Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0633/17
Data do Acordão:11/22/2017
Tribunal:PLENO DA SECÇÃO DO CT
Relator:CASIMIRO GONÇALVES
Descritores:RECURSO POR OPOSIÇÃO DE ACÓRDÃOS
FALTA
PRESSUPOSTOS
Sumário:Se não se verifica, no recurso por oposição de acórdãos, identidade substancial das situações fácticas em confronto, nem divergência de soluções quanto à mesma questão de direito, deve o mesmo ser julgado findo, por falta de um dos pressupostos desse recurso, nos termos do disposto no nº 5 do art. 284º do CPPT.
Nº Convencional:JSTA000P22593
Nº do Documento:SAP201711220633
Data de Entrada:05/31/2017
Recorrente:AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Recorrido 1:A...
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam no Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

RELATÓRIO
1.1. A Fazenda Pública recorre, por oposição de acórdãos, nos termos do disposto no art. 27º, nº 1, al. b) do ETAF e do art. 284° do CPPT, do aresto proferido na Secção de Contencioso Tributário do TCA Sul, em 05/03/2015, que negou provimento ao recurso que a mesma Fazenda Pública interpusera da sentença proferida no TAF de Leiria em que se julgara procedente a impugnação judicial que A……………, com os sinais dos autos, deduziu contra liquidações adicionais de IVA referentes ao exercício de 1995.
Invoca-se oposição entre o acórdão recorrido e o acórdão proferido na Secção de Contencioso Tributário do STA, em 19/11/2014, no proc. nº 0407/12.

1.2. Rematando as alegações do recurso, a Fazenda Pública formula as conclusões seguintes:
I - Assenta o presente recurso na oposição entre o acórdão recorrido (Acórdão TCA Sul processo n° 03128/09 e o acórdão da 2ª secção do Supremo Tribunal Administrativo exarado no processo n° 0407/12 e datado de 19.11.2014;
II - Em ambos os acórdãos está em causa o recurso a métodos indirectos de determinação da matéria tributável por parte da AT no âmbito de acção inspectiva, em sequência do não cumprimento de obrigações por parte dos sujeitos passivos, nomeadamente no que concerne a irregularidades/omissões contabilísticas detectadas;
III - No Acórdão recorrido foi perfilhado entendimento contrário ao preconizado no Acórdão fundamento no que concerne à questão de saber se o critério da margem de comercialização obtida por amostragem utilizado pela AT no âmbito da acção de inspecção pode ser posto em causa com o fundamento de que outro critério — o indicado pelo impugnante — seria mais adequado;
IV - Em ambas as situações, face à impossibilidade de comprovação e quantificação directa da matéria tributável ficou a AT legitimada a socorrer-se de métodos indirectos para a sua determinação, em ambos se questionou se o método utilizado pela AT para quantificar a matéria tributável foi o mais adequado/desadequado;
V - Entendeu o douto acórdão recorrido que:
“(…) a impugnação tem de proceder já que o impugnante logrou demonstrar, através da enunciada prova testemunhal e documental a existência de elementos susceptíveis de afastar o enquadramento feito pela Administração Tributária e Aduaneira, apontando um critério mais credível, por coerente e adequado à quantificação exacta e justa daí que, como se começou por afirmar, bem andou a Mma. Juiz “a quo” ao considerar que “(…) não pode a presente impugnação deixar de ter sucesso.”.
VI - Procedendo ao “afastamento” do critério utilizado pela AT por considerar que o critério apontado pelo impugnante é “mais credível”, e daí fazendo decorrer a desadequação do critério que serviu de base correcção da matéria tributável.
VII - Em oposição, preconizou o acórdão fundamento que:
“(…) a questão não é a de saber se o critério utilizado pela AT é o mais adequado para quantificar a matéria tributável, sendo seguro que sempre poderíamos aventar muitos outros, eventualmente mais perfeitos; a questão é a de saber se o critério utilizado se revela adequado, racionalmente ajustado e se está alicerçado em factos comprováveis.
Não podemos perder de vista que a AT se viu compelida a utilizar os métodos indirectos porque o Contribuinte não cumpriu com os deveres que legalmente lhe estão cometidos e que permitiriam a tributação do seu rendimento real e que, por isso, passou a competir à AT, dentro dos limites da lei, eleger o método que repute mais adequado à determinação da matéria tributável, sem prejuízo de o Tribunal poder sindicar a sua correcta interpretação e aplicação em caso de litígio entre a AT e o sujeito passivo.
Ora, como bem decidiu a Juíza do Tribunal a quo, o método adoptado pela AT para a determinação da matéria tributável nem é inadmissível nem se mostra, em abstracto, ostensivamente inadequado, antes se apresentando como racional e fundamentado em factos concretamente apurados. Na verdade, à luz das regras da experiência, segundo critérios de razoabilidade e tendo em conta as circunstâncias do exercício da actividade (...).
(...) Na verdade, estabelecida a legitimidade do recurso aos métodos indirectos, impende sobre o Impugnante a demonstração do erro ou manifesto excesso na quantificação da matéria tributável, sendo que a dúvida a esse propósito será decidida em sentido desfavorável à sua pretensão. Como adverte SALDANHA SANCHES, «o regime de dúvida razoável aplicado à prova indirecta levaria longe de mais, na medida em que a avaliação indirecta é sempre menos exacta da que é feita, nos termos legais, pelo contribuinte» (SALDANHA SANCHES, Manual de Direito Fiscal, Lex - 1981, pág. 281. No mesmo sentido, mas já no domínio da LGT, pronunciou-se o mesmo Autor, na 2ª edição daquele Manual, Coimbra Editora, pág. 311.). Bem se compreende que assim seja pois «a quantificação por presunção só a si lhe é imputável, pelo que o contribuinte, se queria ser tributado pelo lucro real, deveria ter uma contabilidade sã, que permitisse o controlo dos dados nela constantes».(...)”
VIII - Concluindo o mesmo acórdão que:
“(...) II – No que respeita à quantificação da matéria tributável, deve considerar-se suficiente a fundamentação que permite ao destinatário conhecer os motivos por que a fixação foi naquele concreto montante, habilitando-o a conformar-se ou contra ela reagir graciosa ou contenciosamente.
III - O critério usado pela AT na quantificação da matéria tributável por métodos indiciários tem de revelar-se adequado e racionalmente ajustado — um modo adequado de aproximação à realidade -, mas não pode ser atacado com o fundamento de que outro ou outros se revelariam mais ajustados, pois não pode perder-se de vista que a quantificação por presunção é imputável exclusivamente ao contribuinte, que se queria ser tributado pelo lucro real, deveria ter cumprido com as obrigações que sobre ele recaíam.(…)”
IX - Assim, verifica-se a identidade de situações, já que em ambos os Acórdãos (recorrido e fundamento), estão em causa o recurso a métodos indiretos de determinação da matéria tributável por parte da AT no âmbito da acção inspetiva, por força do não cumprimento de obrigações por parte dos sujeitos passivos.
X - Em ambos se questionou se o método utilizado pela AT para quantificar a matéria tributável foi o mais adequado/desadequado, sendo que, no acórdão recorrido se afastou o método utilizado pela AT por se considerar que o apresentado pelo impugnante era “mais adequado”, e no acórdão fundamento se entendeu que o critério usado pela AT na quantificação da matéria tributável por métodos indiciários não pode ser atacado com o fundamento de que outro ou outros se revelariam mais ajustados.
XI - Concluindo, em ambos os acórdãos foi decidida a mesma questão de direito e analisadas as mesmas disposições legais, tendo o acórdão recorrido perfilhado, de forma expressa, solução diametralmente oposta à do acórdão fundamento, não podendo deixar de se concluir que deve ser julgada verificada a oposição de acórdãos invocada.
XII - Razão pela qual deverá o presente recurso proceder, com a consequente revogação do acórdão proferido pelo TCA Sul no processo nº 03128/09;
XIII - Desta forma, deve ser proferido acórdão que decida a questão controvertida no sentido sustentado pela FP no presente recurso, ou seja, de acordo com o sentido decisório do acórdão fundamento.
Termina pedindo que seja dado provimento ao presente recurso, devendo ser proferido acórdão que decida no sentido preconizado no acórdão fundamento, assim se fazendo JUSTIÇA.

1.3. Não foram apresentadas contra-alegações.

1.4. O MP emite Parecer nos termos seguintes:
«A recorrente, FAZENDA PÚBLICA, vem sindicar o acórdão do TCAS, de 05 de Março de 2015, exarado a fls. 207/224, por alegada oposição com o acórdão do STA, de 19 de Novembro de 2014, proferido no recurso n° 0407/12, disponível no sítio da Internet www.dgsi.pt.
O acórdão recorrido manteve decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, que julgou procedente impugnação judicial deduzida contra LA do IVA, de 1995, no entendimento de que o impugnante apresentou um critério de determinação da matéria tributável mais credível, por coerente e adequado à quantificação exata e justa.
A recorrente alegou, em 1° grau, no sentido de evidenciar a oposição de acórdãos, nos termos de fls. 242/247.
A recorrente estruturou, também, alegações de 2° grau (de fundo), tendo concluído nos termos de fls. 288/290.
O recorrido, A………….., não contra-alegou.
São requisitos do prosseguimento do recurso por oposição de acórdãos:
- Identidade de situações fácticas;
- Trânsito em julgado do acórdão fundamento;
- Quadro legislativo substancialmente idêntico;
- Acórdãos proferidos em processo diferentes ou incidentes diferentes do mesmo processo;
- Necessidade de decisões opostas expressas. [(1) Código de Procedimento e de Processo Tributário, anotado e comentado, 2007, II volume, página 808/812, Juiz Conselheiro Jorge Lopes de Sousa].
- A decisão recorrida não estar em sintonia com a jurisprudência mais recente consolidada do STA.
A alteração substancial da regulamentação jurídica relevante para afastar a existência de oposição de julgados verifica-se sempre que as eventuais modificações legislativas possam servir de base a diferentes argumentos que possam ser valorados para determinada solução [(2) Acórdãos do PLENO da SCT-STA, de 1992.06.19 e 2005.05.18, proferidos nos recursos números 19532 e 276/05, respetivamente].
A oposição de soluções jurídicas pressupõe identidade substancial das situações fácticas, entendida não como uma total identidade de factos mas apenas como a sua subsunção às mesmas normas legais. [(3) Obra citada, página 809 e acórdão do STJ de 1995.04.26 proferido no recurso n° 87156].
A oposição de soluções exige, ainda, pronúncia expressa sobre a questão, não bastando a pronúncia implícita ou a mera consideração colateral, tecida no âmbito da apreciação de questão distinta. [(4) Acórdãos do PLENO SCT-STA, de 2009.05.06, proferido no recurso n° 617/08 e de 2013.04.10-P. 0298712, disponíveis no sítio da Internet www.dgsi.pt.].
A nosso ver, ressalvado melhor juízo, não se verificam os pressupostos de prosseguimento do recurso por oposição de acórdãos.
Na verdade, no acórdão recorrido está em causa a LA de IVA de 1995, que teve na sua génese um ação inspetiva, no decurso da qual a IT verificou que a sociedade comercial, da qual o recorrido era gerente, evidenciava irregularidades na organização e execução da contabilidade e indícios fundados de que a contabilidade não refletia a exata situação patrimonial e o resultado, efetivamente, obtido, pelo que procedeu à determinação do lucro tributável por métodos indiciários, nos termos do disposto no artigo 51°/a) / d) e 52° a) do CIRC.
Na determinação da matéria tributável a AT utilizou o critério das margens de comercialização, obtida por amostragem que, de acordo com o RIT, incidiu sobre 25 das 33 coleções incluídas no inventário físico de 1995, que corresponde a 75% do seu universo e que apurou uma margem de comercialização sobre o preço de 302%.
O tribunal recorrido manteve a decisão de 1ª instância, mantendo a anulação da liquidação no entendimento de que o impugnante apresentou um critério mais credível e adequado à determinação da matéria tributável de forma mais exata e justa, uma vez que ficou provado que a sociedade devedora originária comercializava cerca de 40 produtos, e não 33, com preços diferenciados, sendo certo que quando considerados 34 dos produtos comercializados a margem de lucro ronda os 250% e não os 302%.
No acórdão fundamento estavam em causa liquidações adicionais de IRS de 1993, 1994 e 1995, que tiveram na sua génese um procedimento de inspeção, no âmbito do qual se constatou que o impugnante, de facto, exerceu a atividade de construção de prédios para venda, embora não estivesse coletado para o efeito, tendo sido notificado para proceder à regularização da sua escrita, com a cominação do lucro tributável ser fixado por métodos indiciários, nos termos do estatuído no artigo 38° do CIRS.
Como não deu cumprimento ao determinado a AT procedeu à inscrição oficiosa do impugnante e à determinação do rendimento tributável por métodos indiciários/indiretos, nos termos do disposto no artigo 38° do CIRS.
Na determinação da matéria tributável foi utilizado o critério do custo de construção da habitação económica/m2, constante de Portarias anualmente aprovadas, acrescido de 10%, nos exercícios em causa nos autos.
Em ambos os acórdãos se procedeu à determinação da matéria tributável por métodos indiretos, nos termos do estatuído nos artigos 51º e 52° do CIRC e 38° do CIRC, sendo certo que em ambos os casos estava em causa a questão de saber se o critério utilizado era adequado para quantificar a matéria tributável.
A nosso ver inexiste identidade de situações de facto e daí que a solução jurídica das causas tenha tido diferente.
Com efeito, no acórdão fundamento, em que o impugnante se limitou a questionar a adequação do critério utilizado pela AT, alegando que “o que as portarias fornecem é o custo da construção”, decidiu-se que o que está em causa não é a questão de saber se o critério utilizado pela AT é o mais adequado para quantificação da matéria tributável, pois, em princípio, sempre seria possível sugerir outros critérios, eventualmente, mais perfeitos.
Na verdade, diz-se no acórdão fundamento, a questão é a de saber se o critério utilizado se revela adequado, racionalmente ajustado e se está alicerçado em factos comprováveis.
Com efeito, continua o acórdão fundamento, não se pode esquecer que a AT procedeu à determinação da matéria tributável por facto imputável ao sujeito passivo, nos termos legais, pois, de outro modo, seria tributado o rendimento real, pelo que passou a competir à AT, nos termos legalmente estabelecidos eleger o método que julgue mais adequado à determinação da matéria tributável, sem prejuízo do controlo jurisdicional.
Ora, diz-se no acórdão fundamento, o método utilizado pela AT não é inadmissível, não se mostra, em abstrato, ostensivamente, inadequado, antes se mostrando racional e fundamentado em factos concretamente apurados.
Efetivamente, conclui a decisão fundamento, a utilização dos custos de construção da habitação económica constitui uma forma válida da aproximação à realidade, se bem que, manifestamente, favorável ao contribuinte.
Pelo contrário, no acórdão recorrido, decidiu-se que, a impugnação tem de proceder, uma vez que o impugnante conseguiu demonstrar, através da anunciada prova testemunhal e documental que o critério utilizado pela AT não é o mais adequado, sendo que o critério por si apresentado é mais credível, por coerente e mais adequado à quantificação exata e justa.
De facto, sustenta a decisão recorrida, a B…………, devedora originária, comercializava 40 produtos e não 33, como se diz no RIT, não sendo verdade que a amostra de 25 produtos escolhidos pela AT corresponda a 75% do universo dos produtos comercializados, pois, apenas, corresponde a 62,5%, um pouco mais de metade.
Por outro lado, diz-se no acórdão recorrido, a amostra dos 34 artigos apresentada pelo impugnante, que a FP não põe em causa, num universo de 40, e que determinou que se obtivesse uma média de margem de lucro de 250%, pelo número de artigos que compreende, a quase totalidade dos produtos da atividade da sociedade, é certo que consubstancia um critério mais credível, por coerente e adequado à quantificação exata e justa.
Não se verificam, assim, salvo melhor juízo, todos os enunciados pressupostos para prosseguimento do presente recurso por oposição de acórdãos.
Se assim não for entendido, então, a nosso ver, o recurso não deve lograr provimento.
Na verdade, o critério usado pela AT para determinação da matéria tributária assenta em pressupostos fácticos inexatos.
Com efeito, a sociedade devedora originária comercializava 40 e não 33 produtos, pelo que a amostra deveria ter por referência esse total de 40 produtos.
A amostra da AT corresponde, assim, a 62,5% do universo dos produtos comercializados e não a 75%, como, erroneamente, sustentou a AT.
Por outro lado, a amostra apresentada pelo impugnante, de 34 produtos, no referido universo de 40, revela-se racionalmente ajustada e está alicerçado em factos comprováveis, corresponde a 82% do universo dos produtos comercializados, tendo determinado uma média de margem de lucro de 250%
Portanto, o critério utilizado pela AT para determinação da matéria tributável, por assentar em pressupostos de facto inexatos não se afigura credível por coerente e adequado à quantificação exata e justa daquela matéria que, não obstante a utilização dos métodos indiretos deve aproximar-se o mais possível da tributação do rendimento real.
Termos em que deve dar-se por não verificada a oposição de acórdãos e dar- se o acórdão por findo, ou, caso assim não se entenda, negar-se provimento ao recurso e manter-se o acórdão recorrido na ordem jurídica.
1.5. Corridos os vistos legais, cabe decidir.

FUNDAMENTOS
2. O aresto recorrido considerou a provados os factos seguintes:
A) A sociedade comercial B…………………….. Lda., foi alvo de uma acção de fiscalização, respeitante aos exercícios de 1995 e 1996, que culminou com a elaboração do relatório de fls. 16 a 20 do apenso, que se dá por integralmente reproduzido onde, entre o mais, consta o seguinte:






(...)»
B) Foi elaborado o verbete de fixação do IVA referente ao ano de 1995 - fls. 53 do apenso.
C) E emitidas as liquidações de IVA e juros compensatórios do ano de 1995 de fls. 59 a 77, que se dão por integralmente reproduzidas.
D) Instaurada a execução fiscal para cobrança das dívidas referidas na alínea antecedente, por despacho de 3/11/2001, foi revertida a execução contra o ora impugnante - fls. 97 do apenso.
E) A B………., Lda., comercializava cerca de 40 produtos, com preços diferenciados.
F) Quando considerados 34 dos produtos comercializados pela B………., Lda., a margem de lucro ronda os 250%.
G) Em 21.10.1999 reuniu a Comissão de Revisão a que se refere os artigos 85° e ss. do CPT, constituída por E…………….., Subdirector Tributário, Delegado da Fazenda Pública — Presidente e pelos vogais ………………., Perita da Fiscalização Tributária delegada da Fazenda Pública e ………….., nomeado pelo contribuinte, a qual apreciou a reclamação apresentada pelo contribuinte B………….., Lda., não tendo chegado a acordo, quanto, a quantificação do montante de IVA referente 1999 resultantes da aplicação de métodos indirectos. (cfr. acta da reunião da Comissão de Revisão junto ao processo administrativo não paginado.)
(Esta alínea foi aditada ao Probatório pelo TCA Sul, ao abrigo do disposto no nº 1 do art. 662º do CPC, ex vi art. 281º do CPPT).

3.1. Como se referiu, a Fazenda Pública invoca oposição de acórdãos entre o acórdão recorrido e o acórdão proferido pela Secção de Contencioso Tributário do STA, em 19/11/2014, no processo nº 0407/12.
Importa, portanto, antes de mais, averiguar se os requisitos da oposição se verificam, já que, não obstante ter sido proferido despacho pelo Exmo. Relator (fls. 276/277), a considerá-la verificada, tal decisão, como vem sendo jurisprudência pacífica e reiterada deste Supremo Tribunal, (Cfr., entre outros, o ac. de 7/5/2003, rec. nº 1149/02.) não só não faz caso julgado, como não impede ou desobriga o Tribunal de recurso de a apreciar. (Cfr. o nº 5 do art. 641 do CPC; cfr. também neste sentido, Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e de Processo Tributário: Anotado e Comentado, Vol. IV, 6ª ed., Lisboa, Áreas Editora, 2011, p. 479 (anotação 15 ao art. 284º).)
Vejamos.

3.2. Sendo aplicável o regime legal resultante do ETAF de 2002, nos termos dos arts. 2º, nº 1, e 4º, nº 2, da Lei nº 13/2002, de 19/2, na redacção da Lei nº 107-D/2003, de 31/12, a admissibilidade do recurso por oposição de acórdãos, tendo em conta o regime previsto nos artigos 27º, al. b) do ETAF e 152º do CPTA, depende, como se deixou expresso no ac. de 26/9/2007, do Pleno da Secção do Contencioso Tributário deste STA, no processo nº 0452/07, da satisfação dos seguintes requisitos:
«– existir contradição entre o acórdão recorrido e o acórdão invocado como fundamento sobre a mesma questão fundamental de direito;
– a decisão impugnada não estar em sintonia com a jurisprudência mais recentemente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo.
Como já entendeu o Pleno da Secção do Contencioso Administrativo deste Supremo Tribunal Administrativo (( ) Acórdão de 29-3-2006, recurso nº 1065/05), relativamente à caracterização da questão fundamental sobre a qual deve existir contradição de julgados, devem adoptar-se os critérios já firmados no domínio do ETAF de 1984 e da LPTA, para detectar a existência de uma contradição:
– identidade da questão de direito sobre que recaíram os acórdãos em confronto, que supõe estar-se perante uma situação de facto substancialmente idêntica;
– que não tenha havido alteração substancial na regulamentação jurídica;
– que se tenha perfilhado, nos dois arestos, solução oposta;
– a oposição deverá decorrer de decisões expressas e não apenas implícitas (( ) Neste sentido, podem ver-se os seguintes acórdãos da SCA:
– de 29-3-2006, recurso n.º 1065/05;
– de 17-1-2007, recurso n.º 48/06;
– de 6-3-2007, recurso n.º 762/05;
– de 29-3-2007, recurso n.º 1233/06.
No mesmo sentido, pode ver-se MÁRIO AROSO DE ALMEIDA e CARLOS CADILHA, Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, 2ª edição, páginas 765-766.)».
Por um lado, portanto, a oposição deverá decorrer de decisões expressas, não bastando a pronúncia implícita ou a mera consideração colateral, tecida no âmbito da apreciação de questão distinta e, por outro lado, a oposição de soluções jurídicas pressupõe identidade substancial das situações fácticas, entendida esta não como uma total identidade dos factos mas apenas como a sua subsunção às mesmas normas legais.

3.3. No caso, conforme decorre quer das alegações de 1º grau constantes de fls. 242/247, quer das Conclusões das alegações (de 2º grau) supra transcritas, a Fazenda Pública substancia a existência de oposição de acórdãos na alegação seguinte: estando em causa o recurso a métodos indirectos de determinação da matéria colectável por parte da AT no âmbito de acção inspectiva, por força do não cumprimento de obrigações legais por parte dos sujeitos passivos, e questionando-se em ambos os arestos se o método utilizado pela AT para quantificar a matéria tributável foi, ou não, o mais adequado, enquanto no acórdão recorrido se afastou o método utilizado pela AT por se considerar que o apresentado pelo impugnante era “mais adequado”, já no acórdão fundamento se concluiu que o critério usado pela AT na quantificação da matéria tributável com recurso a métodos indirectos, não pode ser atacado com o fundamento de que outro ou outros se revelariam mais ajustados.
Daí concluindo a recorrente que o acórdão recorrido perfilhou, de forma expressa, solução diametralmente oposta à do acórdão fundamento, apesar de em ambos os acórdãos ter sido decidida a mesma questão de direito e analisadas as mesmas disposições legais.

3.4. Ora, atentando no teor do acórdão recorrido, dele ressalta, no essencial, o seguinte:
— Está em causa uma liquidação adicional de IVA de 1995, operada à sociedade comercial B……………., Lda., no seguimento de uma acção de inspecção a essa sociedade e no decurso da qual os Serviços de Inspecção Tributária verificaram que tal sociedade (da qual o recorrido A………… era gerente, e contra o qual veio, posteriormente, a reverter a execução fiscal) evidenciava irregularidades na organização e execução da contabilidade e indícios fundados de que esta não reflectia a exacta situação patrimonial e o resultado efectivamente obtido.
— Considerando não ser possível proceder à quantificação directa da matéria tributável ali em questão, os Serviços da Inspecção Tributária (IT) procederam à determinação do lucro tributável por métodos indirectos, nos termos do disposto no art. 51°/a) / d) e 52° a) do CIRC.
— E para determinar a matéria tributável a AT utilizou o critério das margens de comercialização obtida por amostragem: a qual, de acordo com o Relatório de Inspecção Tributária (RIT), incidiu sobre 25 das 33 colecções (livros e enciclopédias) incluídas no inventário físico de 1995, que corresponde a 75% do seu universo de vendas e que apurou uma margem de comercialização sobre o preço de 302%.
— Tendo o recorrido impugnado judicialmente a dita liquidação de IVA, o TAF de Leiria julgou a impugnação procedente, e tendo a Fazenda Pública recorrido para o TCAS, o acórdão recorrido confirmou a decisão de 1ª instância, mantendo a anulação da liquidação no entendimento de que o impugnante apresentou um critério mais credível e adequado à determinação da matéria tributável.
Isto porque:
— Ficou provado que a sociedade devedora originária comercializava cerca de 40 produtos e não 33 (como considerara a AT, apesar de, alegadamente, a B………….., Lda., ter disponibilizado à AT um mapa que retratava o universo de produtos que comercializava), com preços diferenciados, sendo certo que, mesmo considerando apenas 34 dos 40 produtos comercializados, a margem de lucro ronda os 250% e não os 302%, sendo que do RIT não é possível descortinar, minimamente, a razão porque é que se entendeu escolher aqueles 25 produtos e não um outro qualquer número e/ou valor, já que nenhuma circunstância de facto é referenciada que a permita extrapolar, sequer, como plausível e, muito menos como admissível.
— Acrescendo que a AT também não demonstra a razão pela qual, sendo em número de 40 o universo total de produtos/mercadorias comercializados e vendidas pela impugnante (cfr. Probatório), foram apenas seleccionadas 25 para a amostra, atendendo, até, a que, como se disse e também se refere na al. F) do Probatório, a margem de lucro baixaria de 302% para 250% pela consideração de 34 das mercadorias comercializadas, não se vislumbrando razões para a selecção daquelas 25 mercadorias.
— Ou seja, não é verdade que, conforme se diz no RIT, a amostra de 25 produtos escolhidos pela AT corresponda a 75% do universo de produtos comercializados pela B…………. De facto, tal amostragem, apenas corresponde a 62,5% dos produtos, ou seja, um pouco mais de metade. E, por outro lado, também parece seguro e certo que a amostra de 34 dos artigos apresentada pelo impugnante (e que a AT não põe em causa), num universo de 40, e que determinou que se obtivesse uma média de margem de lucro de 250%, consubstancia um critério mais adequado (dado o número de artigos que compreende, ou seja, a quase totalidade dos produtos da actividade da sociedade) para alcançar a matéria tributável mais próxima da realidade (embora também quanto a este não se exteriorize qualquer dado objectivo que permita aferir da representatividade desses artigos relativamente à actividade da B…………
— Assim sendo, contrariamente ao entendimento da recorrente Fazenda Pública, está demonstrada a desadequação do critério utilizado para a determinação da quantificação da matéria tributável, pelo que a impugnação tem de proceder, uma vez que o impugnante logrou demonstrar, através da enunciada prova testemunhal e documental, a existência de elementos susceptíveis de afastar o enquadramento feito pela AT, apontando um critério mais credível, por coerente e adequado à quantificação exacta e justa.

3.5.1. Por sua vez, o acórdão fundamento respeita a impugnação judicial de liquidações adicionais de IRS, dos anos de 1993, 1994 e 1995, operadas pela AT após procedimento de inspecção, no âmbito do qual se constatou que o ali impugnante exerceu efectivamente a actividade de construção de prédios para venda, embora não estivesse colectado para o efeito [apesar de não colectado em qualquer actividade comercial/industrial declarara, além dos rendimentos da categoria A, também os da categoria C (sociedade de simples administração de bens), actos isolados (vendas de fracções de um prédio construído)], tendo, por isso, sido notificado para proceder à regularização da sua escrita, com a cominação de que, não o fazendo, o lucro tributável seria fixado por métodos indirectos, nos termos do estatuído no art. 38° do CIRS.
E não tendo o sujeito passivo dado cumprimento ao determinado na referida notificação, a AT procedeu à inscrição oficiosa do impugnante e à determinação do rendimento tributável por métodos indirectos, nos termos do dito art. 38° do CIRS, tendo, nessa determinação utilizado o critério do custo de construção da habitação económica/m2, constante de Portarias anualmente aprovadas, acrescido de 10%, nos exercícios em causa nos autos.

3.5.2. No que ora releva, a factualidade julgada provada no acórdão fundamento é, para além do mais, a seguinte:
«(...)
5 - O ora impugnante não correspondeu ao convite, feito pela AT, de regularizar a sua escrita, pelo que, entendendo a Administração Tributária não ser possível a comprovação directa e exacta dos proveitos deste (em virtude dos valores declarados das vendas das fracções serem baixos, tendo em conta o local onde se situavam e o preço praticado na zona para idênticos apartamentos) e procedeu à determinação da matéria colectável, por aplicação de métodos indiciários, com recurso aos valores do preço de construção por metro quadrado de habitação económica, para prédios localizadas na sede do concelho da Lousã, estabelecidos por portaria - citado Relatório de Inspecção.
6 - Do relatório final de fiscalização, efectuado ao contribuinte, que lhe foi regularmente notificado e que aqui se dá por reproduzido, para todos os efeitos legais, consta nomeadamente o seguinte:
(...)
1 – Proveitos
- O valor declarado das vendas dos apartamentos é baixo, tendo em conta o local onde se situam e o preço praticado na zona para idênticos apartamentos.
- Tendo-se procurado alguns dados sobre a realidade dos valores efectivos das vendas, junto dos adquirentes, não foi possível conseguir o que se pretendia devido a ausência dos mesmos, alguns por serem emigrantes, mas o proprietário do 3º direito quando questionado sobre o assunto, mostrou-se indeciso quanto ao valor da compra que efectuara, limitando-se a lançar um valor incerto de 4.500.000$00 e assegurando que assumiu a aquisição do seu apartamento em 1991, em plena construção, o que se verificou, também com outros adquirentes, como o do 2º andar direito; (segue-se quadro 1 do Relatório, relativo às vendas das fracções realizadas nos anos de 1992, 1993, 1994 e 1995, donde consta o respectivo preço e a identificação e os NIFs dos adquirentes).
(...)
4 - Elementos corrigidos
4.1. Cálculo dos proveitos
- Por inexistência de contabilidade ou dos livros de registo exigidos pelos artigos 111º do CIRS e 50º do CIVA, conforme alínea a) do nº 1 do artigo 38º do CIRS, apesar da notificação efectuada, nos termos dos n.ºs 3 e 4 do artigo 38º, a determinação do lucro tributável vai-se fazer com aplicação dos métodos indiciários, no que se refere aos proveitos, por não ser possível a comprovação e quantificação directa e exacta dos mesmos;
- Segundo as Portarias 1133-C/91 de 31/10; 1026/92 de 31/10, 1103-C/93 de 30/10 e 975-C/94 de 31/10, que atribuem um preço de construção de habitação económica, por metro quadrado, respectivamente, para prédios localizados na sede de concelho de Lousã: 1992 - 65.600$00; 1993 - 70.800$00; 1994 - 75.600$00 e 1995 - 79.000$00, os valores resultantes seriam de 1992 - 18.499.200$00; 1993 - 6.938.400$00; 1994 - 5.670.000$00 e 1995 - 5.925.000$00, perfazendo um total de Esc. 37.032.600$00;
- Não obstante esses montantes em relação ao custo, foram presumidos os valores da venda por habitação e por garagem, respectivamente de 5.000.000$00 e 600.000$00 relativamente às vendas operadas em 1992, com um agravamento de cerca de 10% desses valores para vendas verificadas em anos subsequentes, tendo em conta que a compra de alguns desses apartamentos foi negociada em anos anteriores, ou seja ainda em construção;
- Do exposto conclui-se que o sujeito passivo ainda sai beneficiado pelo critério seguido pelos serviços em 2.672.600$00, sobretudo nos prédios alienados em 1992 e 1993;
(seguem-se vários anexos e mapas demonstrativos das operações referentes ao cálculo dos proveitos e custos e do apuramento do rendimento colectável)
7 - Notificado o impugnante do relatório de inspecção e despacho de fixação da matéria tributável, por métodos indiciários, que fixou os referidos rendimentos para efeitos de IRS nos seguintes montantes: - Esc. 8.856.000$00 para o ano de 1993; - Esc. 11.012.518$00 para o ano de 1994 e - Esc. 11.338.774$00 para o ano de 1995; veio este requerer a revisão da matéria tributável, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 84º do CPT - Reclamação de fls. 14 e segs. dos autos e que aqui se dá por reproduzida para todos os efeitos legais.
8 - Os peritos reuniram em 6 de Junho de 1997, em Comissão de Revisão, não tendo chegado a acordo – Acta da Comissão de Revisão de fls. 18 dos autos e laudos dos peritos designados pelo impugnante e pela Fazenda Pública de fls. 19 e fls. 20 e verso dos autos e que aqui se dão por reproduzidos para todos os efeitos legais.
9 - Na falta de acordo da Comissão de Revisão, o Director Distrital de Finanças de Coimbra, em 16/09/1997, confirmou a decisão proferida pelo Presidente da Comissão de Revisão, fixando a matéria colectável em sede de IRS relativos aos anos de 1992, 1993, 1994 e 1995, de acordo com o expresso na Acta de fls. 24 a fls. 25 dos autos, donde ressaltam com interesse para a presente decisão os seguintes factos e fundamentos:
(...)
5.2 - Quanto aos proveitos:
5.2.1. Quanto aos valores de venda, através do relatório de inspecção tributária foram corrigidos para valores mais próximos dos valores de mercado, tendo-se também como referência o preço de construção de habitação económica/m2, constante das portarias anualmente publicadas, sendo esses indicadores os seguintes.
(...)
5.2.2. - Por outro lado, do relatório de inspecção tributária extraem-se, dentre outros, os seguintes indicadores:
(...)
5.2.3 - Depreende-se assim que, relativamente aos exercícios de 1992 e 1993, os valores médios propostos são inferiores aos valores normais de mercado, e aos valores de referência das Portarias anuais, pelo que, decido manter os rendimentos colectáveis inicialmente fixados e que são os seguintes:
(...)
5.2.4 - Quanto aos exercícios de 1994 e 1995, embora os valores propostos no relatório inicial sejam inferiores aos valores de mercado ao tempo, são, no entanto, superiores aos preços de referência por m2 de habitação económica, constantes das Portarias anuais já citadas.
Apesar de não se ter obtido acordo entre os vogais, o vogal da Fazenda Pública propôs operar com tais preços de referência (1994 - 75.600$00/m2 e 1995 - 79.000$00/m2), os quais permitiriam abater aos valores inicialmente propostos, os valores de 330.000$00 e 675.000$00, nos exercícios de 1994 e 1995 respectivamente.
Com tal proposta, operar-se-ia com um valor médio/m2 inferior ao proposto no relatório inicial, embora, em termos relativos, superior ao dos anos anteriores, o que se justificará, pelo facto de, em 1994 e 1995 não ter sido vendida qualquer garagem, o que, a ter acontecido, naturalmente faria diminuir o valor médio/m2.
5.2.5 - Porque concordo com a referida proposta, que me parece justa e razoável, em função dos indicadores disponíveis, decido fixar os rendimentos colectáveis de IRS dos exercícios de 1994 e 1995, nos valores que resultam da mesma, e que são os seguintes:
[...]
FACTOS NÃO PROVADOS:
1 - A quantificação dos custos não documentados, referidos pelo impugnante, nomeadamente os custos com o corte e transporte da madeira, que o impugnante alegadamente utilizou na construção do prédio, os custos com a maquinaria e os custos com a mão-de-obra.
2 - Que o preço de venda das diversas fracções seja o que consta das respectivas escrituras».

3.6. Do confronto entre os arestos (acórdão recorrido e acórdão fundamento) vê-se que, não obstante em ambos se ter procedido à determinação da matéria tributável por métodos indirectos (nos termos do disposto nos arts. 51º e 52° do CIRC – no acórdão recorrido - e do art. 38° do CIRS – no acórdão fundamento) e em ambos estar também em causa a questão de saber se o critério utilizado era adequado para quantificar a matéria tributável, não há entre tais arestos identidade de situações de facto. Sendo esta não identidade que determina a diferente solução jurídica acolhida em cada uma das decisões.
Com efeito, como sublinha o MP, no acórdão fundamento (em que o ali impugnante se limitou a questionar a adequação do critério utilizado pela AT, alegando que “o que as portarias fornecem é o custo da construção”), veio a decidir-se que a questão não é saber se o critério utilizado pela AT é o mais adequado para quantificação da matéria tributável, pois, em princípio, sempre seria possível sugerir outros critérios, eventualmente, mais perfeitos, mas é, antes, a de saber se o critério utilizado se revela adequado, racionalmente ajustado e se está alicerçado em factos comprováveis.
E em rigor e salvo o devido respeito, esta referência a critério alicerçado em factos comprováveis (e à consequente valoração dos factos julgados provados em cada um dos acórdãos), logo coloca a questão suscitada pela Fazenda Pública, num patamar diverso, em termos de inexistência da invocada oposição de acórdãos. Aliás, realça-se no acórdão que foi por facto imputável ao contribuinte que a AT procedeu, nos termos legais, à determinação da matéria tributável (pois, de outro modo, seria tributado o rendimento real), pelo que passou a competir à AT, nos termos legalmente estabelecidos, eleger o método que julgue mais adequado à determinação dessa matéria tributável, sem prejuízo do controlo jurisdicional. Sendo que, no caso, o método utilizado pela AT não é inadmissível, não se mostra, em abstracto, ostensivamente, inadequado, antes se mostrando racional e fundamentado em factos concretamente apurados: é que, conclui-se no acórdão, a utilização dos custos de construção da habitação económica constitui uma forma válida da aproximação à realidade, se bem que, manifestamente, favorável ao contribuinte.
Ao invés, no acórdão recorrido decidiu-se que a impugnação procede, visto que o impugnante conseguiu demonstrar, através da anunciada prova testemunhal e documental, que o critério utilizado pela AT não é o mais adequado, sendo que o critério por si apresentado é mais credível, por coerente e mais adequado à quantificação exata e justa. Juízo este que, face à fundamentação do acórdão, decorre e assenta na factualidade que se julgou provada, nomeadamente, no facto de se ter provado, quer que a amostra dos 25 produtos escolhidos pela IT para o cálculo da média da margem de comercialização não corresponde à referida percentagem de 75% (apenas corresponderá a cerca de 62,5%) do universo dos (cerca de 40) produtos comercializados pela sociedade inspeccionada, quer que a amostra de 34 artigos (que veio a ser apresentada pelo impugnante e que a FP não põe em causa), naquele universo de 40, determinou que se obtivesse uma média de margem de lucro de 250%, sendo que esse número de 34 compreende a quase totalidade dos produtos da atividade da sociedade.
A diferente solução acolhida nos arestos em confronto, assenta, portanto, nos diferentes juízos de facto que formularam sobre a prova produzida nos respectivos autos, bem como na valoração, em termos de facto, dos elementos que, em cada caso, compõem e integram os critérios utilizados para o apuramento da matéria tributável, e não em divergente interpretação de norma jurídica sobre a aplicação dos métodos indirectos, respectiva quantificação, ou repartição do ónus da prova sobre os pressupostos para a aplicação ou quantificação assim operada. Sendo que a apreciação da matéria de facto não é, nesta sede, sindicável (a questão do eventual erro de julgamento de facto não cabe no âmbito e objecto do recurso por oposição de acórdãos).
Assim, porque apenas é relevante para fundamentar o recurso por oposição de acórdãos, a oposição entre soluções expressas (como se referiu, a oposição deverá existir relativamente às decisões propriamente ditas e não em relação aos seus fundamentos, não bastando a pronúncia implícita ou a mera consideração colateral, tecida no âmbito da apreciação de questão distinta), concluímos que, no caso presente e no contexto factual e jurídico acima referenciado, a diversidade de soluções a que o Tribunal chegou nos dois casos em confronto não determina qualquer oposição de julgados, na medida em que não se verificam nem a alegada identidade substancial das situações fácticas em confronto nem divergência de soluções quanto à mesma questão de direito.
Em suma, por falta dos pressupostos do recurso de oposição de acórdãos, deve o mesmo ser considerado findo, atento o disposto no nº 5 do art. 284º do CPPT.

3.7. No acórdão não se ultrapassou a fase da apreciação dos requisitos de admissibilidade do recurso por oposição de acórdãos, pois que, tendo-se concluído que tais requisitos não se verificavam, se deliberou, como se viu, julgar findo o recurso.
Assim, neste contexto, atenta também a especificidade da situação e a conduta processual das partes, essa decisão pode considerar-se de complexidade inferior à comum, justificando-se a dispensa do remanescente da taxa de justiça devida no recurso, ao abrigo do disposto no nº 7 do art. 6º do RCP.

DECISÃO
Termos em que, face ao exposto, acordam os Juízes do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do STA em julgar findo o recurso.
Custas pela recorrente, com dispensa do remanescente da taxa de justiça, nos termos referidos supra.

Lisboa, 22 de Novembro de 2017. – Joaquim Casimiro Gonçalves (relator) – Dulce Manuel da Conceição Neto – José da Ascensão Nunes Lopes – Francisco António Pedrosa de Areal Rothes – Pedro Manuel Dias Delgado - Ana Paula da Fonseca Lobo – Jorge Miguel Barroso de Aragão Seia – Isabel Cristina Mota Marques da Silva – António José Pimpão.


Segue acórdão de 21 de Fevereiro de 2018:

Acordam, em conferência, os Juízes do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

1. A Fazenda Pública, notificada do acórdão proferido nos presentes autos em 22/11/2017, veio, ao abrigo do disposto no nº 1 do art. 616º e nº 1 do art. 666º, ambos do Código de Processo Civil (CPC), aplicáveis por força do disposto na al. e) do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), requerer a respectiva reforma quanto a custas alegando para o efeito que a impugnação judicial que está na origem dos presentes autos foi instaurada antes de 1/1/2004, mais concretamente em 29/11/2001 (fls. 1 dos autos), razão pela qual beneficiará no processo da isenção subjectiva de custas prevista na al. a) do nº 1 do art. 2º do Código das Custas Judiciais (CCJ), devendo o acórdão, na parte em que condenou a Fazenda Pública em custas, ser reformado em conformidade (cfr. requerimento de fls. 320 e ss).

2. Notificado o recorrido para se pronunciar, querendo, nada veio aos autos.

3. Com dispensa de vistos, dada a simplicidade da questão, cumpre decidir em conferência, tendo em conta que o regime da reforma da sentença, contemplado no art. 616º do CPC, é aplicável aos acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo por força do preceituado no art. 666º, aplicável nos termos do art. 685º do mesmo CPC e do art. 2º, al. e) do CPPT).

4. E decidindo, dir-se-á que à requerente assiste a razão legal invocada, sendo inteiramente fundada a pretensão de reforma do acórdão, pois que se constata que a data da apresentação da petição inicial de impugnação ocorreu em 29/11/2001, conforme carimbo aposto a fls. 1 dos autos.
Ora, no regime de custas anterior à vigência do DL nº 324/2003, de 27/12, a Fazenda Pública estava isenta de custas nos processos de natureza tributária, de acordo com o disposto no art. 3º do Regulamento das Custas dos Processos Tributários (DL 29/98, de 11/2), como, aliás, já antes constava do art. 5º do Regulamento das Custas nos Processos das Contribuições e Impostos e do art. 2º da Tabela das Custas no Supremo Tribunal Administrativo, aprovado pelo DL nº 42.150, de 12/2/59. E não obstante as disposições que isentavam a Fazenda Pública de custas nos processos tributários tivessem sido revogadas pelo art. 4º, nºs. 4 e 5, do citado DL nº 324/2003 (deixando a Fazenda Pública de beneficiar de isenção no Código das Custas Judiciais que entrou em vigor no dia 1/1/2004 - art. 16º do mesmo diploma), tal só é aplicável aos processos instaurados após a sua entrada em vigor (cfr. o nº 1 do seu art. 14º), produzindo apenas efeitos, no que respeita às custas judiciais tributárias, a partir da data da transferência dos tribunais tributários para a tutela do Ministério da Justiça (art. 15º, nº 2), que ocorreu na sequência da publicação do DL nº 325/2003, de 29/12, que entrou em vigor no dia seguinte à sua publicação (art. 18º).
Assim, considerando o disposto nos normativos referidos e que, atenta a data da instauração da presente impugnação judicial, a Fazenda Pública está isenta de custas, impõe-se, portanto, a reforma, neste segmento, do acórdão proferido nos presentes autos.

5. Decisão
Nestes termos, acordam os Juízes do Pleno da Secção de Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo em deferir o pedido de reforma do acórdão proferido nos presentes autos (no segmento em que se condenou a Fazenda Pública em custas) e, consequentemente, em determinar que dele passe a constar o seguinte: «Sem custas, por a Fazenda Pública delas estar isenta nos processos tributários instaurados até 1/01/2004».
Sem custas.
Lisboa, 21 de Fevereiro de 2018. - Joaquim Casimiro Gonçalves (relator) - Dulce Manuel da Conceição Neto – José da Ascensão Nunes Lopes - Pedro Manuel Dias Delgado – Ana Paula da Fonseca Lobo – Jorge Miguel Barroso de Aragão Seia - Francisco António Pedrosa de Areal Rothes – António José Pimpão.