Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0977/07.5BELRS 0466/15
Data do Acordão:11/27/2019
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:PEDRO DELGADO
Descritores:IVA
CÁLCULO PRO RATA
LOCAÇÃO FINANCEIRA
Sumário:Considerando que não foi fixada pela primeira instância a matéria de facto pertinente para a discussão da questão colocada pelas partes, há que revogar, nesta medida, a sentença recorrida e determinar a baixa dos autos ao tribunal a quo, para que a sentença seja substituída por outra que decida, após ampliação da base factual necessária para a aplicação do direito.
Nº Convencional:JSTA000P25235
Nº do Documento:SA2201911270977/07
Data de Entrada:04/22/2015
Recorrente:A........ (PORTUGAL), SA
Recorrido 1:AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo


1 – A………….. (Portugal) SA, com os demais sinais dos autos, vem interpor recurso da decisão do Tribunal de Lisboa que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida contra a decisão de indeferimento de reclamação graciosa que teve como objecto as liquidações adicionais de IVA e juros compensatórios referentes ao exercício de 2003, no montante global de € 139.463,35.

Termina as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões:
«A. A locação financeira deve ser considerada como uma prestação de serviços compósita, a qual não pode ser dividida, de forma artificial e aleatória, para efeitos de restrição do direito à dedução do IVA.
B. É errada a premissa de que parte o Tribunal a quo, segundo a qual o IVA suportado nos inputs da atividade de locação financeira (tributada em sede de IVA) é passível de ser integralmente deduzido de acordo com o método de afetação real.
C. Não existe qualquer proibição no Código do IVA e na Diretiva do IVA quanto à utilização simultânea do método de afetação real e do método do pro rata por um sujeito passivo.
D. Quando um sujeito passivo incorre em custos com recursos afetos indistintamente a setores isentos e a setores tributados, é o próprio Código do IVA, em linha com a Diretiva do IVA, que determina que a dedução do IVA é feita na proporção das operações tributadas realizadas pelo sujeito passivo, i.e. através do cálculo do pro rata de dedução global.
E. A Recorrente aplicou, em 2003, o cálculo do pro rata geral de dedução segundo e tão só de acordo com as regras indicadas no artigo 23.º n°4 do Código do IVA nesse ano de 2003.
F. A Recorrente apenas aplicou a percentagem de pro rata geral aos custos comuns gerais para os quais não foi possível estabelecer um nexo imediato direto com um setor específico e que, como tal, não foram passíveis de registo na contabilidade de forma analítica e objeto de centros orçamentais distintos.
G. A Recorrente tem o direito de deduzir todo o IVA que não se encontre a ser recuperado pelo método de afetação real, na proporção da totalidade das operações por si realizadas que conferem o direito à dedução, face à totalidade das suas operações (i.e., das que conferem e das que não conferem esse direito à dedução), nos termos do artigo 23.º n.º 4 do Código do IVA.
H. A forma de cálculo do artigo 23.º n.º 4 é imperativa e não pode ser alterada com base numa interpretação que não tem o mínimo apoio na letra ou no espírito da lei, i.e. não tem qualquer fundamento legal.
I. Ao corrigir a forma de cálculo do pro rata sem a mínima base legal que a habilite para o efeito, a Autoridade Tributária age em violação material da lei, violando o princípio da legalidade, da reserva de lei e da neutralidade do sistema do IVA.
Termos em que, com o douto suprimento de V. Exas. que desde já se impetra, deve ser dado provimento ao presente recurso, revogando a decisão recorrida, sendo julgada procedente por provada a ilegalidade da liquidação adicional de Imposto sobre o Valor Acrescentado n.º 06184369, no valor de € 118.969,55 e, bem assim, a ilegalidade da liquidação adicional n.º 06184370, no valor de € 11.050,69, correspondente à proporção dos juros compensatórios, com todas as suas consequências legais, incluindo a condenação da Autoridade Tributária no pagamento de juros indemnizatórios, nos termos do artigo 43:º da Lei Geral Tributária.»

2 – Não foram apresentadas contra alegações.

3 – O Exmº Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer a fls. 310/311 com a seguinte fundamentação, que, na parte relevante se transcreve:
«(…) No âmbito do recurso n.º 01017/12, que correu no STA, e em que estava em causa uma situação similar à, ora, em apreciação, foi colocada a seguinte questão prejudicial ao TJUE.
“Num contrato de locação financeira, em que o cliente paga a renda sendo esta composta pela amortização financeira, juros e outros encargos, essa renda paga deve ou não entrar, na sua acção plena, para o denominador do pro rata, ou, ao invés, devem, ser considerados unicamente os juros, pois estes, são a remuneração, o lucro que a actividade da banca obtém pelo contrato de locação?”
A esta questão prejudicial respondeu o TJUE (Processo C-183/13, de 10 de Julho de 2014) nos seguintes termos:
“O artigo 17, n.º 5, terceiro parágrafo, alínea c) da Sexta Directiva 77/7 388/CEE do Conselho, de 17 de Maio de 1977, relativa à harmonização das legislações dos Estados-Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado: matéria colectável uniforme, deve ser interpretado no sentido de que não se opõe a que um Estado — Membro, em circunstâncias como as do processo principal, obrigue um banco que exerce, nomeadamente, actividades de locação financeira a incluir, no numerador e no denominador da fracção que serve para estabelecer um único e mesmo pro rata de dedução para todos os seus bens e serviços de utilização mista, apenas a parte das rendas pagas pelos clientes, no âmbito dos seus contratos de locação financeira, que corresponde aos juros, quando a utilização desses bens e serviços seja sobretudo determinada pelo financiamento e pela gestão desses contratos, o que incumbe ao órgão jurisdicional de envio verificar.”
Como resulta do probatório, na fundamentação dos actos tributários sindicados, refere-se que o cálculo do pro rata efectuado pela impugnante conduz a distorções.
Todavia, salvo melhor juízo, o tribunal recorrido, apesar de já ter sopesado na sua decisão o referido acórdão do TJUE não retirou sobre a factualidade apurada, a ilação ou juízo de facto sobre se a utilização desses bens e serviços de utilização mista é ou não, sobretudo, determinado pelo financiamento e pela gestão dos contratos de locação financeira.
Ora, a aquisição dessa matéria de facto para os autos e para a qual o STA é incompetente é essencial para, em função da jurisprudência do TJUE, aferir se a parcela das rendas dos contratos relativa à amortização do capital deve ou não constar do numerador e do denominador da fracção que serve para estabelecer um único e mesmo pro rata de dedução (Neste sentido acórdão do STA, de 4 de Março de 2015, proferido no recurso n.° 081/13, disponível no sítio da Internet www.dgsi.pt).
Termos em que se impõe revogar, ao abrigo do disposto no n.º 3 do artigo 682.° do Código de Processo Civil, a sentença impugnada, para ser substituída por outra que decida após a ampliação da base factual necessária para a aplicação do direito, de acordo com o que atrás se apontou, assim, se concedendo provimento ao recurso.
Termos em que deve dar-se provimento ao recurso e revogar-se a sentença recorrida, a qual deve ser substituída por outra que decida após ampliação da matéria de facto para aplicação do direito, nos termos apontados.»

4 - Colhidos os vistos legais, cabe decidir.

5 – O tribunal recorrido fixou a seguinte matéria de facto:

1) A impugnante é uma instituição de crédito, cujo objeto social consiste na realização de operações financeiras típicas, a par de operações de locação financeira (cfr. fls. 284, do processo administrativo).
2) No âmbito das operações de locação financeira mencionadas em a), designadamente no ano de 2003, eram pagas à impugnante, pelos locatários, rendas, as quais englobam uma parte relativa a amortização financeira e outra parte relativa a juros e outros encargos, sendo esta última parte registada como proveito (cfr. fls. 294, do processo administrativo)
3) Durante o ano de 2003, a impugnante suportou custos, em relação aos quais não conseguiu determinar especificamente a que operações, das mencionadas em a), respeitavam (cfr. fls. 294, do processo administrativo).
4) Durante o ano de 2003, a impugnante utilizou três métodos para cálculo do IVA dedutível:
a) Pro rata específico, de 3%, relativo à atividade bancária;
b) Afetação real, relativo à atividade de locação financeira, quanto aos custos nos quais foi possível estabelecer um nexo direto e imediato;
c) Pro rata específico, de 30%, relativo aos custos comuns à atividade tributada e à atividade isenta, mencionados em 3) (cfr. fls. 281 e 282, 292 a 297, do processo administrativo).
5) No cálculo da percentagem mencionada em 4.c), a impugnante considerou os valores totais relativos às rendas recebidas no âmbito das operações de locação financeira (cfr. fls. a8a e 282, 292 a 297, do processo administrativo).
6) A impugnante foi objeto de ação inspetiva, em cumprimento da Ordem de Serviço n.º 01200500289, pela Direção de Serviços da Inspeção Tributária da então Direção Geral dos Impostos (cfr. fls. 273, do processo administrativo, e fls. 121, do processo administrativo — reclamação graciosa).
7) Da ação inspetiva referida em 6) resultou um Relatório de Inspeção Tributária (RIT), datado de 06.06.2006, do qual consta designadamente o seguinte:
III— 1.3.- IVA — Imposto sobre o Valor Acrescentado
III— 1.3.1. - IVA liquidado
(…)
III — 1.3.1.3. - Regularizações do Prorata Definitivo para o exercício de
2003 (Art. 23°, n° 4)
- € 124.142,14
III — 1.3.1.3.1 - Procedimento adoptado pelo contribuinte
O Sujeito Passivo, procedeu a regularizações de IVA, no Campo 40, da Declaração Periódica de Substituição de IVA, referente ao mês de Dezembro de 2003, no montante total de €. 187.974,75, respectivamente €155.177,68 e € 32.797,07, relativamente ao prorata dos custos comuns do 30% e da prorata da actividade do banco de 3%.
No decurso do exercício em análise, o Banco adoptou o seguinte regime para efeitos de IVA
Dedutível:
Não efectuou qualquer dedução de IVA com referência à sua actividade bancária;
Efectuou afectação real, para efeitos de dedução de IVA, com referência à sua actividade de leasing;
O A........ Portugal, SA tem vindo a adoptar este procedimento no que se refere ao IVA Dedutível, que consiste em não ter efectuado qualquer dedução de IVA ao longo do ano para a actividade bancária, subsistindo algumas despesas comuns em que não houve dedução de imposto.
No final do exercício o Banco não efectua qualquer regularização de IVA nos termos do Art° 23° do (CIVA).
Contrariamente ao procedimento que tem seguido, o Banco entrega uma declaração de substituição, referente a Dezembro de 2003, a fim de proceder à regularização de IVA, para o exercido de 2003, com base no cálculo do prorata definitivo, previsto no Art°. 23° do CIVA. Efectua o apuramento do prorata relativo à actividade bancária e do prorata geral a aplicar aos custos comuns, respectivamente de 3% e 30% (cf. Anexo n°26, Folhas 1, 6 e 7).
No cálculo do prorata geral (Custos Comuns) (Cfr. Anexo n° 26, Folha 6) efectua também a inclusão da actividade leasing, no montante €22.834.474,46.



De salientar que existem sempre despesas comuns e que há impossibilidade prática de determinar a que actividade dizem respeito. Nestes casos o imposto suportado deverá ser deduzido segundo o método da percentagem de dedução ou prorata.
As operações resultantes de uns contratos de locação financeira representam um tipo de operação, de entre vários, praticados pela empresa. Para este tipo de operação determina a alínea i) do n°2 do Art° 16° do IVA que o valor tributável é o valor da renda recebida ou a receber do locatário.
A renda, no âmbito dos contratos de locação financeira, decompõe-se em, amortização financeira e juros ou outros encargos. Esta componente amortização financeira corresponde à divisão do valor do bem (capital) pelo período do contrato e segundo a regra de dedução da afectação real o imposto suportado bens é totalmente dedutível.
A componente juros e outros encargos – que também compõe a renda, corresponde ao valor acrescentado pela entidade financeira e é registada nas respectivas contas de proveitos.
Podemos utilizar a proporcionalidade existente entre os dois tipos de operações (com e sem direito a dedução) para determinar ou estimar a imolação dos inputs aos dois tipos de operações.
- No entanto, no cálculo de referida proporção apenas deverá entrar o valor que excede o valor dos custos utilizados nas operações tributadas, já que através da aplicação do método de afectação real os custos específicos são directamente imputados e o respectivo IVA é integralmente dedutível.
Com efeito, será apenas aquele valor que se encontra em conexão com os custos comuns utilizados indistintamente nas operações tributadas e não tributadas.
Assim no cálculo da percentagem de dedução (prorata) apenas poderá ser considerado o montante correspondente aos juros e outros encargos relativos à actividade de leasing.
III - 1.3.1.3.2. Regularização do prorata
A empresa, no cálculo da referida proporção, considerou no numerador e no denominador da fracção a amortização financeira, no montante de €20.929.519,66, componente da renda no âmbito dos contratos de locação financeira.
Não considerou no denominador da fracção o montante de € 87.347,50, referente a proveitos resultantes a títulos de investimento e participações, conforme consta do balancete a 31/12/2003. Este montante não tem significado para efeitos do cálculo do prorata.
A prática utilizada pela empresa de incluir no cálculo do prorata as componentes “amortização financeira” e “juros de títulos de investimento”, conduziu a uma percentagem de dedução muito superior aquela que corresponde ao real peso das operações com direito à dedução no conjunto das operações praticadas e provocou distorções significativas no apuramento do imposto dedutível relativo aos denominados custos comuns.
É o que se verifica na análise dos elementos de suporte aos cálculos do prorata geral, em que o Banco considera como operações tributadas da actividade leasing o montante de total €22.834.474,46 (Cfr. Anexo nº 26, Folha 5). Este valor corresponde às prestações pagas, que inclui quer a amortização financeira quer na juros.
Ora para efeitos do cálculo da percentagem da dedução (prorata), nos termos do n°4 do Art° 23.º do CIVA, e tal como atrás já foi referido, apenas se poderá considerar o montante correspondente a os juros e outros encargos relativos a actividade de leasing no montante de €1.904.954,80.
Com efeito, a empresa apurou um prorata geral de 30% (Cfr. Anexo n° 26, Folha 6). O resultado da fracção, depois de expurgada a amortização financeira, bem como a inclusão dos rendimentos de títulos, passa a ser de 6% (pro-rata).
Deste modo procedemos à correcção do prorata geral de 30% para 6%, resultando assim uma correcção ao valor regularizado pelo Sujeito Passivo de € 155.177,68 para € 31.035,54 com referência à aplicação ao IVA Dedutível relativo aos bens e serviços comuns adquiridos ao longo do ano, pelo que a diferença a corrigir é de € 124.142,14, uma vez que o se mantém o pro rata da actividade bancária de 3% (€ 32.797,07), conforme se discrimina no quadro seguinte



IX Direito de Audição

Foi efectuada notificação, e enviado o Projecto de Conclusões do Relatório de Inspecção ao exercício de 2003, através do Oficio nº 01476, de 18.5.2006, da Direcção de Serviços de Inspecção Tributaria, que foi recebido pelo contribuinte em 05 de Junho de 2006. Nos termos do nº3 do Art.º 60º do Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária e nº 1 do Art.º 60º, da Lei Geral Tributária, o contribuinte exerceu o Direito de Audição.
Analisado o documento mencionado e considerando os argumentos/documentos apresentados pelo Sujeito Passivo, forrou alterados os seguintes pontos do Projecto de Conclusões:
(…)
DC - 1.3 — IVA— Imposto s/ e Valor Acrescentado

DC - 1.3.1 — IVA Liquidado

(…)

IX — 1.3.1.3. - Regularizações do Prorata Definitivo para o exercício de 2003 (Art°. 23°, n° 4) - €.118.969,55
IX 1.3.1.3.1 - Procedimento adoptado pelo contribuinte
IX - 1.3.1.3.2. Regularização do prorata (Art° 23, nºs 4 e 6 do CIVA)
O Sujeito Passivo, em sede de Direito de Audição, não contestou o fundamento da correcção efectuada em sede de IVA. Procedeu somente à contestação do montante em causa que pretende alterar de € 124.142,14 para €.118.969,55, em virtude de não concordar com os valores considerados para efeitos do cálculo do prorata geral.
Refere o Sujeito Passivo que, para o cálculo da percentagem de dedução do prorata, efectuado pela Administração Fiscal (6%), não foram considerados na fracção correspondente os montantes registados nas contas “80287— Juros de Credito Vencido” €45.873,36 e “893 — Reembolso de Despesas” - €160.639,11 (Pontos 31 a 40 do Direito de Audição €206.512,47), ambos os montantes afectos à actividade de leasing, sobre os quais incide IVA.
Analisados os elementos apresentados, verificamos ser de atender à pretensão do Sujeito Passivo, pelo que a correcção inicial de €124.142,14 (com a utilização da prorata de 6%), altera-se para €. 118.969,55 (com a utilização da prorata de 7%).
São os seguintes os valores para efeitos do cálculo do prorata:







...“ (cfr. fls. 273 a fls. 57, do processo administrativo, a fls. 121 a 154, do processo administrativo — reclamação graciosa).
8) Na sequência do RIT mencionado em 7, foram emitidas, pela AT, em nome da impugnante, as seguintes liquidações, relativas ao ano de 2003, tendo como data limite para pagamento voluntário 30.09.2006:
a. Adicional de IVA n° 06184369, no valor de 127.604,84 Eur.;
b. De juros compensatórios, n.º 06184370, no valor de 11.858,51 Eur. (fls. 28 e 29).
9) As liquidações mencionadas em 8) foram pagas a 29.09.2006 (fls. 28 C 29).
10) Através de documento, que deu entrada na direção de finanças de Lisboa, a 10.01.2007, a impugnante apresentou reclamação graciosa das liquidações mencionadas em 8), na sequência do que foi autuado, a 03.04.2007, o procedimento de reclamação graciosa nº 3247200704001591 (cfr. fls. nº 9 a 113, do processo administrativo reclamação graciosa).
11) No âmbito do procedimento mencionado em 10), após elaboração de projeto de indeferimento e consequente exercício do direito de audição pela impugnante, foi elaborada informação, na direção de finanças de Lisboa, datada de 19.10.2007, da qual consta designadamente o seguinte:
DOS FACTOS E DO DIREITO
1. Antes de nos pronunciarmos, refira-se que o imposto, bem como os correspondentes juros compensatórios foram pagos em 29.09.2008, i.e., dentro do prazo de cobrança voluntária (cfr. doc. 1 em anexo à pi).
2. Em 07.12.2004, a recorrente remeteu aos serviços do IVA uma declaração periódica P2 (cfr. fls.115) respeitante ao mês de dezembro de 2003, através da qual apurou um débito no montante de € 31.667,50.
3. No campo 40 dessa mesma DP, a reclamante declarou como regularização de imposto a seu favor o montante de € 187 974,75.
4. Porém em 07.06.2006 e para o mesmo período o sujeito passivo apresentou uma P3 de substituição (cfr. fls. 116), em cujo campo 40 fez inscrever o valor € 69.005,20 correspondendo este ao que efectivamente como adiante veremos, poderia ter sido deduzido.
5. razão pela qual foi emitida a liquidação adicional (no que se refere a esta correção), pela diferença entre os valores inscritos em ambos os campos 40 das duas DP s i.e pela quantia de € 118.969,55.
6. Cumpre pois, começar por esclarecer que a empresa e, de harmonia com o art.º 3º do Regime Geral das instruções de crédito, aprovado pelo Decreto-lei 298/92, de 31 de dezembro (cfr. doc. de fls. 117 a 118) uma instituição de crédito.
7. E tem como objectivo principal a realização de operações financeiras na sua maioria isentas de imposto, referindo os SIT a fls. 11 do relatório, que a Contribuinte tem vindo a especializar-se em operações nos mercados de títulos operações nos mercados monetários, serviços especializados de consultoria e operações de crédito, de locação financeira e operações de corretagem.
8. A locação financeira de que nos interessa agora ocupar, enquanto prestação de serviços e uma actividade sujeita a imposto e dele não isenta, razão pela qual a Sociedade se encontra enquadrada, para efeitos de IVA, no regime normal mensal (cfr. fls. 112-A).
9. No decurso da acção inspectiva os SIT puderam constatar que a reclamante sustentada no método da afectação real não tinha efectuado qualquer dedução de IVA relativamente à actividade bancária, tendo em contrapartida, quanto à actividade de leasing, procedido à dedução de imposto na sua totalidade.
10. Acresce o relatório que a reclamante apesar de sempre ter optado por não deduzir qualquer imposto quanto às despesas comuns aos dois sectores de actividade veio na declaração periódica de substituição referente ao mês de dezembro de 2003, cujo print podemos consultar a fls. 115 dos autos, a inscrever no campo 40 um valor total decorrente da soma de pro rata relativo à actividade bancária, por conseguinte, específico no valor de € 32.797,07 (cfr. fls. 45) e do pro rata geral aplicado aos custos comuns, no valor de € 155 177, 68 (cfr. fls. 45)
11. Uma vez analisada a fracção do pro rata geral foi possível concluir que a recorrente (cfr. fls. 46) fizera incluir no seu numerador, bem como no seu denominador o montante de € 22.843.474,46, respeitante a operações de leasing tributadas, o que apurasse um valor de 30% (29,11%).
12. Não aceitando a inclusão de tal valor na fracção, os SIT reformularam o cálculo do pro rata, tendo assim concluído por uma percentagem muito inferior de dedução de imposto ou seja um pro rata de 6% (5,82%), valor que, no entanto em consequência do direito de audição, veio a ser corrigido para 7% (cfr. fls. 30 do relatório).
13. a questão, pois, que aqui nos cumpre apreciar é unicamente a que se prende com a inclusão ou sua negativa do valor de € 22.834.474,48 respeitante a operações tributadas – actividade de leasing na fracção do pro rata. Vejamos.
14. A actividade da sociedade reclamante, tal como foi enunciada está isenta de IVA, já que as operações resultantes do exercício dessa actividade financeira se enquadram na linha limitativa das operações referidas no nº 28 do art.º 9º do código do IVA.
15. Em regra porque podem haver operações que embora indissociáveis das financeiras o não seja em sentido puro, não beneficiando portanto de isenção de imposto, não poderá a reclamante, por força do disposto no nº1 do art.º 20º do mesmo Código, deduzir o imposto que tenha incidido sobre bens ou serviços adquiridos, importados ou utilizados para o exercício dessa actividade financeira.
16. Já relativamente as prestações de serviços de locação financeira sujeitas a imposto nos termos do art.º 4.º do CIVA e dele não isentas tem a reclamante, de acordo com os art.ºs 19.º a 25.º do mesmo diploma legal direito à dedução do imposto suportado nos inputs afectos a essas mesmas operações.
17. Em razão dessa actividade mista os sujeitos passivos que efectuam simultaneamente operações tributáveis que conferem o direito à dedução e operações isentas que não conferem esse direito denominam-se sujeitos passivos mistos.
18. é por isso que não sendo dedutível todo o imposto suportado é preciso determinar qual o valor do IVA que o poderá ser. Ora bem, um sujeito passivo misto poderá fazê-lo através do método de afectação real ou do método pro rata.
19. Com efeito, prevê o nº2 do art.º 23.º do CIVA que os contribuintes possam efectuar a dedução do imposto a que tenham direito segundo a afectação real da totalidade ou parte dos bens ou serviços utilizados.
20. Este método da afectação real permite a dedução integral do imposto suportado nas aquisições destinadas a operações tributáveis que confiram o direito à dedução (exceptuando os casos previstos no art.º 21.º) é excluir totalmente do direito à dedução as aquisições destinadas a operações que não conferem esse direito.
21. Sendo, indiscutivelmente, o método que melhor se coaduna com as situações de facto e que seria desejável que todos os sujeitos passivos por ele optassem sempre que possível, sendo também esse o caminho apontado pela Directiva Comunitária que versa sobre esta matéria.
22. Foi também este o método de dedução do imposto escolhido pela reclamante quanto à Actividade de Locação Financeira.
23. O contrato de locação financeira nunca é demais recordar, consubstancia uma operação tributada em imposto sobre o valor acrescentado. Trata-se de uma prestação de serviços enquadrada no art.º 4º do CIVA.
24. Na verdade, o conceito de prestação de serviços dado pelo art.º 4º de natureza económica e ultrapassando assim a definição jurídica dada pelo art.º 1154.º do Código Civil tem um carácter residual, sendo consideradas como prestações de serviços as prestações efectuadas a título oneroso que não constituam transmissões ou importações de bens.
25. Por ser uma operação sujeita e não isenta de imposto é possível, nos termos dos art.ºs 19.º e ss do CIVA, a dedução integral do imposto suportado nos seus inputs.
26. Pelo que, quando o sujeito passivo, face à necessidade de apurar o seu imposto dedutível, optou pelo método da afectação real quanto a este sector de actividade (locação financeira) isso significou que só podia deduzir o imposto suportado com os inputs dessa actividade, o que, naturalmente equivale a dizer que não podia ser dedutível segundo este método, o imposto suportado com outra actividade que não essa.
27. Isto significa que o legislador quando facultou aos sujeitos passivos a adopção de tal método cuidou de compartimentar os vários sectores de actividade por forma a que o imposto dedutível de um deles não viesse a afectar o imposto não dedutível de outro ou a ser por ele afectado.
28. Neste quadro não é pois, despicienda a justificação da correcção de imposto pelo técnico responsável pela acção inspectiva, designadamente quando este, a nosso ver de forma pertinente, decompõe a renda percepcionada pela reclamante enquanto contraprestação da locação financeira em amortização financeira e, em juros legais.
29. Na realidade esta destrinça tem um significado que é este, não se discute que o valor tributável seja um só, tal como o alegado, por força da alínea h) do nº2 do art.º 16.º do CIVA que dispõe que o valor tributável é o valor da renda recebida do locatário.
30. Todavia só a amortização financeira corresponde stricto sensu à contraprestação da locação financeira. Já que o juro decorrente dessa actividade não é, em rigor, exclusivo dessa actividade, mas comum a uma actividade bancária mais abrangente.
31. Repare-se que o que aqui se trata é de encontrar um critério objectivo que permita traduzir com alguma fidelidade o peso das operações isentas no universo das operações sujeitas.
32. E nesse sentido, consideramos que o critério que foi perpetrado pelos SIT i.e., atendendo à decomposição das operações por forma a restringir o universo das operações financeiras, que não possam, de todo, ser imputáveis à actividade de Leasing, foi um bom critério.
33. Já o Pro rata é o método que, regra geral, se aplica às empresas mistas que exercem actividades económicas distintas (sujeitas e isentas), através do qual se apura a percentagem correspondente ao montante anual das operações que dão lugar à dedução nos termos do n° 1 do Art°23° do CIVA.
34. O que se alcança através da percentagem dada pelo quociente entre o montante anual líquido de imposto das transmissões de bens e prestações de serviços que conferem direito à dedução e o montante anual de todas as operações efectuadas pelo sujeito passivo líquido de imposto, incluindo as operações isentas ou fora do campo da incidência, tal como preceitua o n° 4 do Art° 23°.
35. A Reclamante optou por adoptar este método, especificamente quanto ao sector da Actividade Bancária. E encontrou um pro rata de 3%. Valor que veio a ser confirmado pelos Serviços, como se pode ler a fls 23 do Relatório, cujo cálculo, aliás, por facilidade de exposição, iremos demonstrar em Anexo a esta informação (cfr fls. 127).
36. Mas para além de a Contribuinte ter optado pelo método da afectação real quanto ao sector da locação financeira e pelo método do Pro Rata quanto ao sector bancário, tornou-se também necessário apurar a percentagem dedutível quanto aos custos comuns às duas actividades.
37. O que encontra justificação no facto de os bens ou serviços adquiridos terem sido utilizados para efectuar, indistintamente, operações tributáveis com direito à dedução e operações isentas que não conferiam esse direito.
38. Pelo que a Reclamante apurou, igualmente, um Pro rata geral para apurar a percentagem de imposto dedutível suportado nesses custos comuns.
39.A este propósito há que relevar o explanado no ofício n° 17076, da Direcção de Serviços do Imposto sobre o Valor Acrescentado que a propósito vem esclarecer no seu item n° 2 o que a seguir se transcreva:” Verifica-se também que algumas empresas que declararam a afectação real de todos os bens e serviços utilizados, adquirem na realidade alguns bens e serviços cuja utilização é comum aos outros sectores de actividade, pelo que não poderá deixar de ser aplicado ao imposto contido nessas aquisições um “pro rata” ou percentagem de dedução.
40. Foi justamente o que fez a Reclamante. Mas não podia ter incluído na fracção desse Pro Rata o valor da actividade de Leasing no montante de € 20.723.007,19 (€ 22.834. 474,46 - € 2.111.467,27 (juros e outros encargos), já que o IVA suportado nos inputs desta actividade era integralmente dedutível de acordo com o método da afectação real adoptado.
41. Se nos é permitido, a sujeição da actividade de Leasing ao método pro rata é uma falsa questão na medida em que não apurar uma percentagem de dedução quando o método adoptado pela Contribuinte quanto ao sector da locação financeira, foi o da afectação real que permite a dedução integral do imposto suportado.
42. Deste modo, não podendo estar as mesmas operações simultaneamente afectas a dois métodos distintos de apuramento do IVA dedutível, foi corrigido - e bem - o Pro Rata Geral de Custos Comuns de 30% para 6%, e após o direito de audição exercido pela Contribuinte para 7%, cujo cálculo, igualmente demonstraremos em documento anexo à presente informação. (cfr. fls 127).
43. Recapitulando temos que:
• A Reclamante exerceu no exercício de 2003 duas actividades distintas: a actividade bancária e a actividade de locação financeira.
• A primeira abarca operações sujeitas a imposto e dele não isentas e outras operações sujeitas a imposto dele isentas. A segunda é tributada e não isenta de imposto.
• Como tal o imposto suportado com os inputs da primeira é, ou não, dedutível em função da natureza das operações praticadas, ao contrário do imposto suportado com os inputs da segunda que é totalmente dedutível.
• A Contribuinte optou por utilizar o método da afectação real por forma a apurar do imposto dedutível tendo deduzido na totalidade os custos suportados com a actividade de locação financeira e não deduzido qualquer valor de custos suportados com a actividade bancária.
● Inicialmente optou por não deduzir qualquer imposto suportado nos custos comuns às duas actividades.
• Todavia com a Declaração Periódica P2 respeitante ao mês de Dezembro de 2003 a Contribuinte inscreveu no campo 40 montante de € 187.974,75, e no Campo 40 da P3 o montante de € 69.005,20.
• Este valor resultou em primeiro lugar de ter sido utilizado pelo sujeito passivo um Pro Rata especifico para a actividade bancária de 3%, valor que veio a ser confirmado pelos Serviços.
• No tocante à actividade de locação financeira a Reclamante manteve o método da afectação real, deduzindo na totalidade o imposto suportado com os seus inputs.
● Mas para aquele valor de € 187.974,75, concorreu ainda o Pro Rata geral que a Reclamante calculou face à necessidade de apurar o imposto dedutível relativamente aos custos comuns àquelas actividades. (cfr. fls. 57).
• Nesta fracção promovida para esse mesmo efeito a Reclamante optou por incluir quer no seu numerador, quer no seu denominador o valor respeitante aos custos suportados com a actividade de locação financeira (cfr. fls. 56).
• Os Serviços não aceitaram essa inclusão na medida em que o Contribuinte ao utilizar a afectação real quanto à actividade de locação financeira pudera deduzir o imposto na totalidade.
Assim, se a Contribuinte deduzira na totalidade esse valor não poderia vir, por outro lado, a influenciar a fracção do pro rata,
• É verdade que no cálculo do Pro Rata devem fazer parta todas as operações praticadas pelo sujeito passivo, sujeitas e isentas.
• Mas isso só se processa desse modo caso o Contribuinte não tivesse optado pelo método da afectação real quanto a um sector de actividade.
• Se, por exemplo, o sujeito passivo em vez de ter optado pelo método da afectação real tivesse ab initio optado pelo método pro rata, naturalmente que poderia incluir na fracção o montante respeitante às operações de locação financeira.
• Agora o que, de todo, não podia fazer era, face à possibilidade de deduzir integralmente esse valor segundo a afectação real, fazer simultaneamente, constar esse valor da fracção pro rata, porque isso naturalmente consubstanciaria uma distorção significativa da tributação que é justamente o contrário do que se pretende com a adopção de qualquer um destes métodos de dedução do imposto.
• Razão pela qual a correcção do Pro Rata de 30% dos custos comuns calculado pelo Contribuinte foi, e bem, alterada para a percentagem de 7% que traduz uma regularização obrigatória de imposto a favor do Estado, uma vez regularizado o montante de € 69.005,20, no montante de € 118.969.55 (cfr fls. 24 do Relatório).
1. Realizada a instrução do processo e apreciada a matéria controvertida, foi prestada a respectiva informação tendo sido efectuado o correspondente projecto de decisão da reclamação em 08.08.2007.
2. O mesmo foi comunicado através de notificação efectuada à Reclamante por carta registada no dia 04.09.2007 (ver documentos constantes a fls. 128 e 129 do presente processo) para exercer por escrito o direito de audição prévia previsto no art. 60° da Lei Geral Tributaria dando-se assim cumprimento ao estabelecido no n° 5 do citado artigo e lei.
3. Para o exercício daquele direito, foi estabelecido o prazo de 15 dias contados desde o 30 dia útil após aquele registo.
4. No decurso do qual vem a Reclamante, mediante petição que se junta de fls.140 a fls. 155 dos autos cuja leitura para uma profícua compreensão deverá ser feita em articulação com o projecto de decisão, expor do seguinte:
5. De novo vem a Reclamante alegar que não obstante ter adoptado o método de afectação real para o apuramento do imposto dedutível suportado nos inputs da actividade de locação financeira e o método Pro Rata para apuramento do imposto dedutível suportado nos inputs da actividade bancária, teve necessidade de utilizar um pro rata específico quanto aos inputs suportados com a aquisição de bens indistintamente afectos quer à actividade de locação financeira, quer à actividade bancária.
6. Pelo que vem manifestar a sua incompreensão pela impossibilidade de fazer incluir no cálculo desse pro rata comum as operações respeitantes ao sector de locação financeira,
7 Até porque aduz, o Código do IVA não proíbe a utilização simultânea do método da afectação real e do método do pro rata por um sujeito passivo.
8. Invoca ainda os princípios da legalidade e da prossecução do interesse público aos quais, no seu entender, deve AT obedecer.
9. Reclamando, por fim, o princípio da neutralidade fiscal que em seu entender lhe confere a legitimidade em querer libertar-se inteiramente do ónus do IVA pago no âmbito das suas actividades económicas.
10. Vejamos. Nunca esteve em causa a legitimidade da Reclamante na adopção de um pro rata comum aos dois sectores de actividade.
11. Senão, tenhamos em atenção o que se informou no Relatório: A renda dos contratos de locação financeira decompõe-se em amortização financeira e juros ou outros encargos Esta componente — amortização financeira corresponde ao valor do bem (capital) pelo período do contrato e segundo a regra de dedução de afectação real o imposto suportado na aquisição dos respectivos bens é totalmente dedutível.
“A componente — juros ou outros encargos — que também compõe a renda corresponde ao valor acrescentado pela entidade financeira e é registada nas respectivas contas de proveitos”.
Podemos utilizar a proporcionalidade existente entre os dois tipos de operações (com e sem direito a dedução) para determinar ou estimar a afectação dos ínputs aos dois tipos de operações.”
No entanto, no cálculo da refenda fracção apenas deverá entrar o valor que excede e valor dos custos utilizados nas operações tributadas, já que através da aplicação do método, afectação real os custos específicos são directamente imputados e o respectivo IVA é integralmente dedutível.” (o sublinhado é nosso).
“Com efeito, será apenas aquele valor que se encontra em conexão com os custos comuns utilizados indistintamente nas operações tributadas e não tributadas.”
- Assim, no cálculo da percentagem de dedução (pro rata) apenas poderá ser considerado o montante correspondente aos juros e outros encargos relativos a actividade de leasing.
12. O que está em causa no caso que apreciamos respeita à possibilidade de, na determinação da afectação real de um bem misto, a mesma poder ser expressa por uma proporção.
13. Proporção que já não se baseia no volume de negócios gerados a jusante mas destina-se a representar o grau de utilização dos bens e serviços nas operações que possibilitam a dedução do IVA e nas outras que não a possibilitam a partir de outros critérios que visem determinar o seu nível de utilização numa circunstância e na outra.
14. No projecto de decisão, de harmonia com o informado pelos SIT reiterámos que na fracção do pro rata dos custos comuns aos dois sectores de actividade o sujeito passivo nunca poderia ter incluído o valor da actividade de Leasing no montante de € 20.723.007,19 € 22.834.474,46 € 2.111.467,27 (juros e outros encargos) justamente porque o IVA suportado nos inputs dessa actividade já tinha sido de acordo com o método da afectação real por si adoptado, integralmente dedutível.
15. A este critério presidiu justamente a preocupação de aceitar uma proporção que tivesse o mínimo de adesão à realidade material.
16. Na verdade, os sujeitos passivos que optem pela afectação real, devem ter presente que a sua prática é susceptível de criar “distorções significativas de tributação”, o que legitima a AT e corrigir por força o n° 2 do Art° 23° do CIVA, a dedução sempre que essa distorção se revele significativa.
17. Com esta norma o legislador quis acautelar uma proporção entre as actividades o mais fidedigna possível da realidade económica em causa e fê-lo precisamente atribuindo ao órgão inspectivo a faculdade de casuisticamente corrigir essa situação.
18. Que o deverá fazer ponderando algumas variáveis, a saber: a natureza dos bens ou serviços cuja dedução do IVA se pretende determinar, a natureza das actividades exercidas, a forma como a empresa que as exerce se encontra organizada e o tipo de utilização que e dado pois empresa aos bens e serviços em causa tudo que tem de ser avaliado em concreto.
19. É, pois, a partir desta análise que se formulará o juízo e a consequente convicção de tais distorções, advindo em todo o caso a pertinência de uma cognoscível fundamentação que permita dar a conhecer aos sujeitos passivos das razões que estiveram subjacentes às correcções de imposto
20. In casu os SIT fundamentaram bem a sua correcção. É que a actividade de locação financeira sendo uma actividade tributada permite a dedução integral do imposto dedução que a Reclamante exerceu de acordo com o método da afectação real.
21. E os custos inerentes a actividade de locação financeira são, por força desse mesmo método, custos específicos, por conseguinte, de utilização exclusiva nessa actividade.
22. Ao consubstanciarem custos específicos não podem as operações a que eles são imputáveis simultaneamente concorrer para o apuramento do IVA dedutível dos custos comuns indistintamente utilizados nas duas actividades porque isso como facilmente se compreendera distorceria completamente a realidade tributária do sujeito passivo
23. Pelo que na medida em que a parte dos inputs afecta à realização das operações financeiras fora já objecto de prévia separação através da aplicação do método da afectação real terão as mesmas de ser excluídas do cálculo da proporção.



12) Na sequência da informação mencionada em 11) e de pareceres de concordância, de 23.10.2007 e 07.11.2007, foi proferido despacho, pelo director de finanças adjunto da direcção de finanças de Lisboa, a 12.11.2007, com o seguinte teor:
“Concordo, pelo que convolo em definitivo o projecto de decisão e com os fundamentos constantes daquele, bem como da presente informação e respectivos pareceres, indefiro o pedido da reclamante (cfr. fls. 35, dos autos, e fls. 254 e 254 verso, do processo administrativo – reclamação graciosa)».


6. Do objecto do recurso
A questão objecto do presente recurso consiste em saber se padece de erro de julgamento a sentença recorrida ao considerar que nas operações de locação financeira, nomeadamente quando estão em causa simultaneamente operações que conferem e operações que não conferem direito a deduzir (operações mistas), o IVA incide sobre o valor da contrapartida recebida ou a receber do locatário, ou seja sobre a renda, e assim, no cálculo da percentagem de dedução ou pro rata aplicável, é apenas o valor da parcela juro de que é composta a renda recebida ou a receber do locatário que deve constar do numerador e no denominador da fracção que constitui aquela percentagem, e não o valor total das operações.
Estava em causa o procedimento preconizado pela Administração Tributária e Aduaneira ao considerar que para o apuramento da percentagem de dedução segundo o método do pro rata não concorre a parcela de capital constante das rendas pagas pelos clientes da impugnante no que respeita ao desenvolvimento da sua actividade de locação financeira, mas apenas a parte das rendas que corresponde aos juros, procedimento esse que a sentença exarada a fls. 175/208 considerou ter cabimento legal, e ser mais consentâneo com a disciplina do artigo 23.º do CIVA.
A decisão recorrida, ponderando a jurisprudência do Acórdão C-183/13 de 10 julho do TJUE e do Acórdão deste Supremo Tribunal Administrativo de 29.10.2014 proferido no recurso 1075/13, que fora suspenso face ao pedido de reenvio prejudicial que deu origem ao referido Acórdão do TJUE, considerou «que o entendimento da AT, de que, no cálculo do pro rata de dedução em causa (onde está em causa o facto de o juro e demais encargos, que integram a renda paga pelos locatários, consubstanciarem, apenas eles, o proveito obtido pela locadora, como resulta do RIT e não é posto em causa pela impugnante), não deve ser considerado o valor das rendas relativo à amortização financeira não só não atenta contra os princípios enformadores do IVA, como se revela mais adequada à sua prossecução, considerando a própria ratio do art.° 23., do CIVA.»

Mais se entendeu que «tendo os custos específicos e individualizáveis, relativos à atividade de locação financeira, sido deduzidos, por aplicação do método da afetação real, como a própria impugnante refere, e atendendo a que, nas correções em causa, se está perante custos comuns às atividades isenta e tributada e a que a parte da renda relativa a juros e outros encargos é aquela que consubstancia o proveito dos contratos de locação, assume-se como critério mais consentâneo com a disciplina do art° 23° do ClVA, o critério aplicado pela AT.
Concluiu assim o Tribunal Tributário de Lisboa que não se verifica qualquer erro sob os pressupostos de facto e de direito, tratando-se, nos termos já evidenciados, de uma solução que o próprio CIVA (e a Sexta Diretiva, que este, à época, transpusera) admitia. Por outro lado, esta permite assegurar a maior neutralidade possível do imposto, na medida em que potencia evitar grandes distorções, uma vez que tem em conta apenas a parte da renda que corresponde a efetiva contrapartida dos contratos em causa (cfr. n.° 4, do acórdão Banco Mais vs. Fazenda Pública, supra). – cf. sentença a fls. 207/208.

Não conformada com o assim decidido alega a recorrente que a forma de cálculo do artigo 23.º n.º 4 é imperativa e não pode ser alterada com base numa interpretação que não tem o mínimo apoio na letra ou no espírito da lei, i.e. não tem qualquer fundamento legal.
Mais alega que apenas aplicou a percentagem de pro rata geral aos custos comuns gerais para os quais não foi possível estabelecer um nexo imediato directo com um sector específico e que, como tal, não foram passíveis de registo na contabilidade de forma analítica e objecto de centros orçamentais distintos.
E que tem o direito de deduzir todo o IVA que não se encontre a ser recuperado pelo método de afectação real, na proporção da totalidade das operações por si realizadas que conferem o direito à dedução, face à totalidade das suas operações (i.e., das que conferem e das que não conferem esse direito à dedução), nos termos do artigo 23.º n.º 4 do Código do IVA.
Conclui que, ao corrigir a forma de cálculo do pro rata sem a mínima base legal que a habilite para o efeito, a Autoridade Tributária age em violação material da lei, violando o princípio da legalidade, da reserva de lei e da neutralidade do sistema do IVA.


A questão essencial no presente recurso é, pois, a de saber se num contrato de locação financeira, em que o cliente paga a renda, sendo esta composta pela amortização financeira, juros e outros encargos, essa renda paga deve ou não entrar, na sua acepção plena, para o denominador do pro rata, ou, ao invés, devem ser considerados unicamente os juros, pois estes, são a remuneração, o lucro que a actividade da banca obtém pelo contrato de locação.

7. A questão nestes termos suscitada é, como se referiu na sentença recorrida, idêntica à que foi objecto do Acórdão do TJUE de 10.07.2014, proferido no processo C-183/13, na sequência de pedido de reenvio suscitado no âmbito do recurso 1017/12 deste Supremo Tribunal Administrativo.
Estava ali em causa o litígio entre a Administração Tributária e uma instituição bancária que exercia actividades de locação financeira no sector automóvel e outras actividades financeiras.
Concretamente estava em causa saber, tal como no caso subjudice, quais as situações em que a Administração tributária pode restringir a aplicação do método do pro rata, no caso de tal método provocar distorções significativas na tributação.
No caso ali em análise a instituição bancária havia calculado o seu pro rata de dedução com base numa fracção que comporta, no numerador, as remunerações recebidas relativamente às operações financeiras que conferiam direito à dedução, às quais foi acrescentado o volume de negócios gerado pelas operações de locação financeira que conferiam direito à dedução, e, no denominador, as remunerações recebidas relativamente a todas as operações financeiras, às quais foi acrescentado o volume de negócios gerado por todas as operações de locação financeira.
Também ali a Administração Tributária considerou, no que respeita às operações de locação financeira, que o facto de ter utilizado como critério a parte do volume de negócios gerada pelas operações que conferiam direito à dedução, sem excluir desse volume de negócios a parte das rendas recebidas que compensavam o custo de aquisição dos veículos, tinha tido por efeito falsear o cálculo do pro rata de dedução.
E também naquele caso a Fazenda Pública alegara que o litígio não tem por objecto a interpretação do n.° 4 do artigo 23.° do CIVA, que precisa a regra de dedução prevista no n.° 1 desse artigo, mas a possibilidade de a administração exigir que um sujeito passivo determine o alcance do seu direito à dedução segundo a afectação dos bens e dos serviços em causa, a fim de sanar uma distorção significativa na tributação.
Em face de tal litígio o acórdão do TJUE apreciou a questão prejudicial que lhe foi suscitada por este Supremo Tribunal Administrativo e que era a de saber se «num contrato de locação financeira, em que o cliente paga a renda, sendo esta composta pela amortização financeira, juros e outros encargos, essa renda paga deve ou não entrar, na sua acepção plena, para o denominador do pro rata, ou, ao invés, devem ser considerados unicamente os juros, pois estes, são a remuneração, o lucro que a actividade da banca obtém pelo contrato de locação».

No enquadramento jurídico da questão ponderou o Tribunal de Justiça que o Código do IVA estabelecia- artº 23º. ns. 2 e 3, que, no caso de se verificarem distorções significativas na tributação, e, não obstante o disposto no número 1, poderá o sujeito passivo efectuar a dedução segundo a afectação real de todos ou parte dos bens e serviços utilizados.
De acordo com o TJUE esta norma reproduz, em substância, a regra de determinação do direito à dedução enunciada na Directiva do IVA- artº 17º, nº5, terceiro parágrafo, al. c) da sexta directiva - constituindo por isso a transposição, para o direito interno do Estado português do direito da EU.

Vejamos as disposições em causa:
Artº 23º, nº 2 do CIVA dispõe que: «Não obstante o disposto da alínea b) do número anterior, pode o sujeito passivo efectuar a dedução segundo a afectação real de todos ou parte dos bens e serviços utilizados, com base em critérios objectivos que permitam determinar o grau de utilização desses bens e serviços em operações que conferem direito a dedução e em operações que não conferem esse direito, sem prejuízo de a Direcção-Geral dos Impostos lhe vir a impor condições especiais ou a fazer cessar esse procedimento no caso de se verificar que provocam ou que podem provocar distorções significativas na tributação.»
Por sua vez dispõe o artº 17º, nº 5 da Directiva 77/388/CEE o seguinte:
5. No que diz respeito aos bens e aos serviços utilizados por um sujeito passivo, não só para operações com direito à dedução , previstas nos nºs 2 e 3, como para operações sem direito à dedução, a dedução só é concedida relativamente à parte do imposto sobre o valor acrescentado proporcional ao montante respeitante à primeira categoria de operações.
Este pro rata é determinado nos termos do artigo 19 º, para o conjunto das operações efectuadas pelo sujeitos passivo.
E no parágrafo terceiro em causa diz-se também:

«Todavia, os Estados-membros podem:
c ) Autorizar ou obrigar o sujeito passivo a efectuar a dedução com base na utilização da totalidade ou de parte dos bens e dos serviços;»

Sobre a interpretação desta norma o Acórdão do Tribunal de Justiça não deixou de sublinhar na interpretação de uma disposição de direito da União, importa ter em conta não apenas os respectivos termos mas também o seu contexto e os objectivos prosseguidos pela regulamentação em que está integrada (acórdão SGAE, C 306/05, EU:C:2006:764, n.° 34).
E que no caso em apreço, o artigo 17.°, n.° 5, terceiro parágrafo, alínea c), da Sexta Directiva dispõe que um Estado Membro pode autorizar ou obrigar o sujeito passivo a efectuar a dedução do IVA com base na afectação da totalidade ou de parte dos bens e dos serviços e pode prever um regime de dedução que tenha em conta a afectação especial da totalidade ou de parte dos bens e dos serviços em causa.
Sendo que, na inexistência de qualquer outra indicação na Sexta Directiva quanto às regras que podem ser utilizadas nesta situação, incumbe aos Estados Membros estabelecê-las (v. parágrafos 21 a 24 do Acórdão).
Sublinha-se ainda que, por um lado, como decorre claramente da redacção dos artigos 17.°, n.° 5, e 19.°, n.° 1, da Sexta Directiva, esta última disposição remete unicamente para o pro rata de dedução previsto no artigo 17.°, n.° 5, primeiro parágrafo, desta directiva e, assim, apenas fixa uma regra de cálculo específica para o caso visado neste artigo 17.°, n.° 5, primeiro parágrafo.
E que, por outro lado, embora o segundo parágrafo do artigo 17.°, n.° 5, da Sexta Directiva preveja que essa regra de cálculo se aplica a todos os bens e serviços de utilização mista adquiridos por um sujeito passivo, o terceiro parágrafo desse artigo 17.°, n.° 5, que também inclui a disposição que figura na alínea c), começa com a conjunção adversativa «todavia», que implica a existência de derrogações à referida regra (acórdão Royal Bank of Scotland, EU:C:2008:750, n.° 23). - parágrafos 25 e 26.
Ora, nesta perspectiva a norma do artº 23º nº 2 do CIVA, ao permitir que Administração tributária imponha condições especiais no caso de se verificarem distorções significativas na tributação, reproduz, em substância, a regra de determinação do direito à dedução enunciada na Directiva do IVA- artº 17º, nº5, terceiro parágrafo, al. c) da sexta directiva, quando ali se estabelece que, «todavia, os Estados-membros podem: autorizar ou obrigar o sujeito passivo a efectuar a dedução com base na utilização da totalidade ou parte dos bens ou serviços».

O Acórdão do TJUE sublinha ainda que, de acordo com o princípio da neutralidade fiscal, as modalidades do cálculo da dedução de IVA, devem reflectir, objectivamente, a parte real das despesas efectuadas com a aquisição de bens e serviços de utilização mista.
E que, para este efeito, a Sexta Directiva não se opõe a que os Estados-membros apliquem, numa determinada operação, um método ou um critério de repartição diferente do método baseado no volume de negócios, desde que esse método garanta uma determinação do pro rata de dedução do IVA pago a montante mais precisa do que a resultante da aplicação do método do volume de negócios (v., neste sentido, acórdão BLC Baumarkt, EU:C:2012:689, n.° 24). - ponto 32 do Acórdão
A este propósito, o TJUE considera - ponto 33 do Acórdão - que, embora a realização, por um banco, de operações de locação financeira para o sector automóvel, como as que estão em causa no processo principal, possa implicar a utilização de certos bens ou serviços de utilização mista, como edifícios, consumo de electricidade ou certos serviços transversais, na maioria dos casos esta utilização é sobretudo determinada pelo financiamento e pela gestão dos contratos de locação financeira celebrados com os seus clientes, e não pela disponibilização dos veículos, entendendo, contudo, que tal juízo incumbe ao órgão jurisdicional de reenvio com referência ao caso no processo principal.

E conclui que, nestas condições, o cálculo do direito à dedução em aplicação do método baseado no volume de negócios, que tem em conta os montantes relativos à parte das rendas que os clientes pagam e que servem para compensar a disponibilização dos veículos, leva a determinar um pro rata de dedução do IVA pago a montante menos preciso do que o resultante do método aplicado pela Fazenda Pública, baseado apenas na parte das rendas correspondente aos juros que constituem a contrapartida dos custos de financiamento e de gestão dos contratos suportados pelo locador financeiro, uma vez que estas duas actividades constituem o essencial da utilização dos bens e serviços de utilização mista destinada à realização das operações de locação financeira para o sector automóvel - ponto 34.

Assim, conclui o Tribunal de Justiça, respondendo à questão prejudicial suscitada, que o artigo 17.°, n.° 5, terceiro parágrafo, alínea c), da Sexta Directiva deve ser interpretado no sentido de que não se opõe a que um Estado-membro, em circunstâncias como as do processo principal, obrigue um banco que exerce, nomeadamente, actividades de locação financeira a incluir, no numerador e no denominador da fracção que serve para estabelecer um único e mesmo pro rata de dedução para todos os seus bens e serviços de utilização mista, apenas a parte das rendas pagas pelos clientes, no âmbito dos seus contratos de locação financeira, que corresponde aos juros, quando a utilização desses bens e serviços seja sobretudo determinada pelo financiamento e pela gestão desses contratos, o que incumbe ao órgão jurisdicional de reenvio verificar.

Independentemente de se concordar ou não com a interpretação efectuada pelo TJUE, o primado do direito da União Europeia impõe a aceitação da mesma.
Com efeito, como se sublinhou no Acórdão deste Supremo Tribunal Administrativo de 17.06.2015, proferido no recurso 956/13, o TJUE é uma instituição da União Europeia (art. 13.º, n.º 1, do TFUE) vinculativa (atento o princípio do precedente vinculativo), na medida em que as decisões do TJUE devem ser acatadas por todos os órgãos jurisdicionais dos Estados-Membros: não só o tribunal que reenvia fica vinculado à interpretação decidida pelo TJUE, como também, do mesmo modo e em questão idêntica, ficam vinculados todos os demais.
Ora a questão de saber, quando a utilização desses bens e serviços (de utilização mista) seja sobretudo determinada pelo financiamento e pela gestão dos contratos de locação financeira, tal como enunciada e definida pelo TJUE, incumbe em primeira linha ao tribunal recorrido.
Porém, o tribunal recorrido, apesar de já ter sopesado na sua decisão o referido acórdão do TJUE não retirou sobre a factualidade apurada, a ilação ou juízo de facto sobre se a utilização desses bens e serviços de utilização mista (como, por exemplo, os referidos pela impugnante no artº 44º da petição inicial) é ou não, sobretudo, determinado pelo financiamento e pela gestão dos contratos de locação financeira.
E, como bem nota o Ministério Público no seu parecer, a aquisição dessa matéria de facto para os autos e para a qual o STA é incompetente é essencial para, em função da jurisprudência do TJUE, aferir se a parcela das rendas dos contratos relativa à amortização do capital deve ou não constar, na sua acepção plena, do numerador e do denominador da fracção que serve para estabelecer um único e mesmo pro rata de dedução. (Cf., também neste sentido, os acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo, de 4.03.2015 processo nº 1017/12 e 81/13, de 3.06.2015 processo nº 970/13, de 17.06.2015 processos nº 1874/13 e 956/13, de 27.01.2016 processo nº 331/14, bem como o recente acórdão de 09.10.2019, recurso 0401/14.7.BEPRT)

Neste contexto, porque que este Tribunal de recurso não dispõe de base factual para decidir o presente recurso jurisdicional – uma vez que ele pressupõe uma realidade de facto que não está pré-estabelecida nem aqui pode estabelecer-se por virtude de o Supremo Tribunal Administrativo, como tribunal de revista, carecer de poderes de cognição em sede de facto – verifica-se, um défice na fixação dos elementos de facto pertinentes para a discussão do aspecto jurídico da causa, que impõe a necessidade de ampliação da matéria de facto.

8. Em face de tudo o exposto, considerando a citada jurisprudência do TJUE e considerando que, como supra se deixou dito,
a) a questão essencial no presente recurso é a de saber se num contrato de locação financeira, em que o cliente paga a renda, sendo esta composta pela amortização financeira, juros e outros encargos, essa renda paga deve ou não entrar, na sua acepção plena, para o denominador do pro rata, ou, ao invés, devem ser considerados unicamente os juros, pois estes, são a remuneração, o lucro que a actividade da banca obtém pelo contrato de locação;
b) não foi considerada pela sentença recorrida a necessidade de apurar se nas operações de locação financeira, como as que estão em causa nos presentes autos, que podem implicar a utilização de certos bens ou serviços de utilização mista, como edifícios, consumo de electricidade ou certos serviços transversais, essa utilização desses bens e serviços de utilização mista é ou não, sobretudo, determinada pelo financiamento e pela gestão dos contratos de locação financeira,
e
c) que não foi fixada pela primeira instância a matéria de facto pertinente para a discussão deste aspecto jurídico da causa, há que revogar, nesta medida, a sentença de fls. a fls. 175 e segs., e determinar a baixa dos autos ao tribunal a quo, para que a sentença seja substituída por outra que decida, após ampliação da base factual necessária para a aplicação do direito, de acordo com o que se atrás se apontou, assim se concedendo provimento ao recurso.

9. Termos em que acordam os Juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em julgar procedente o recurso e, em consequência, revogar a sentença recorrida, que deve ser substituída por outra que decida, após ampliação da base factual necessária para a aplicação do direito nos termos acima apontados.

Custas pela Recorrida, ainda que sem taxa de justiça neste Supremo Tribunal Administrativo, uma vez que não contra-alegou.

Lisboa, 27 de Novembro de 2019. – Pedro Delgado (relator) – Francisco Rothes – Ascensão Lopes.