Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0679/18
Data do Acordão:09/21/2018
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:SÃO PEDRO
Descritores:RECURSO DE REVISTA EXCEPCIONAL
SUSPENSÃO DE EFICÁCIA
Sumário:Não se justifica admitir recurso excepcional de revista no âmbito de uma providência cautelar de decisão relativamente ao “fumus boni juris”, que se mostra fundamentada e é juridicamente plausível.
Nº Convencional:JSTA000P23616
Nº do Documento:SA1201809210679
Data de Entrada:07/06/2018
Recorrente:A...
Recorrido 1:ORDEM DOS ADVOGADOS
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Formação de Apreciação Preliminar – art. 150º, 1, do CPTA.

Acordam no Supremo Tribunal Administrativo (art. 150º, 1 do CPTA)

1. Relatório

1.1. A…………. recorreu, nos termos do art. 150º, 1, do CPTA, para este Supremo Tribunal Administrativo do acórdão do TCA Sul, proferido em 10-5-2018, que confirmou a sentença proferida pelo TAC de Lisboa, que por seu turno julgou improcedente a SUSPENSÃO DE EFICÁCIA da deliberação da ORDEM DOS ADVOGADOS que lhe aplicou a sanção disciplinar de SUSPENSÃO POR UM ANO e as sanções acessórias de restituição à participante da quantia de 6.000,00 euros (entregues a titulo de provisão) e de 1.500,00 euros (que lhe tinham sido confiados).

1.2. Fundamenta a admissão da revista na sua situação pessoal – “o recorrente da revista, que é cego, está suspenso do exercício da sua actividade profissional como advogado, pelo período de um ano” – e considera a mesma necessária para uma melhor aplicação do Direito.

1.3. A Ordem dos Advogados pugna pela não admissão da revista.

2. Matéria de facto

Os factos dados como provados são os constantes do acórdão recorrido para onde se remete.

3. Matéria de Direito

3.1. O artigo 150.º, n.º 1, do CPTA prevê que das decisões proferidas em 2ª instância pelo Tribunal Central Administrativo possa haver, excepcionalmente, revista para o Supremo Tribunal Administrativo «quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental» ou «quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito». Como decorre do próprio texto legal e a jurisprudência deste STA, tem repetidamente sublinhado trata-se de um recurso excepcional, como de resto o legislador cuidou de sublinhar na Exposição de Motivos das Propostas de Lei nºs 92/VIII e 93/VIII, considerando-o como uma «válvula de segurança do sistema», que só deve ter lugar, naqueles precisos termos.

3.2. A primeira instância julgou improcedente a providência cautelar de suspensão de eficácia (de uma sanção disciplinar de suspensão de exercício da advocacia por um ano), por ter entendido que se não verificava o requisito previsto no art. 120º, n.º 1 do CPTA, isto é a probabilidade de que a pretensão formulada na acção principal viesse a ser julgada procedente.

3.3. O TCA Sul manteve a conclusão a que chegou a primeira instância por não existirem elementos de facto ou de direito que, de acordo com as regras de conhecimento sumário, apontassem para a probabilidade de procedência da acção principal.

Quanto à invocada prescrição, disse o acórdão, que não releva apenas a data da ocorrência dos factos, mas também a data do seu conhecimento pela entidade recorrida e ainda a circunstância da infracção cometida ter natureza permanente e a subsunção dos factos praticados pelo arguido no crime de abuso de confiança.

Entendeu ainda não ser provável que o recorrente tenha razão quanto à “não prorrogação do prazo para interposição do recurso” – (o recorrente tinha no âmbito do processo disciplinar pedido a prorrogação do prazo de recurso de dez dias, o que lhe não foi concedido).

Por outro lado, referiu ainda o acórdão recorrido, que os factos imputados ao ora recorrente “encontram-se demonstrados, quer por confissão do arguido, quer por prova documental produzida, além de não serem postos em causa no presente processo cautelar”.

Concluiu, em suma, o TCA Sul que o requerente não logrou concretizar fundamentos de invalidade do acto que permitissem formular um juízo de probabilidade de procedência da acção principal, de forma a ser possível dar por verificado o requisito do “fumus boni juris”, nos termos da 2ª parte do n.º 1 do art. 120º do CPTA.

3.4. O recorrente foi punido disciplinarmente com a sanção de um ano de suspensão do exercício da advocacia, essencialmente por não ter devolvido a uma cliente a quantia de 6.000,00 euros – que lhe tinha sido entregue a titulo de provisão para se deslocar à Venezuela visando a libertação do filho da sua cliente – e a quantia de 1.500,00 euros - que lhe tinha sido entregue pela mesma cliente para, naquela deslocação, entregar ao filho, uma vez que o recorrente nunca chegou a deslocar-se àquele país.

Entenderam as instâncias, perante a prova dos referidos factos imputados ao arguido, não era provável a procedência da acção principal.

Julgamos que não existem razões para admitir o recurso.

O recorrente invoca a sua situação pessoal (“cego”) para desse modo realçar a relevância social das consequências da suspensão do exercício da sua actividade. Todavia, esse aspecto foi de algum modo tomado em conta quando se deu como provado o requisito “periculum in mora” e se entendeu, no caso concreto, que deveria prevalecer “o interesse privado do aqui recorrente”, pois “atenta a sua condição de invisual, terá muito maiores diculdades em reorganizar a sua vida se for mantida a presente suspensão”. Assim, estando em discussão (no acórdão do TCA e neste recurso) apenas a probabilidade de procedência da acção principal, a situação pessoal do requerente não é relevante para a questão da admissibilidade da revista.

Relativamente ao critério legal – art. 120º, 1, segunda parte do CPTA – não se justifica a intervenção deste STA. O TCA Sul entendeu que o requisito ali previsto (fumus boni juris) só se verificava quando o requerente demonstrasse a probabilidade da sua pretensão seja julgada procedente e tal resulta claramente do citado artigo.

Quanto à aplicação em concreto do referido requisito, deve dizer-se desde logo, que a mesma se limita ao caso concreto em discussão, não revestindo por isso de relevância jurídica ou social fundamental. Está em causa saber se um concreto comportamento é ou não susceptível de ser disciplinarmente punido, e, portanto, uma situação específica, cuja discussão jurídica não extravasa o caso em análise.

Só seria de admitir a revista se a decisão recorrida se mostrasse manifestamente errada a justificar só por si a intervenção do STA com vista a uma melhor interpretação e aplicação do Direito.

Mas não é o caso.

Estamos no âmbito da tutela cautelar, onde juízo sobre a pretensão do requerente na causa principal, tem natureza sumária e nem sequer vincula o julgamento da causa principal (art. 364º, 4 do CPC). Com este âmbito, isto é, um conhecimento sumário da pretensão a exercer no processo principal, temos duas decisões no mesmo sentido sem que sejam evidentes erros manifestos a ponto de, só por isso, justificarem a intervenção deste STA.

Daí que não se justifique a admissão da revista.

4. Decisão

Face ao exposto não se admite a revista.

Custas pelo recorrente.

Porto, 21 de Setembro de 2018. – São Pedro (relator) Costa Reis – Madeira dos Santos.