Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0353/16
Data do Acordão:10/12/2016
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ANA PAULA LOBO
Descritores:CADUCIDADE DO DIREITO DE LIQUIDAÇÃO
REVISÃO
SUSPENSÃO DA CADUCIDADE
Sumário:I - A razão de ser da suspensão do prazo de caducidade enquanto decorre uma acção inspectiva é ser ela necessária para a Administração Tributária recolher elementos para liquidar um tributo. II - Uma acção inspectiva de que não decorreu qualquer acto de liquidação não tem qualquer efeito suspensivo do prazo de caducidade.
III - A notificação prévia para o procedimento de inspecção não inicia o prazo de suspensão do prazo de caducidade, constante do art.º 46.º, n.º 1 da Lei Geral Tributária, cujo termo inicial é o início da acção inspectiva.
IV - O pedido de revisão é também causa suspensiva do prazo de caducidade, tal como definido no art.º 46.º, n.º 2, e) da Lei Geral Tributária na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 64-B/2011, de 30 de Dezembro.
Nº Convencional:JSTA00069840
Nº do Documento:SA2201610120353
Data de Entrada:03/18/2016
Recorrente:A.................,LDA
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TAF BRAGA
Decisão:NEGA PROVIMENTO
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - EXEC FISCAL.
Legislação Nacional:LGT98 ART46 N1 N2 E ART45 N1.
L 64-B/2011 DE 2011/12/30.
CCIV66 ART12 ART297 N2.
RCPIT98 ART51 ART49.
Aditamento:
Texto Integral: Recurso Jurisdicional
Decisão recorrida – Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga
. 28 de outubro de 2015.



Julgou improcedente o fundamento de oposição invocado pela Oponente, enquadrável no art. 204º nº 1 al. e) do CPPT, tendo a mesma sido devidamente notificada das liquidações adicionais de IVA referentes ao ano de 2008, dentro do decurso do prazo de caducidade.



Acordam nesta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

A………………L.dª, no processo de oposição n.º 533/14.1BEBRG apresentada contra à execução fiscal n.º 1775201301055968 instaurada para pagamento das liquidações adicionais de IVA e respetivos juros compensatórios, veio interpôr o presente recurso da sentença supra mencionada, tendo, para esse efeito formulado, a final da sua alegação, as seguintes conclusões:

1. O presente recurso vem interposto da sentença de 28 de novembro de 2015, que julgou improcedente a Oposição deduzida pela ora Recorrente à execução fiscal n.º 1775201301055968 instaurada para pagamento de IVA de janeiro a outubro de 2008, com fundamento na falta de notificação da liquidação objeto da referida execução fiscal à Recorrente no prazo de caducidade, enquadrável nos termos do disposto no artigo 204º, n.º 1, al. e), do CPPT;

2. A sentença recorrida padece de erro de interpretação do artigo 46º, n.º 1, da LGT e de erro na aplicação do artigo 46º, n.º 2, al. e), da LGT, nos seguintes aspetos:
(i) considera suspenso o prazo de caducidade de liquidação de tributo com a notificação prévia para procedimento de inspeção prevista no artigo 49º do RCPITA, apesar de a Recorrente não ter sido notificada de ordem de serviço da inspeção nem de despacho, nos termos previstos no artigo 51º do RCPITA;
(ii) não considera o período de duração superior a 6 meses de uma inspeção prévia com o mesmo âmbito, para efeitos de derrogar o efeito suspensivo proclamado;
(iii) aplica a norma contida no artigo 46º, n.º 2, al. e), da LGT que prevê o pedido de revisão da matéria coletável como causa de suspensão do prazo de caducidade, não obstante tal norma só ter surgido em data posterior à data em que se iniciou o prazo de caducidade considerado suspenso;

3. O direito de liquidar o tributo em causa – IVA de 2008 – caduca no prazo de 4 anos a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário, nos termos do disposto no artigo 45º da LGT, ou seja, a 1 de Janeiro de 2013, sem prejuízo das eventuais interrupções e suspensões;

4. De acordo com o disposto no artigo 46º, n.º 1, da LGT, o prazo de caducidade suspende-se “com a notificação ao contribuinte, nos termos legais, da ordem de serviço ou despacho no início da acção de inspecção externa”, sendo que in casu a Recorrente nunca foi notificada da ordem de serviço da inspeção ou despacho no início da inspeção realizada em 2012, ao arrepio do previsto no artigo 51º do RCPITA;

5. Ao invés, os únicos atos de que a Recorrente foi notificada no âmbito dessa inspeção foram a comunicação prévia para procedimento de inspeção prevista no artigo 49º do RCPITA e a nota de diligência para a conclusão do procedimento de inspeção ao abrigo do artigo 61º do RCPITA, que não consubstanciam ordem de serviço nem despacho subsumíveis na norma contida no artigo 46º, n.º 1, da LGT;

6. Conclui-se, assim, que o prazo de caducidade iniciado em 1 de janeiro de 2009 não pode considerar-se suspenso a propósito da inspeção realizada em 2012, nos termos do disposto no artigo 46º, n.º 1, da LGT;

7. Acresce que, mesmo que a Recorrente tivesse sido notificada da ordem de serviço ou despacho referente a tal inspeção tivesse suspendido o prazo de caducidade, o que só por mero dever de patrocínio se equaciona, certo é que a suspensão do prazo de caducidade não poderia prevalecer, na medida em que a Recorrente já tinha sido alvo de ação inspetiva com o mesmo âmbito em 2010 e 2011 que durou mais de 6 meses, pelo que o efeito suspensivo teria sido anulado;

8. Com efeito, nos termos do disposto no artigo 46º, n.º 1, da LGT, o prazo de caducidade suspende-se com a notificação ao contribuinte da ordem de serviço da ação inspetiva ou de despacho, cessando tal suspensão caso a mesma ultrapasse o prazo de 6 meses, contando-se o prazo do seu início como se nunca se tivesse suspendido;

9. A ratio das normas tributárias que preveem a caducidade no Direito Tributário prende-se com razões objetivas de segurança jurídica, tendo o propósito último de gerar a definição da situação do obrigado tributário num prazo razoável, cujo decurso conduz à preclusão do direito do Estado de promover a liquidação dos impostos que lhe sejam eventualmente devidos;

10. Esta mesma ratio está contida no artigo 46º, n.º 1, parte final, da LGT, que determina que a duração por tempo considerado excessivo de ação inspetiva tendente à avaliação da necessidade de liquidar algum tributo tem como efeito a cessação do efeito suspensivo atribuído à realização dessa ação inspetiva, ou seja, o contribuinte tem o direito à certeza jurídica de que não ficará sujeito à eventual liquidação de tributos ad eternum, na circunstância de impender sobre ele uma ação inspetiva;

11. Esta mesma ratio justifica que a caducidade se tenha por verificada, mesmo que o prazo de realização da inspeção seja prorrogado nos termos legais (vg nos casos previstos no artigo 36º do RCPIT), como é pacificamente aceite pela jurisprudência (ex. douto Acórdão do TCA Sul, de 12 de maio de 2009 (Proc. n.º 02961/09), pois, se assim não fosse, sairia frustrada a intenção confessa do legislador de salvaguardar o contribuinte de ações inspetivas desnecessárias, longas e geradoras de incerteza quanto à sua situação tributária por incúria dos serviços da Autoridade Tributária (neste sentido veja-se os artigos 63º, n.º 4, da LGT e 36º do RCPIT, bem como a jurisprudência, de que destacamos o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 7 de maio de 2008, prolatado no âmbito do Proc. n.º 0102/08);

12. Se isto é inequívoco relativamente à prorrogação formal do prazo inicialmente estipulado para a realização da ação inspetiva, será naturalmente aplicável à situação de sucessão de ações inspetivas realizadas com o mesmo âmbito de objeto e abarcando o mesmo período temporal, ainda que realizadas a coberto de ordens de inspeção diferentes, como é o caso tratado nos presentes autos, pelo que o período em que decorreram as duas ações inspetivas (que durou 216 dias) deve ser contado como um único, sob pena de se subverter a ratio legis da norma que condiciona o limite do período de suspensão do prazo de caducidade por força da realização de uma ação inspetiva;

13. Se não fosse assim, estava descoberta a fórmula mágica para a Autoridade Tributária atropelar a garantia dos contribuintes inerente à limitação da suspensão do prazo de caducidade em caso de demora excessiva do procedimento inspetivo, pois poderia simplesmente encerrar ações inspetivas e retomá-las dois dias depois, para que nunca fosse ultrapassado ininterruptamente o prazo de 6 meses findo o qual o período de suspensão se torna inócuo para efeito de suspensão do prazo de caducidade do direito de liquidação de tributos;

14. Assim sendo, tendo a Recorrente sido objeto de ação inspetiva por período superior a 6 meses, nunca operaria qualquer suspensão do prazo de caducidade ao abrigo do n.º 1 do artigo 46º da LGT, tendo o direito à liquidação do imposto em causa caducado em 1 de janeiro de 2013;

15. Para além disso, mesmo que o prazo de caducidade se tivesse suspendido por período igual ao da duração da inspeção ocorrida em 2012 - 27 dias -, o que só se equaciona por mero dever de patrocínio, o pedido de revisão da matéria coletável apresentado pela Recorrente em 16 de janeiro de 2013 não é causa de suspensão do mesmo, apesar de prevista no artigo 46º, n.º 2, al. e), da LGT, uma vez que esta norma foi introduzida pela Lei n.º 64-B/2011, de 30 de dezembro, que só entrou em vigor em 1 de janeiro de 2012, uma vez que a lei substantiva tributária só dispõe para o futuro, nos termos do disposto no artigo 12º da LGT e do princípio da irretroatividade da lei fiscal, constitucionalmente consagrado no n.º 3 do art.º 103.º da CRP (neste sentido, Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, de 4 de outubro de 2007, Proc. n.º 00108/03.TFPRT.11);

16. Inexistindo qualquer outro motivo de suspensão do prazo de caducidade iniciado em 1 de janeiro de 2009, deve o mesmo ter-se por verificado no passado dia 1 de janeiro de 2013, tendo caducado o direito da Autoridade Tributária de liquidar IVA relativo ao período compreendido entre janeiro e outubro de 2008, pelo que, tendo a mesma sido notificada das liquidações em causa ulteriormente, não são as mesmas exigíveis em sede de execução fiscal, por serem ineficazes perante o seu destinatário, nos termos do disposto no artigo 36º, n.º 1, do CPPT.

Requereu que seja concedido provimento ao recurso, revogando-se a sentença que julgou improcedente a Oposição.

Não foram apresentadas contra-alegações.

O Magistrado do Ministério Público emitiu parecer no sentido da confirmação da sentença recorrida.

A Sentença recorrida considerou provados os seguintes factos:
1. Em 21.09.2013, foi instaurado pelo Serviço de Finanças de Felgueiras o processo de execução fiscal nº 1775201301055968, contra a Oponente, para cobrança coerciva de IVA respeitante aos períodos compreendidos entre 01/2008 a 10/2010, no montante global de € 475.508,52. (conforme PEF apenso)

2. A Oponente foi inspecionada pelos serviços de inspeção da Autoridade Tributária entre 17.11.2010 e 24.05.2011, por ordem de serviço nº OI201002943, circunscrita aos exercícios de 2007 e 2008. (cfr. doc. nº 2 junto aos autos com a petição inicial)

3. Por ofício nº 36378/0504, datado de 14.06.2011, foi a Oponente notificada do resultado da ação de inspeção, da qual consta:

“ Para conhecimento, fica (m) por este meio notificado (s), nos termos do artigo 62º do RCPIT, que da ação de inspeção levada a cabo por este Serviço, ao abrigo da Ordem de Serviço acima referida, não resultam quaisquer atos tributários ou em matéria tributária que lhe sejam desfavoráveis.” (cfr. doc. nº 3 junto aos autos com a petição inicial)

4. Em 28.06.2012, foi emitida informação com pedido para a realização de novo procedimento inspetivo à Oponente, cujo conteúdo se transcreve na parte que releva:“
(…)
4. Na decorrência de diligências inspetivas levadas a efeito pela Direção de Finanças de Braga, junto do sujeito passivo B…………, Lda., com o NIF:…………, foram identificadas operações que evidenciam ter existido, durante os anos de 2008, 2009 e 2010, por parte da Sociedade A……………, LDA, transmissões de bens para aquela Sociedade, embora intermediadas por outra Sociedade.
5. Estas operações não constam de qualquer fatura ou documento equivalente emitido por aquela Sociedade e ascendem aos montantes de, € 747.867,67, € 621.755,92 e € 812.844,10, respetivamente.
6. É pois, com fundamento nestes novos elementos levados ao conhecimento da Direção de Finanças do Porto, em Novembro de 2011, pela respetiva Direção de Finanças de Braga (através do oficio nº 5089996, de 23.09.2011, que é agora solicitado um outro procedimento externo de inspeção àquele sujeito passivo.
7. A situação fatual sintetizada na presente informação enquadra-se, assim, na previsão normativa contida na primeira parte do nº 4 do artigo 64º da LGT, pelo que mostram-se reunidos os pressupostos legais para Superiormente poder ser autorizado um novo procedimento externo de inspeção ao sujeito passivo em causa.

CONCLUSÃO

Nestes termos, afigura-se-nos ser de autorizar, com referência ao ano de 2008, a realização de um novo procedimento externo de âmbito geral ao sujeito passivo A…………., Lda, nos termos propostos pela competente Direção de Finanças.”(cfr. doc. de fls. 199 a 201, junto aos autos)

5. Do despacho emitido em 03.07.2012, pelo Sr. Diretor Geral, na sequência da informação referida em 4., consta “ Autorizo”. ( cfr. doc de fls. 199 junto aos autos)

6. A Oponente foi inspecionada entre 09.02.2012 e 18.10.2012, por ordem de serviço nº OI201105328, aos anos 2009 e 2010, prorrogado por mais dois períodos de três meses. (cfr. docs. nº 5 e 6 juntos com a petição inicial)

7. Por ordem de serviço nº OI201204984, data de 14.09.2012, foi determinada a inspeção externa à Oponente, relativa ao ano de 2008. (cfr. doc. de fls. 198 junto aos autos)

8. O procedimento inspetivo referido em 7., iniciou em 21.09.2012 tendo concluído a 18.10.2012. (cfr. docs. nº 4 e 6 juntos aos autos com a petição inicial)

9. Por ofício nº 58368/0509, foi remetido à Oponente o documento que se identifica como

“Assunto: Carta – Aviso”, recebido em 19.09.2012, do qual consta o conteúdo que se transcreve em parte:“ Nos termos da alínea l) do nº 3 do artigo 59º da Lei Geral Tributária (LGT) e do artigo 49º do Regime Complementar do Procedimento de Inspeção Tributária (RCPIT) fica (m) notificado (s) de que a muito curto prazo se deslocará (ão) à morada acima referenciada, técnico(s) dos Serviços de Inspeção Tributária. A visita do (s) técnico (s) tem como finalidade a verificação do cumprimento das correspondentes obrigações tributárias e terá o âmbito e extensão a seguir indicadas: (…)” (cf. doc nº 7 junto com a petição inicial)

10. Em 29.11.2012, foi exarado o Relatório de Inspeção, notificado à Oponente em 18.12.2012, do qual se transcrevem as partes que relevam: (….) (cfr. doc. nº 6 junto com a petição inicial)

11. Em 16.01.2013 a Oponente apresentou, junto da Direção de Finanças do Porto, pedido de revisão da matéria tributável. ( cfr. doc. nº 8 junto com a petição inicial)

12. Em 23.05.2012, foi a Oponente notificada da decisão de indeferimento do pedido de revisão da matéria coletável. (cfr. doc. e fls. 1011 a 1013 do processo administrativo apenso)

13. Em 28.06.2013, a Oponente foi notificada das liquidações adicionais de IVA e juros compensatórios, com as referências que seguem:
- nº doc. de cobrança 102013302026308, IVA relativo ao período de 01/2008, no valor de € 8.742,23;- nº doc. de cobrança 102413302026409, juros compensatórios relativos ao período 01/2008, no valor de €1.652,64;
- nº doc. de cobrança 102213302026508, IVA relativo ao período de 02/2008, no valor de € 28.233,74;- nº doc. de cobrança 102713302026609, juros compensatórios relativos ao período 02/2008, no valor de € 5.241,42;
- nº doc. de cobrança 102513302026708, IVA relativo ao período 03/2008, no valor de €18.279,87;
- nº doc. de cobrança 1020133020268009, juros compensatórios relativos ao período 03/2008, no valor de € 3.329,44;
- nº doc. de cobrança 102813302026908, IVA relativo ao período 04/2008, no valor de € 11.068,28;
- nº doc. de cobrança 102413302027009, juros compensatórios relativos ao período 04/2008, no valor de € 1.979,02;
- nº doc. de cobrança 102213302027108, IVA relativo ao período 05/2008, no valor de € 17.358,34;
- nº doc. de cobrança 102713302027209, juros compensatórios relativos ao período 05/2008, no valor de € 3.049,36;
- nº doc. de cobrança 102513302027308, IVA relativo ao período 06/2008, no valor de € 11.320,66;
- nº doc. de cobrança 102013302027409, juros compensatórios relativos ao período 06/2008, no valor de € 1.949.01;
- nº doc. de cobrança 102813302027508, IVA relativo ao período 07/2008, no valor de € 8.939,52;
- nº doc. de cobrança 102213302027609, juros compensatórios relativos ao período 07/2008, no valor de € 1.509,68;
- nº doc. de cobrança 102013302027708, IVA relativo ao período 08/2008, no valor de € 6.648,34;
- nº doc. de cobrança 102513302027809, juros compensatórios relativos ao período 08/2008, no valor de € 1.100,89;
- nº doc. de cobrança 102313302027908, IVA relativo ao período 09/2008, no valor de € 9.452,16;
- nº doc. de cobrança 102013302028009, juros compensatórios relativos ao período 09/2008, no valor de € 1.533.06;
- nº doc. de cobrança 102813302028108, IVA relativo ao período 10/2008, no valor de € 7.183,74;
- nº doc. de cobrança 102213302028209, juros compensatórios relativos ao período 10/2008, no valor de € 1.141,53. (cfr. doc. nº 1 junto com a petição inicial)

14. A presente Oposição deu entrada no Serviço de Finanças de Felgueiras-1 em 18.11.2013. (cfr. doc. de fls. 5)

Questões objecto de recurso:
1. Suspensão do prazo de caducidade do direito de liquidar imposto com o procedimento inspectivo.


1. Suspensão do prazo de caducidade do direito de liquidar imposto com o procedimento inspectivo

A primeira questão suscitada pela recorrente prende-se com a falta de notificação da ordem de serviço da inspeção ou do despacho, nos termos previstos no artigo 51º do Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária. Considera que a suspensão do prazo de caducidade do direito à liquidação só ocorre com tal notificação que diz não ter tido lugar.
A sentença recorrida quer na matéria de facto provada quer na sua fundamentação apenas indica que ocorreu a notificação prévia para o procedimento de inspecção a que se refere o art.º 49.º do Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária, acrescentando a data de início do procedimento de inspecção com uma fundamentação genérica para o teor dos documentos juntos aos autos.
Tal questão não é um mero detalhe pois é aquela primeira notificação que releva para efeitos de suspensão do prazo de caducidade, como indica o art.º 46.º, n.º 1 da Lei Geral Tributária, não podendo ser suprida a sua falta pela mera constatação de que a referida acção inspectiva teve lugar.
Porém, como se verifica de fls. 198 dos autos e de forma muito deficiente foi levado ao probatório no ponto 7, a recorrente foi notificada, na pessoa do TOC, da ordem de serviço no início da acção inspectiva, em 2012.09.21.
Tendo a recorrente sido alvo de uma acção inspectiva de que não decorreu qualquer acto de liquidação a circunstância de ela ter decorrido por um período superior a seis meses é irrelevante dado que não teve qualquer efeito suspensivo do prazo de caducidade, tendo ele continuado a decorrer. A razão de ser da suspensão do prazo de caducidade enquanto decorre uma acção inspectiva é ser ela necessária para a Administração Tributária recolher elementos para liquidar um tributo. Se não foi necessário fazer qualquer investigação a Administração Tributária sempre teve a possibilidade de liquidar o tributo devido, não fazendo qualquer sentido suspender o prazo de caducidade.
Porém, neste caso, depois de findar a acção inspectiva a Administração Tributária recolheu junto de terceiros elementos que considerou indiciadores de que o imposto liquidado não reflectia a vida negocial da empresa e, por isso, realizou outro procedimento de inspecção. Durante ele, estava impedida de corrigir a liquidação inicial de imposto por falta de elementos bastantes para o efeito, daí a suspensão do prazo de caducidade constante do art.º 46.º, n.º 1 da Lei Geral Tributária.
A acção inspectiva que esteve na génese das liquidações exequendas teve a duração de 88 dias.
Haverá ainda que considerar um outro efeito suspensivo do prazo de caducidade desencadeado pela apresentação de um pedido de revisão, tal como definido no art.º 46.º, n.º 2, e) da Lei Geral Tributária. Contrariamente ao defendido pela recorrente não se verifica aqui qualquer aplicação retroactiva da lei fiscal. A referida alínea e) «Com a apresentação do pedido de revisão da matéria colectável, até à notificação da respectiva decisão», foi aditada pela Lei n.º 64-B/2011, de 30 de Dezembro.
Assim, quando a recorrente apresentou o seu pedido de revisão em 2013.01.16 estava há muito vigente tal dispositivo legal.
Como decorre do disposto no art.º 12.º do Código Civil, aqui aplicável por força do disposto no art.º 2.º do Código de Processo e Procedimento Tributário, a lei só dispõe para o futuro. Quando uma lei estabelece um prazo mais longo, como acontece quando se introduziu um novo facto suspensivo do prazo de caducidade, o novo prazo tem aplicação aos prazos em curso ainda que contabilizando o tempo já decorrido, nos termos do art.º 297.º, n.º 2 do Código Civil. Neste caso o decurso do prazo de caducidade extingue o direito à liquidação do tributo mas esse efeito extintivo só se completa quando o prazo se completa. Enquanto se mostra em curso o prazo de caducidade a situação jurídica ainda não se encontrava extinta podendo ser alterados por vontade legislativa os requisitos da extinção dessa situação jurídica.
Adicionando os dois períodos de suspensão verifica-se, tal como concluiu a sentença recorrida, que quando ao oponente foi notificada do acto de liquidação que esteve na génese do montante exequendo, em 28.06.2013, ainda se não havia completado o prazo de caducidade do direito à liquidação de 4 anos, art.º 45º nº 1 da Lei Geral Tributária, pois o prazo de caducidade que se iniciou em 1 de Janeiro de 2009 cessaria em 1 de Janeiro de 2013, caso não tivessem existido a suspensão de 217 dias que fizeram avançar o prazo de caducidade até aos primeiros dias de Agosto de 2013.
Não enferma, pois, a sentença recorrida dos vícios que lhe vinham imputados, impondo-se a sua confirmação.


Deliberação

Termos em que acordam os Juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.

Custas pela recorrente.
(Processado e revisto pela relatora
com recurso a meios informáticos (art.º 131º nº 5 do Código de Processo Civil, ex vi artº 2º Código de Procedimento e Processo Tributário).

Lisboa, 12 de Outubro de 2016. – Ana Paula Lobo (relatora) – Casimiro Gonçalves – Ascensão Lopes.