Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0825/16
Data do Acordão:12/06/2017
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ASCENSÃO LOPES
Descritores:CUSTAS DE PARTE
RECURSO
ALÇADA
Sumário:I - Dispõe o nº 3 do artº 33º da portaria nº 419º-A/2009 de 17 de Abril que, da decisão da reclamação da nota justificativa de custas de parte “cabe recurso em um grau se o valor da nota exceder 50 Ucs”. Estes limites e valores constam também do nº 6 do artigo 31º do RCP aprovado pelo DL 34/2008 de 28 de Fevereiro.
No caso dos autos esse valor é seguramente inferior e daí que é manifesto que o despacho questionado, desde logo por esta razão, não admite recurso para o STA.
II - Acresce referir que não obstante ter sido proferido despacho admitindo o recurso, tal decisão não impede ou desobriga o Tribunal de recurso de a apreciar por atenção ao art. 685.º-C, n.ºs 5 e 6 do Código de Processo Civil.
Nº Convencional:JSTA000P22655
Nº do Documento:SA2201712060825
Data de Entrada:06/28/2016
Recorrente:FAZENDA PÚBLICA
Recorrido 1:A............, LDA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam, em conferência, nesta Secção do contencioso tributário do Supremo Tribunal Administrativo
1 - RELATÓRIO
A Fazenda Pública, vem recorrer para este Supremo Tribunal do despacho do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, proferido em 3 de Setembro de 2015 a fls.87 dos autos, que indeferiu a reclamação por ela interposta contra a nota justificativa de custas de parte no valor de € 1.428,00.

Inconformada com o assim decidido, interpôs o presente recurso com as respectivas alegações que resumiu nas seguintes conclusões:
«A. Visa o presente Recurso reagir contra o Despacho de 03 de setembro de 2015 da Meritíssima Juiz a quo que, em concordância com o parecer do ilustre Procurador da República, ordenou a notificação da Fazenda Pública para proceder à autoliquidação da taxa de justiça, no prazo de 10 dias efetuada por carta datada de 13-10-2015, por considerar tal notificação ilegal, por extemporânea, atendendo a que deveria ter sido efetuada conjuntamente com a notificação da sentença, que ocorreu em 11-05-2015.
B. Foi a sentença prolatada nos presentes autos notificada às partes — impugnante — por notificação datada de 07-05-2015, tendo aquela, atenta a ausência de recurso, transitado em julgado em 21-05-2015;
C. Conjuntamente com tal notificação não foi efetuada a notificação à Fazenda Pública nos termos e para os efeitos do n° 2 do art. 15° do RCP;
D. Entretanto, foi esta notificada da nota de custas de parte apresentada pela impugnante, sobre a qual apresentou reclamação, em 04-06-2015, uma vez que, relativamente à rubrica “honorários”, o montante exigido não se mostrava condizente com os montantes efetivamente pagos e com o fundamento precisamente de não ter sido notificada para proceder ao pagamento da taxa de justiça;
E. Em 16-10-2015 foi efetivada a notificação da Fazenda Pública “... do parecer e do despacho proferido nos autos, de que se remete cópia, notificando-se ainda da sentença proferida da qual se remeteu cópia 07-05-2015. Mais se notifica ainda para em 10 dias proceder à autoliquidação da taxa de justiça, nos termos do art° 15° n° 2 do regulamento das Custas Processuais.”, ato do qual ora se recorre.
Com efeito
F. E de acordo com o disposto no n° 2 do art.º 15º do RCP, na redação dada pela Lei n.º 7/2012, de 13 de fevereiro, as partes que beneficiam de dispensa do prévio pagamento da taxa de justiça, independentemente de condenação a final, devem ser notificadas com a decisão que decida a causa principal ainda que suscetível de recurso, para efetuar o seu pagamento no prazo de 10 dias.
G. Nos presentes autos, tal notificação não ocorreu nos termos do n.º 2 do art° 15.º do RCP, uma vez que a decisão final foi notificada à Fazenda Pública em 11-05-2015, enquanto que a notificação para o pagamento da taxa de justiça apenas ocorreu em 16-10-2015,
H. Isto é, a decisão final não veio acompanhada da notificação para o pagamento da taxa de justiça
Deste modo,
I. A falta da notificação à Fazenda Pública, com a decisão que decidiu a causa principal, para proceder a autoliquidação da taxa de justiça, implicou a sua preclusão pelo decurso do tempo, mais concretamente, por caducidade.
J. A intempestividade da notificação efetuada pela Secretaria Judicial tem também como consequência a impossibilidade da parte vencedora exigir custas de parte.
K. Ora nos termos do n.º 6 do art° 161° do CPC “os erros e omissões praticados pela secretaria judicial não podem, em qualquer caso, prejudicar as partes”
L. Sendo que o prejuízo para a Fazenda Pública poderá advir da decisão a proferir naquela Reclamação, que ainda não teve decisão expressa, mas cujo desfecho será certamente afetado pelo presente ato ou pela ausência de reação ao despacho e notificação presentes;
M. Uma vez que, mesmo que condenada a Fazenda Pública em custas a final, o presente ato de notificação irá necessariamente influenciar o desfecho daquela reclamação anteriormente apresentada;
N. Violando-se ainda os princípios da legalidade, da certeza e da segurança jurídica — corolários da confiança jurídica (v.g. Comes Canotilho, in “Direito Constitucional e Teoria da Constituição”, 7.ª edição, pg. 257: “O homem necessita de segurança para conduzir, planificar e conformar autónoma e responsavelmente a sua vida”).
O. Em face do exposto, e salvo melhor opinião, entende-se que a notificação para a Fazenda Pública proceder à autoliquidação da taxa de justiça, deverá ser considerada ilegal porque contrária à lei.
Termos em que, Sempre com o mui douto suprimento de V. Exas., deverá ser considerado procedente o presente recurso e revogado o despacho de 03 de setembro de 2015 da Meritíssima Juiz a quo, por ser ilegal a notificação da Fazenda Pública para proceder à autoliquidação da taxa de justiça, efetuada por carta datada de 13-10-2015, como é de Direito e de inteira Justiça.»

Não foram apresentadas contra alegações.
O Ministério Público a fls. 110 dos autos emitiu parecer com o seguinte teor:
«1. A Fazenda Pública apresentou reclamação da nota justificativa de custas de parte (art.25° RCP; art.33° n.º 1 Portaria nº 419-A/2009,17 abril; doc.fls.72/73)
A reclamação foi indeferida por despacho proferido em 3 setembro 2015 (fls.87)
O recurso interposto da decisão de indeferimento da reclamação não deve ser admitido, porquanto o valor da nota (€ 1 428,00) não excede 50 UC, de valor correspondente a € 5 100 [€ 102 x 50 = € 5100] (art.33° n° 3 Portaria n° 419-A/2009, 17 abril; art.22° DL nº 34/2008, 26 fevereiro diploma de aprovação do RCP)
A decisão de admissão do recurso não vincula o tribunal superior (despacho fls. 100;art. 641º n° 5 CPC vigente)
Sem prescindir
2. O despacho impugnado não pode ser considerado de mero expediente, antes contendo decisão lesiva da esfera jurídica da recorrente, na medida em que determina o pagamento de parcela de custas de parte que aquela considera inexigível
A decisão impugnada carece em absoluto de fundamentação, com violação de disposição legal imperativa (despacho proferido em 3 setembro 2015 fls.87; art. 154º CPC vigente) A doutrina destilada em jurisprudência consolidada, segundo a qual a absoluta falta de fundamentação constitui causa de nulidade da sentença de conhecimento oficioso, é aplicável aos despachos (acórdãos STA-SCT 16.11.2011 processo 110453/11; 20.03.2011 processo n° 717/10;10.03.2011 processo n° 716/10; arts.613° n° 3 e 682° n° 3 CPC vigente)
3.Neste contexto deve ser proferido acórdão:
a) declaratório da nulidade do despacho impugnado;
b) ordenando a subsequente devolução do processo ao tribunal recorrido, para proferimento de novo despacho com a fundamentação exigível.»

2 - Fundamentação

O teor do despacho recorrido de fls. 87 é o seguinte: “Notifique a Fazenda Pública nos termos doutamente promovidos”
O Parecer do Mº Pº de fls 85 tem o seguinte teor:
Vem a Fazenda Pública reclamar da nota justificativa de custas de parte apresentada nos autos pela sociedade impugnante “A…………, Lda” (cfr. fls. 68 e ss.), discordando do valor a pagar, invocando o facto de não ter efectuado o pagamento de taxa de justiça, não lhe tendo sido feita a notificação prevista nos termos do n° 2 do artº 15° do Regulamentos das Custas Processuais,
Na verdade, por lapso dos serviços de secretaria deste tribunal, a notificação da FP para proceder à autoliquidação da taxa de justiça, conforme impõe a norma legal supra citada, não foi efectuada conjuntamente com a notificação da decisão da causa, julgando procedente a presente Impugnação.
De todo o modo, a inobservância do disposto no artº 15° n° 2 do RCP, no caso, não pode ser impeditiva da obtenção do pagamento dos valores devidos a título de custas de parte, pela parte delas credora — cfr. artigos 25° n° 1 e 2b e 26° n° 3, ambos do RCP.
Sendo certo, ainda, que não pode a requerente das custas de parte ser prejudicada pelo lapso dos serviços de secretaria do tribunal — cfr. art° 157°n° 6 CPC.
Nesta conformidade, promovo, se proceda a nova notificação da Fazenda Pública, dando cumprimento integral ao disposto no art° 15° n° 2 do RCP, seguindo-se os ulteriores termos.
DECIDINDO NESTE STA
Questiona a recorrente Fazenda Pública o despacho judicial proferido nos autos a fls. 87, supra destacado, no qual foi decidido notificar a Fazenda Pública na sequência de promoção do Ministério Público na 1ª instância (o qual teve vista para efeitos de se pronunciar sobre a reclamação da nota justificativa de custas de parte apresentada pela FP e elaborada pela sociedade impugnante que obteve vencimento na causa) a fim de dar cumprimento integral ao disposto no art° 15° n° 2 do RCP, e na circunstância concreta e reconhecida pela remissão que o referido despacho faz para a referida promoção antecedida de exposição/fundamentação que se deve considerar implicitamente acolhida.
Cumpre em primeiro lugar apreciar da admissibilidade do recurso na circunstância de o valor da nota justificativa de custas de parte ter o valor de apenas 1428 Euros.
Ora, dispõe o nº 3 do artº 33º da portaria nº 419º-A/2009 de 17 de Abril que, da decisão da reclamação da nota justificativa de custas de parte “cabe recurso em um grau se o valor da nota exceder 50 Ucs”. Estes limites e valores constam também do nº 6 do artigo 31º do RCP aprovado pelo DL 34/2008 de 28 de Fevereiro.
No caso dos autos esse valor é seguramente inferior e daí que é manifesto que o despacho questionado, desde logo por esta razão, não admite recurso.
Acresce referir que não obstante ter sido proferido despacho admitindo o recurso, (a fls. 100 dos autos), tal decisão não impede ou desobriga o Tribunal de recurso de a apreciar por atenção ao art. 685.º-C, n.ºs 5 e 6 do Código de Processo Civil – CPC onde se prescreve:
“5 - A decisão que admita o recurso, fixe a sua espécie e determine o efeito que lhe compete não vincula o tribunal superior nem pode ser impugnada pelas partes, salvo na situação prevista no n.º 3 do artigo 306.º.
6 - A decisão que não admita o recurso ou retenha a sua subida apenas pode ser impugnada através da reclamação prevista no artigo 643.º.

Devemos pois considerar os preceitos, já destacados e, ainda, o teor do artigo 288.º do CPPT que dispõe:
Conclusão ao relator. Conhecimento de questões prévias
1 - Feita a distribuição, serão os autos conclusos ao relator que poderá ordenar se proceda a qualquer diligência ou se colha informação do tribunal recorrido ou de alguma autoridade.
2 - O relator não conhecerá do recurso se entender que lhe faltam manifestamente os respectivos pressupostos processuais.
3 - Do despacho do relator referido no número anterior é admitida reclamação para a conferência.

Aqui chegados, dúvidas não restam de que o recurso não poderá prosseguir neste STA.
4- DECISÃO:
Termos em que, face ao exposto, acordam os Juízes da Secção de Contencioso Tributário do STA, em não admitir o recurso.
Os autos baixarão à primeira instância para o desenvolvimento dos ulteriores termos processuais.
Custas a cargo da recorrente.

Lisboa, 6 de Dezembro de 2017. – Ascensão Lopes (relator) – Ana Paula Lobo – António Pimpão.