Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0844/12.0BELRA 01175/17
Data do Acordão:06/03/2020
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:SUZANA TAVARES DA SILVA
Sumário:
Nº Convencional:JSTA000P26012
Nº do Documento:SA2202006030844/12
Data de Entrada:10/25/2017
Recorrente:AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Recorrido 1:A... LDA
Votação:UNANIMIDADE COM 1 DEC VOT
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

I – Relatório

1 – Por Acórdão de 5 de Fevereiro de 2020 acordaram os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo em negar provimento ao recurso que o Representante da Fazenda Pública interpusera da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, que, em 22 de Maio de 2017, havia julgado parcialmente procedente a impugnação judicial que a A…………, Lda deduzira da liquidação adicional de IVA, imputada a Dezembro de 2010 e dos respectivos juros de mora. Por essa decisão foi também condenada a Recorrente em custas.

2 – Por requerimento de 21 de Fevereiro de 2020 (fls. 365 do SITAF), veio o Recorrente, nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 616.º e n.º 1 do artigo 666.º do Código de Processo Civil (CPC) ex vi da al. e) do artigo 2 do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) requerer a reforma quanto a custas, mais concretamente, a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, nos seguintes termos:
1. Nos autos de Impugnação já referenciados, a Secção Contencioso Tributário do STA decidiu-se pela verificação da caducidade do direito à liquidação (artigo 45.º da LGT) e negou provimento ao recurso interposto pela FP, confirmando a decisão de primeira instância.
2. O problema é que, tendo em conta o valor da causa, impõe-se, nos termos da lei, o pagamento do respectivo remanescente, em cumprimento do disposto na anotação à TABELA I anexa ao Regulamento das Custas Processuais (RCP), de acordo com a 1.ª parte do n.º 7 do art.º 6.º do citado diploma legal.
3. Mas, na nossa opinião, a decisão agora tomada não implicou um grau elevado de sofisticação da análise.
4. Porque a questão em causa, embora controversa, apenas é apreciada de uma forma qualitativa, se efectivamente se verifica ou não, pelo que, salvo melhor opinião, não se trata de uma análise especialmente complexa.
5. Acresce que a Fazenda Pública entende que adoptou, neste processo, um comportamento processual irrepreensível de colaboração com os Tribunais, pautando a sua conduta processual pelo princípio da legalidade, como se demonstrou, pelo princípio de colaboração com a justiça, abstendo-se da prática de actos inúteis, fornecendo todos os elementos necessários à boa decisão da causa e não promovendo quaisquer expedientes de natureza dilatória.
6. E ao não se pronunciar sobre o valor das custas processuais, com a consequência de funcionar a regra geral da fixação do valor a pagar apenas pelo critério do valor da causa, parece-nos, neste caso concreto, que o valor aqui a pagar a título de remanescente, que também inclui na sua natureza um elemento de bilateralidade (cfr. 4°, n.° 2, da Lei Geral Tributária), se nos afigura elevado em termos de uma contrapartida devida pela utilização do serviço público da justiça prestado, podendo até ofender os princípios constitucionais do direito de acesso aos tribunais e da proporcionalidade decorrentes do estatuído nos artigos 20.°, n.º 2.° e 18.°, n.° 2, da CRP.
7. Diz-nos o acórdão do STA de 22/03/2017, no recurso nº 01568/15, que “A dispensa do remanescente prevista neste preceito legal prende-se com a verificação de dois requisitos cumulativos, a simplicidade da questão tratada e a conduta das partes facilitadora e simplificadora do trabalho desenvolvido pelo tribunal”.
8. Por outro lado, conforme entendimento expresso no acórdão do STA de 07.05.2014, proferido no processo n.º 01953/13 a que aderimos, «A norma constante do nº7 do art. 6º do RCP deve ser interpretada em termos de ao juiz, ser lícito, mesmo a título oficioso, dispensar o pagamento, quer da totalidade, quer de uma fracção ou percentagem do remanescente da taxa de justiça devida a final, pelo facto de o valor da causa exceder o patamar de €275.000, consoante o resultado da ponderação das especificidades da situação concreta (utilidade económica da causa, complexidade do processado e comportamento das partes), iluminada pelos princípios da proporcionalidade e da igualdade».
9. Considerando que o valor da presente causa ultrapassa o patamar de 275.000€ e que a mesma não assumiu especial complexidade nem a conduta assumida por qualquer uma das partes, em recurso, pode considerar-se num nível reprovável, nada obsta que a recorrente seja dispensada, do pagamento do remanescente da taxa de justiça, atendo o resultado da ponderação das especificidades da situação concreta (utilidade económica da causa, complexidade do processado e comportamento das partes), iluminada pelos princípios da proporcionalidade e da igualdade.
10. Pelo exposto, parecem-nos aqui reunidas as circunstâncias para que este Tribunal faça uso da faculdade prevista na segunda parte do n.º 7 do art.º 6.º do RCP, por forma a dispensar a Fazenda Pública do pagamento do remanescente da taxa de justiça, reformando-se, nessa parte, o Acórdão quanto a custas, ao abrigo do n.º 1 do art.º 616.º do CPC.
11. E, em consequência, salvo melhor opinião, deverá proceder-se à reforma da conta de custas, tendo em conta o máximo de € 275,000,00 fixado na TABELA I do RCP, desconsiderando-se, neste caso concreto, o remanescente aí previsto
Nestes termos, requerer-se, a V. Ex.ª, se digne proceder à reforma do acórdão, no que respeita à condenação em custas pela Fazenda Pública, dispensando-se o pagamento do remanescente da taxa de justiça».


2 - O Requerido não se pronunciou


3 - Cumpre apreciar e decidir, vindo o processo à conferência com dispensa de novos vistos.

II – Fundamentação

Pediu o Requerente a reforma do acórdão quanto a custas, pretendendo que este Supremo Tribunal Administrativo use da faculdade prevista na segunda parte do n.º 7 do art. 6.º do RCP, de modo a dispensá-lo do pagamento do remanescente da taxa de justiça.

O acórdão cuja reforma é peticionada não concedeu provimento ao recurso interposto pelo ora Requerente e consequentemente, foi proferida condenação do mesmo nas custas, condenação que se nos afigura inquestionável em face das normas legais que regulam a responsabilidade por custas.

No que concerne ao peticionado, este Supremo Tribunal Administrativo tem vindo a afirmar que a dispensa do remanescente da taxa de justiça tem natureza excepcional, pressupõe uma menor complexidade da causa e uma simplificação da tramitação processual aferida pela especificidade da situação e pela conduta das partes.

Ora, o caso sub judice apresenta uma complexidade normal (e não menor). E, o enquadramento fáctico-normativo do problema foi incorrectamente apresentado pela Recorrente nas suas peças processuais, nunca esclarecendo a razão pela qual ocorria uma estranha decisão de imputação do facto tributário a um exercício alheio ao ano em que o mesmo se tinha verificado, pelo que também não é correcto afirmar que a conduta processual das partes se tenha pautado pela simplificação e pelo auxílio na realização da justiça. Daqui resulta que não se verificam in casu os requisitos expressamente consagrados na lei para determinar a requerida dispensa de remanescente.

Não obstante, admite-se, com base num juízo de proporcionalidade, que, atento o valor da causa, seja adequado proceder à dispensa de parte do pagamento do remanescente da taxa de justiça.

Assim, e em linha com o que tem sido a orientação jurisprudencial deste Tribunal, justifica-se a dispensa parcial do remanescente da taxa de justiça devida pelo recurso, ao abrigo do disposto no n.º 7 do art. 6.º do RCP, quando o montante da taxa de justiça devida se mostre desproporcionado em face do concreto serviço prestado, mesmo que a questão decidenda no recurso não se afigure de complexidade inferior à comum, e desde que a conduta processual das partes se limite ao que lhes é exigível e legalmente devido.

Face ao exposto, acorda-se em reformar o acórdão quanto a custas e dispensar em 50% o pagamento do remanescente da taxa de justiça, correspondente ao valor da causa, na parcela excedente a €275.000.

Sem custas
Lisboa, 3 de Junho de 2020. – Suzana Tavares da Silva (relatora) – Paulo Antunes (com declaração de voto) – Francisco Rothes.

Tendo ficado vencido no acórdão a que se reporta o presente pedido de dispensa do pagamento da taxa de justiça, não vejo razão para não deferir o mesmo na totalidade.
Paulo Antunes