Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01064/14.5BEPRT
Data do Acordão:05/29/2019
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:FRANCISCO ROTHES
Descritores:IRC
CUSTOS
PERDA DE BENS
INDEMNIZAÇÃO
RISCO
SEGURO
Sumário:I - Nos termos do disposto no art. 23.º, n.º 1, alínea j), do CIRC, na redacção em vigor em 2009, eram considerados custos ou perdas para efeitos de determinação do lucro tributável as indemnizações suportadas pelo sujeito passivo «resultantes de eventos cujo risco não seja segurável» e nos termos do art. 45.º, n.º 1, alínea e), do mesmo Código, não eram dedutíveis as «indemnizações pela verificação de eventos cujo risco seja segurável».
II - Atentas as regras da hermenêutica jurídica (cfr. art. 9.º do CC), não pode extrair-se das referidas normas o sentido de que as indemnizações serão custos fiscalmente relevantes na parte em que excedam os limites do seguro obrigatório, pois nem a letra da lei (que constitui o ponto de partida e o limite da actividade interpretativa) consente essa interpretação nem dos demais elementos interpretativos resulta ser essa a intenção do legislador.
III - O legislador terá pretendido, numa opção legítima, proteger os terceiros, mediante a consagração de estímulos para que o sujeito passivo acautele o risco normal da sua actividade – intenção que só resulta plenamente realizada se o sujeito passivo transferir totalmente a sua responsabilidade para uma seguradora, e não apenas a que resulta do seguro obrigatório –, com a possibilidade de deduzir integralmente as despesas com o pagamento dos prémios de seguro, ao invés de confiar na álea em ordem à obtenção de lucro mais elevado.
Nº Convencional:JSTA000P24607
Nº do Documento:SA22019052901064/14
Data de Entrada:03/25/2019
Recorrente:A..............., SARL
Recorrido 1:AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Recurso jurisdicional de sentença proferida em processo de impugnação judicial com o n.º 1064/14.5BEPRT

1. RELATÓRIO

1.1 A sociedade acima identificada como Recorrente interpôs recurso para o Supremo Tribunal Administrativo da sentença por que o Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto julgou improcedente a impugnação judicial por ela deduzida, na sequência do indeferimento da reclamação graciosa, contra a autoliquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC) do ano de 2009, na parte em que pretende deduzir, para efeitos de determinação do lucro tributável, o montante das indemnizações que pagou aos seus clientes pelo furto dos bens que estes lhe tinham dado em penhor, garantindo os mútuos por ela concedidos.

1.2 O recurso foi admitido, com subida imediata e nos próprios autos e a Recorrente apresentou a motivação do recurso, que resumiu em conclusões do seguinte teor:

«I. A sentença objecto de recurso incorre no vício de erro de julgamento por incorrecta interpretação das seguintes disposições legais: artigos 23.º, n.º 1, al. j) [(Permitimo-nos corrigir o manifesto lapso de escrita: a Recorrente escreveu m) onde queria dizer j).)]; 45.º, n.º 1 alínea e), ambos do CIRC na redacção vigente em 2009; artigos 32.º e 33.º do Decreto-Lei n.º 365/99 de 17 de Setembro, na redacção vigente em 2009.

II. A questão central é a correcta interpretação das normas contida nas disposições referidas à actividade de prestamista na seguinte situação: tendo o prestamista transferido o risco para uma seguradora no cumprimento da obrigação legal, não o tendo feito na totalidade, mas apenas no respeito do limite mínimo exigido por lei, na verdade bem acima do mínimo, no caso de furto e de ter procedido à indemnização dos mutuários pela perda dos objectos depositados em penhor, se a parte não coberta pelo seguro pode ser dedutível como custo para efeito de determinação do lucro tributável.

III. A questão NÃO está em saber se é possível deduzir como custo prejuízo resultante de risco segurável, pois não é possível, antes está em saber o que é «risco segurável», em concreto e tendo por base uma interpretação das normas pertinentes acima descritas à luz do sistema fiscal português.

IV. A Recorrente, que desenvolve a actividade de prestamista, regulada pelo Decreto-Lei n.º 365/99, de 17 de Setembro, actividade que consiste, de acordo com o disposto no n.º 2 do art. 1.º do DL n.º 365/99, no exercício por pessoa singular ou colectiva da actividade de mútuo garantido por penhor, no cumprimento do estatuído no art. 32.º/1, – obrigatoriedade de o prestamista indemnizar o mutuário “[e]m caso de perda, extravio, furto, roubo ou incêndio das coisas dadas em penhor” – e de transferir o respectivo risco para uma seguradora, fê-lo além dos limites determinados no n.º 2 do mesmo artigo, ou seja, o valor segurado foi feito multiplicando por 4 o valor das avaliações das existências e acrescendo 50%.

V. Em 2009, a Recorrente foi vítima de furto, devidamente comprovado nos autos.

VI. A Recorrente viu-se obrigada a pagar o valor total das indemnizações aos mutuários, relativamente à perda dos bens dados em penhor pelos mutuários.

VII. Uma vez que o valor segurado não cobria a totalidade dos bens, a Recorrente viu-se obrigada a suportar o prejuízo com a parte não coberta, logo não reembolsada pela seguradora.

VIII. O Tribunal a quo, confirmando entendimento da AT, considerou que o SP prestamista obrigado a transferir o risco na totalidade para uma seguradora, e entende que o mesmo é “segurável”, pelo que se enquadra na previsão do art. 46.º/1, al. e), do CIRC, não sendo dedutível como custo fiscal.

IX. Tendo por base informação vinculativa solicitada pela ora Recorrente em 2009, a AT havia fundamentado a sua interpretação do seguinte modo: (1) O roubo de objectos não é “actividade normal da empresa”, pelo que não pode ser considerado “custo indispensável para a realização dos rendimentos”; (2) A semelhança com a situação sobre que recaiu o parecer 2/2007, do Centro de Estudos Fiscais, sancionado superiormente, segundo o qual: “não são aceites como custos ou perdas para efeitos de determinação do lucro tributável os valores das indemnizações pagas aos clientes atingidos pelo desvio de fundos depositados no Banco, na parte não abrangida pelo seguro”; (3) Não se conseguir provar que na situação dos valores não cobertos por seguro se está perante “um bem de risco não segurável”.

X. A sentença a quo assenta em pressupostos errados por interpretação errada da Lei. Assim:

XI. Que decorre dos artigos 32.º e 33.º do Decreto-Lei n.º 365/99 de 17 de Setembro: que a lei não prevê a obrigação dos prestamistas indemnizarem os mutuários lesados, antes cabe às seguradoras; que os prestamistas apenas têm o dever legal de transferir na totalidade o risco.

XII. Tais artigos não só não permitem essa interpretação como a afastam. A própria sentença transcreve na página 10 o artigo 32.º do DL 365/99, segundo o qual: “1- Em caso de perda, extravio, furto, roubo ou incêndio das coisas dadas em penhor, fica o prestamista obrigado a indemnizar o mutuário”. O número 2 do artigo 33.º do DL 365/99 (transcrito na página 9 da sentença), determina que “2- O valor do seguro a que se refere o número anterior é no mínimo o que resultar da média das avaliações efectuadas no ano anterior” ficando, pois, claro que a lei apenas impõe a transferência para uma seguradora, de um «mínimo» resultante «da média das avaliações efectuadas no ano anterior».

XIII. Na interpretação e aplicação da lei a sentença omite por completo qualquer referência, sequer implícita: ao contexto sistemático dos artigos 23.º e 45.º do CIRC, nomeadamente a questão da indispensabilidade dos custos e o recurso aos princípios gerais da “constituição fiscal”, designadamente os princípios da tributação pelo rendimento real e de acordo com a capacidade contributiva (rendimento-acréscimo), e da igualdade e justiça fiscal; à questão, importante em matéria de tributação, do princípio da especialidade dos exercícios.

XIV. Uma interpretação meramente literal e nos termos em que o tribunal a quo procedeu não permite um completo esclarecimento do sentido da norma quando se refere a «risco segurável».

XV. Na verdade, é possível, em abstracto, segurar qualquer dos seus riscos, levando em conta quanto aos seguros comerciais por risco as disposições dos arts. 432.º a 441.º do Cód. Com. E, neste aspecto, não pode existir risco que, em abstracto, não seja segurável. Mas isso torna a norma em apreço incompreensível.

XVI. A interpretação correcta do sentido de «risco segurável», quando feita recorrendo quer ao elemento gramatical quer ao espírito da lei, atendendo, portanto, aos princípios da constituição fiscal e aos elementos sistemático e lógico-racional de interpretação só pode ser a seguinte (sendo cumulativos os requisitos): é segurável o risco quando exista o dever de proceder ao seguro, na medida desse dever, e na possibilidade efectiva de o fazer. No caso foi feito o seguro e cumprida a medida do dever (além mesmo da medida).

XVII. O Tribunal a quo não levou a sério o prejuízo real sofrido pela Recorrente e trata como rendimento-acréscimo o que foi perda, com violação dos princípios constitucionais referidos.

XVIII. No caso em apreço, o prejuízo resultante dos furtos não é rendimento, muito menos acréscimo de rendimento, é prejuízo.

XIX. Não deve haver dúvidas que os valores pagos pela Recorrente aos mutuários lesados a título de “reposição” dos objectos roubados por eles dados em penhor são “custos/gastos” quer na nomenclatura do POC (vigente à data dos factos), quer do SNC, na medida em que houve, de facto, uma “diminuição nos benefícios económicos durante o período contabilístico”, “na forma de exfluxos de activos”.

XX. Quanto à “indispensabilidade dos custos”: a assunção pela Recorrente dos encargos com a indemnização na parte não coberta pela apólice foi, comprovadamente, indispensável para a Recorrente voltar a ter a confiança dos clientes e manter-se na sua actividade, desta forma podendo vir a receber novos pedidos de empréstimo com penhores, como, de resto, veio a suceder, pelo que tal montante não pode deixar de constituir um verdadeiro custo fiscal à luz da norma do art. 23.º do CIRC. Qual seria a alternativa? Não reembolsar os clientes? Só pode haver uma resposta: teria sempre que reembolsar por razões contratuais, legais, de boa gestão, e de sobrevivência do negócio.

XXI. A propósito da indispensabilidade dos custos e com pertinência para o presente caso, entre outros: - Acórdão de 12/03/2015 do TCA-Norte, Proc. 00005/04.2BEPNF (Rel. Vital Lopes); Acórdão de 09/12/1998, do TCA-Sul, Proc. 00400/97 (Rel. Jesus Gomes Correia); Acórdão de 02/07/2002, do TCA-Sul, Proc. 6540/02 (Rel. Francisco Rothes).

XXII. Significa isto que serão de considerar como custos ou perdas aqueles que, devidamente comprovados, sejam indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto e para a manutenção da respectiva fonte produtora.

XXIII. Já no âmbito da Contribuição Industrial, cujo código que tinha disposição paralela – o art. 26.º – a AT vinha recusando que o valor das mercadorias ou valores em dinheiro furtados pudessem ser considerados como “custos de exercício”. Mas já então esse critério merecia a crítica de VÍTOR FAVEIRO, que escrevia:

XXIV. “A Administração Fiscal vem seguindo o critério geral de não aceitar, como custos ou perdas, o roubo ou o extravio de mercadorias, e, portanto, o seu abatimento ao inventário das existências. Trata-se, porém, de um entendimento manifestamente errado, enquanto critério geral uniforme, porquanto se a existência de mercadorias é havida como um valor positivo porque se destinam à realização de operações de afluxo de valores positivos ao rédito da empresa, a perda material de tais unidades, seja a que título for, e desde que comprovada em termos razoáveis, não pode deixar de ser havida como realidade que “foi indispensável suportar para a realização dos proveitos ou para a manutenção da fonte produtora” Noções Fundamentais de Direito Fiscal, 1986, II volume, pág. 603 (sublinhado da Requerente).

XXV. A ratio legis do art. 45.º, n.º 1, al. e) do CIRC é também a de garantir a observância do princípio da especialização dos exercícios nos casos em que exista um hiato temporal entre o pagamento das indemnizações aos lesados pelo segurado e o respectivo ressarcimento pela seguradora, e isso não foi levado em conta na sentença.

XXVI. O Tribunal a quo cita o acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 20 de Junho de 2006, tirado no processo 01138/06, para concluir que: «O referido acórdão determina, com meridiana clareza, que as indemnizações a título de furto são aceites como custo desde que o risco não seja segurável». Porém, além de não haver semelhança com o caso em apreço na sua configuração concreta, é óbvio e não se discute que as indemnizações a título de furto são aceites como custo desde que o risco não seja segurável, pois o que importa é saber se, em concreto, o risco era segurável.

XXVII. A terminar, uma referência ao Parecer n.º 2/2007 do Centro de Estudos Fiscais, de 15/01/2007, usado pela AT no ponto 8 da Informação vinculativa constante do processo instrutor e que consubstanciou o acto impugnado ora recorrido. Pois, importa dizer que por decisão do Supremo Tribunal Administrativo de 15/01/2014, Proc. 0815/11 (Rel. Francisco Rothes) foi dada como improcedente a posição da AT e dada razão ao Banco recorrente.

NESTES TERMOS e nos mais de direito doutamente supridos por V.exas.,

Deve o recurso ser julgado procedente, anulando-se a sentença recorrida e, em consequência, anulando-se a (auto)liquidação de IRC do exercício de 2009, ordenando-se o reembolso dos valores pagos de IRC, derramas, juros compensatórios, e determinando-se que a AT pague à Recorrente juros indemnizatórios, tudo nos termos do pedido na petição inicial nos autos».

1.3 Não foram apresentadas contra-alegações.

1.4 Recebidos os autos neste Supremo Tribunal Administrativo, foi dada vista ao Ministério Público e o Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de que seja negado provimento ao recurso, com a seguinte fundamentação: «[…]

Nos termos do estatuído no artigo 23.º do CIRC consideram-se como custos fiscais ou perdas os que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora.
Para que os custos enumerados no artigo 23.º do CIRC sejam considerados dedutíveis para efeitos fiscais é necessário, pois, que se verifiquem dois requisitos cumulativos, a saber:
1. Que sejam comprovados através de documentos emitidos nos termos legais;
2. Que sejam indispensáveis para a realização dos proveitos.
Para aferir da indispensabilidade dos custos há que ter em conta o intuito objectivo que levou a recorrente a proceder como procedeu, sendo certo que tal intuito não se identifica com o concreto ânimo de quem tomou tal decisão.
Efectivamente, o intuito objectivo é determinado a posteriori, tendo como referência todas as circunstâncias conhecidas no momento da decisão e nunca as posteriores.
Se a decisão teve na sua génese tão só o interesse da empresa, o prosseguimento do seu objecto social, tal como os seus sócios e gestores, bem ou mal não interessa, ao tempo o interpretaram, o custo não pode deixar de ser havido como indispensável.
Se a motivação predominante for outra não deverá ser fiscalmente aceite.
Cabe ao sujeito passivo o ónus de alegação dos factos justificativos da necessidade do custo (Apontamentos ao IRC, páginas 88 e 90, Professor Rui Duarte Morais).
Todavia, há encargos que, mesmo quando contabilizados como custos ou perdas do exercício não são dedutíveis para efeitos de determinação do lucro tributável, como acontece com as indemnizações pela verificação de eventos cujo risco seja segurável (artigo 42.º/1/ e) do CIRC, na redacção vigente à data do facto tributário).
Como resulta do probatório, a recorrente exerce a actividade de prestamista, cujo regime jurídico está regulado no DL 365/99, de 17/09.
Em caso, nomeadamente, de furto das coisas dadas em penhor, o prestamista fica obrigado a indemnizar o mutuário (artigo 32.º/1 do DL 365/99).
Tal indemnização é a que resulta do valor da avaliação do objecto, deduzida do valor em dívida à data da ocorrência e acrescida de metade do valor da avaliação (artigo 32.º/2).
A responsabilidade de indemnizar do prestamista prevista no artigo 33.º do DL 365/99 é, obrigatoriamente, transferida para uma companhia de seguros (artigo 33.º/1).
O valor de tal seguro é, no mínimo, o que resultar da média das avaliações efectuadas no ano anterior, fixado por indicação do prestamista (artigo 33.º/2/3).
Temos, assim, que, o prestamista tem a obrigação de indemnizar, em caso de furto, e que essa obrigação deve ser transferida na totalidade para uma seguradora.
Ora, na norma do artigo 42.º/1/ e) do CIRC, na redacção vigente à data do facto tributário, consideram-se os seguros obrigatórios “…mas também aqueles que, numa óptica normal de gestão diligente, e tendo em conta a natureza da actividade, a empresa deveria providenciar, por forma a acautelar o risco normal da sua actividade” (Lições de Fiscalidade, 2012, João Ricardo Catarino, Vasco Branco Guimarães (coord.), página 257).
Como resulta do probatório, o valor segurado pela recorrente, à data dos factos, era inferior ao valor dos bens dados em penhor.
Face ao exposto parece certo que a indemnização paga pela recorrente aos mutuários não pode ser relevada como custo fiscal, pois que esse risco era segurável, uma vez que toda essa responsabilidade deveria ter disso transferida para uma companhia de seguros nos termos, já enunciados, do regime jurídico da actividade prestamista (Neste sentido decisão arbitral, de 01/02/2018-P. 486/2017-T, disponível em www.caad.pt ).
A sentença recorrida, em nosso entendimento, não merece censura».

1.5 Colhidos os vistos dos Conselheiros adjuntos, cumpre apreciar e decidir.


* * *

2. FUNDAMENTAÇÃO

2.1 DE FACTO

O Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto deu como assentes os seguintes factos:

«1. A Impugnante é uma sociedade que se dedica à “concessão de empréstimos garantidos por penhor, no caso, artigos em ouro, prata e relógios. Como consequência da actividade principal de prestamista, dedica-se à venda de ouro em segunda mão adjudicado em “leilão” promovido pelo próprio, quando os mutuários não resgatam os artigos e deixam de pagar os juros. Uma parte existência assim adquirida é afecta ao comércio a retalho (artigos usados em ouro, prata, joalharia e relógios) possuindo para o efeito uma ourivesaria, a restante é vendida quase em exclusivo a um único cliente” – cfr. Relatório de Inspecção Tributária [RIT], a fls. 20 do PA apenso;

2. Em 2009 a Impugnante foi alvo de “furtos às suas instalações e, não obstante possuir seguro de responsabilidade civil obrigatório – porque os valores segurados eram inferiores aos valores dos bens dados em penhor pelos mutuários – teve de indemnizar estes últimos pela respectiva diferença” – cfr. projecto de despacho, a fls. 90 do PA apenso;

3. Em 11 de Junho de 2012 iniciou-se um procedimento inspectivo à Impugnante, para os anos de 2008 e 2009 – cfr. RIT, a fls. 19 do PA apenso;

4. No âmbito do procedimento referido em 3 foram identificadas situações passíveis de correcção, que a Impugnante corrigiu “através da entrega das respectivas declarações de substituição de IRC, IVA e guias de pagamento do Imposto do Selo, para os períodos de imposto de 2008 e 2009” – cfr. RIT, a fls. 21 do PA apenso;

5. No dia 7 de Dezembro de 2012 foi pago o valor de € 77.804,79, referente ao documento 2012.1811339, respeitante a IRC do ano de 2009 – cfr. Nota de Cobrança de IRC, a fls. 60 do PA apenso;

6. Em 10 de Abril de 2013 foi apresentada a reclamação graciosa 3190201304001184, que foi indeferida por despacho de 7 de Abril de 2014 – cfr. despacho, a fls. 100 do PA apenso;

7. A presente acção deu entrada no dia 9 de Maio de 2014 – cfr. comprovativo de entrega de documento, a fls. 2 do suporte físicos dos autos».


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2.2 DE DIREITO

2.2.1 A QUESTÃO A APRECIAR E DECIDIR

Apesar da exiguidade da matéria de facto dada como assente, nos autos está em causa a possibilidade de aceitar como custo fiscal, para efeitos de determinação do lucro tributável da ora Recorrente relativamente ao ano de 2009, a diferença entre os montantes por ela pagos aos seus clientes a título de indemnização pelos bens móveis furtados e que detinha em penhor no âmbito da sua actividade de prestamista – à data regulada pelo Decreto-Lei n.º 365/99, de 17 de Setembro (Este diploma foi revogado pelo art. 41.º do Decreto-Lei n.º 160/2015 de 11 de Agosto, que veio estabelecer um novo regime jurídico da actividade prestamista.), que, no n.º 2 do seu art. 1.º a define como o «exercício por pessoa singular ou colectiva da actividade de mútuo garantido por penhor» –, e o montante que a esse título foi pago pela seguradora para quem tinha transferido, parcialmente, o risco que para ela advinha do furto desses mesmos bens.
A questão suscita-se em face da redacção dos arts. 23.º e 42.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (CIRC), artigos que tinham como epígrafe, respectivamente, «Custos ou perdas» e «Encargos não dedutíveis para efeitos fiscais» e que, na redacção aplicável – que é a que vigorava no ano de 2009(Ou seja, anterior à republicação do CIRC efectuada pelo Decreto-Lei n.º 159/2009, de 13 de Julho, o qual, nos termos do respectivo art. 9.º, «aplica-se aos períodos de tributação que se iniciem em, ou após, 1 de Janeiro de 2010».) – e na parte que ora nos interessa considerar, dispunham, também respectivamente: «1- Consideram-se custos ou perdas os que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora, nomeadamente os seguintes: […] j) Indemnizações resultantes de eventos cujo risco não seja segurável; […]» e «1- Não são dedutíveis para efeito de determinação do lucro tributável os seguintes encargos, mesmo quando contabilizados como custos ou perdas do exercício: […] j) As indemnizações pela verificação de eventos cujo risco seja segurável; […]».
Note-se, desde já, que o que está em causa nos autos é se as indemnizações por furto, na parte que foram suportadas pela ora Recorrente, podem constituir um custo ou perda fiscalmente relevante; não estão aqui em causa eventuais custos ou perdas por furto de mercadorias, o que tem como consequência serem espúrios os considerandos que a este propósito foram tecidos nas alegações de recurso.
A controvérsia, atento os fundamentos utilizados pela AT para indeferir a reclamação graciosa deduzida pela ora Recorrente – e condição necessária à abertura da via contenciosa, uma vez que estamos perante autoliquidação (cfr. art. 131.º, n.º 2, do CPPT) – , situa-se em torno da interpretação do que sejam eventos cujo risco seja segurável.
Podemos, pois, desde já, afastar a discussão sobre a comprovação e a indispensabilidade enquanto requisitos para a relevância fiscal dos custos ou gastos, pois não foi com fundamento na falta de verificação de qualquer deles que a AT indeferiu a reclamação graciosa. O fundamento para esse indeferimento, para a recusa da AT em aceitar a referida verba (diferença entre os montantes das indemnizações que pagou aos seus clientes e os que foram pagos pela seguradora para quem tinha transferido o risco) como gasto para efeitos da determinação do lucro tributável, foi exclusivamente o de que o risco em causa – o risco pelo furto dos bens móveis que a ora Recorrente detém por lhe terem sido dados em penhor no âmbito da sua actividade de prestamista – é segurável.
Na verdade, apesar de a ora Recorrente, nos termos do disposto no art. 33.º do Decreto-Lei n.º 365/99, ter transferido para uma seguradora a responsabilidade pelo risco de furto que sobre ela recai nos termos do art. 32.º do mesmo diploma legal (Dispõem os arts. 32.º e 33.º do Decreto-Lei n.º 365/99, de 17 de Setembro: «

Artigo 32.º
Obrigação específica de indemnizar
1- Em caso de perda, extravio, furto, roubo ou incêndio das coisas dadas em penhor, fica o prestamista obrigado a indemnizar o mutuário.
2- A indemnização referida no número anterior é a que resultar do valor da avaliação do objecto, deduzida do valor em dívida à data da ocorrência e acrescida de metade do valor da avaliação.
Artigo 33.º
Seguro obrigatório
1- A responsabilidade de indemnizar prevista no artigo anterior é obrigatoriamente transferida para uma companhia seguradora.
2- O valor do seguro a que se refere o número anterior é no mínimo o que resultar da média das avaliações efectuadas no ano anterior.
3- O valor a que se refere o número anterior durante o 1.º ano de actividade é fixado por indicação do prestamista.
4- Anualmente deve ser feita prova da renovação do seguro e do pagamento do respectivo prémio junto da Direcção-Geral do Comércio e da Concorrência.
5- A entidade seguradora comunica à Direcção-Geral do Comércio e da Concorrência a rescisão do contrato de seguro».), a cobertura por ela contratada com a seguradora não assegurou o pagamento da totalidade das indemnizações que teve de suportar pelo furto ocorrido no ano de 2009.
Assim, a ora Recorrente teve de suportar as indemnizações na parte em que o risco não estava coberto pelo contrato de seguro. É essa parte que sustenta dever ser considerada como custo fiscalmente dedutível para efeitos de apuramento lucro tributável.
A AT discorda, porque entende, em síntese, que estamos perante um risco segurável, motivo por que, se a ora Recorrente não diligenciou por contratar um seguro que assegurasse a cobertura total do risco, não pode agora pretender que seja relevado como custo para efeitos fiscais a parte das indemnizações que teve de suportar.
Ou seja, como acima adiantámos, a sorte do recurso joga-se em torno da interpretação que for feita das normas da alínea j) do n.º 1 do art. 23.º do CIRC e da alínea e) do n.º 1 do art. 42.º do mesmo Código.
Enquanto a sentença e a AT entenderam que não há dúvidas de que o risco por furto é um risco segurável, o que exclui a possibilidade de a verba em causa ser relevada para efeitos da determinação do lucro tributável, a Recorrente sustenta que o sentido a conferir à expressão risco segurável é o de que «é segurável o risco quando exista o dever de proceder ao seguro, na medida desse dever, e na possibilidade efectiva de o fazer». Assim, se bem interpretamos as alegações da Recorrente, esta considera que as indemnizações por ela suportadas, na medida em que excedem a cobertura proporcionada pelo contrato de seguro obrigatório, devem ser deduzidas como custo.
Vejamos, pois, qual a melhor interpretação.

2.2.2 DO SENTIDO DA EXPRESSÃO CUJO RISCO SEJA SEGURÁVEL
Na interpretação das normas fiscais e, assim, da expressão em causa, devem seguir-se as regras as regras e princípios gerais de interpretação das normas jurídicas, como decorre do n.º 1 do art. 11.º da Lei Geral Tributária (LGT).
Assim, desde logo, há que ter presente a letra da lei, que, não constituindo o único, nem sequer o mais importante elemento a considerar na tarefa hermenêutica, é o que constitui o seu ponto de partida e «[c]omo tal cabe-lhe desde logo uma função negativa: a de eliminar aqueles sentidos que não tenham qualquer apoio, ou pelo menos uma qualquer “correspondência” ou ressonância nas palavras da lei» (J. BAPTISTA MACHADO, Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, Almedina, 1983, pág. 182. O mesmo Autor, na pág. 189, explicita: «A letra (o enunciado linguístico) é, assim o ponto de partida. Mas não só, pois exerce também a função de um limite, nos termos do art. 9.º, n.º 2: não pode ser considerado como compreendido entre os sentidos possíveis da lei aquele pensamento legislativo (espírito, sentido) “que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso”. Pode ter de proceder-se a uma interpretação extensiva ou restritiva, ou até porventura a uma interpretação correctiva, se a fórmula verbal foi sumamente infeliz, a ponto de ter falhado completamente o alvo. Mas, ainda neste último caso, será necessário que do texto “falhado” se colha pelo menos indirectamente uma alusão àquele sentido que o intérprete venha a acolher como resultado da interpretação».), como resulta do disposto no n.º 2 do art. 9.º do Código Civil (CC).
Ora, com todo o respeito, a letra da lei não consente a interpretação defendida pela Recorrente. Nem na formulação pela positiva do art. 23.º, n.º 1, alínea j), do IRC – são custos as «[i]ndemnizações resultantes de eventos cujo risco não seja segurável» – nem na formulação pela negativa do art. 42.º, n.º 1, alínea e), do mesmo Código – não são dedutíveis «[a]s indemnizações pela verificação de eventos cujo risco seja segurável» – não há elemento literal algum que permita concluir que o legislador pretendeu limitar o montante da indemnização por risco segurável excluído da dedução ao montante mínimo do seguro obrigatório.
A única referência efectuada pelo legislador é ao facto de o risco ser ou não segurável, sem qualquer outra menção ou referência que possa ser convocada em abono da tese da Recorrente como o mínimo de correspondência verbal requerido pelo n.º 2 do art. 9.º do CC.
Se a intenção do legislador fosse a que fossem dedutíveis, não só as indemnizações suportadas pelo sujeito passivo relativamente a danos cujo risco não é segurável, mas também as indemnizações por danos cujo risco é segurável, na parte em que a excedem o montante assegurado pelo contrato de seguro obrigatório, por certo teria encontrado um modo de expressar essa intenção na letra da lei.
Nem se diga, como o faz a Recorrente, que essa distinção – entre risco segurável e risco não segurável –, se entendida como mera susceptibilidade de o risco ser alvo de contrato de seguro, não tem conteúdo, com o argumento de que existe a possibilidade de todos os riscos serem objecto de contrato de seguro.
Não é assim. Desde logo, porque há riscos normalmente não seguráveis, v.g., no que se refere aos seguros de responsabilidade civil, os danos resultantes de actos de terrorismo, guerra, guerra civil, invasão, hostilidades, insurreição ou distúrbios laborais (greves, tumultos, etc.). Mas também porque há casos, alguns dos quais foram tratados pela jurisprudência dos tribunais superiores (Vide, a título de exemplo os seguintes acórdãos:
- do Tribunal Central Administrativo,
- de 9 de Dezembro de 1998, proferido no processo n.º 400/97, disponível em
http://www.dgsi.pt/jtca.nsf/170589492546a7fb802575c3004c6d7d/83c2771ae4fe578180256a48004b95c1;
- de 2 de Julho de 2002, proferido no processo n.º 6540/02, disponível em
http://www.dgsi.pt/jtca.nsf/170589492546a7fb802575c3004c6d7d/ed6a36fc8a26355180256bf20051188f;), em que as companhias de seguros não se mostram disponíveis para cobrir determinados riscos.
Mas não é só o elemento literal que não dá apoio à interpretação sustentada pela Recorrente. Também a teleologia da norma (Temos presente que «a interpretação da norma não deve cingir-se à letra, mas reconstituir a partir dela o “pensamento legislativo”», utilizando ainda como elementos para o efeito, a “unidade do sistema jurídico”, “as circunstâncias em que a lei foi elaborada” e as “condições específicas do tempo em que é aplicada” (cfr. J. BAPTISTA MACHADO, ob. cit., págs. 188 e segs.)) não fornece subsídio algum ao sentido proposto pela Recorrente.
Como bem referiu o Procurador-Geral Adjunto no seu parecer, à previsão da norma do art. 42.º, n.º 1, alínea e), do IRC acolhem-se não só os seguros obrigatórios como «também aqueles que, numa óptica normal de gestão diligente, e tendo em conta a natureza da actividade, a empresa deveria providenciar, por forma a acautelar o risco normal da sua actividade» (JOÃO RICARDO CATARINO e VASCO BRANCO GUIMARÃES, Lições de Fiscalidade, 2012, pág. 257. ).
A razão de ser de o legislador ter optado pela exclusão da dedutibilidade dos encargos com as indemnizações quando o risco seja segurável é também «a de zelar pelo interesse de terceiros, os eventuais lesados, cujo ressarcimento ficará melhor garantido existindo seguro» (RUI DUARTE MORAIS, Apontamentos ao Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas, Almedina, 2007, pág. 94.). A teleologia da norma resulta facilmente perceptível em face de uma actividade como a prosseguida pela ora Recorrente: o legislador visa assegurar que o mutuário, ainda que fique privado do bem que deu em penhor e que, nos termos contratuais, lhe deveria ser restituído, não ficará sem a indemnização que lhe seja devida pelos danos sofridos.
Ou seja, o desígnio prosseguido pela norma não depende da indemnização respeitar ou não os limites do seguro obrigatório, quando exista a obrigação de segurar. Poderia, é certo, a opção do legislador ter ido nesse sentido, permitindo ao sujeito passivo deduzir os encargos com as indemnizações suportadas na parte em que excedessem a cobertura proporcionada pelo seguro obrigatório. Admitimos até que essa opção pudesse melhor concretizar o princípio da tributação do rendimento real imposto pelo n.º 2 do art. 104.º da Constituição da República Portuguesa, mas não asseguraria com a mesma eficácia a protecção dos terceiros eventualmente lesados pela actividade do sujeito passivo.
Seja como for, não foi essa a opção do legislador, que, a nosso ver, se move no âmbito da sua liberdade conformadora, cuja sindicância apenas poderia ser efectuada por este Supremo Tribunal por violação do princípio da proporcionalidade, caso se verificasse um “erro manifesto”, em violação dos princípios e regras jurídicas que, num estado de Direito, sustentam as relações entre o estado e os cidadãos. Na verdade, o princípio da proibição do excesso aplica-se a todos e quaisquer actos dos poderes públicos, vinculando o legislador, a administração e a jurisdição, sendo certo que a margem de actuação do legislador é de controlo mais restrito: os tribunais limitam-se, então, a examinar se a regulação legislativa é manifestamente inadequada. Isto porque se reconhece ao poder legislativo uma “prerrogativa de avaliação” da relação meio/fim da medida, pelo que apenas caberá ao tribunal ajuizar da ocorrência ou não ocorrência de um “erro manifesto” nessa mesma avaliação.
Ora, afigura-se-nos que no caso não há que ponderar a violação do princípio da proporcionalidade por parte do legislador: a opção legislativa de não permitir a dedução dos encargos suportados pelo sujeito passivo com as indemnizações quando respeitem a risco segurável, podendo não ser a que melhor assegura a tributação pelo rendimento real – sobretudo na parte em que as indemnizações excedam o montante assegurado pelo seguro obrigatório –, não se nos afigura constituir “erro manifesto” na “prerrogativa de avaliação” do legislador. Bem pelo contrário, afigura-se-nos uma opção legítima do legislador, qual seja a de proteger os terceiros, mediante a consagração de estímulos para que o sujeito passivo acautele o risco normal da sua actividade – intenção que só resulta plenamente realizada se o sujeito passivo transferir totalmente a sua responsabilidade para uma seguradora, e não apenas a que resulta do seguro obrigatório –, com a possibilidade de deduzir integralmente as despesas com o pagamento dos prémios de seguro, ao invés de confiar na álea em ordem à obtenção de lucro mais elevado.
Nem se diga que da opção legislativa resulta uma qualquer sanção para o sujeito passivo: este poderá facilmente conformar a sua actuação de modo a que o seguro cubra a todo o tempo o risco de furto dos bens móveis que lhe são dados em penhor como garantia dos mútuos. Para tanto, basta-lhe ou contratar um seguro que cubra a totalidade do risco, ainda que, para isso, tenha de exceder os limites do seguro obrigatório, ou manter a sua actividade dentro dos limites da cobertura conferida pelo seguro obrigatório.
Assim, também o elemento racional ou teleológico não pode, a nosso ver, ser convocado a favor da tese da Recorrente.
Por tudo o que deixámos dito, a sentença não merece censura.

2.2.3 CONCLUSÕES

Preparando a decisão, formulamos as seguintes conclusões:

I - Nos termos do disposto no art. 23.º, n.º 1, alínea j), do CIRC, na redacção em vigor em 2009, eram consideradas custos ou perdas para efeitos de determinação do lucro tributável as indemnizações suportadas pelo sujeito passivo «resultantes de eventos cujo risco não seja segurável» e nos termos do art. 45.º, n.º 1, alínea e), do mesmo Código, não eram dedutíveis as «indemnizações pela verificação de eventos cujo risco seja segurável».

II - Atentas as regras da hermenêutica jurídica (cfr. art. 9.º do CC), não pode extrair-se das referidas normas o sentido de que as indemnizações serão custos fiscalmente relevantes na parte em que excedam os limites do seguro obrigatório, pois nem a letra da lei (que constitui o ponto de partida e o limite da actividade interpretativa) consente essa interpretação nem dos demais elementos interpretativos resulta ser essa a intenção do legislador.

III - O legislador terá pretendido, numa opção legítima, proteger os terceiros, mediante a consagração de estímulos para que o sujeito passivo acautele o risco normal da sua actividade – intenção que só resulta plenamente realizada se o sujeito passivo transferir totalmente a sua responsabilidade para uma seguradora, e não apenas a que resulta do seguro obrigatório –, com a possibilidade de deduzir integralmente as despesas com o pagamento dos prémios de seguro, ao invés de confiar na álea em ordem à obtenção de lucro mais elevado.


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3. DECISÃO

Em face do exposto, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo acordam, em conferência, em negar provimento ao recurso.

Custas pela Recorrente (cfr. art. 527.º do CPC).


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Lisboa, 29 de Maio de 2019. – Francisco Rothes (relator) – Isabel Marques da Silva – Ana Paula Lobo.