, certamente, que quem recebeu o imposto de terceiros com a obrigação de o entregar integralmente e de uma só vez o possa pagar em prestações em igualdade de circunstâncias com quem teve de suportar o encargo com esse mesmo imposto.

Vejamos.

É para nós inequívoco que, fora dos regimes excepcionais de regularização de dívidas que amiúde vemos aprovados pelo legislador - frequentemente motivados por necessidades financeiras excepcionais do próprio Estado –, o pagamento em prestações de dívidas provenientes de recursos próprios comunitários, de impostos retidos na fonte ou de impostos repercutidos a terceiros é em regra proibido, como enfaticamente resulta do disposto no n.º 2 do artigo 42.º da Lei Geral Tributária e surge reafirmado, no âmbito da execução fiscal, no n.º 2 do artigo 196.º do CPPT.

A razão de ser de tal proibição prende-se com um juízo de censura acrescido - e dotado de tutela sancionatória contra-ordenacional ou criminal –, relativamente à falta de entrega de prestações tributárias retidas ou objecto de repercussão a terceiros, pois o encargo do imposto foi, nesses casos, suportado por pessoa diversa do executado, que dele presumivelmente se terá apropriado, em prejuízo do Estado e eventualmente de quem efectivamente o suportou (como paradigmaticamente sucede com as contribuições para a segurança social).

Daí que as razões para tal proibição desapareçam em caso de falecimento do executado – cfr. a parte final do n.º 2 do artigo 196.º do CPPT -, ou, fora deste caso, sejam contrabalançadas com outros interesses de excepcional relevo, densificadas pelo legislador nas duas alíneas do n.º 3 do artigo 196.º do CPPT, mas mantendo-se a ressalva da manutenção da responsabilidade contra-ordenacional ou criminal que ao caso couber (cfr. o corpo do n.º 3 do artigo 196.º do CPPT).

Tal ressalva não existe no regime, também excepcional, de pagamento em prestações previsto no n.º 5 do artigo 196.º da LGT, aplicável a dívidas exequendas que excedam 500 unidades de conta, o que apenas confirma que tal regime é inaplicável às dívidas a que se refere o n.º 2 do artigo 196.º CPPT - que apenas admitem o pagamento em prestações nos casos previstos no seu n.º 3 -, aplicando-se apenas às demais e constituindo excepção à regra do pagamento em prestações em número máximo de 36 prevista no n.º 4 do artigo 196.º do CPPT, que inequivocamente não vale para as dívidas a que se refere o n.º 2 do artigo 196.º, que, como dissemos já, apenas podem ser pagas em prestações nos estritos termos legalmente previstos no n.º 3 do artigo 196.º do CPPT (e em que o número máximo de prestações admissíveis, nos casos da alínea b) do n.º 3, é, actualmente, de 24).

Tem sido este o entendimento deste STA, expresso nos dois Acórdãos em que tratou da questão - Acórdãos de 20 de dezembro de 2011, rec. n.º 01704/11 e de 4 de Julho de 2018, rec. n.º 0580/18 -, e que entendemos plenamente justificado, nenhuma censura merecendo a sentença recorrida que a tal entendimento jurisprudencial aderiu.

Este entendimento revela-se o que mais adequado, em face dos princípios gerais que regem a matéria e é sistematicamente sustentado na lógica interna do artigo 196.º do CPPT (em que no respectivo n.º 2 surge a proibição, com ressalva do caso de falecimento do executado, no n.º 3 a excepção à proibição, no n.º 4 o regime geral de pagamento em prestações para as demais dívidas exequendas e no n.º 5 a excepção a este último regime no que ao número de prestações respeita, para dívidas de valor mais elevado).

Entendemos, pois, que o n.º 5 do artigo 196.º do CPPT – que permite, em casos excepcionais, o alargamento até 5 anos do número de prestações autorizadas para pagamento de dívidas exequendas de valor superior a 500 UCs -, é inaplicável às dívidas a que se refere o n.º 2 do artigo 196.º do CPPT, designadamente às resultantes de impostos repercutidos a terceiros, como a que está em causa nos autos.

A doutrina que alegadamente sustenta a posição da recorrente, ao não adiantar razão convincente por que se deve entender de outro modo, não logra infirmar o que pacificamente, e ao que julgamos justificadamente, se vem decidindo.

Resulta do exposto que nada há a censurar à sentença recorrida, impondo-se o não provimento do recurso.


- Decisão -

7 - Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em negar provimento ao recurso, confirmando a sentença recorrida.

Custas pela recorrente.

Lisboa, 10 de Abril de 2019. – Isabel Marques da Silva (relatora) – Francisco Rothes – Dulce Neto.