Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01428/13
Data do Acordão:02/26/2014
Tribunal:PLENO DA SECÇÃO DO CT
Relator:CASIMIRO GONÇALVES
Descritores:RECURSO POR OPOSIÇÃO DE ACÓRDÃOS
PRESSUPOSTOS
Sumário:Se não se verifica divergência de soluções quanto à mesma questão de direito, deve o recurso ser julgado findo, por falta dos pressupostos desse recurso de oposição de acórdãos, nos termos do disposto no nº 5 do art. 284º do CPPT.
Nº Convencional:JSTA000P17151
Nº do Documento:SAP2014022601428
Data de Entrada:09/18/2013
Recorrente:A............, SA
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam no Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

RELATÓRIO
1.1. A…………, S.A., com os demais sinais dos autos, recorre, por oposição de acórdãos, do aresto proferido pelo Tribunal Central Administrativo Sul, em 27/3/2012, que, dando provimento a recurso interposto pela Fazenda Pública, declarou nula a sentença proferida pelo TAF de Sintra e, decidindo em substituição, julgou totalmente improcedente a impugnação judicial que aquela tinha deduzido contra o acto de liquidação de IRC e juros compensatórios, do ano de 2000.
Invoca existência de oposição de acórdãos entre o acórdão recorrido e o acórdão proferido no mesmo Tribunal, em 10/3/2009, no proc. nº 02608/08.

1.2. A recorrente apresentou, nos termos do disposto no nº 3 do art. 284º do CPPT, alegações tendentes a demonstrar a alegada oposição de julgados (fls. 845 e ss).

1.3. Por despacho do Exmo. Relator (fls. 858/859) considerou-se «poder haver oposição entre o acórdão proferido a fls. 561 segs. e o reproduzido a fls. 635 segs.» e foi ordenada a notificação das partes para deduzirem alegações, nos termos do disposto no nº 5 do art. 284º do CPPT.

1.4. A recorrente termina as alegações do recurso formulando as conclusões seguintes:
1. O presente recurso jurisdicional por oposição de acórdãos vem interposto do acórdão proferido nos presentes autos, em 27 de Março de 2012, por estar, na óptica da ora recorrente, em oposição com o acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo Norte em 10 de Março de 2009, no âmbito do recurso n° 02608/08.
2. Defende a recorrente que em ambos os arestos está em causa a aferição da legalidade de liquidações de IRC, emitidas com base na correcção à matéria colectável das ali impugnantes, partindo da desconsideração de custos incorridos com o afretamento de aeronaves, tendo por base a sua indispensabilidade à luz do artigo 23° do CIRC, sendo certo que as soluções jurídicas chegadas são opostas.
3. Julga a recorrente que a análise jurídica efectuada pelo TCA Norte, no acórdão proferido em 10 de Março de 2009, no âmbito do recurso n° 02608/08 é a que se mostra conforme ao espírito e letra da lei, devendo, por conseguinte, manter-se.
4. Assim sendo, deve o acórdão recorrido ser revogado, com todas as consequências legais.
5. Dos autos resultou demonstrada a necessidade e imprescindibilidade dos custos de deslocação e representação suportados pela recorrente, atenta a natureza da actividade por ela prosseguida e o contexto empresarial em que a mesma se insere: são custos indispensáveis à obtenção dos proveitos ou para a manutenção da fonte produtora da empresa.
6. Ficou, ainda, provado, que o recurso ao aluguer de aeronaves, em detrimento da compra de lugares em aviões que cumprem as rotas comerciais delineadas pelas companhias aéreas, constitui uma vantagem efectiva para as empresas e, igualmente, a normalidade e proporcionalidade/justificabilidade destes custos atenta a dimensão da empresa em causa, tratam-se de custos racionais, proporcionais e normais atento o volume dos proveitos que proporcionam à recorrente.
7. E certo, o tribunal a quo não é alheio à prova efectuada: muito pelo contrário, é sensível à necessidade de uma empresa da dimensão da recorrente de incorrer em custos desta natureza para o exercício da sua actividade. Todavia, as consequências jurídicas que daí retira é que não se mostram correctas: o tribunal recorrido erra na interpretação e aplicação da norma do n° 1 do art. 23° do CIRC, a única mobilizável no caso concreto - designadamente na interpretação do requisito da indispensabilidade e da relação com os ganhos ínsito naquela norma —, e, concomitantemente, num inegável vício de violação do princípio constitucional da tributação de acordo com o seu lucro real e do princípio fundamental da liberdade de gestão e da autonomia privada.
8. Com efeito, o tribunal a quo nem por um único momento considerou a vigência, no nosso ordenamento jurídico, de um princípio constitucional que nunca poderia ter ignorado: o princípio segundo o qual as empresas devem ser fundamentalmente tributadas de acordo com o seu lucro real, em resultado do que não teve também em conta a regra segundo a qual têm relevância fiscal todos os encargos suportados pelas sociedades na prossecução dos seus objectivos estatutários.
9. Ora, de acordo com a formulação do artigo 23° do CIRC, a regra, bem ao invés do que pretende a Administração fiscal e, na sentença da qual ora se recorre, o tribunal a quo, é a de que todos os custos efectivamente incorridos pelas sociedades na prossecução dos seus objectivos estatutários são custos fiscalmente dedutíveis — muito embora a indispensabilidade do custo constitua um conceito indeterminado, que carece de preenchimento, a verdade é que aí o poder da Administração é rigorosamente vinculado: não lhe assiste qualquer margem de livre apreciação, nem lhe cabe formular juízos de oportunidade.
10. O artigo 23° do CIRC não pode ser usado como mecanismo de controlo da validade, consoante a correspondente rentabilidade, dos actos de gestão das empresas: num ordenamento jurídico que reconheça expressamente a liberdade de iniciativa económica e o direito de propriedade privada, a bondade das opções empresariais não pode ser sindicada pela Administração, a menos que sobre elas recaia a suspeita de que são ilegais.
11. Por outro lado, a indispensabilidade do custo não pode aferir-se nem em função da sua aptidão para gerar, de imediato, a realização de um ganho, nem em função da sua importância para a capacidade de subsistência da empresa — basta, aliás, ter em conta que muitos dos exemplos de custos fiscalmente aceites fornecidos pelo legislador não determinam a obtenção directa de proveito algum, nem se podem considerar vitais para a manutenção da fonte produtora (por exemplo, as despesas com regimes complementares de segurança social ou os encargos suportados com diferenças de câmbio).
12. Na verdade, o corpo do n° 1 daquele artigo 23° apenas permite a desconsideração fiscal dos custos extra-empresariais, isto é, daqueles que não apresentam qualquer afinidade com a actividade da sociedade, como os encargos com despesas privadas dos sócios ou com terceiros, estranhos à empresa: a sua aplicação para desconsiderar fiscalmente um custo efectivamente suportado está, portanto, circunscrita às situações de confusão entre o património empresarial e o património pessoal dos sócios, bem como àquelas em que a empresa, em detrimento do seu património, pretende beneficiar terceiro.
13. A regra é a de que as despesas correctamente contabilizadas sejam custos fiscais. O critério da indispensabilidade foi criado pelo legislador tendo em vista, para lá de não permitir a intromissão da Administração fiscal na gestão da empresa, impedir a consideração fiscal de gastos que, embora contabilizados como custos, não são susceptíveis de se subsumirem ao âmbito da actividade da empresa.
14. Sempre que ocorra a verificação de um determinado evento que comporte um encargo a suportar por determinada sociedade na prossecução dos seus fins estatutários, a conexão empresarial desse encargo está assegurada, já que se verificou efectivamente uma diminuição patrimonial — por outras palavras, uma perda como a que foi apurada pela ora recorrente, não está sequer sujeita ao teste da indispensabilidade, já que corresponde a uma perda efectivamente sofrida com a aquisição de um serviço utilizado na prossecução dos seus fins estatutários.
15. Aceitando que os negócios se praticaram a valores adequados — e outra coisa não é admissível na ausência de correcções aos preços praticados —, aceitando ainda que o recurso aos serviços adquiridos é matéria da inviolável esfera de autonomia privada daquele que a eles recorre e admitindo — dado nunca ter sido questionado — a finalidade empresarial a que o serviço adquirido se destina (proporcionar a célere deslocação dos trabalhadores da empresa para participação em reuniões de negócios nas instalações da casa-mãe, a A…………, e bem assim nas instalações de fornecedores e clientes da sociedade, em diversos pontos do território nacional e internacional), o encargo suportado com a aquisição de um serviço utilizado na actividade operacional da empresa como um elemento potenciador e maximizador da fonte produtora resulta, necessariamente, numa perda, que não pode deixar de ser tida em conta na determinação da matéria colectável.
16. Neste sentido, retirar à recorrente a possibilidade de relevar fiscalmente o custo experimentado com o aluguer de aeronaves utilizadas nas deslocações dos seus trabalhadores no interesse da sociedade constituiria uma segunda desvantagem, que se viria adicionar à que resultou realmente da verificação do encargo.
17. Ora, assumindo que a dedutibilidade fiscal dos custos deve depender apenas de uma relação justificada com a actividade produtiva da empresa — e já não, como talvez defenda o tribunal a quo, de uma relação de causalidade directa e adequada à formação dos proveitos ou de um juízo de mérito ou oportunidade do custo tendo em vista a sua contribuição imediata para a manutenção da fonte produtora -, não há dúvida de que, no caso dos presentes autos, o custo experimentado com o aluguer de aeronaves equivale a um encargo contraído no interesse da empresa e a uma opção/acto de gestão abstractamente subsumível no perfil lucrativo da empresa.
18. Termos em que deverá entender-se que a decisão recorrida, que julga improcedente a impugnação judicial deduzida pela ora recorrente, assenta em erro de julgamento em matéria de direito, aqui relevado na deficiente interpretação e aplicação do direito, violando o disposto no n° 1 do artigo 23° do CIRC e os princípios constitucionais da tributação pelo lucro real, da liberdade de gestão e da autonomia privada.
19. Para além do mais, e tal como referido, entende a ora recorrente que o acórdão recorrido se encontra em oposição com o proferido pelo Tribunal Central Administrativo Norte em 10 de Março de 2009, no âmbito do recurso n° 02608/08: confrontados os Acórdãos e não obstante assentarem os mesmos em factualidades bastante similares, resulta evidente que, quanto ao pressuposto decisório comum, o mesmo Tribunal tem considerações e decisões jurídicas absolutamente antagónicas.
20. Estamos perante duas decisões do mesmo Tribunal que, partindo de uma mesma factualidade e de uma mesma premissa jurídica (a de que a indispensabilidade do custo se basta com a causalidade económica, i.e., que a sua realização foi efectuada no interesse da empresa), todavia, estabelecem graus de exigência probatória inteiramente distintos para a demonstração da mesma causalidade económica.
21. O Acórdão Recorrido, apesar de partir da convicção de que a Administração fiscal não questiona a real existência dos custos na empresa, impõe ao contribuinte que concretize detalhadamente os vários gastos em que incorreu neste domínio; Já o Acórdão Fundamento entendeu que a exigência probatória imposta pelo artigo 23° do CIRC se basta com aquela prova mínima da dita "congruência económica" dos gastos com o aluguer de aeronaves, isto é, com a demonstração da existência de uma causalidade económica dos custos e da sua ligação à empresa (mesmo não tendo sido fornec[idos], como devia, comprovativos das reuniões, congressos ou estudos de mercado nem a identificação e alojamento das pessoas que efectuaram as deslocações).
22. Face ao exposto, torna-se evidente a oposição entre os acórdãos invocados, sendo que deverá o entendimento preconizado no Acórdão Fundamento aplicar-se aos presentes autos, atenta a factualidade provada e, bem assim, todo o acima exposto.
Termina pedindo a procedência do presente recurso.

1.5. Não foram apresentadas contra-alegações.

1.6. O MP emite Parecer no qual se pronuncia pela inexistência da invocada oposição de acórdãos, por «… ao contrário do que vem alegado, as soluções opostas dos dois arestos não residem no grau de "exigência probatória" da demonstração da "causalidade económica" dos custos. É que no acórdão fundamento o tribunal decidiu pela procedência do recurso por ter entendido que a sentença recorrida e a decisão da administração tributária questionavam a bondade e oportunidade das despesas. E de acordo com a argumentação defendida, seguindo a doutrina de ANTÓNIO MOURA PORTUGAL (in "A dedutibilidade dos custos na jurisprudência fiscal portuguesa, Coimbra Editora, 2004"), e de TOMÁS CASTRO TAVARES (in, "Da relação de dependência parcial entre a contabilidade e o direito fiscal na determinação do rendimento tributável das pessoas colectivas: algumas reflexões ao nível dos custos", publicado na Ciência e Técnica Fiscal, n° 396 (Outubro-Dezembro de 1999), «a indispensabilidade deve ser aferida a partir de um juízo positivo da subsunção na actividade societária, o qual, por natureza, não deve ser sindicado pelo Direito Fiscal, que se não deve imiscuir, muito menos valorar as decisões empresariais do contribuinte». Doutrina que é igualmente defendida no aresto recorrido, como se alcança da respectiva fundamentação de direito (cfr. acórdão a fls. 572 dos autos).
Ao contrário, no aresto recorrido o tribunal decidiu-se pela improcedência da acção por entender que não era possível à administração tributária, no âmbito dos seus poderes de fiscalização e controlo, relacionar as despesas em causa com o objecto societário por falta de elementos, recaindo sobre a Recorrente o ónus de fornecer tais elementos, o que não foi cumprido.
E assim sendo a diferenciação das soluções não assenta em divergência de entendimentos sobre a mesma questão de direito, pese embora as semelhanças verificadas entre os dois casos.
Afigura-se-nos, assim, que não se mostram reunidos os requisitos legais do recurso de oposição de acórdãos, o qual deve assim ser julgado findo, nos termos do n° 5 do artigo 284° do CPPT.»

1.7. Corridos os vistos legais, a recorrente veio, entretanto, invocando o disposto no 63° do CPTA, apresentar requerimento de ampliação do pedido e da causa de pedir, nos termos seguintes, em síntese:
1° - No passado dia 3/5/2005, deu entrada no TAF de Sintra uma petição inicial tendo em vista a anulação liquidação adicional referente ao IRC do exercício de fiscal de 2000.
2° - No seguimento dessa liquidação adicional, a AT instaurou o competente processo de execução fiscal - ao qual foi atribuído o n° 3611200501063200 -, suspenso em virtude da prestação de garantia bancária pela ora Recorrente (cfr. docs 1 e 2 que se juntam e aqui se dão por integralmente reproduzidos).
Com efeito,
3° - Como é do conhecimento público, no passado dia 31/10 foi publicado o DL 151-A/2013, que instituiu um regime excepcional de regularização de dívidas de natureza fiscal, nos termos do qual ao pagamento das dívidas tributárias em mora por parte dos contribuintes se associaria um perdão dos juros de mora, dos juros compensatórios e das custas dos processos de execução fiscal.
4° - Sucede que, após ponderação das vantagens económicas associadas, a ora Recorrente decidiu proceder ao pagamento, ao abrigo do DL 151-A/2013, da sua dívida tributária em execução no processo de execução fiscal acima referido (cfr. doc. 3 que se junta e aqui se dá por reproduzido).
Ora,
5° - Nos termos do acórdão tirado pelo STA, no âmbito do processo n° 030/11, em 29/6/2011 «É admissível, em processo de impugnação judicial, a ampliação do pedido e da causa de pedir, nos termos do disposto no artigo 63º do CPTA, ex vi do artigo 2º, alínea e) do CPPT, sempre que se verifiquem factos supervenientes».
6° - Sendo que «a modificação objectiva da instância prevista no art. 63º do CPTA pode ser feita em qualquer estado do processo, em primeira ou em segunda instância, sem necessidade de haver acordo de ambas as partes» (Vide Acórdão n° 08410/12, de 1/3/2012, do TCAS, disponível em www.dgsi.pt.)
Assim sendo,
7º - Uma vez que o supra referido pagamento ao abrigo do DL 151-A/2013 - que contende com a matéria em discussão nos presentes autos -, é superveniente relativamente às liquidações originariamente contestadas no âmbito dos presentes autos,
8° - O pedido e a causa de pedir do presente recurso devem ser ampliados — ou, o que será mais rigoroso, explicitados -, em conformidade, de modo a reflecti-lo.
9° - Assim, onde se lia (na parte referente ao pedido):
«Termos em que deve o presente recurso ser julgado procedente, por provado, com todas as demais consequências legais».
10° - Deve passar a ler-se:
«Termos em que deve o presente recurso ser julgado procedente, por provado, com todas as demais consequências legais, nomeadamente em sede de restituição do imposto pago em 6/12/2013 — no montante de € 752.033,90 - e respectivos juros indemnizatórios, nos termos e para os efeitos dos artigos 43° da Lei Geral Tributária e 61° do CPPT».
E termina pedindo que seja deferida a ampliação do pedido e da causa de pedir nos termos propostos supra.

Ordenada a notificação da Fazenda Pública para, atendendo ao disposto nos arts. 264º e 265º do novo CPC, se pronunciar sobre esta matéria atinente à ampliação do pedido e da causa de pedir, veio alegar o seguinte, além do mais:
III) Ora, diga-se, desde já, que o presente requerimento carece de qualquer fundamento legal, devendo ser ordenado o seu desentranhamento dos autos e que a Fazenda Pública não só não concorda com a presente ampliação do pedido, como também considera o comportamento do recorrente, perante as circunstâncias que rodearam o pagamento da dívida por si voluntariamente efectuado, como violador do princípio da colaboração e da boa-fé.
IV) Assim, antes de mais, há que realçar que o presente processo se encontra na fase de apreciação de um recurso interposto, pela recorrente, por oposição de julgados, tendo o mérito da causa já sido analisado e decidido pelas duas instâncias que sobre o mesmo foram chamadas a pronunciar-se, pelo que, tratando-se deste tipo de recurso, em que só está em causa a realização de um julgamento ampliado de revista para efeitos de uniformização de jurisprudência, já está esgotada processualmente a possibilidade de ser determinada qualquer ampliação da matéria de facto para efeitos de ser proferida uma nova decisão, que neste caso seria em 3° grau de jurisdição, sobre a matéria da impugnação judicial.
V) Pelo que, em primeiro lugar, a fase processual em que se encontram os presentes autos já não permite ao recorrente a apresentação de um requerimento de ampliação do pedido e da causa de pedir.
VI) Em segundo lugar e, ainda que assim não se entenda, sem conceder, o presente requerimento não cumpre os pressupostos do art. 63° do CPTA invocado pelo recorrente como constituindo o fundamento legal da sua apresentação.
VII) Na verdade, ainda que a doutrina e a jurisprudência venham a admitir a aplicação, no âmbito do processo judicial tributário, do art. 63° do CPTA, com a consequente possibilidade de modificação da instância, tal modificabilidade depende sempre da existência de factos subjectivamente supervenientes. Deste modo se, entretanto, o impugnante vem a tomar conhecimento, conhecimento que não tinha antes, da existência de factos que indiciam que o acto padece de outros vícios, que não só os invocados na petição inicial, é-lhe permitida essa ampliação, nos termos do referido artigo.
VIII) Ora, no caso, atento o requerimento apresentado pelo recorrente nem sequer estamos perante uma ampliação da causa de pedir. Efectivamente, pergunta-se, quais são os novos vícios que o recorrente imputa à liquidação? Em que é que se consubstancia a ampliação do pedido? E tanto assim o é, que o próprio recorrente, no art. 8° do requerimento que apresenta sente a necessidade de afirmar que "o pedido e a causa de pedir devem ser ampliados - ou, o que será mais rigoroso, explicitados..."
IX) Por outro lado, o "novo" facto que ocorreu, entretanto, e que constitui o fundamento do pedido de ampliação da causa de pedir e do pedido, foi o pagamento efectuado, voluntariamente, pelo recorrente, ao abrigo de um diploma legal, que permitiu a regularização, excepcional, das dívidas fiscais e que não deixa de configurar um "acordo" entre o credor e o devedor no sentido de ser permitida essa regularização.
X) É, pois, um facto "criado", também, pelo recorrente que ponderando as vantagens económicas, optou por pagar o imposto devido e que se encontrava a ser exigido em processo de execução fiscal.
XI) Assim, não constitui um facto suficientemente relevante para fundamentar a presente ampliação dado que carece de aptidão para importar novos vícios à liquidação impugnada.
XII) Em terceiro lugar, ainda que se coloque a hipótese, meramente académica, da aplicação do art. 264° do CPC, desde já, a Fazenda Pública vem dizer que não acorda no presente pedido de ampliação da causa de pedir e do pedido.
XIII) Aliás, tratando-se de receitas públicas e atenta a qualidade do credor "Estado", nem sequer seria possível qualquer acordo entre o Estado e o recorrente nesse sentido, conforme decorre do princípio da indisponibilidade do crédito tributário, n° 2 do art. 30° da LGT.
XIV) Em quarto lugar e, ainda que assim também não se entenda, admitindo-se o que só por mera cautela de patrocínio se equaciona, o presente pedido de ampliação de causa de pedir e de pedido, o mesmo careceria sempre de qualquer fundamento legal e, na óptica da recorrida, constitui mesmo uma grave violação do princípio da boa-fé.
XV) De facto, o recorrente efectuou o pagamento da dívida de imposto, cuja exigência decorria da liquidação de imposto impugnada nos autos, em virtude de ter aderido a um regime, excepcional, de regularização de dívidas fiscais que foi aprovado pelo DL 151-A/2013.
XVI) Nos termos daquele diploma que institui um regime excepcional, foi prevista a dispensa do pagamento por parte do contribuinte que se apresente a regularizar a sua situação fiscal, dos juros de mora, dos juros compensatórios e das custas do processo de execução fiscal, bem como, a atenuação do pagamento das coimas associadas ao incumprimento do dever de pagamento dos impostos dos quais resultaram as mesmas dívidas ou a dispensa da pena nos crimes fiscais, cfr. art. 2° do referido diploma.
XVII) E esse benefício assume todo o relevo uma vez que, como bem sabe o recorrente, o facto de lhe ter sido atribuído tal dispensa de pagamento de juros, não só corresponde a um tratamento diferenciado, por mais favorável, relativamente a todos os outros contribuintes faltosos que não regularizaram em prazo as suas dívidas fiscais, como também, implica que o Estado tenha "perdoado" esses juros, custas e coimas, confiando não só na resolução do diferendo entre ele e o contribuinte, como também que, do facto de ter permitido essa regularização, não lhe adviriam novos encargos financeiros.
XVIII) É que se o Estado previsse que, ao dispensar o contribuinte do pagamento dos juros, este ainda lhe iria pedir juros indemnizatórios pelo pagamento da dívida dentro do quadro de um regime excepcional, com toda a certeza, sempre optaria por não ter permitido esse pagamento nos termos em que o mesmo foi realizado.
Termos pelos quais não deve ser admitido o presente requerimento de ampliação da causa de pedir e do pedido, devendo o mesmo ser desentranhado por já não ser possível, na presente fase processual a sua apresentação, ou, ainda que assim não se entenda, deve sempre o mesmo ser julgado improcedente por falta dos pressupostos processuais para a sua apresentação, ou, caso também ainda assim não se entenda, deve sempre ser julgado improcedente, por infundado, nos termos legais.

FUNDAMENTOS
2. No acórdão recorrido julgaram-se provados os factos seguintes:
a) Pela ordem de serviço nº 04/01/182, de 24 de Maio de 2004, foi determinada a inspecção externa de âmbito parcial às contas consolidadas do exercício de 2000, da ora Impugnante, A A…………, S.A. - Cfr. documento a fls. 97;
b) Em 26 de Outubro de 2004 foi elaborado Relatório de Inspecção, do qual se extrai o seguinte: “(…) Este relatório integra também as correcções fiscais da análise das declarações modelo 22 de IRC, individuais, de cada uma das empresas do grupo.
(…)
3.1.1 REINTEGRAÇÕES E AMORTIZAÇÕES NÃO ACEITES COMO CUSTO
O grupo considerou indevidamente como custo fiscal, o valor de € 306.613.35 (…), decorrente das seguintes situações:
3.1.1.1 € 231.824,95 - UTILIZAÇÃO DE TAXAS SUPERIORES ÀS LEGAIS
A sociedade dependente B…………, S.A., efectuou a amortização de bens do activo imobilizado (…) no montante de € 426.422,95, adquiridos com vista ao melhoramento das instalações cedidas em regime de aluguer pela Administração do Porto de Lisboa (APL), sendo relativamente aos mesmos, utilizadas taxas superiores às definidas no Decreto-Regulamentar nº 2/90, de 12 de Janeiro, com base no disposto no artº 13º do referido Decreto e na Licença de utilização nº 1132, atribuída pela APL em 19/01/1996.
O artº 13º do Decreto-Regulamentar nº 2/90, de 12/01, refere no seu nº 1, que “os elementos do activo imobilizado adquiridos ou produzidos por entidades concessionárias e que nos termos da cláusulas do contrato de concessão sejam revertíveis no final desta, podem ser reintegrados ou amortizados em função do número de anos que restem do período de concessão quando aquele for inferior ao seu período mínimo de vida útil”.
Sendo a actividade da empresa o comércio de viaturas e a prestação de serviços conexos, e sendo esta concessionária das marcas VW, Audi e Skoda, apenas se entende existir um contrato de concessão entre a empresa e as representantes das referidas marcas.
Com efeito, a Licença de utilização emitida pela APL, na qual o Sujeito Passivo se fundamenta para praticar taxas diferentes das legalmente previstas, não se traduz num contrato de concessão, permitindo apenas à empresa a utilização de determinadas instalações detidas pela APL (parte do armazém nº 24 e cerca de 1600 m2 do terra plano adjacente na .........), mediante o pagamento de uma renda mensal.
Trata-se pois de um simples contrato de arrendamento entre uma entidade que tem por principal actividade a administração do património do Estado, especificamente do Ministério do Equipamento Social – Secretaria de Estado dos Transportes, e uma empresa concessionária de automóveis, que necessita do espaço administrado pela primeira, para exposição das viaturas que comercializa.
Deste modo, os bens do activo imobilizado adquiridos pela B…………, S.A., relativamente aos quais foram praticadas taxas de amortização superiores às definidas no Decreto-Regulamentar nº 2/90, de 12/01, deverão ser entendidos como simples beneficiações em património que não é detido pela própria empresa.
Assim, esta situação não tem enquadramento no disposto no artº 13º do referido Decreto-Regulamentar, pelo que, nos termos do artº 29º nº 1 e artº 32º, nº 1, alínea c), ambos do CIRC, não foi aceite para efeitos fiscais o valor diferencial de € 231.824,95 (…), entre a amortização praticada de € 426.422,95 e a amortização devida de € 194.598,00.
(…)
3.1.7 OUTROS CUSTOS NÃO ACEITES – ALUGUER DE AERONAVES
O grupo considerou custo para efeitos fiscais o valor de € 1.481.891,93 (…), referente a aluguer de aeronaves efectuado pela empresa C…………, o qual foi contabilizado na rubrica “Deslocações e Estadas” pela D…………, S.A.
Com vista à apreciação da sua indispensabilidade para a obtenção dos proveitos, foi aquela empresa notificada, por escrito, para a indicação das pessoas que o utilizaram, motivo e locais de alojamento devidamente comprovado, juntando para o efeito as facturas do hotel e refeições, extractos dos cartões de crédito, etc., de forma a demonstrar inequivocamente a efectiva realização das viagens ao serviço da empresa.
Em resposta a empresa alegou que a «identificação dos indivíduos que viajaram é matéria que concerne à empresa C…………», acrescentando que o motivo das viagens foi profissional, nomeadamente reuniões de trabalho relacionadas com as marcas que a D………… representa, bem como, a análise de eventuais oportunidades de negócio. Algumas das viagens tiveram intuito comercial pelo que os quadros da empresa foram a acompanhar clientes» e «os documentos justificativos (por exemplo facturas de hotel, refeições e extractos de cartões de crédito), não constituíram encargos para a D…………, não existindo, por isso, registo delas na contabilidade».
Para além dos esclarecimentos referidos, não foram apresentados quaisquer outros elementos, nomeadamente marcações de reuniões ou documentos comprovativos da efectiva estadia nos locais de destino, como havia sido solicitado pela Administração Tributária, que permitissem aferir sobre a sua indispensabilidade para a formação dos proveitos.
O artº 23º do CIRC enumera de forma exemplificativa as despesas efectuadas pelas empresas que podem ser consideradas custos, ou seja, como componentes negativas do resultado líquido do exercício, tendo como elemento preponderante a indispensabilidade para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto, ou para a manutenção da fonte produtora.
Neste contexto, não basta que exista uma conexão entre custos e proveitos para que os primeiros tenham relevância fiscal, é pois necessário comprovar a sua indispensabilidade para a formação (dos) proveitos.
Posto isto, afigura-se-nos que a empresa não comprovou de forma inequívoca a indispensabilidade do referido custo, na medida em que:
a) Não sendo identificados os funcionários que efectuaram as viagens associadas ao aluguer de aeronaves, bem como os respectivos destinos e motivos da sua realização, não comprova, consequentemente, a indispensabilidade de tais custos para a realização dos proveitos ou para a manutenção da fonte produtora;
b) Não sendo apresentados documentos comprovativos, nomeadamente facturas de hotéis, refeições ou outros, não é possível aferir da efectiva realização destas viagens ao serviço da empresa.
A este respeito salienta-se que, conforme o referido pelo Sujeito Passivo, tais documentos não foram apresentados pelo facto de não terem constituído encargo para a D…………, situação que se estranha, dado que é prática generalizada por parte das empresas procederem à contabilização como custo dos encargos suportados pelos funcionários em deslocações e estadas, bem como em representação ao serviço da empresa.
Com efeito, a própria organização contabilística da D………… assim o evidencia, quando regista despesas dos seus funcionários nas contas do POC “Deslocações e Estadas” e “Despesas de Representação”.
c) Estranha ainda a Administração Tributária que algumas das viagens em causa se realizem em períodos de fim de semana ou que neles são compreendidos, pois tratando-se de negócios conforme alega a empresa, não se compreende que os mesmos sejam tratados em períodos não laborais.
Acresce ainda que a referida disposição legal (artº 23º do CIRC), efectua uma enumeração exemplificativa das despesas que podem ser consideradas como custos, ou seja, como componentes negativas do resultado líquido do exercício, desde que seja comprovado o elemento preponderante que é a sua indispensabilidade para a realização dos proveitos.
No entanto, não é este o único normativo a dispor para o efeito, sendo igualmente necessária a sua conjugação com o disposto no artº 32º do CIRC, que restringe o seu âmbito ao determinar que nem todas essas despesas podem ser imputadas negativamente ao resultado líquido do exercício, e definir quais as que não podem ser deduzidas enumerando-as na alínea f) do nº 1 do artº 32º do CIRC, « … e aviões de turismo e todos os encargos com estes relacionados…».
Assim, e dado que a empresa não efectuou a comprovação da indispensabilidade dos custos associados ao aluguer de aeronaves, não são os mesmos aceites nos termos do artº 23º do CIRC, para efeitos do apuramento do lucro tributável consolidado.
(…)
3.1.9 BENEFÍCIOS FISCAIS – CRIAÇÃO DE EMPREGO PARA JOVENS
A D…………, S.A., efectuou a dedução no campo 234 do Q07, da declaração Mod. 22/IRC, individual, e da declaração de consolidação, de € 238.060,11 (…), nos termos do nº 1 do artº 48º-A do Estatuto dos Benefícios Fiscais, aditado pela Lei nº 72/98 de 03/11 - Criação de emprego para jovens (actual artigo 17º).
(…)
Da análise efectuada, verificou-se que os trabalhadores considerados na dedução deste benefício, foram admitidos com contrato a termo certo, não cumprindo consequentemente os requisitos subjacentes à criação líquida de emprego, previstos naquela disposição legal.
Assim sendo, e sem necessidade de aprofundar a análise da situação, isto é, número de trabalhadores em causa, e cálculo efectuado para efeitos de majoração, não foi aceite a dedução efectuada no montante acima referido, pelo que se procedeu à sua correcção para efeitos de apuramento do resultado fiscal consolidado.
(…)
3.1.10 MAJORAÇÃO DE DONATIVOS
A D………… (…) contabilizou como custo um donativo no valor de € 498.797,90, concedido à empresa E…………, S.A., tendo deduzido no campo 237 do Q07 da declaração Mod. 22/IRC, no montante de € 199.519,16 (…).
Da análise efectuada à situação, constatou-se a existência de um protocolo celebrado entre a sociedade E…………, S.A., e a D…………, S.A., onde esta se compromete a doar à empresa E…………, entre 1999 e 2001, uma quantia de € 748.196,85, tendo diversas contrapartidas, entre as quais a E………… passaria a incluir o logótipo da marca Volkswagen e a referência à sua qualidade de Transportador Oficial em todos os documentos que se justifique, receberia 25 bilhetes VIP para um acontecimento especial, e 10 bilhetes para todos os acontecimentos organizados pela E…………, ficando ainda com a preferência no fornecimento de viaturas, quer se trate de aquisição ou de aluguer.
Em face do exposto, conclui-se que esta situação não se traduz num donativo, uma vez que este não é atribuído em consequência de qualquer contrapartida da parte de quem o recebe, pelo que não é susceptível de enquadramento no Estatuto do Mecenato, aprovado pelo Decreto-Lei nº 74/99, de 16 de Março.
Assim sendo, procedeu-se ao seu acréscimo, para efeitos de determinação do lucro tributável consolidado.
(…) - Cfr. documento a fls. 92 a 121, o qual se dá, aqui, por integralmente reproduzido;
c) Consta dos autos documento assinado pelo Chefe da Divisão de Gestão Patrimonial da Administração do Porto de Lisboa (adiante APL), onde consta, nomeadamente, o seguinte:
“(…) Licença de Utilização nº 1132
Processo nº 2043/DP/GP
Aos 19 de Janeiro de 1996, a Administração do Porto de Lisboa, adiante designada por APL, conforme deliberação do seu Conselho de Administração, e nos termos do artº 18º do Decreto-Lei nº 468/71, de 5 de Novembro, outorga a B…………, S.A., (…), licença para utilização, a título precário, duma parcela do armazém nº 24, com o nº 329 de inventário, com cerca de 3.500 m2 de área, bem como cerca de 1.600 m2 de terraplano adjacente, na ………, freguesia de ………, concelho de Lisboa (…), nas condições fixadas nos artigos seguintes:
Artº 1º
(Destino das instalações)
As instalações destinam-se a stands de automóveis de marcas pertencentes ao grupo F………… e áreas de apoio oficinal, administrativo, não podendo delas fazer-se uso diferente, sem autorização (…) da APL.
(…)
Artº 3º
(Taxas de utilização)
1 – Pela utilização das instalações fica a titular da licença obrigada ao pagamento das taxas dominiais com os seguintes valores:
Ilegível (…)
Artº 6º
(Observância das disposições legais)
1 – A presente licença não dispensa a titular do cumprimento das obrigações prescritas na lei para a execução de quaisquer obras e para o exercício da actividade prosseguida.
2 – Quaisquer obras de adaptação, reparação e conservação que se tornem necessário efectuar no conjunto das instalações só poderão ser executadas depois de previamente apreciadas e autorizadas pela APL.
(…)
Artº 12º
(Outras condições)
Em tudo o omisso na presente licença, regerá o Decreto-Lei nº 488/71, de 5 de Novembro. (…)” – Cfr. documento a fls. 153 a 158, o qual se dá, aqui, por integralmente reproduzido;
d) Por ofício datado de 3 de Novembro de 2004, foi a Impugnante notificada do Relatório de Inspecção Tributária, referente ao exercício de 2000 - Cfr. documento a fls. 91 a 123;
e) Com base nas correcções efectuadas na sequência da acção inspectiva, em 18 de Novembro de 2004 foi efectuada liquidação adicional de IRC nº 8310026918, relativo ao exercício de 2000, no montante de € 1.080.586,67 - Cfr. documento a fls. 151 e documento a fls. 296 do PAT apenso aos autos;
f) Consta dos autos documento denominado “Declaração”, emitida pela D…………, empresa do grupo da Impugnante, com o seguinte teor: “Para efeitos de apresentação em Tribunal, se declara que os colaboradores da D…………, S.A., que constam da lista anexa (e que faz parte integrante da presente declaração), passaram a deter vínculo contratual sem termo nas datas mencionadas na referida lista, passando, por esse motivo e a partir dessa data, a estar em condições de usufruir dos benefícios fiscais previstos no artº 17º (anterior 48º A) do E.B.F.(…)” - Cfr. documento a fls. 336 e 337, o qual se dá, aqui, por integralmente reproduzido;

3.1. O presente recurso vem interposto do acórdão proferido na Secção de Contencioso Tributário do TCA Sul, em 27/3/2012, que, dando provimento a recurso interposto pela Fazenda Pública, declarou nula a sentença proferida pelo TAF de Sintra e, decidindo em substituição, julgou totalmente improcedente a impugnação judicial que aquela tinha deduzido contra o acto de liquidação de IRC e juros compensatórios, do ano de 2000.
Por despacho proferido em 28/5/2013 (fls. 859) o Exmo. relator do acórdão recorrido considerou «poder haver» a apontada oposição de acórdãos.
Mas porque tal decisão do relator não faz, nesse âmbito, caso julgado, nem impede ou desobriga o Tribunal de recurso de apreciar a questão da oposição - cfr. art. 641, nº 5 do novo CPC – podendo, se for caso disso, ser julgado findo o respectivo recurso, (Cfr. o ac. deste STA, de 7/5/2003, proc. nº 1149/02: «o eventual reconhecimento judicial da alegada oposição de julgados pelo tribunal recorrido, ao abrigo, nos termos e para os efeitos do disposto no referido art. 284° nº 5 do CPPT não só não faz, sobre o ponto, caso julgado, pois apenas releva em sede de tramitação/instrução do respectivo recurso, como, por isso, não obsta a que o Tribunal Superior, ao proceder à reapreciação da necessária verificação dos pressupostos processuais de admissibilidade, prosseguimento e decisão daquele recurso jurisdicional, considere antes que aquela oposição se não verifica e, em consequência, julgue findo o recurso».
Cfr., também neste sentido, Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e de Processo Tributário, Anotado e Comentado, Vol. IV, 6ª ed., Áreas Editora, 2011, anotação 15 ao art. 284º pp. 479 a 484.) importa, então, averiguar se a alegada oposição de acórdãos se verifica.

3.2. Sendo ao caso aplicável o regime legal resultante do ETAF de 2002, nos termos dos arts. 2º, nº 1, e 4º, nº 2, da Lei nº 13/2002, de 19/2, na redacção da Lei nº 107-D/2003, de 31/12, a admissibilidade do recurso por oposição de acórdãos, tendo em conta o regime previsto nos artigos 27º, al. b) do ETAF e 152º do CPTA, depende, como se deixou expresso no ac. de 26/9/2007, do Pleno da Secção do Contencioso Tributário deste STA, no processo nº 0452/07, da satisfação dos seguintes requisitos:
«– existir contradição entre o acórdão recorrido e o acórdão invocado como fundamento sobre a mesma questão fundamental de direito;
– a decisão impugnada não estar em sintonia com a jurisprudência mais recentemente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo.
Como já entendeu o Pleno da Secção do Contencioso Administrativo deste Supremo Tribunal Administrativo (( ) Acórdão de 29-3-2006, recurso nº 1065/05), relativamente à caracterização da questão fundamental sobre a qual deve existir contradição de julgados, devem adoptar-se os critérios já firmados no domínio do ETAF de 1984 e da LPTA, para detectar a existência de uma contradição:
– identidade da questão de direito sobre que recaíram os acórdãos em confronto, que supõe estar-se perante uma situação de facto substancialmente idêntica;
– que não tenha havido alteração substancial na regulamentação jurídica;
– que se tenha perfilhado, nos dois arestos, solução oposta;
– a oposição deverá decorrer de decisões expressas e não apenas implícitas (( ) Neste sentido, podem ver-se os seguintes acórdãos da SCA:
– de 29-3-2006, recurso n.º 1065/05;
– de 17-1-2007, recurso n.º 48/06;
– de 6-3-2007, recurso n.º 762/05;
– de 29-3-2007, recurso n.º 1233/06.
No mesmo sentido, pode ver-se MÁRIO AROSO DE ALMEIDA e CARLOS CADILHA, Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, 2ª edição, páginas 765-766.)».
Por um lado, portanto, a oposição deverá decorrer de decisões expressas, não bastando a pronúncia implícita ou a mera consideração colateral, tecida no âmbito da apreciação de questão distinta e, por outro lado, a oposição de soluções jurídicas pressupõe identidade substancial das situações fácticas, entendida esta não como uma total identidade dos factos mas apenas como a sua subsunção às mesmas normas legais.

3.3. Neste contexto, importa, então, apreciar se se verifica, ou não, a suscitada oposição no que respeita à questão em apreciação nos acórdãos em confronto e que, de acordo com a recorrente se substancia na questão de saber se (aceitando-se que a indispensabilidade do custo se basta com a causalidade económica, isto é, que a sua realização foi efectuada no interesse da empresa), todavia, se estabelecem graus de exigência probatória inteiramente distintos para a demonstração da mesma causalidade económica: o acórdão, embora partindo da convicção de que a AT não questiona a real existência dos custos da empresa, impõe ao contribuinte que concretize detalhadamente os vários gastos em que incorreu neste domínio; ao passo que o acórdão fundamento entendeu que a exigência probatória imposta pelo art. 23º do CIRC se basta com a prova mínima da dita «congruência económica», dos gastos com aluguer de aeronaves, isto é, com a demonstração da existência de uma causalidade económica dos custos e da sua ligação à empresa (mesmo não tendo sido fornecidos comprovativos das reuniões, congressos ou estudos de mercado nem a identificação e alojamento das pessoas que efectuaram as deslocações).
Vejamos, pois.

4.1. No caso presente, a A…………, S.A., impugnou judicialmente liquidação adicional de IRC e juros compensatórios, do exercício de 2000, tendo o TAF de Sintra proferido sentença julgando procedente tal impugnação e anulando a liquidação visada.
A Fazenda Pública interpôs para o TCA Sul recurso jurisdicional da mesma sentença e, por acórdão de 27/3/2012, o TCAS, dando provimento ao recurso, declarou nula a sentença e, decidindo em substituição, julgou totalmente improcedente a dita impugnação judicial.
Sendo este o acórdão ora recorrido.
No qual, depois de declarada a nulidade da sentença e afirmada a consequente verificação dos requisitos para conhecer, em substituição, da única questão subsistente e em causa na impugnação, se enunciou esta como sendo a respeitante «ao julgamento da correção referente à dedução fiscal de custos com o aluguer, por parte da impugnante, de aeronaves, no valor total de € 1.481.891,93, para o ano de 2000, recusada pela at, em virtude de, grosso modo, não considerar esses gastos indispensáveis para a realização dos proveitos.»
E em apreciação de tal questão, o acórdão veio a julgar pela improcedência da impugnação, com a fundamentação seguinte, no que ora releva:
«… Perfilhamos, a título de premissa, só não serem indispensáveis “os custos que não tenham relação causal e justificada com a actividade produtiva da empresa”, isto é, a indispensabilidade, dos gastos fiscais, tem de entender-se “como referida à ligação dos custos à actividade desenvolvida pelo contribuinte” ((5) Por oposição à tese restritiva de, apenas, considerar dedutíveis os custos que patenteiem uma conexão objetiva, de causa efeito, com os proveitos.) Por outro lado, também, é seguro afirmar não recair sobre o contribuinte o ónus provatório da indispensabilidade dos seus custos.
Contudo, se a at, atuando submetida ao princípio da legalidade, fundamentadamente, despoleta a dúvida sobre a relação justificada de uma determinada despesa com a atividade do sujeito passivo, necessária e logicamente, por se encontrar mais habilitada para o efeito, compete a este uma explicação sobre a "congruência económica" da operação, a qual não se cumpre com a alegação abstracta e conclusiva de que a despesa se insere no interesse societário e/ou da existência de relação justificada com a atividade desenvolvida, exigindo-se, sim, que o contribuinte alegue e comprove factos concretos, sindicáveis, capazes de demonstrar a realidade, veracidade, das atuações empresariais provocantes dos gastos registados, em ordem a que, entre o mais, não resulte inviabilizada a função físcalizadora da AT».
E mais adiante o acórdão recorrido acrescenta, ainda, que «Concedendo-se que, em princípio, a explicação de as deslocações aéreas se terem destinado a assegurar presença em reuniões de trabalho, relacionadas com as marcas de automóveis representadas pela D…………, com a análise de eventuais oportunidades de negócio e intuitos comerciais, pelo acompanhamento de clientes, seria bastante para surpreender a relação causal e justificada dos custos com a atividade produtiva da impugnante, objetivamente, somos confrontados com justificativo de cariz conclusivo, genérico e vago, insusceptível de qualquer tipo de controle ou sindicância. Por outras palavras, sendo perfeitamente aceitável, posto o ramo de negócio e a dimensão, que representantes e/ou funcionários da impugnante tenham tido necessidade de se deslocar ao estrangeiro para contactos empresariais e comerciais, com facilidade se aceita que o fizessem recorrendo a viagens de avião, desde logo, pela celeridade que incorporam.
Ora, em sintonia com o entendimento que traçamos como perfilhado, mais do que essa explicação generalista, quase óbvia, impunha-se que a impugnante tivesse fornecido uma prova, mínima, da dita “congruência económica” dos gastos com aluguer de aeronaves, durante o ano de 2000. Ou seja, pelo menos não podia ter deixado de responder à solicitação, supra referenciada, dos serviços da AT, de molde a dissipar dúvidas sobre a casuística realização das viagens e sua ligação com a promoção do interesse societário»
Ou seja, no acórdão recorrido decidiu-se pela improcedência da impugnação por se entender que, no caso, não era possível à AT, no âmbito dos seus poderes de fiscalização e controlo, relacionar as questionadas despesas com o objecto societário, por falta de elementos, recaindo sobre a recorrente o ónus de fornecer tais elementos, o que não foi cumprido.

4.2. Por sua vez, no caso do acórdão fundamento [proferido na Secção do Contencioso Tributário do mesmo TCA Sul, em 10/3/2009, no processo nº 02608/08 (Apesar de ali terem sido interpostos dois recursos (o primeiro, interposto de despacho interlocutório que indeferira requerimento de adiamento, por falta do respectivo mandatário, da diligência de inquirição de testemunhas e o segundo, interposto da decisão final da impugnação) só este último releva para o presente recurso por oposição de acórdãos. )], apreciando-se também, para efeitos do disposto no art. 23º do CIRC, a “indispensabilidade” de despesas por deslocações em aeronaves fretadas, decidiu-se (reportando para conceito de «indispensabilidade» aceite no acórdão do mesmo TCAS, de 17/7/2007, proc. nº 1107/06) pela procedência da impugnação.
Para tanto considerou-se que não cabe à AT «emitir juízos de valor sobre a bondade da gestão empresarial prosseguida, na esteira do escopo societário, mas apenas quando tal juízo de valor reflicta uma pronúncia sobre a oportunidade de determinado tipo de conduta empresarial e, por maioria de razão, sobre a orientação dessa mesma conduta, enquanto conduta devida para a obtenção de ganhos» (ou seja, é ilegítimo determinar a qualificação de uma determinado despesa enquanto custo ao abrigo do art. 23º/1 se e na medida em que essa aferição repousar numa ponderação de causalidade entre o custo e os proveitos). E como no caso se concluiu que a AT e a sentença tinham apelado a critérios ligados à bondade da gestão empresarial [pois haviam entendido «que não se encontrava demonstrado, - cabendo o respectivo ónus à impugnante -, que as importâncias aqui em causa e não aceites como custos fiscais relevantes foram indispensáveis à obtenção de proveitos da recorrente, em juízos de valor que se prendem com a bondade e oportunidade de tais despesas, segundo critérios de (boa) gestão, uma vez que não questionam, em concreto, nem a realização de tais despesas pela recorrente, nos montantes indicados, nem que elas fossem adequadas à concretização do seu escopo societário»] também se entendeu que, sendo assim, forçoso se impunha concluir pela procedência da impugnação.
Ou seja, a solução jurídica a que se chegou no acórdão fundamento assenta, em suma, na consideração de que a correcção ao lucro tributável é ilegal porque AT e a sentença recorrida aferiram a indispensabilidade questionando a bondade e oportunidade das despesas, quando deveriam aferi-la a partir de um juízo positivo da subsunção na actividade societária.

4.3. Ora, neste contexto, não parece que ocorra a invocada oposição de acórdãos.
Na verdade, como bem aponta o MP, as soluções opostas dos dois arestos não residem no grau de "exigência probatória" da demonstração da "causalidade económica" dos custos.
Desde logo, ambos os arestos confluem na consideração de que a indispensabilidade dos gastos, para efeitos do disposto no art. 23º do CIRC, deve ser aferida a partir de um juízo positivo da subsunção na actividade societária, não cabendo à AT imiscuir-se na gestão das empresas nem valorar as decisões empresariais do contribuinte.
Por outro lado, enquanto no acórdão fundamento o recurso procede, precisamente porque se considera que, no caso ali apreciado, a AT e a sentença recorreram, ilegalmente, a critérios relacionados com as opções de gestão da empresa, para concluírem pela não demonstração da indispensabilidade das ditas despesas, no acórdão recorrido o recurso improcede porque, diferentemente, se considera que, suscitando a AT, fundamentadamente, dúvida sobre a relação justificada de uma determinada despesa com a actividade do sujeito passivo e competindo a este uma explicação sobre a "congruência económica" da operação, este ónus não se cumpre com a alegação abstracta e conclusiva de que a despesa se insere no interesse societário e/ou da existência de relação justificada com a actividade desenvolvida, exigindo-se, sim, que o contribuinte alegue e comprove factos concretos, sindicáveis, capazes de demonstrar a realidade, veracidade, das actuações empresariais provocantes dos gastos registados, em ordem a que, entre o mais, não resulte inviabilizada a função físcalizadora da AT: e, no caso e quanto às concretas despesas em questão, não era possível à AT, no âmbito dos seus poderes de fiscalização e controlo, relacioná-las com o objecto societário, por falta de elementos, recaindo sobre a impugnante o ónus de fornecer tais elementos, o que não foi cumprido.
Portanto, pese embora a semelhança verificada, a diferenciação das soluções não assenta em divergência de entendimentos sobre a mesma questão de direito, mas assenta, ainda, numa concreta e diferente valoração dos elementos de prova constantes dos respectivos autos e na consequente subsunção, ou não, das respectivas despesas àquele uniforme conceito de indispensabilidade.
Sendo certo, de todo o modo, que apenas seria relevante para fundamentar o recurso por oposição de julgados, a oposição entre soluções expressas e que tal oposição deverá existir relativamente às decisões propriamente ditas e não em relação aos seus fundamentos [não bastando, sequer, a pronúncia implícita ou a mera consideração colateral, tecida no âmbito da apreciação de questão distinta (Cfr. Jorge de Sousa e Simas Santos, Recursos Jurisdicionais em Contencioso Fiscal, p. 424; bem como, os acs. do Plenário do STA, de 15/11/2006, rec. nº 387/05, e os acs. do Pleno desta Secção do STA, de 15/9/2010, recs. nºs. 344/2009 e 881/2009. )].
Não se mostram, pois, reunidos os pressupostos da oposição de acórdãos que é invocada pelo recorrente, pelo que o recurso deve considerar-se findo, atento o disposto no nº 5 do art. 284º do CPPT.

5. E considerando-se findo o presente recurso, não há, consequentemente, que apreciar, por ter ficado inerentemente prejudicada, a requerida ampliação (ou «explicitação») da causa de pedir e do pedido, relativamente à restituição do imposto pago em 6/12/2013 e respectivos juros indemnizatórios.

DECISÃO
Termos em que, face ao exposto, acordam os Juízes do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do STA em julgar findo o recurso.
Custas pela recorrente.
Lisboa, 26 de Fevereiro de 2014. – Joaquim Casimiro Gonçalves (relator) - Isabel Cristina Mota Marques da SilvaJosé de Ascensão Nunes Lopes - Pedro Manuel Dias Delgado - Dulce Manuel da Conceição Neto - João António Valente TorrãoFrancisco António Pedrosa de Areal Rothes.