Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0171/16
Data do Acordão:12/06/2017
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:FRANCISCO ROTHES
Descritores:CADUCIDADE DO DIREITO À LIQUIDAÇÃO
PORTARIA
TAXA DE GESTÃO DE RESÍDUOS
Sumário:I - Ainda que as partes se encontrem de acordo quanto ao prazo de caducidade a aplicar à situação sub judice, o tribunal não fica vinculado por esse acordo e, por isso, dispensado de indagar qual o regime legal aplicável, pois o tribunal não está vinculado pela alegação das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito (cfr. art. 5.º, n.º 3, do CPC).
II - O prazo fixado pelo art. 3.º da Portaria n.º 72/2010, de 4 de Fevereiro, não é um prazo de caducidade do direito à liquidação, mas tão-só um prazo meramente ordenador ou disciplinar.
III - A liquidação da TGR, na ausência de regra especial, fica sujeita aos prazos de caducidade fixados pelo art. 45.º da LGT.
Nº Convencional:JSTA00070440
Nº do Documento:SA2201712060171
Data de Entrada:02/18/2016
Recorrente:A......., S.A.
Recorrido 1:AGÊNCIA PORTUGUESA DO AMBIENTE, I.P.
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TAF LOULÉ
Decisão:NEGA PROVIMENTO
Área Temática 1:DIR FISC - TAXA.
Legislação Nacional:PORT 72/2010 ART3.
CPC ART607 ART5.
LGT ART45 ART46 ART8.
CIRS ART77 ART92.
CIMI ART113 ART116.
CONST ART103 N2 ART165 N1.
DL 178/2006 ART58 N6.
PORT 278/2015 ART6.
L 82-D/2014 ART16.
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC0428/14 DE 2015/09/09.; AC STA PROC0955/09 DE 2009/12/16.; AC STA PROC01842/13 DE 2014/06/18.; AC STA PROC0442/15 DE 2016/05/11.
Referência a Doutrina:ANTUNES VARELA, J MIGUEL BEZERRA E SAMPAIO E NORA - MANUAL PROCESSO CIVIL 2ED PAG659.
CARDOSO DA COSTA - SOBRE O PRINCIPIO DA LEGALIDADE DAS TAXAS E DEMAIS CONTRIBUIÇÕES FINANCEIRAS - ESTUDOS DE HOMENAGEM AO PROF. DOUTOR MARCELLO CAETANO NO CENTENÁRIO DO SEU NASCIMENTO VOLI PAG789-807.
GOMES CANOTILHO E VITAL MOREIRA - CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA ANOTADA 2007 VOLI PAG1095.
CASALTA NABAIS - DIREITO FISCAL 5ED PAG159 PAG359.
Aditamento:
Texto Integral: Recurso jurisdicional da sentença proferida no processo de impugnação judicial com o n.º 2077/14.82BESNT

1. RELATÓRIO

1.1 A sociedade denominada “A…………., S.A.” (adiante Recorrente) recorre para o Supremo Tribunal Administrativo da sentença, na parte que lhe foi desfavorável, por que o Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé, julgando parcialmente procedente a impugnação judicial deduzida, após indeferimento de prévia reclamação graciosa, i) anulou a decisão proferida na reclamação graciosa, ii) anulou, com fundamento em caducidade do direito à liquidação, a liquidação da taxa de gestão de resíduos (TGR) referente ao ano de 2010 na parte «que fixou a colecta adicional de € 93.033,18, notificado através da informação constante do DUC» e iii) manteve o «acto de liquidação da Taxa de Gestão de Resíduos relativo ao ano de 2010 que determinou a colecta de € 693.354,56, notificado através do fax 081/11/DPEA-DEA», na medida em que considerou que o cálculo preliminar da TGR foi notificado antes do dia 15 de Maio de 2011 (data que considerou ser a do termo do prazo do direito à liquidação) e, nessa parte e por força da sua não contestação em sede de audiência prévia, se convolou em acto de liquidação definitiva da TGR referente ao ano de 2010.

1.2 O recurso foi admitido, para subir imediatamente, nos próprios autos, com efeito meramente devolutivo e a Recorrente apresentou alegações, com conclusões do seguinte teor (Porque usamos o itálico nas transcrições, os excertos que estavam em itálico no original surgirão, aqui como adiante, em tipo normal.):

«A. Em 19 de Dezembro de 2011, a RECORRENTE deduziu impugnação judicial contra o despacho da Senhora Subdirectora-geral da Agência Portuguesa do Ambiente, datado de 29 de Novembro de 2011, que indeferiu a reclamação graciosa oportunamente apresentada contra o acto de liquidação definitiva da taxa de gestão de resíduos (TGR) referente ao ano de 2010, no valor global de € 787.387,74 (setecentos e oitenta e sete mil trezentos e oitenta e sete euros e setenta e quatro cêntimos).

B. No âmbito da referida acção impugnatória, a RECORRENTE peticionou, a título principal, a anulação total do identificado acto de liquidação definitiva da TGR referente ao ano de 2010, em virtude de o mesmo lhe ter sido notificado depois do termo do prazo de caducidade previsto no artigo 3.º da Portaria n.º 72/2010, de 4 de Fevereiro (norma que estipula que «a APA procede à liquidação definitiva da taxa de gestão de resíduos e notificação dos sujeitos passivos, por via electrónica, até ao dia 15 de Maio do ano seguinte»).

C. Neste domínio, o Tribunal a quo confirmou que o acto de liquidação definitiva da TGR referente ao exercício de 2010 se encontrava efectivamente sujeito ao prazo de caducidade prescrito pelo artigo 3.º da Portaria n.º 72/2010, de 4 de Fevereiro, dependendo a sua validade intrínseca da realização da respectiva notificação à RECORRENTE até ao dia 15 de Maio de 2011.

D. No entanto, alicerçando-se na conclusão segundo a qual o acto de liquidação definitiva da TGR referente ao exercício de 2010 se encontrava sujeito ao referido prazo de caducidade, o Tribunal a quo dissecou o procedimento de liquidação seguido pela AGÊNCIA PORTUGUESA DO AMBIENTE, identificando o(s) momento(s) de notificação à RECORRENTE do(s) respectivo(s) acto(s) de liquidação definitiva e, nesse contexto, aferindo o cumprimento – ou a violação – do transcrito artigo 3.º da Portaria n.º 72/2010, de 4 de Fevereiro.

E. Perante o probatório fixado em primeira instância, o Tribunal a quo qualificou o procedimento de liquidação definitiva da TGR adoptado pela AGÊNCIA PORTUGUESA DO AMBIENTE da seguinte forma: «Pretendeu, aqui, a Administração dar a conhecer à Impugnante o apuramento por si efectuado, isto é, a liquidação da TGR de 2010 através da aplicação das taxas à matéria tributável que identificou, “previamente à emissão do DUC”, sem prejuízo de a Impugnante poder, no prazo que lhe foi concedido, carrear para o procedimento elementos que determinassem a reavaliação dos elementos considerados na liquidação. Trata-se, então, de uma liquidação sujeita a termo: a liquidação produziria todos os seus efeitos se a Impugnante nada dissesse no prazo que lhe foi dado, sendo então emitido o Documento Único de Cobrança» (cf. Sentença recorrida, pp. 13-14).

F. Assente na referida qualificação o Tribunal a quo procedeu, por fim, à identificação dos momentos notificativos relevantes para a aferição do respectivo prazo de caducidade, sufragando, por um lado, que a ora RECORRENTE se pronunciou acerca do cálculo preliminar da TGR referente ao ano de 2010 «em 6 de Maio de 2011 – cfr. Ponto 5 do probatório –, informando que verificou a existência de diferenças no apuramento dos quantitativos de resíduos, apresentando um mapa de apuramento da TGR que na sua opinião seria a efectivamente devida, no valor de € 693.354,56. Deste comportamento retira-se que aquela liquidação sujeita a termo produziu parcialmente os seus efeitos, na parte relativa a estes € 693.354,56, que não foram objecto de divergência em 6 de Maio de 2011. E, assim sendo, verifica-se que, no ponto – na parte em que a Impugnante aceitou (e pagou - cfr. o ponto 14 do probatório) a liquidação –, este acto tributário foi notificado dentro do prazo de caducidade» (cf. Sentença recorrida, p. 14),...

G. … e, por outro, «Relativamente aos restantes € 94.033,18, [que] a posição final da Administração foi remetida à Impugnante em 16 de Maio de 2011, tendo sido necessariamente recebida em data posterior, (...) pelo que neste segmento se verifica a caducidade do direito à liquidação, vício de violação de lei por erro nos pressupostos de direito que consequência a sua remoção da ordem jurídica» (cf. Sentença recorrida, p. 16).

H. Em conformidade com a transcrita fundamentação de direito o Tribunal a quo julgou a impugnação judicial parcialmente procedente, determinando, em consequência: (i) a anulação do despacho da Senhora Subdirectora-Geral da Agência Portuguesa do Ambiente que indeferiu a reclamação graciosa oportunamente apresentada contra o acto de liquidação definitiva da taxa de gestão de resíduos (TGR) referente ao ano de 2010; (ii) a anulação do «acto de liquidação da Taxa de Gestão de Resíduos relativo ao ano de 2010 que fixou a colecta adicional de € 93.033,18, notificado através da informação constante do DUC», na medida em que tal acto foi notificado à RECORRENTE após o termo do respectivo prazo de caducidade; e, por fim, (iii) a manutenção do «acto de liquidação da Taxa de Gestão de Resíduos relativo ao ano de 2010 que determinou a colecta de € 693.354,56, notificado através do fax 081/11/DPEA-DEA», na medida em que o cálculo preliminar da TGR notificado à RECORRENTE antes do dia 15 de Maio de 2011 se convolou, nessa parte e por força da sua não contestação em sede de audiência prévia, em acto de liquidação definitiva da TGR referente ao ano de 2010.

I. Perante o que antecede, a RECORRENTE pretende contestar, no âmbito do presente recurso jurisdicional, o segmento dispositivo que determinou a manutenção na ordem jurídica do «acto de liquidação da Taxa de Gestão de Resíduos relativo ao ano de 2010 que determinou a colecta de € 693.354,56, notificado através do fax 081/1l/DPEA-DEA», invocando a pronúncia deste SUPREMO TRIBUNAL acerca da (in)validade do pressuposto de direito utilizado na Sentença recorrida para manter parcialmente na ordem jurídica o referido acto tributário, ou seja, da premissa judicativa segundo a qual o cálculo preliminar da TGR notificado à RECORRENTE antes do dia 15 de Maio de 2011 se convolou, por força da sua não contestação em sede de audiência prévia, em acto de liquidação definitiva da TGR referente ao ano de 2010.

J. Ora, conforme resulta do probatório fixado em primeira instância, em 28 de Abril de 2011 a RECORRENTE foi notificada para, em sede de «consulta prévia a respeito do apuramento de informação para a liquidação do acerto de contas da taxa de gestão de resíduos (TGR) relativa ao ano de 2010», se pronunciar acerca do «cálculo preliminar da TGR» realizado pela AGÊNCIA PORTUGUESA DO AMBIENTE (cf., respectivamente, artigos 7 e 3 do probatório).

K. Neste contexto, o Tribunal a quo considerou que a notificação do referido cálculo preliminar da TGR referente ao ano de 2010 consubstanciara «uma liquidação sujeita a termo: a liquidação produziria todos os seus efeitos se a Impugnante nada dissesse no prazo que lhe foi dado, sendo então emitido o Documento Único de Cobrança» (cf. Sentença recorrida, p. 14).

L. Consequentemente, não tendo a RECORRENTE contestado, em sede de consulta prévia, o projectado valor de € 693.354,56 (seiscentos e noventa e três mil trezentos e cinquenta e quatro euros e cinquenta e seis cêntimos), o Tribunal a quo concluiu que «aquela liquidação sujeita a termo produziu parcialmente os seus efeitos, na parte relativa a estes € 693.354,56 que não foram objecto de divergência em 6 de Maio de 2011. E, assim sendo, verifica-se que, no ponto – na parte em que a Impugnante aceitou (e pagou – cfr. o ponto 14 do probatório) a liquidação –, este acto tributário foi notificado dentro do prazo de caducidade» (cf. Sentença recorrida, p. 14).

M. Por outras palavras, o Tribunal a quo considerou que o cálculo preliminar da TGR referente ao ano de 2010, notificado à RECORRENTE em 28 de Abril de 2011, se convolouretroactivamente – em acto de liquidação definitivo – a partir do momento em que a RECORRENTE não invocou, em sede de audiência prévia, novos elementos susceptíveis de alterar o sentido decisório projectado pela AGÊNCIA PORTUGUESA DO AMBIENTE.

N. Porém, um tal pressuposto de direito foi erradamente fixado pelo Tribunal a quo, na medida em que à notificação para a audiência prévia deve suceder, impreterivelmente – mesmo nos casos em que o respectivo direito de audição não seja exercido – a notificação do acto final do procedimento, nos termos do disposto nos artigos 77.º, n.º 6, da Lei Geral Tributária e 36.º, n.º 1, do Código de Procedimento e de Processo Tributário.

O. Atalhando a presente análise, sublinhe-se que este SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO já teve oportunidade de observar que «Em caso algum a lei prevê a dispensa de pronúncia de acto decisório definitivo após o decurso do prazo para o interessado exercer o direito de audição. O mais provável é que, não invocando o interessado elementos novos, o projecto de decisão comunicado se venha a transformar em decisão definitiva, mas para tal é necessária a pronúncia de uma decisão que confirme isso mesmo. Sem esta, o projecto de decisão não passará disso mesmo» (cf. Acórdão proferido no processo n.º 0930/08, de 19-11-2008, disponível em www.dgsi.pt).

P. Por seu turno, a apontada conclusão mantém-se plenamente válida nos casos em que o contribuinte não tenha exercido o respectivo direito de audição, tendo este SUPREMO TRIBUNAL sufragado – de forma plenamente transponível para o caso vertente – que, «apesar de não ter formalmente exercido o seu direito de audição, a conversão do projecto de decisão em decisão definitiva não poderia operar automaticamente, carecendo de um acto próprio e subsequente ao termo do prazo para exercício do direito de audição» (cf. Acórdão proferido no processo n.º 0930/08, de 19-11-2008, disponível em www.dgsi.pt).

Q. No mesmo sentido se pronunciou JORGE LOPES DE SOUSA, destacando que «Tem-se constatado que, frequentemente, a administração tributária, sobretudo na área da segurança social, procede a notificação do projecto de decisão para efeito de possibilitar a execução do direito de audição, acompanhado da indicação de que, se o destinatário nada disser no prazo para exercer esse direito, o projecto passará a considerar-se como decisão definitiva, indicando-se a data em que ela se considera notificada» e observando, incisivamente, que «Esta prática não tem qualquer fundamento legal, pois a decisão definitiva de actos que afectem a esfera jurídica dos contribuintes tem de lhes ser notificada, como exigem os arts. 77.º, n.º 6, da LGT e 36.º, n.º 1, do CPPT. Na verdade, o contribuinte tem direito à notificação para exercício do direito de audição e à notificação da decisão final, não podendo a administração tributária, obrigada a observar o princípio da legalidade, optar por um regime processual que não tem cobertura legal» (cf. Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado, Volume I, 6.ª Edição, Áreas Editora, p. 519).

R. Em suma, conclui o citado A. que «não pode a Administração, sem cobertura legal, auto-dispensar-se de praticar e notificar o acto final e [que] sem uma decisão final e a respectiva notificação, não se estará perante um acto que produza efeitos em relação ao destinatário» (cfr. op. e loc. cit).

S. Ora, no caso concreto verificou-se que o Tribunal a quo, perante a falta de exercício do direito de audição na parte correspondente à colecta de € 693.354,56 (seiscentos e noventa e três mil trezentos e cinquenta e quatro euros e cinquenta e seis cêntimos), sustentou que o respectivo cálculo preliminar da TGR do ano de 2010 se convolara automaticamente em liquidação definitiva desse mesmo tributo, considerando-a notificada à RECORRENTE na data de recepção do primitivo projecto de liquidação (i.e., antes de 15 de Maio de 2011).

T. Por outras palavras, o Tribunal a quo assacou à notificação realizada pela AGÊNCIA PORTUGUESA DO AMBIENTE para consulta prévia no âmbito da liquidação preliminar da TGR do ano de 2010, na parte não contestada pela RECORRENTE em sede de direito de audição, todos os efeitos decorrentes da notificação do acto de liquidação definitiva da TGR referente ao ano de 2010.

U. Todavia, um tal entendimento é, conforme sobressai da jurisprudência e da doutrina acima transcritas, manifestamente desconforme com o regime estatuído nos artigos 77.º, n.º 6, da Lei Geral Tributária e 36.º, n.º 1, do Código de Procedimento e de Processo Tributário, o qual impõe, mesmo em situações de não exercício do respectivo direito de audição, a emissão e a notificação da decisão final do procedimento – in casu, da liquidação definitiva da TGR referente ao ano de 2010.

V. Do anterior resulta, sem necessidade de maiores desenvolvimentos, que a premissa judicativa em que o Tribunal a quo assentou para decidir a manutenção parcial do acto tributário impugnado é ilegal por ter assentado em manifesto erro sobre os respectivos pressupostos.

W. Por conseguinte, não sendo admissível a conclusão de direito sufragada na Sentença recorrida, resta concluir que o acto de liquidação definitiva da TGR referente ao ano de 2010, na parte mantida na ordem jurídica, foi efectivamente notificado à RECORRENTE – como não poderia deixar de ser – conjuntamente com a decisão final do respectivo procedimento de consulta prévia (e, portanto, já depois do dia 15 de Maio de 2011),...

X. … ou seja, com a notificação, no dia 7 de Junho de 2011, do Documento Único de Cobrança n.º 516400000155876 relativo à «liquidação definitiva da taxa de gestão de resíduos (TGR) referente ao ano de 2010 – acerto de contas», onde a AGÊNCIA PORTUGUESA DO AMBIENTE indicou o quantitativo definitivamente apurado no montante de € 787.387,74 (setecentos e oitenta e sete mil trezentos e oitenta e sete euros e setenta e quatro cêntimos) e a respectiva data para o seu pagamento voluntário (cf. artigo 11 do probatório fixado em primeira instância e fls. 71-72 dos autos),...

V. … ou, no limite, como igualmente equacionou o Tribunal a quo, com a notificação do Ofício n.º 210/11/DEPEA-DEA, expedido pela AGÊNCIA PORTUGUESA DO AMBIENTE no dia 16 de Maio de 2011 (e, portanto, necessariamente notificado à RECORRENTE em dada posterior), do qual consta a posição final desta Autoridade sobre a TGR devida pela RECORRENTE no ano de 2010 (cf. artigo 7 do probatório fixado em primeira instância).

Z. Consequentemente, verifica-se que o acto de liquidação definitiva da TGR referente ao ano de 2010, na parte mantida na ordem jurídica pela Sentença recorrida, foi – contrariamente ao decidido na Sentença recorrida – praticado já depois do termo do respectivo prazo de caducidade, ou seja, depois do dia 15 de Maio de 2011, pelo que se impunha ao Tribunal a quo promover a sua anulação pari passu com o «acto de liquidação da Taxa de Gestão de Resíduos relativo ao ano de 2010 que fixou a colecta adicional de € 93.03313, notificado através da informação constante do DUC».

AA. Não o tendo feito, deverão VV. Exas. anular a Sentença proferida pelo Tribunal a quo na parte recorrida e, bem assim, remover da ordem jurídica o remanescente do acto de liquidação impugnado, no montante de € 693.354,56 (seiscentos e noventa e três mil trezentos e cinquenta e quatro euros e cinquenta e seis cêntimos).

Termos em que, requer a VV. Exas. se dignem anular a sentença na parte recorrida e, bem assim, remover da ordem jurídica a parte remanescente do acto de liquidação impugnado, no apontado montante de € 693.354,56 (seiscentos e noventa e três mil trezentos e cinquenta e quatro euros e cinquenta e seis cêntimos)».

1.3 A “Agência Portuguesa do Ambiente, I.P.” (adiante Recorrida ou, abreviadamente, APA) não apresentou contra alegações.

1.4 Recebidos os autos neste Supremo Tribunal Administrativo, foi dada vista ao Ministério Público e o Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de que o recurso não merece provimento, com a seguinte fundamentação:

«1. QUESTÃO A DECIDIR:

- a caducidade do direito à liquidação da taxa de gestão de resíduos referente ao ano de 2010.

Tal foi a questão tratada na sentença recorrida (fls. 225 e ss) relativamente à qual foi interposto recurso com as conclusões (de fls. 261), nas quais se discorda do decidido ainda que, fazendo aplicação do previsto no art. 3.º da Portaria n.º 72/2010, de 4 de Fevereiro, defendendo-se ser de atender não ao momento considerado, de 28-4-2011, por corresponder ainda ao exercício do direito de audição, mas ao de 7-6-2011, em que teve lugar a notificação da liquidação definitiva, nos termos dos artigos 77.º n.º 6 da L.G.T. e 36.º n.º 1 do C.P.P.T.

2. POSIÇÃO QUE SE DEFENDE:

Afigura-se muito duvidoso que com o previsto no art. 3.º da Portaria 72/2010, de 4/2, se tenha estabelecido um prazo de caducidade, pese embora o seu teor ser o seguinte:
- “Sem prejuízo do previsto nos números seguintes, a APA procede à liquidação definitiva da taxa de gestão de resíduos e notificação dos sujeitos passivos, por via electrónica, até ao dia 15 de Maio do ano seguinte, depois de verificada a informação anual por eles prestada efeitos os acertos de conta que se revelarem necessários”.
Com efeito, “às taxas, na ausência de um Regime Geral especifico, deverão ser aplicadas as disposições da Lei Geral Tributária e do Código de Procedimento e Processo Tributário na medida em que não colidam com a sua natureza bilateral” – assim, Nuno de Oliveira Garcia Contencioso de Taxas, ed. Almedina, 2011, pág. 42.
Ora, da bilateralidade da taxa tal como foi prevista no Dec.-Lei n.º 178/2006, de 4 de Fevereiro, com a alteração da Lei n.º 64-A/2008, de 31 de Dezembro, parece não ser de considerar outro prazo que não o previsto na L.G.T. quanto a “caducidade”.
Com efeito, no art. 58.º n.º 5 daquele Dec.-Lei foi previsto que a liquidação e pagamento seriam “disciplinados” por portaria.
Na Portaria n.º 72/2010, de 4/2, ordenaram-se os vários actos a praticar dentro do procedimento de liquidação, pagamento e repercussão da dita taxa – assim, nomeadamente, nos seus arts. 2.º, 3.º, 5.º, 8.º e 12.º.
E se foi prevista a dita data de 15 de Maio como limite para a liquidação, tal não obstou a que fosse ainda previsto que a mesmo tivesse lugar posteriormente – assim, nos artigos 4.º, 9.º, 10.º e 11.º.
Na dúvida, quanto à aplicação do previsto no dito art. 3.º como Lei especial à dita Lei geral, é de recorrer à “ratio” da dita Portaria, a qual só pode ter sido regulamentar a disciplina aplicável à liquidação, pagamento e repercussão da dita taxa que não afastar o previsto na Lei geral quanto à caducidade que diz já respeito à “extinção da relação jurídica tributária”.
Assim, e ainda que seja de concordar com a recorrente quanto a não ser de considerar como notificação da liquidação definitiva a efectuada a 28-4-2011, resultando esta ter esta sido posteriormente efectuada, ainda dentro do prazo previsto no art. 46.º n.º1 da L.G.T., o recurso não pode proceder.
Aliás, a comunicação da liquidação definitiva efectuada por FAX, a 16-5-2011, vale como prova da liquidação ter sido efectuada dentro do prazo previsto no dito art. 3.º da Portaria, tendo o anterior dia 15 sido um domingo – art. 297.º al. e) do C. Civil».

1.5 Colhidos os vistos dos Conselheiros adjuntos, cumpre apreciar e decidir.


* * *

2. FUNDAMENTAÇÃO

2.1 DE FACTO

O Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé procedeu ao julgamento da matéria de facto nos seguintes termos:

«1. Em 18 de Abril de 2011, a Agência Portuguesa do Ambiente elaborou a Informação n.º 028/11/DPEA-DFA relativa ao «Apuramento de informação para a liquidação definitiva da taxa de gestão de resíduos referente ao ano de 2010» - cfr. fls. 103-98 do apenso.

2. Posteriormente, a Agência Portuguesa do Ambiente remeteu a A………., LDA., o Ofício n.º 030/11/DPEA-DEA, relativo à «Taxa de gestão de resíduos relativos ao ano de 2010 / Liquidação definitiva», o qual se dá aqui por integralmente reproduzido - cfr. fls. 96-91 do apenso.

3. No dia 28 de Abril de 2011, a Agência Portuguesa do Ambiente remeteu a A…………, LDA., o Ofício n.º 081/11/DPEA-DEA, relativo à «Taxa de gestão de resíduos relativos ao ano de 2010», o qual se dá aqui por integralmente reproduzido e que, no que ora interessa, tem o seguinte teor:
Tendo ocorrido um lapso nos cálculos que determinaram o valor a liquidar no acerto de contas da taxa de gestão de resíduos (TGR) relativa ao ano de 2010, remetidos a V. Exa. através do fax com a ref. 030/11/DPEA-DEA, queira considerá-lo sem efeito, substituindo o mesmo pela presente comunicação.
(...)
Do valor da TGR do ano de 2010, 1.524.945,09€, e depois de efectuado o acerto de contas com o montante já liquidado por conta sobre a estimativa dos resíduos geridos durante o primeiro semestre de 2010, resulta o valor a liquidar de 787.387,74 €.
A ser o caso de V. Exa. encontrar eventuais divergências no apuramento efectuado pela APA relativamente à quantidade de resíduos efectivamente geridos, poderá submeter no prazo de 3 dias úteis e pela mesma via, novos elementos que as consubstanciem, de modo a ser efectuada uma reavaliação dos mesmos. (…)” - cfr. fls. 90-87 do apenso e fls. 74 dos autos.

4. No dia 2 de Maio de 2011, A………., LDA., solicitou a prorrogação do prazo de resposta - cfr. fls. 84 dos autos.

5. Em 6 de Maio de 2011, A…………., LDA., apresentou a sua resposta, considerando serem apenas devidos € 693.354,56 - cfr. fls. 78-78v do apenso.

6. No dia 13 de Maio de 2011, a Agência Portuguesa do Ambiente remeteu a A………., LDA., o Ofício n.º 100/11/DPEA-DEA, relativo à «Taxa de gestão de resíduos relativos ao ano de 2010», o qual se dá aqui por integralmente reproduzido e que, no que ora interessa, tem o seguinte teor:
Na sequência da comunicação de V. Exa. com a ref. S01250-201105-DAF em resposta ao nosso fax com a ref. 081/11/DPEA-DEA enviado no âmbito do procedimento instituído de consulta prévia, informa-se que estando as 335.578,23 toneladas de resíduos depositados no aterro de V. Exa. enquadrados na categoria de resíduos urbanos (...) considera-se ser sobre os mesmos aplicável o agravamento em 50% da taxa prevista para os resíduos correspondentes à fracção caracterizada como reciclável. (...)
Com base no requerido esclarecimento, apoiado em eventuais resultados laboratoriais efectuados aos resíduos em causa que comprovem o exposto por V. Exas., encontra-se esta Agência disponível para proceder à reclassificação em conformidade com o solicitado e à consequente alteração do montante a pagar no âmbito deste acerto de contas.” - cfr. fls. 70 do apenso.

7. No dia 16 de Maio de 2011, a Agência Portuguesa do Ambiente remeteu a A…………, LDA., e a outras 10 entidades, o Oficio n.º 210/11/DPEA- DEA, relativo à «Taxa de gestão de resíduos relativos ao ano de 2010», o qual se dá aqui por integralmente reproduzido e que, no que ora interessa, tem o seguinte teor:
A comunicação de V. Exa., em resposta ao fax enviado no âmbito do procedimento instituído de consulta prévia, a respeito do apuramento de informação para a liquidação do acerto de contas da taxa de gestão de resíduos (TGR) relativa ao ano de 2010, vem manifestar discordância relativamente à metodologia aplicada por esta Agência no que se refere à determinação da fracção reciclável a considerar para efeitos do agravamento em 50% da taxa prevista para os resíduos correspondentes à fracção reciclável, argumentando que: (...)
Sobre esta matéria é entendido por esta Agência o seguinte: (...)
Não se reconhecendo legitimidade nos argumentos veiculados, considera-se de manter a metodologia já aplicada na determinação da fracção reciclável a considerar para efeitos do agravamento em 50% da taxa prevista para os resíduos correspondentes à fracção reciclável, ie, considerar a caracterização de resíduos com referência ao ano a que a taxa reporta, bem como a vigência do agravamento durante os 12 meses do ano.” - cfr. fls. 67-65 do apenso, artigo 7.º da PI e artigo 58.º da Contestação.

8. Em 31 de Maio de 2011, A…………, LDA., remeteu um fax à Agência Portuguesa do Ambiente no qual prestou esclarecimentos relativos aos resíduos urbanos, aos inertes de RCD e a outros - cfr. fls. 64 do apenso.

9. No dia 6 de Junho de 2011, foi elaborada, em nome de A………., LDA., a nota de liquidação relativa à “taxa de gestão de resíduos (TGR) referente ao ano de 2010 - acerto de contas” no valor de € 787.387,74 - cfr. fls. 63-61 do apenso e fls. 211 dos autos.

10. Esta nota de liquidação não foi enviada a A……….., LDA. - cfr. fls. 193 dos autos.

11. No mesmo dia, a Agência Portuguesa do Ambiente remeteu a A……….., LDA., o Documento Único de Cobrança relativo à “liquidação definitiva da taxa de gestão de resíduos (TGR) referente ao ano de 2010 - acerto de contas”, com a data limite de pagamento de 30 de Junho de 2011 e o valor de € 787.387,74 - cfr. fls. 71-72 dos autos.

12. Em 9 de Junho de 2011, a Agência Portuguesa do Ambiente remeteu a A…………., LDA., o Ofício n.º 119/11/DPEA-DEA, relativo à «Taxa de gestão de resíduos relativa ao ano de 2010», o qual se dá aqui por integralmente reproduzido e que, no que ora interessa, tem o seguinte teor:
Na sequência da comunicação de V. Exa. com a ref. S01689-2011-DAP em resposta ao nosso fax com a ref. 100/11/DPEA-DEA enviado no âmbito do procedimento instituído de consulta prévia, informa-se que é entendimento desta Agência que a caracterização de resíduos efectuada no âmbito da Parte II do Anexo da Portaria n.º 851/2009, de 7 de Agosto, abrange todos os resíduos urbanos depositados em aterro.
(...) Uma vez que os resíduos classificados com o código LER 170904 não se encontram identificados na referida tabela n.º 1, reitera-se que deverá V. Exa. justificar devidamente, mediante identificação dos contaminantes que refere e apoiado em eventuais resultados laboratoriais efectuados, a classificação proposta para os resíduos em causa”. - cfr. fls. 56-54 do apenso.

13. No dia 14 de Junho de 2011, a Agência Portuguesa do Ambiente recebeu um requerimento de A……….., LDA., no qual esta, “notificada para proceder ao pagamento do montante de € 787.387,74 (...) constante do Documento Único de Cobrança n.º 516000000155876, relativa à liquidação definitiva da taxa de gestão de resíduos do ano de 2010”, requereu que fosse aceite “o pagamento voluntário do montante de € 693.354,56, em virtude de a Requerente pretender contestar, através dos meios de defesa que se encontram ao seu dispor, da parte remanescente da liquidação definitiva da taxa de gestão de resíduos do ano de 2010, no valor de € 94.033,18” - cfr. fls. 50-49 do apenso.

14. Em 29 de Junho de 2011, A…………, LDA., efectuou o pagamento de € 693.354,56 a título de pagamento parcial voluntário da liquidação definitiva da Taxa de Gestão de Resíduos do ano de 2010 - cfr. o documento 9 junto com a Petição Inicial e o artigo 12.º deste articulado.

15. No dia 20 de Julho de 2011, A…………., LDA., foi citada para o Processo de Execução Fiscal n.º 1058-2011/01075349, instaurado para cobrança da Taxa de Gestão de Resíduos de 2010 em falta e respectivas custas processuais, no montante global de € 94.318,91 - cfr. o documento 10 junto com a Petição Inicial e o artigo 13.º deste articulado.

16. Em 28 de Outubro de 2011, a Agência Portuguesa do Ambiente recebeu a Reclamação Graciosa que A…………, LDA., no qual esta, “notificada para proceder ao pagamento do montante de € 787.387,74 (...) constante do Documento (laico de Cobrança n.º 516000000155876, relativa à liquidação definitiva da taxa de gestão de resíduos do ano de 2010”, deduziu contra esta - cfr. fls. 40-16 do apenso.

17. No dia 22 de Novembro de 2011, a Subdirectora-Geral Geral da Agência Portuguesa do Ambiente indeferiu aquela Reclamação – acto impugnado –, com fundamento na informação n.º 290/11/DPEA-DEA, a qual se dá aqui por integralmente reproduzida e que, no que ora interessa, tem o seguinte teor:
(…)
18- No que se refere ao pedido de caducidade, assente no facto de a emissão do DUC ser posterior à data de 15 de Maio, conforme sustenta a reclamante e aliás documentalmente junto à mesma, documento n.º 1, facilmente se constata que a APA emitiu o citado DUC a 2011-06-06, o que leva a reclamante a pedir a caducidade de todo o procedimento.
19- Ora, quanto à qualificação do prazo em questão, previsto no n.º 3 da Portaria n.º 72/2010, de 4 de Fevereiro, este não constitui um prazo cominatório, no sentido em que faça precludir a obrigação do sujeito passivo, mas antes um prazo ordenador para a actuação administrativa, pelo que a sua não verificação, por si só e enquanto tal, não extingue os direitos e obrigações em causa.
20- Acresce ainda referir que não foram recepcionados por esta Agência, apesar de reiteradamente solicitados, os elementos adicionais que consubstanciassem a classificação dos resíduos identificados com o código LER 170904 enquanto inertes RCD.
(…)” - cfr. fls. 4-1 do apenso».


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2.2 DE DIREITO

2.2.1 A QUESTÃO A APRECIAR E DECIDIR

A sociedade acima identificada discorda da sentença, na parte que lhe foi desfavorável, porquanto considera que nesta se fez errado julgamento quanto à caducidade do direito de liquidação na parte correspondente a € 693.354,56, do total de € 787.387,74.
Na verdade, tendo a sociedade impugnado judicialmente essa liquidação e a decisão (proferida pela Subdirectora-Geral da APA) que indeferiu a reclamação graciosa que deduziu contra o mesmo acto, o Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé proferiu sentença em que decidiu nos seguintes termos:
«Termos em que, julgando parcialmente procedente a Impugnação Judicial:
- Se anula o acto da Subdirectora Geral da Agência Portuguesa do Ambiente, de 22 de Novembro de 2011, que indeferiu a Reclamação Graciosa;
- Se mantém o acto de liquidação da Taxa de Gestão de Resíduos relativo ao ano de 2010 que determinou a colecta de € 693.354,56,notificado através do fax 081/11/DPEA-DEA;
- Se anula o acto de liquidação da Taxa de Gestão de Resíduos relativo ao ano de 2010 que fixou a colecta adicional de € 94.033,18, notificado através da informação constante do DUC.
Custas pela Impugnante e pela Impugnada na proporção do vencido – artigos 527.º do CPC e 6.º, n.º 1, do RCP».
Interessa-nos agora apenas a parte em que a sentença julgou improcedente a impugnação judicial, ou seja, a parte em que manteve o «acto de liquidação da Taxa de Gestão de Resíduos relativo ao ano de 2010 que determinou a colecta de € 693.354,56, notificado através do fax 081/11/DPEA-DEA».
Para decidir nesse sentido, considerou o Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé, em síntese da sua autoria, o seguinte:
«- A liquidação da TGR é um acto divisível;
- A liquidação da TGR do ano de 2010 foi praticada sujeita a termo – produziria todos os seus efeitos se a Impugnante nada dissesse no prazo que lhe foi dado, sendo então emitido o Documento Único de Cobrança –, tendo sido notificada antes de Maio de 2011 através do Ofício n.º 081/11/DPEA-DEA;
- Como a Impugnante apenas reagiu parcialmente contra a liquidação, esta tornou-se eficaz quanto aos € 693.354,56 que não foram postos em crise;
- Relativamente aos restantes € 94.033,18, a posição final da Administração foi remetida à Impugnante em 16 de Maio de 2011, tendo sido necessariamente recebida em data posterior, que não foi possível apurar e que a Impugnante, sem oposição da Impugnada, refere ter sido em 19 de Maio, pelo que neste segmento se verifica a caducidade do direito à liquidação, vício de violação de lei por erro nos pressupostos de direito que consequencia a sua remoção da ordem jurídica. Finalmente, uma vez que a parte da liquidação que foi praticada dentro do prazo de caducidade e que, por isso, se mantém na ordem jurídica, foi aceite e paga pela Impugnante – cfr. pontos 5, 13 e 14 do probatório –, não lhe vindo assacados vícios próprios (as restantes questões suscitadas na PI são relativas às taxas agravadas que deram origem aos apontados € 94.033,18), fica prejudicado o conhecimento das restantes questões suscitadas na Petição Inicial, já que independentemente das respostas que lhes fossem dadas, a liquidação sempre teria que ser parcialmente anulada nesta parte».
Ou seja, a sentença recorrida, depois de ter tecido diversos considerandos em torno do procedimento da liquidação e respectivas fases, com referência às pertinentes normas do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) e da Lei Geral Tributária (LGT), entendeu que, relativamente ao acto de liquidação impugnado, «o procedimento adoptado pela Entidade Impugnada não obedeceu de forma estanque àquelas fases procedimentais e foi, até, em determinados momentos, contraditório», motivo por que «apenas determinando casuisticamente a natureza dos actos praticados no procedimento se poderá concluir, ou não, pela prática e notificação de acto(s) de notificação».
Depois, considerando que a liquidação da TGR segue o paradigma actual – em que são os contribuintes quem determina a matéria tributável sujeita a tributação (no caso, através da prestação da informação anual relevante), à qual depois é aplicada a taxa, muitas vezes mediante meios automáticos e informatizados, sendo que a intervenção da AT se verifica a posteriori, em funções de controlo –, deixou registado que no caso sub judice foi esse o procedimento seguido: a TGR foi liquidada com base na informação anual prestada pelo sujeito passivo e depois de feitos os acertos de contas com o montante já entregue por conta, sendo-lhe notificada (pelo Ofício n.º 081/11/DPEA-DEA) com o objectivo de, «previamente à emissão do DUC», este se conformar com essa liquidação ou contra ela reagir, designadamente, «[a] ser o caso de […] encontrar eventuais no apuramento efectuado pela APA relativamente à quantidade de resíduos efectivamente geridos, poderá submeter no prazo de 3 dias úteis e pela mesma via, novos elementos que as consubstanciem, de modo a ser efectuada uma reavaliação dos mesmos. (…)”» [cfr. n.º 3 dos factos provados].
Por isso, entendeu que se tratou de «uma liquidação sujeita termo», ou seja, «a liquidação produziria todos os seus efeitos se a Impugnante nada dissesse no prazo que lhe foi dado, sendo então emitido o Documento Único de Cobrança».
Prosseguiu o Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé considerando que «a Impugnante pronunciou-se quanto a este acto em 6 de Maio de 2011 – cfr. ponto 5 do probatório –, informando que se verificou a existência de diferenças no apuramento dos quantitativos de resíduos, apresentando um mapa de apuramento da TGR que na sua opinião seria a efectivamente devida, no valor de € 693.354,56», daí concluindo que «aquela liquidação sujeita a termo produziu parcialmente os seus efeitos, na parte relativa a estes € 693.354,56 que não foram objecto de divergência em 6 de Maio de 2011» e, assim, que, nessa parte em que a Impugnante aceitou a liquidação, «este acto tributário foi notificado dentro do prazo de caducidade».
Foi este entendimento adoptado pelo Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé – que nas alegações de recurso é qualificado como “convolação retroactiva” do cálculo preliminar da TGR em liquidação definitiva por falta de invocação de novos elementos em sede de audiência prévia – que gerou o desacordo da Recorrente. Segundo esta, «à notificação para a audiência prévia deve suceder, impreterivelmente – mesmo nos casos em que o respectivo direito de audição não seja exercido –, a notificação do acto final do procedimento», nos termos do disposto no art. 77.º, n.º 6, da LGT e no art. 36.º, n.º 1, do CPPT, invocando em favor da sua tese a doutrina e a jurisprudência, de que cita exemplos. Assim, concluiu que «a premissa judicativa em que o Tribunal a quo assentou para decidir a manutenção parcial do acto tributário é ilegal por ter assentado em manifesto erro sobre os respectivos pressupostos», motivo por que «não sendo admissível a conclusão de direito sufragada na Sentença recorrida», deve, ao invés, considerar-se que «o acto de liquidação definitiva da TGR referente ao ano de 2010, na parte mantida na ordem jurídica, foi efectivamente notificado à RECORRENTE – como não poderia deixar de ser – conjuntamente com a decisão final do respectivo procedimento de consulta prévia (e, portanto, já depois do dia 15 de Maio de 2011)», ou seja, após o termo do prazo de caducidade.
Segundo a Recorrente, o acto de liquidação deve considerar-se notificado «com a notificação, no dia 7 de Junho de 2011, do Documento Único de Cobrança n.º 516400000155876 relativo à «liquidação definitiva da taxa de gestão de resíduos (TGR) referente ao ano de 2010 – acerto de contas», onde a AGÊNCIA PORTUGUESA DO AMBIENTE indicou o quantitativo definitivamente apurado no montante de € 787.387,74 (setecentos e oitenta e sete mil trezentos e oitenta e sete euros e setenta e quatro cêntimos) e a respectiva data para o seu pagamento voluntário» ou, quando muito, «como igualmente equacionou o Tribunal a quo, com a notificação do Ofício n.º 210/11/DEPEA-DEA, expedido pela AGÊNCIA PORTUGUESA DO AMBIENTE no dia 16 de Maio de 2011 (e, portanto, necessariamente notificado à RECORRENTE em dada posterior), do qual consta a posição final desta Autoridade sobre a TGR devida pela RECORRENTE no ano de 2010»; em qualquer caso, sempre após 16 de Maio de 2011, que entende ser o termo do prazo para o exercício do direito à liquidação, uma vez que o dia 15 de Maio desse ano foi um domingo [cfr. art. 279.º, alínea e), do Código Civil (CC)].
A questão que cumpre apreciar e decidir é, pois, a de saber se a sentença recorrida fez correcto julgamento na parte em que manteve na ordem jurídica a liquidação – parte correspondente ao montante de € 693.354,56 – por considerar que, nessa parte, esse acto foi notificado à ora Recorrente dentro do prazo da caducidade do direito de liquidar a TGR do ano de 2010.

2.2.2 DA CADUCIDADE DO DIREITO À LIQUIDAÇÃO

Como resulta do que deixámos dito, a questão que cumpre apreciar e decidir é a da caducidade do direito à liquidação.
É certo que a divergência da Recorrente com a sentença circunscreve-se à data em deve considerar-se que foi notificada a liquidação. Essa divergência, contudo, só assume relevância no sentido da decisão a proferir quanto à questão da caducidade do direito à liquidação se admitirmos, como o fizeram a sentença e a Recorrente, que o direito de liquidar a TGR respeitante ao ano de 2010 caduca em 15 de Maio de 2011, asserção que ambos retiram do art. 3.º da Portaria n.º 72/2010, de 4 de Fevereiro (ELI: http://data.dre.pt/eli/port/72/2010/02/04/p/dre/pt/html.), que dispõe: «Sem prejuízo do disposto nos números seguintes, a APA procede à liquidação definitiva da taxa de gestão de resíduos e notificação dos sujeitos passivos, por via electrónica, até ao dia 15 de Maio do ano seguinte, depois de verificada a informação anual por eles prestada e feitos os acertos de contas que se revelem necessários».
Quer a Recorrente quer o Juiz do Tribunal a quo consideraram que o citado preceito estipula um prazo especial de caducidade do direito à liquidação: a primeira com abundante fundamentação (cfr. arts. 146.º a 174.º da petição inicial e n.ºs 9 a 32 das alegações pré-sentenciais); o segundo exclusivamente com base no fundamento de que «[f]ace às posições assumidas pela Impugnante e pela Impugnada no procedimento e nestes autos é possível assentar em que as partes estão de acordo quanto ao prazo da caducidade da liquidação: as duas concordam que a liquidação deve ser notificada ao sujeito passivo até ao dia 15 de Maio do ano seguinte a que respeita, nos termos do artigo 3.º da Portaria n.º 72/2010, de 4 de Fevereiro».
Ora, salvo o devido respeito, o referido preceito legal não estipula um prazo especial de caducidade do direito à liquidação; estipula, isso sim, um prazo meramente ordenador ou disciplinar, como procuraremos demonstrar.
Começando pela fundamentação aduzida na sentença, importa ter presente que o acordo das partes apenas pode relevar em sede de julgamento da matéria de facto, no que respeita a matéria que possa ser julgada com base em meios de prova sujeitos à livre apreciação do julgador [cfr. art. 607.º, n.ºs 4 e 5, do Código de Processo Civil (CPC)]. Já no que respeita ao julgamento da matéria de direito, o tribunal não fica vinculado pela alegação, nem pelo eventual acordo das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito, como resulta inequivocamente do n.º 3 do art. 5.º do CPC (Que consagra a expressão do princípio jura novit curia, traduzido no brocardo latino da mihi factum, dabo tibi jus.).
Significa isto que o acordo entre as partes quanto à matéria de direito não impõe que o tribunal se dispense de verificar qual o regime jurídico aplicável, de interpretá-lo e de aplicá-lo. Em qualquer das fases dessa tarefa poderá divergir do acordo das partes, que nunca o vinculará: o tribunal pode proceder a diversa caracterização dos factos e decidir com base em norma jurídica ou entendimento diversos dos que foram alegados pelas partes (Cfr. ANTUNES VARELA, J. MIGUEL BEZERRA e SAMPAIO E NORA, Manual de Processo Civil, 2.ª edição, Coimbra Editora, pág. 659.).
Note-se, em todo o caso, que nem sequer é líquido que haja acordo entre as partes quanto à natureza do prazo fixado pelo art. 3.º da Portaria n.º 72/2010, de 4 de Fevereiro, pois, se é certo que a APA não refutou o entendimento da ora Recorrente, também nunca afirmou expressamente que a data aí referida constituía o termo de um prazo de caducidade do direito à liquidação, tendo-se apenas limitado a sustentar que a notificação da liquidação foi efectuada com respeito por essa data, o que é coisa diferente.
Não será, pois, com fundamento no acordo das partes que poderá o tribunal, seja em 1.ª instância seja em sede de recurso, dar como adquirida a natureza do prazo em causa como um prazo de caducidade.
Vejamos, pois, qual a natureza do prazo previsto naquela disposição legal.
A TGR, apesar da controvérsia em torno da sua natureza jurídica ( Sobre a natureza jurídica do tributo e sua qualificação, vide o acórdão da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo de 9 de Setembro de 2015, proferido no processo n.º 428/14, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/0b077cf11c34935d80257ec20053e86f.), é inquestionavelmente um tributo.
Os prazos de caducidade do direito à liquidação dos tributos estão previstos na Lei Geral Tributária (LGT), cujo art. 45.º, n.º 1, estabelece que «[o] direito de liquidar os tributos caduca se a liquidação não for validamente notificada o contribuinte no prazo de quatro anos, quando a lei não fixar outro».
Considerou a Impugnante, ora Recorrente, que o prazo fixado pelo art. 3.º da Portaria n.º 72/2010, de 4 de Fevereiro, é um prazo especial de caducidade do direito à liquidação, ou seja, que nos casos em que a liquidação seja a efectuar com base nos elementos regularmente declarados pelo sujeito passivo, se a APA não proceder à liquidação da TGR até 15 de Maio do ano seguinte àquele a que respeita a taxa, rectius se não proceder à notificação válida dessa liquidação dentro desse prazo, caduca o direito de proceder à liquidação. Em abono da sua tese, invoca quer a necessidade de não comprometer a possibilidade de repercutir a taxa sobre o agente produtor dos resíduos geradores da mesma – repercussão consagrada no art. 7.º da referida Portaria n.º 72/2010 e imposta pelo princípio comunitário do poluidor-pagador – quer a diversidade de natureza das liquidações que considera abrangidas pela previsão dos n.ºs 1 e 2 do art. 45.º da LGT, para concluir, em conjugação com o disposto no art. 46.º da mesma Lei, que na previsão do art. 45.º não se incluem «os actos tributários de mera adesão, praticados em conformidade com os elementos regularmente declarados pelo contribuinte e sujeitos aos prazos especiais de caducidade expressamente consagrados pelo legislador».
Se bem alcançamos a alegação da Impugnante, esta considera que, quando são praticados em conformidade com os elementos regularmente declarados pelo contribuinte, os actos de liquidação ficam sujeitos a uma disciplina de caducidade própria, que não a do art. 45.º da LGT. E a Impugnante deu mesmo exemplos de outras situações, que considera serem igualmente de «liquidação por mera adesão», que entende estarem sujeitas a prazos especiais de caducidade, designadamente os previstos no art. 77.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (CIRS) e o previsto no art. 113.º do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI).
Salvo o devido respeito, não podemos concordar.
Desde logo, devemos ter presente que a caducidade dos tributos é uma matéria que se refere à relação jurídica tributária e que, porque contende com as garantias dos contribuintes, fica sujeita ao princípio da legalidade. Recorde-se que a Constituição da República Portuguesa (CRP), de modo expresso, concretiza que, tal como a incidência, a taxa, os benefícios fiscais, as garantias dos contribuintes são determinados pela lei (art. 103.º, n.º 2). E o art. 8.º da LGT, depois de no seu n.º 1 fazer eco daquela norma constitucional, na alínea a) do seu n.º 2 dispõe: «Estão ainda sujeitos ao princípio da legalidade tributária: a) A liquidação e cobrança dos tributos, incluindo os prazos de prescrição e caducidade; […]».
Não significa isto que a criação de taxas constitua matéria incluída na reserva de competência da Assembleia da República, admitindo hoje a doutrina – que cremos maioritária – que o Governo crie taxas por decreto-lei, uma vez que em matéria de taxas, após a revisão constitucional de 1997 e de acordo com a redacção então dada à alínea i) do n.º 1 do art. 165.º da CRP («1. É da exclusiva competência da Assembleia da República legislar sobre as seguintes matérias, salvo autorização ao Governo: […] i) Criação de impostos e sistema fiscal e regime geral das taxas e demais contribuições financeiras a favor das entidades públicas; […]».), apenas está sujeita a reserva parlamentar o respectivo regime geral (Neste sentido, vide:
- CARDOSO DA COSTA, Sobre a Princípio da Legalidade das “Taxas” (e das «Demais Contribuições Financeiras»), Estudos em Homenagem ao Professor Doutor Marcello Caetano no Centenário do seu Nascimento, vol. I, Coimbra Editora, págs. 789-807.
- GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA, Constituição da República Portuguesa Anotada, vol. I, Coimbra, 2007, pág. 1095.), que continuamos a aguardar. O que nos parece, no mínimo, duvidoso é que se possa sustentar que o regime de caducidade do direito à liquidação das taxas não haja de ser incluído no regime geral das taxas e, por isso, não fique sujeito à referida reserva parlamentar. Em resumo, se, embora com dúvidas, se pode entender que, após a revisão constitucional de 1997, nada obsta à criação de taxas por decreto-lei, desde que devidamente autorizada, já se nos afigura dificilmente sustentável que a fixação do regime da caducidade da respectiva liquidação possa ser remetida para portaria.
Seja como for, a nosso ver, o n.º 6 do art. 58.º do Decreto-Lei n.º 178/2006, de 5 de Setembro, na redacção aplicável (Que é a que lhe foi dada pela Lei n.º 64-A/2008, de 31 de Dezembro (Orçamento do Estado para 2009). ) – que diz: «A liquidação e o pagamento da taxa de gestão de resíduos são disciplinados por portaria do ministro responsável pela área do ambiente» –, limitou-se a relegar para a portaria do ministro responsável pela área do ambiente a disciplina dos procedimentos de liquidação e pagamento da TGR; essa norma não autoriza de modo algum que por esse modo pudesse ser alterado o regime da caducidade da TGR, designadamente quanto aos prazos para a sua verificação, com a consequente perempção do direito de liquidar, que, na ausência de norma especial que fixe um regime próprio (e que nunca poderia ser criada por portaria), não é outro senão o consagrado no art. 45.º da LGT.
Depois, porque, contrariamente ao que sustenta a Recorrente, o art. 45.º da LGT não se refere exclusivamente às liquidações adicionais ou oficiosas; refere-se, na ausência de expressa restrição nele consagrada, a todas as liquidações, inclusive às que são efectuadas com base nas declarações dos contribuintes. Se fosse intenção do legislador deixar de fora estes últimos actos – que são, seguramente, os mais numerosos no universo de todas as liquidações no actual modelo de «privatização da administração tributária» (Expressão cunhada por CASALTA NABAIS, Direito Fiscal, Almedina, 5.ª edição, págs. 159 e 359.) –, por certo não teria deixado de o dizer expressamente (cfr. art. 9.º, n.º 3, do CC).
Aliás, a jurisprudência da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo é uniforme no sentido de que as disposições legais que nos diversos códigos fiscais fixam os prazos para a AT proceder à liquidação na sequência da oportuna apresentação da declaração pelo sujeito passivo não são prazos de caducidade do direito à liquidação; ao invés, são meros prazos ordenadores (do procedimento) ou disciplinares e, por isso, dirigidos aos serviços da administração a quem esteja cometida a liquidação, destinando-se a permitir que eventuais correcções a efectuar nesse acto (com a consequente liquidação adicional ou reforma da liquidação) possam respeitar os prazos da caducidade do direito de liquidar previstos no art. 45.º da LGT (Cfr. os seguintes acórdãos:
-de 16 de Dezembro de 2009, proferido no processo n.º 955/09, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/91c8deccf7a226e4802576a10051dd49;
- de 18 de Junho de 2014, proferido no processo n.º 1842/13, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/5a2ab0ba4773f86f80257d02003c9545;
- de 11 de Maio de 2016, proferido no processo n.º 442/15, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/-/c5c1dca14df6b07f80257fb2003b7cd7.). Quanto aos exemplos dados pela Recorrente, não pode também esquecer-se o teor do n.º 1 do art. 92.º do CIRS e do n.º 1 do art. 116.º do CIMI.
Por outro lado, se dúvidas houvesse quanto a essa natureza meramente ordenadora ou disciplinar do prazo fixado pelo art. 3.º da Portaria n.º 72/2010, as mesmas deverão considerar-se dissipadas pela intervenção do legislador, que no art. 6.º da Portaria n.º 278/2015, de 11 de Setembro (ELI: http://data.dre.pt/eli/port/278/2015/09/11/p/dre/pt/html.) – que sucedeu à Portaria n.º 72/2010, cuja substituição se impôs na sequência das alterações introduzidas ao regime da TGR previsto no art. 58.º do Decreto-Lei n.º 178/2006, de 5 de Setembro, pelo art. 16.º da Lei n.º 82-D/2014, de 31 de Dezembro (ELI: http://data.dre.pt/eli/lei/82-d/2014/12/31/p/dre/pt/html.), sendo que nos termos do n.º 16 (que corresponde ao anterior n.º 6) daquele art. 58.º, dispondo que «Os procedimentos de liquidação e de cobrança da taxa de gestão de resíduos são fixados por portaria do membro do Governo responsável pela área do ambiente» –, veio deixar registado que «A APA, I. P., verifica a informação anual prestada pelos sujeitos passivos e procede à liquidação definitiva da TGR, notificando-os até 30 de Junho do ano seguinte, por via electrónica, sem prejuízo do prazo de caducidade previsto na Lei Geral Tributária e do disposto nos artigos seguintes» (sublinhado nosso).
Nem se diga que esta disposição legal (o art. 6.º da Portaria n.º 278/2015), relativamente ao anterior art. 3.º da Portaria n.º 72/2010, assume natureza inovatória. Na verdade, com excepção de alguns pormenores, designadamente o alargamento do prazo para a liquidação definitiva, os procedimentos de liquidação e pagamento da TGR mantêm idêntica disciplina.
Por outro lado, caso se tratasse de uma alteração do regime da caducidade da TGR – que vimos já não ser possível ser efectuada por mera portaria – por certo o Preâmbulo da Portaria não deixaria de aludir a uma tão importante e radical alteração.
Tudo visto e ponderado, concluímos que o prazo de caducidade da liquidação da TGR, qualquer que seja o modo como esta seja efectuada, é o prazo geral do art. 45.º da LGT. Assim, e aceitando a Recorrente que a notificação da liquidação ocorreu, o mais tardar, em 7 de Junho de 2011 (cfr. art. 173.º da petição inicial), é manifesto que nessa data ainda não se tinha esgotado o prazo para a APA exercer o direito à liquidação da TGR referente ao ano de 2010.
Não há, pois, motivo para revogar a sentença que, embora com fundamentação que não acompanhamos na íntegra, decidiu nesse sentido.

2.2.3 CONCLUSÕES

Preparando a decisão, formulamos as seguintes conclusões:
I - Ainda que as partes se encontrem de acordo quanto ao prazo de caducidade a aplicar à situação sub judice o tribunal não fica vinculado por esse acordo e, por isso, dispensado de indagar qual o regime legal aplicável, pois o tribunal não está vinculado pela alegação das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito (cfr. art. 5.º, n.º 3, do CPC).
II - O prazo fixado pelo art. 3.º da Portaria n.º 72/2010, de 4 de Fevereiro, não é um prazo de caducidade do direito à liquidação, mas tão-só um prazo meramente ordenador ou disciplinar.
III - A liquidação da TGR, na ausência de regra especial, fica sujeita aos prazos de caducidade fixados pelo art. 45.º da LGT.


* * *
3. DECISÃO
Face ao exposto, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo, em conferência, acordam em negar provimento ao recurso.

Custas pela Recorrente.

Lisboa, 6 de Dezembro de 2017. – Francisco Rothes (relator) – Isabel Marques da Silva – Pedro Delgado.