Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01277/14.0BEALM
Data do Acordão:07/03/2019
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ISABEL MARQUES DA SILVA
Descritores:IRS
CONTABILIDADE ORGANIZADA
REGIME SIMPLIFICADO DE TRIBUTAÇÃO
Sumário:O regime simplificado de tributação (artigo 28.º do Código do IRS) constitui um regime não vinculativo, válido somente para quem não tenha optado pelo regime de contabilidade organizada.
Nº Convencional:JSTA000P24753
Nº do Documento:SA22019070301277/14
Data de Entrada:02/07/2019
Recorrente:AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Recorrido 1:A... E B...
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo


– Relatório –

1 – A Autoridade Tributária e Aduaneira recorre para este Supremo Tribunal Administrativo da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada que julgou procedente a impugnação judicial deduzida por A………… e B…………., ambos com os sinais dos autos, contra a decisão de indeferimento da reclamação graciosa das liquidações adicionais de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares relativas aos anos de 2011 e 2012, com os n.ºs 2014 5000046428 e 2014 5000047332 e no valor de €6.695,26 e €4.036,72, respectivamente, apresentando para tanto as seguintes conclusões:

I. Decidiu o Tribunal “a quo” pela procedência da presente Impugnação por concluir que os Impugnantes teriam, nos anos de 2011 e 2012, de ser tributados, em sede de IRS, no regime da contabilidade organizada e não no regime simplificado de tributação, atento o disposto no art.º 28.º do CIRS, decisão com a qual, com o devido respeito, não se concorda;

II. Tendo os Impugnantes procedido à entrega da Declaração de Alterações no decurso do ano de 2006 – mais concretamente no dia 01.03.2006 – pela qual foi feita a opção pelo regime da contabilidade organizada, ficou no entanto enquadrado nesse regime por imposição legal nos anos de 2007, 2008, 2009 e 2010;

III. Aquela opção, face ao então disposto no art.º 28.º do CIRS na redação em vigor, valia apenas para aquele ano, tendo de ser renovada até ao fim do mês de março do ano em que o contribuinte pretendesse utilizar a contabilidade organizada – é o que resulta necessariamente da redação que tinha a alínea b) do n.º 4 daquele artigo: “(…) do ano em que pretendem utilizar a contabilidade organizada como forma de determinação do rendimento” (tratava-se de opção apenas para aquele o ano);

IV. Não tendo procedido a entrega de declaração de alterações para opção pelo regime da contabilidade organizada até ao final do mês de março de 2007, cairia o sujeito passivo no regime simplificado, o que apenas não sucedeu atento os limites quantitativos estabelecidos, que o obrigaram a ficar no regime da contabilidade, por imposição legal;

V. No âmbito de procedimento inspetivo, foram os valores declarados pelos sujeitos passivos objeto de correção, passando a constar: para o ano de 2010 – prestações de serviços (campo 1202 do anexo C da Declaração Modelo 3) - € 141.130,00 (e não os €150.130,00 declarados); para o ano de 2011 – prestações de serviços - € 134 368,24; e, para o ano de 2012 – prestações de serviços – € 124 385,27;

VI. Assim, nos anos de 2011 e 2012 não existiu obrigatoriedade de aplicação do regime da contabilidade organizada, por não terem sido atingidos os limites legalmente impostos;

VII. A alteração trazida pela Lei n.º 53-A/2006, de 29.12, veio no sentido de desonerar o contribuinte da obrigação de opção anual caso pretendesse ficar no regime da contabilidade, passando qualquer um dos regimes a ter um prazo de três anos prorrogável. Tanto assim é que o legislador alterou também a redação da alínea b) do n.º 4 do art.º 28.º, a qual deixou de prever a opção de obrigatoriedade de apresentação da declaração de alterações até ao fim do mês de março do ano em que pretendem utilizar a contabilidade organizada como forma de determinação do rendimento, passando a constar “até ao fim do mês de março do ano em que pretendem alterar a forma de determinação do rendimento, mediante a apresentação de declaração de alterações”. Numa situação prevê-se a alteração do regime do ano em que pretendem utilizar, no outro, simplesmente a alteração do regime – já não é só para aquele ano;

VIII. No entanto, não fizeram os aqui Impugnantes qualquer opção por esse regime da contabilidade no âmbito do novo enquadramento legal. E quando chegados ao ano de 2011 não existe qualquer opção válida por este regime que venha dos anos anteriores (é assim, independentemente dos enquadramentos anteriores os quais resultaram de obrigação legal);

IX. Foi precisamente para esclarecer as dúvidas que então surgiram com a alteração legislativa ocorrida para o ano de 2007 e seguintes, que veio o Exm.º Sr. Diretor Geral da então Direção Geral dos Impostos emitir a Circular n.º 05/2007, de 13.03.2007. E ainda que as orientações genéricas visem a uniformização da interpretação e aplicação das normas tributárias pelos serviços, não deixou aquela de ser do conhecimento dos vários interessados;

X. Pelo que, teriam os Impugnantes que ter procedido a entrega da declaração de rendimentos “até ao fim do mês de Março do ano em que pretendem alterar a forma de determinação do rendimento (…).” E caso existisse opção por este regime após a entrada em vigor da redação dada ao art.º 28.º pela Lei 53-A/2006, de 29.12, a mesma seria válida por três anos – mas não existiu;

XI. Considera-se que a Douta Sentença incorre em erro de julgamento de facto, pois não apenas não fixou como provada toda a factualidade relevante - nada é dito na fundamentação quanto ao facto de, para os rendimentos dos anos de 2007 a 2010, ter o contribuinte ficado no regime da contabilidade organizada por obrigação legal -, como fez errada aplicação dos factos que fixou como provados;

XII. Incorreu também em erro de julgamento de direito, pois ao decidir pela procedência da presente Impugnação, concluindo que os Impugnantes estavam, nos anos de 2011 e 2012, enquadrados no regime da contabilidade organizada, independentemente de opção válida e sem que tivessem obtido rendimentos que impusessem esse regime (ao contrário do que tinha acontecido nos anos anteriores), violou o disposto no art.º 28.º do CIRS.

Nestes termos e nos mais de Direito aplicável, requer-se a V.as Ex.as se dignem julgar PROCEDENTE o presente recurso, por totalmente provado e em consequência ser a douta sentença ora recorrida, revogada e substituída por Douto Acórdão que julgue totalmente improcedente a presente Impugnação, tudo com as devidas e legais consequências”.

2 – Não foram apresentadas contra-alegações.

3 – O Excelentíssimo Procurador-Geral Adjunto junto deste Tribunal emitiu o parecer de fls. 206 a 208, pronunciando-se pelo não provimento do recurso e pela confirmação da sentença impugnada por considerar que “nos anos económicos de 2011 e 2012 o sujeito passivo permanecia no regime de contabilidade organizada, por triénios sucessivos, se não houvesse comunicação de alteração do regime pelo qual se encontrava abrangido (art.28º nº5 CIRS redacção da Lei nº 53-A/2006, 29 dezembro). O regime jurídico vigente neste período apenas contemplava os pressupostos da cessação da aplicação do regime simplificado de determinação dos rendimentos, nada estabelecendo quanto à cessação da aplicação do regime de contabilidade organizada (art.28º nº 6 CIRS). Do mesmo modo, sendo estabelecido um período mínimo de permanência no regime de contabilidade organizada, não era prescrito qualquer limite máximo de permanência neste regime. A solução legislativa radicava na aceitação da contabilidade organizada como regime geral de determinação dos rendimentos empresariais ou profissionais; e do regime simplificado como um regime não vinculativo, válido somente para quem não optasse pelo regime de contabilidade organizada”.

Como tal, “no caso concreto, tendo o sujeito passivo apresentado no ano 2006 declaração de opção pelo regime de contabilidade organizada, deve permanecer nesse regime por períodos sucessivos mínimos de três anos (neles se incluindo os anos 2011 e 2012), por ausência de comunicação de alteração do regime pelo qual se encontrava abrangido”.

4 – Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.


– Fundamentação –

5 – Questão a decidir

É a de saber se o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento em violação do disposto no artigo 28.º do Código do IRS, ao considerar que, nos anos de 2011 e de 2012, a opção de tributação ao abrigo do regime geral da contabilidade organizada exercida pelos Recorridos em 2006 se mantinha válida e eficaz.

6 – Matéria de Facto

É do seguinte teor o probatório fixado na sentença recorrida:

A - O Impugnante encontra-se registado como profissional independente com o CAE 82990 – Outras Atividades de Serviço e Apoio Prestados às Empresas, N.E., cfr. facto não controvertido e que se extrai do Relatório de Inspeção tributária (RIT) de fls. 12 a 21 do processo administrativo apenso aos autos.

B - O Impugnante iniciou atividade em 02.01.1985 e encontra registado na Ordem dos Técnicos de contas sob o n.º …..., cfr. facto não controvertido e artigos 6.º e 7.º da petição inicial.

C - Em 29.06.2001, os Impugnantes apresentaram “Declaração de Alterações”, constando do campo “19 – IRS e IRC – Opção pelo regime de contabilidade organizada (IRS) ou pelo regime geral de determinação do lucro tributável (IRC)”, o seguinte:

“IRS – Opto pelo regime de contabilidade organizada SIM” 3

X

X

1

cfr. fls. 57 e 58 dos autos.

D - Em 22.03.2004, os Impugnantes apresentaram “Declaração de Alterações”, constando do campo “19 – IRS e IRC – Opção pelo regime de contabilidade organizada (IRS) ou pelo regime geral de determinação do lucro tributável (IRC)”, o seguinte:

“IRS – Opto pelo regime de contabilidade organizada SIM” 3

X

X

1

cfr. fls. 51 e 52 dos autos.

E - Em 22.03.2005, os Impugnantes apresentaram “Declaração de Alterações”, constando do campo “19 – IRS e IRC – Opção pelo regime de contabilidade organizada (IRS) ou pelo regime geral de determinação do lucro tributável (IRC)”, o seguinte:

“IRS – Opto pelo regime de contabilidade organizada SIM” 3

X

X

1

cfr. fls. 49 e 50 dos autos.

F - Em 01.03.2006, os Impugnantes apresentaram “Declaração de Alterações”, constando do campo “Enquadramento Definido pelo SF em IR”, o seguinte:

“Enquadramento: Regime de Contabilidade Organizada por Opção

A vigorar a partir de: 2006-01-01 até 2006-12-31”, cfr. documento comprovativo de declaração de alteração de atividade a fls. 53 dos autos.

G - A partir de 2006, os Impugnantes não declararam à Administração Tributária pretender ser tributados pelo regime da contabilidade organizada, cfr. facto não controvertido.

H - Em 07.05.2012, os Impugnantes apresentaram a “Declaração de rendimentos, Modelo 3 de IRS”, referente ao exercício de 2011, fazendo constar do anexo B, rendimentos provenientes de vendas/prestações de serviços no montante de €150.130,00, cfr. fls. 37 dos autos.

I - No ano de 2014, os Impugnantes foram objeto de uma ação de inspeção, promovida pelos Serviços de Inspeção Tributária de Setúbal, com incidência sobre IRS dos exercícios de 2010 a 2012, cfr. relatório de inspeção tributária de fls. 63 a 68 dos autos e fls. 53 a 62 do processo administrativo apenso aos autos.

J - Na sequência da ação de inspeção referida na alínea precedente, em 22.03.2014, foi emitida, em nome dos Impugnantes, a liquidação de IRS n.º 2014 5000046428, no valor de €6.695,26, com data limite de pagamento a 05.05.2014, cfr. fls. 23 dos autos.

K - Na sequência da ação de inspeção referida em H), em 27.03.2014, foi emitida, em nome dos Impugnantes, a liquidação de IRS n.º 2014 5000047332, no valor de €4.036,72, com data limite de pagamento a 05.05.2014, cfr. fls. 24 dos autos.

L - Os Impugnantes apresentaram, junto da Direção de Finanças de Setúbal, um requerimento com data de entrada de 14.05.2014, intitulado “Reclamação Graciosa”, através do qual deduzem o seguinte pedido:

“Nestes termos e nos mais de Direito aplicáveis, deverá a presente reclamação ser deferida e, em consequência, serem anuladas as liquidações identificadas, tudo com as demais consequências legais. (…)”, cfr. fls. 2 a 9 do processo administrativo apenso aos autos.

M - Em 27.08.2014 os Serviços da Divisão de Justiça Tributária da Direção de Finanças de Setúbal emitiram, relativamente ao requerimento referido na alínea precedente, informação com o seguinte teor:

“(…) A reclamante alega que face ao disposto no nº 5 do art 28º deveria ser tributado pelo regime de contabilidade e não pelo regime simplificado.

A Lei 53-A/2006 de 29/12 (Lei do orçamento para 2007) alterou o nº 5 do art 28° passando a ter a seguinte redação: “o período mínimo de permanência em qualquer dos regimes em qualquer dos regimes a que se refere o nº 1 é de três anos, prorrogável por iguais períodos, exceto se o sujeito passivo comunicar, nos termos da alínea b) do nº anterior, a alteração do regime pelo qual se encontra abrangido".

De forma a clarificar os procedimentos face à alteração da norma citada foi sancionado por despacho do substituto legal do Diretor Geral o seguinte entendimento, veiculado pela circular 05/2007 de 13 de Março, do qual se transcreva a parte aplicável ao caso em análise:

“1-Aos sujeitos passivos que estejam obrigatoriamente abrangidos pelo regime de apuramento dos rendimentos empresariais e profissionais com base na contabilidade por não preencherem os requisitos previstos no nº 2 do art 28 do Código do IRS, não se aplica o período mínimo de permanência previsto no nº 5 do mesmo artigo, uma vez que o seu enquadramento não resulta de uma opção”

Tendo caducado em 31/12/2006 a opção feita para este ano (2006), uma vez que pela lei em vigor a opção tinha de ser exercida anualmente e, sendo o reclamante tributado obrigatoriamente de contabilidade no ano de 2007, 2008, 2009 e 2010, o período de permanência prevista no nº 5 do 28, não se aplica, pelo que para poder ser tributado em 2011 e 2012 pelo regime de contabilidade deveria ter manifestado essa opção pela forma e no tempo previsto na lei (nº 4 do art 28º).

Não tendo feito a opção pelo regime de contabilidade organizada depois da entrada em vigor do disposto no n° 5 do art 28°, com a redação dada pela Lei 53-A/2006, de 29 de Dezembro é obrigatoriamente tributado pelo regime simplificado.

Face aos factos expostos e normas legais citadas entende-se que o reclamante foi devidamente enquadrado no regime simplificado, pelo que as liquidações estão em conformidade com a lei, pelo que não procede o alegado e como tal propõe-se o indeferimento do pedido”, cfr. fls. 19 a 22 dos autos e fls. 140 a 143 do processo administrativo apenso aos autos.

N - Sobre a informação referida na alínea precedente, em 27.08.2014, o Chefe da Divisão de Justiça Tributária da Direção de Finanças de Setúbal apôs o seguinte despacho:

“Confirmo. Considero a informação junta como PROJETO DE DECISÃO. Notifique o reclamante para no prazo de 15 dias contados continuamente exercer, querendo, o direito de audição previsto na alínea b) do n.º 1 do artº 60 da LGT. (…)”,cfr. fls. 19 dos autos e fls. 140 do processo administrativo apenso aos autos.

O - Por ofício n.º 020164 de 28.08.2014, os Serviços da Divisão de Justiça Tributária da Direção de Finanças de Setúbal dirigiram ao Impugnante comunicação da qual consta, designadamente:

“(…) Para efeitos de cumprimento do disposto no artigo 60º n.º 1, alínea b) da Lei Geral Tributária – exercício do direito de participação (audição) dos contribuintes no procedimento tributário, junto se envia o projecto de decisão da reclamação graciosa, acompanhado da fundamentação”, cfr. fls. 144 do processo administrativo apenso aos autos.

P - Os Impugnantes apresentaram junto dos Serviços da Divisão de Justiça Tributária da Direção de Finanças de Setúbal um requerimento, com data de entrada de 18.09.2014, sob o assunto “Audição prévia, reclamação graciosa n.º 2208201404000781”, cfr. fls. 145 do processo administrativo apenso aos autos.

Q - Em 06.10.2014 os Serviços da Divisão de Justiça Tributária da Direção de Finanças de Setúbal emitiram informação com o seguinte teor:

(…)

O reclamante veio exercer o direito de audição com os argumentos já apresentados na petição inicial e referindo que a doutrina administrativa veiculada pela circular 05/2007 não se lhe aplica uma vez que em 2006 foi exercida a opção pelo regime de tributação da contabilidade, sendo de aplicar o disposto no n° 5 do art 28º, uma vez que reclamante preenchia, cumulativamente, as duas condições para ser enquadrado naquele regime, devendo prevalecer a vontade expressa pelo reclamante, ou seja, a opção.

Como já foi referido no projeto de decisão e que volta a salientar-se é que em 2007, ano em que entra em vigor a redação do nº 5 do art 28º que prevê a permanência em qualquer dos regimes por um período mínimo de 3 anos, renovável por iguais períodos, estava no regime de contabilidade organizada por obrigação e não por opção, pelo que a norma não se lhe aplicava, o que é explicitado pela circular antes referida.

Perante o entendimento da norma em questão por parte da Administração Tributária entende-se ser manter o indeferimento do pedido conforme proposto no projeto de decisão. (…)”, cfr. fls. 17 e 18 dos autos e fls. 162 e 163 do processo administrativo apenso aos autos.

R - Sobre a informação referida na alínea precedente, em 06.10.2014 o Chefe de Divisão de Justiça Tributária da Direção de Finanças de Setúbal apôs o seguinte despacho:

“Confirmo. Considerando a informação junta torna-se definitivo o projeto de decisão e indefere-se o pedido. Notifique-se.”, cfr. fls. 17 dos autos e fls. 162 do processo administrativo apenso aos autos.

S - Por ofício n.º 7479 de 09.10.2014, os Serviços da Divisão de Justiça Tributária da Direção de Finanças de Setúbal dirigiram ao Impugnante comunicação, através de correio postal registado com aviso de receção, da qual consta, designadamente:

“(…) Fica por este meio notificado que a reclamação acima foi INDEFERIDA por Despacho datado de 2014-10-06, conforme fundamentação que se junta”, cfr. fls. 165 do processo administrativo apenso aos autos.

T - O aviso de receção que acompanhou a comunicação descrita na alínea precedente foi assinado por “B………..”, em 26.10.2014, cfr. fls. não numerada do processo administrativo apenso aos autos.

U - Em 03.11.2014 deu entrada no Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada a presente impugnação, cfr. carimbo aposto a fls. 1 dos autos.

7 – Apreciando

7.1. Do alegado erro de julgamento da sentença recorrida

A sentença recorrida, a fls. 128 a 138 dos autos, julgou totalmente procedente a impugnação judicial deduzida pelos Recorridos por considerar, em suma, que “com a redação dada ao artigo 28.º, n.º 5 do CIRS pela Lei 53-A/2006, de 29 de dezembro, que entrou em vigor em 01.01.2007, estabeleceu-se um regime regra de permanência em qualquer dos regimes a que se refere o n.º 1 (ou seja, determinação dos rendimentos com base no regime simplificado ou com base na contabilidade), por um período mínimo de três anos, que é prorrogável por iguais períodos. Este regime regra apenas poderá ser afastado se o sujeito passivo comunicar, nos termos da alínea b) do n.º 4” a “alteração do regime pelo qual se encontra abrangido. Dito de outo modo, se não existir aquela comunicação, o sujeito passivo permanece, automaticamente, no regime pelo qual se encontrava abrangido, pelo período mínimo de três anos”. Assim, considerando que o Impugnante optou pelo regime de contabilidade organizada em 2001, 2004, 2005 e 2006 e que não foi entregue qualquer comunicação de alteração desse regime, o mesmo foi prorrogado “automaticamente pelos triénios de 2006/2008; 2008/2010 e 2010/2012”.

Discorda a Recorrente do decidido, imputando à sentença erro de julgamento de facto por não ter fixado “como provada toda a factualidade relevante - nada é dito na fundamentação quanto ao facto de, para os rendimentos dos anos de 2007 a 2010, ter o contribuinte ficado no regime da contabilidade organizada por obrigação legal –” e “errada aplicação dos factos que fixou como provados”. E imputa ainda à sentença erro de julgamento de direito, uma vez que “a alteração trazida pela Lei n.º 53-A/2006, de 29.12, veio no sentido de desonerar o contribuinte da obrigação de opção anual caso pretendesse ficar no regime da contabilidade, passando qualquer um dos regimes a ter um prazo de três anos prorrogável. No entanto, não fizeram os aqui Impugnantes qualquer opção por esse regime da contabilidade no âmbito do novo” quadro legislativo. E se em 2007, 2008, 2009 e 2010 os Impugnantes ficaram obrigatoriamente enquadrados no regime de contabilidade organizada por imposição legal (atentos os limites quantitativos legalmente estabelecidos), em 2011 e em 2012 “não existe qualquer opção válida por este regime que venha dos anos anteriores” nem foram obtidos rendimentos que impusessem esse regime, o que inquina a possibilidade de serem tributados ao abrigo desse regime.

Não foram apresentadas contra-alegações e o Exmo. Procurador-Geral Adjunto junto deste Supremo Tribunal Administrativo pronunciou-se pela improcedência do recurso e pela manutenção da sentença recorrida.

Vejamos.

Como é jurisprudência reiterada deste Supremo Tribunal Administrativo, do disposto no n.º 1 do artigo 28.º do Código do IRS resulta (salvo no caso da imputação prevista no artigo 20.º do mesmo Código) que a determinação dos rendimentos empresariais e profissionais se faz com base na aplicação das regras do regime simplificado ou com base nas regras do regime de contabilidade organizada, ficando abrangidos pelo regime simplificado em cada ano os sujeitos passivos que não tenham ultrapassado, no período de tributação imediatamente anterior, qualquer dos limites indicados no n.º 2 daquela disposição legal e não tenham optado pela determinação dos rendimentos com base na contabilidade (assim vide, a título de exemplo, os Acórdãos deste STA proferidos a 27 de Janeiro de 2010 no Processo n.º 0906/09 e a 4 de Novembro de 2015 no Processo n.º 0877/15).

Assim é porque, como bem resulta das palavras de Rui Duarte Morais, “Sobre o IRS”, 2006, Almedina, p. 73, “a regra do nosso sistema fiscal é o lucro ser apurado com base na contabilidade”, caso em que “a matéria colectável de imposto corresponderá então ao resultado contabilístico dessa actividade (art. 29.º, n.º 1), depois de “corrigido” segundo as prescrições da lei fiscal”. Paralelamente, o regime simplificado constitui um regime não vinculativo, válido somente para quem não tenha optado pelo regime de contabilidade organizada. Como ensina SALDANHA SANCHES, Fiscalidade (Julho/Outubro de 2001), o regime simplificado tem sempre como pressuposto uma opção do contribuinte que renuncia ao seu direito subjectivo de ser tributado com base na contabilidade, sendo uma das situações em que a lei atribui relevância à sua vontade e em que ele pode optar pelo regime que considera mais favorável.

Ora, de acordo com o probatório fixado na sentença recorrida (cfr. as alíneas C, D, E e F), em 2001, 2004, 2005 e 2006 os Recorridos optaram expressamente pela respectiva tributação, em sede de IRS, ao abrigo do regime geral da contabilidade organizada. E considerando esta opção manifestada de forma expressa, não havia como oficiosamente obrigar os Recorridos a serem tributados pelo regime simplificado nos anos de 2011 e 2012 (ao contrário do que sufraga a Recorrente).

Com efeito, e conforme resulta do Acórdão deste Supremo Tribunal Administrativo proferido a 27 de Janeiro de 2010 no âmbito do Processo n.º 0906/09, tendo o sujeito passivo optado “pelo regime de contabilidade organizada, não havia como aplicar-lhe o regime simplificado, pois que o preceito não previa a caducidade dessa opção nem fixava qualquer período mínimo de permanência no regime geral (ao contrário do que sucede hoje, na versão que foi conferida ao artigo 28.º n.º 5 do CIRS pela Lei n.º 53-A/2006, de 29 de Dezembro)”, independentemente de essa opção ter sido exercida na Declaração de Início de Actividade ou numa Declaração de Alterações, pois que esta última declaração substitui, no que toca a este aspecto e para todos os legais efeitos, a Declaração de Início de Actividade, ao abrigo do disposto no n.º 5 do artigo 112.º do Código do IRS.

Neste mesmo sentido vai o Acórdão deste STA proferido a 17 de Março de 2010 no Processo n.º 056/10, onde se consigna que, “tendo o sujeito passivo tributado pelo regime simplificado apresentado em 7 Setembro de 2001 a sua opção pelo regime de contabilidade organizada - Declaração de Alterações -, por aplicação do disposto no nº 4 do artº 31º do CIRS, passou a ser tributado por esse regime nos anos seguintes, independentemente do volume de vendas e do período de permanência no anterior regime de tributação simplificado”.

Apenas assim não seria no caso de os Recorridos se encontrarem sujeitos ao regime simplificado (por falta de opção pelo regime geral e inclusão automática no regime simplificado), caso em que, como se escreveu no já referido Acórdão deste Supremo Tribunal Administrativo proferido a 27 de Janeiro de 2010 no âmbito do Processo n.º 0906/09, a norma legal lhe exigia “que entregasse, no caso de pretender ser tributado pelo regime geral num determinado ano, a declaração de alterações até ao fim do mês de Março desse ano. Se ele já se encontrava inserido no regime geral, por opção feita na declaração de início de actividade nos termos da alínea a) do nº 4, não tinha de renovar anualmente essa opção nos termos da alínea b) do nº 4” (nosso sublinhado).

Portanto, perante o comportamento declarativo adoptado pelos Recorridos em 2006, impõe-se considerar como válida e relevante essa opção pelo regime geral de contabilidade relativamente ao ano de 2006 e relativamente aos exercícios seguintes, incluindo os anos de 2011 e de 2012 que se encontram em causa nos presentes autos. O que não sofre qualquer alteração por força do enquadramento legal dos recorridos no período compreendido entre 2007 e 2010 nem por força da alteração legislativa introduzida pela Lei n.º 53-A/2006, de 29 de Dezembro (ao contrário do que a Recorrente pretende fazer crer).

Com efeito, tendo os Recorridos exercido a sua opção pela tributação ao abrigo do regime geral de contabilidade organizada em 2006, revela-se inócuo apurar se reiteraram expressamente a vontade de continuarem a ser tributados ao abrigo desse regime nos anos que se encontram em análise ou se nele foram incluídos automática e implicitamente por força da opção geral anteriormente exercida. E revela-se também inócuo perceber se no período decorrido entre 2007 e 2010 foram obrigatoriamente enquadrados no regime geral de contabilidade organizada porque, como já se referiu, a opção exercida em 2006 manteve-se válida nos anos sob análise independentemente de o valor dos rendimentos obtidos pelos Recorridos os situar, em cada ano, no regime de contabilidade organizada por opção ou por obrigação.

Por outro lado, a entrada em vigor da Lei 53-A/2006, de 29 de Dezembro não tem qualquer impacto no caso dos autos na medida em que, ainda que se considere que tal Lei é de aplicação imediata na situação sub judice (por força do disposto no n.º 3 do artigo 12.º da Lei Geral Tributária, que prevê que “as normas sobre procedimento e processo são de aplicação imediata, sem prejuízo das garantias, direitos e interesses legítimos anteriormente constituídos dos contribuintes”), os anos em análise continuariam incluídos pela nova redacção conferida por aquela Lei ao n.º 5 do artigo 28.º do Código do IRS, que passou a estabelecer que “o período mínimo de permanência em qualquer dos regimes a que se refere o n.º 1 é de três anos, prorrogável por iguais períodos, excepto se o sujeito passivo comunicar, nos termos da alínea b) do número anterior, a alteração do regime pelo qual se encontra abrangido”. Como resulta claramente do texto legal, na ausência de comunicação de alterações por parte do Sujeito Passivo, o período mínimo de permanência no regime de contabilidade organizada foi automaticamente prorrogado por 3 períodos de 3 anos, abrangendo necessariamente os anos de 2011 e de 2012.

Este tem sido, aliás, o entendimento deste STA e que não vemos razões para alterar, por tudo quanto aduzimos anteriormente. Assim, veja-se o Acórdão do STA proferido a 4 de Novembro de 2015 no Processo n.º 0877/15, onde se escreveu que “no caso, o recorrido impugnante marido estava, por opção, a ser tributado, no triénio 2006/2008, de acordo com a contabilidade organizada e não tendo optado pela alteração desse regime no momento em que o poderia ter feito, tal regime mantém-se, pois que, como se viu e bem refere a sentença recorrida, nos termos do n° 5 do art. 28º do CIRS, o período mínimo de permanência em qualquer dos regimes a que se refere o n° 1 é de três anos, prorrogável por iguais períodos, excepto se o sujeito passivo comunicar, nos termos da al. b) do nº 4, a alteração do regime pelo qual se encontra abrangido”. O que os Recorridos não fizeram no caso sub judice, motivo pelo qual não podia a Administração Tributária ter-se substituído aos Recorridos nessa opção.

Nesta conformidade, a sentença em crise nos presentes autos não merece a censura que lhe é dirigida.


– Decisão –

8 - Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes da Secção de Contencioso do Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em negar provimento ao recurso.

Custas pela Recorrente.

Lisboa, 3 de Julho de 2019. – Isabel Marques da Silva (relatora) – Dulce Neto – Francisco Rothes.