Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0213/11.0BECBR 024/18
Data do Acordão:06/17/2020
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:NUNO BASTOS
Descritores:IRC
LOCAÇÃO
ESTABELECIMENTO COMERCIAL
CESSÃO DE EXPLORAÇÃO
INDEMNIZAÇÃO
DESOCUPAÇÃO DE PRÉDIO URBANO
Sumário:I - Consideram-se rendimentos empresariais, para os efeitos da alínea d) do n.º 2 do artigo 3.º do CIRS, as importâncias auferidas, a título de indemnização, conexas com a atividade empresarial do sujeito passivo;
II - Não tem conexão com nenhuma atividade empresarial do sujeito passivo a indemnização acordada com o senhorio para compensação do encerramento do estabelecimento comercial que sujeito passivo nunca explorou ou destinou a exploração.
III - Consideram-se rendimentos empresariais, para efeitos da alínea e) do n.º 2 do artigo 3.º do CIRS, as importâncias conexas com a cessão temporária da exploração do estabelecimento do sujeito passivo;
IV - Tem conexão com a cessão temporária da exploração do estabelecimento do sujeito passivo a renda mensal a este devida pela exploração do dito estabelecimento cedida a terceiro.
Nº Convencional:JSTA000P26055
Nº do Documento:SA2202006170213/11
Data de Entrada:01/17/2018
Recorrente:AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Recorrido 1:A………… E OUTROS
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
1. Relatório

1.1. A Representante da Fazenda Pública interpôs recurso para o Supremo Tribunal Administrativo da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra que julgou procedente a impugnação judicial das liquidações n.ºs 201000002009921 e 201000002010357, referentes a imposto sobre o rendimento das pessoas singulares dos anos de 2006 e de 2007, respectivamente, no valor global de € 13.125,00, que tinha sido interposta por A…………, contribuinte fiscal n.º ………, e por B…………, contribuinte fiscal n.º ………, ambos residentes na Rua da ………, n.º ……, ………, 3080 Figueira da Foz.

Recurso este que foi admitido com subida imediata, nos próprios autos e com efeito devolutivo.

Notificada da sua admissão, apresentou alegações e formulou as seguintes conclusões:

1 A presente Impugnação Judicial foi interposta contra a liquidação de IRS, relativa aos anos de 2006 e 2007, decorrente de acção inspectiva, na qual foram invocados pela Impugnante, ora Recorrida, erro quanto aos pressupostos de facto e vício de ilegalidade da fundamentação de direito;

2 Por douta sentença de 12/10/2017, proferida pelo Meritíssimo Juiz a quo, a referida Impugnação Judicial foi julgada procedente, decisão com a qual não pode a Fazenda Pública concordar.

3 A questão a dirimir nos presentes autos refere-se à diferença de entendimento do Tribunal “a quo” quanto à interpretação e qualificação jurídico-fiscal dos rendimentos obtidos com a cessão de exploração de estabelecimento comercial.

4 A RFP não concorda, com todo o respeito, com a referida decisão judicial que desconsiderou a qualificação dos rendimentos em sede de subsunção da categoria B por entender que são rendimentos de rendas.

5 O negócio subjacente aos rendimentos obtidos tem por base um contrato efectuado pelo gestor de negócios do ora recorrido, um contrato de cessão de exploração de estabelecimento comercial no qual é referido, entre outros os seguintes pontos:

“1º

O 1º Outorgante é dono e legítimo possuidor de um estabelecimento comercial denominado “………”…, com licença de utilização nº ……, passada pela Câmara Municipal da Figueira da Foz em 15/02/1999.”

Pelo presente contrato de cessão de exploração, com início no dia 1 de Fevereiro do corrente ano, o 1º outorgante cede a exploração do referido estabelecimento ao 2º outorgante pelo prazo de 1 ano.

3º…

A presente cessão de exploração é acompanhada de equipamento em estado funcional tal como: balcão, fogão, máquina de lavar loiça, esquentador, máquina registadora, alguns utensílios como pratos, copos, talheres bem como algum mobiliário de café, nomeadamente mesas e cadeiras, etc. etc.”

6 Ora, dúvidas não restam que estamos perante um negócio que a lei qualifica como cessão de exploração de um estabelecimento comercial. E esta cessão de exploração está sujeita a um valor a pagar ao ora recorrido mensalmente por todos os elementos corpóreos e incorpóreos que constituem o universo do estabelecimento comercial.

7 Pela decisão judicial ora proferida, foi dado como provado (alínea Q) que os ora impugnantes não exploram o estabelecimento comercial nem tiveram esse intuito.

8 E, refere a fls. 20 que: “Na presente situação, é indubitável que os impugnantes receberam rendimentos de rendas referentes à cessação de exploração e de indemnizações no âmbito da cessão contratual na qual abriram mão do referido estabelecimento.”

9 A base legal para a sujeição ao referido imposto efectuada pela AT dos rendimentos obtidos está consagrada com força de lei, no nº 2 al. e) do artº 3º do CIRS.

Dispõe o normativo legal da seguinte forma:

“Artigo 3º - Rendimentos da categoria B

1 – (…)

2 – Consideram-se ainda rendimentos desta categoria:

(…)

e) As importâncias relativas à cessão temporária de exploração de estabelecimento;”

10 Bem como a indemnização auferida como compensação pela desocupação do estabelecimento comercial, que se encontra sujeita a imposto nos termos do referido art. 3º nº 2 al. d):

“As importâncias referidas, a título de indemnização, conexas com a actividade exercida, nomeadamente a sua redução, suspensão e cessação…”

11 Pelo que ocorreu erro de direito ao decidir pela ilegalidade da liquidação por se entender que a AT fez incorrecta aplicação da lei aos rendimentos obtidos pela cessão de exploração do estabelecimento comercial.

Pediu fosse dado provimento ao presente recurso e fosse, em consequência, revogada a sentença recorrida.

Os RECORRIDOS não apresentaram contra-alegações.

1.2. Recebidos os autos neste tribunal, foi ordenada a abertura de vista ao Ministério Público.

A Ex.ma Senhora Procuradora-Geral Adjunta emitiu douto parecer no sentido de que deve ser negado provimento ao recurso e deve ser mantida a sentença recorrida.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.



2. Dos fundamentos de facto

Na douta sentença recorrida foram julgados provados os seguintes factos: «(...)

A. Os Impugnantes emigraram para o Canadá explorando nesse país um negócio no ramo de mobiliário de cozinha (cf. doc. a fls. 12 dos autos que aqui se dá, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzido).

B. Em 27.12.2005, o Sr. G………… em nome do ora primeiro Impugnante subscreveu uma escritura pública de «Trespasse» referente ao “[…] estabelecimento comercial designado por «………» - instalado no rés do chão, com os n.ºs. …… e ……, de polícia, que constituem as fracções “A” e “B”, respectivamente, do prédio urbano em regime de propriedade horizontal situado na Rua ………, freguesia de ………, concelho de Figueira da Foz, inscrito na respectiva matriz urbana sob o artigo 2.915, com todos os elementos que o integram, respectivas licenças, alvará e direito ao arrendamento […]” (cf. doc. a fls. 13 a 15 dos autos que aqui se dá, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzido).

C. Em 01.02.2006, o Sr. G………… em nome do ora primeiro Impugnante assinou com o Sr. C………… um «Contrato de cessão de exploração de estabelecimento comercial», com início a 01.02.2006, pelo prazo de um ano e com uma renda mensal de € 375,00, relativo ao estabelecimento referido na alínea anterior, sendo que daquele consta que a “[…] a presente cessão de exploração é acompanhada de equipamento em estado funcional tal como: balcão, fogão, máquina de lavar loiça, esquentador, máquina registadora, alguns utensílios como pratos, copos, talheres, bem como algum mobiliário de café, nomeadamente mesas e cadeiras […]” (cf. doc. a fls. 27 a 28 do PA que aqui se dá, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzido).

D. Em 12.01.2007, os Impugnantes assinaram com o Sr. C………… um «contrato de comodato», referente ao estabelecimento referido nas alíneas anteriores (cf. doc. a fls. 21 a 24 dos autos que aqui se dá, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzido).

E. Em 04.01.2007, os Impugnantes, o Sr. G………… e o Sr. D………… assinaram um «Acordo Extrajudicial em Acções de Preferência», (cf. doc. a fls. 17 a 20 dos autos que aqui se dá, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzido).

F. Por ordem de serviço dos serviços de inspeção tributária foi aberto procedimento de inspeção externa à declaração de IRS dos anos de 2006 e 2007 dos ora Impugnantes (cf. docs. a fls. 4 a 9 do PA que aqui se dão, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzidos).

G. Em informação dos serviços da inspeção tributária, datada de 06.10.2010, intitulado «Projecto de Relatório de Inspecção Tributária», relativamente ao IRS dos Impugnantes dos anos de 2006 e 2007, retira-se que:

“[…]”

3. Outras situações

Os sujeitos passivos em análise, são emigrantes no Canadá, e com residência ocasional no nosso país na Rua ………, n.º ……… - …… - 3080-…… Figueira da Foz, possuindo nesta habitação isenção de IMI ao abrigo do art.º 44.º do EBF (revogado pelo art.º 87.º do n.º 1 da Lei n.º 53-A/2006 de 29/12) - prédios adquiridos através do sistema «poupança emigrante».

Até à data de 13/07/2010, não obstante os sujeitos passivos serem emigrantes encontrava-se o sujeito passivo A………… com domicílio fiscal em Portugal e a esposa B…………, desde 30/06/2009, que nomeou como representante "E…………, com o NIF: ………, com residência na Rua da ………, n.º …… - ……… - 3080-Figueira da Foz.

III. DESCRIÇÃO DOS FACTOS E FUNDAMENTOS DAS CORRECÇÕES MERAMENTE ARITMÉTICAS À MATÉRIA TRIBUTÁVEL

1. Descrição dos factos

No âmbito de uma acção inspectiva a outros sujeitos passivos, verificou-se que os sujeitos passivos em análise no ano de 2007, auferiram rendimentos sujeitos a IRS, referentes a uma indemnização paga pela desocupação do estabelecimento comercial sito na fracção A da Rua ……… inscrito na matriz predial urbana da freguesia de ………, sob o artigo 2915, referentes a uma indemnização paga por D………… com o NIF: ……… e esposa F…………, ambos emigrantes e residentes em França, conforme consta do acordo extrajudicial em acções de preferência - Proc.º 2391/06.0TBFIG 1.º Juízo/Proc.º 2390/06 2TBFIG 3.º Juízo ambas do Tribunal Judicial da Figueira da Foz.

Assim, foi aberto o despacho n.º DI201000344 para averiguação da situação em análise, uma vez que o sujeito passivo A…………, constava no cadastro da DGCI como residente em Portugal, e pelo mesmo não constava no sistema informático da DGCI qualquer declaração de rendimentos em conformidade com o preconizado nos artigos 13.º 15.º e 16.º do código de IRS, pelo que estaríamos perante uma situação de sujeitos passivos não declarantes em sede de IRS.

Em 16/03/2010, deslocámo-nos à residência dos sujeitos passivos constante do cadastro da DGCI, onde fomos informados no local, que os senhores que procurávamos eram emigrantes, não sendo vistos já alguns meses no local. Pela análise ao acordo de acção de preferência verificámos que do mesmo constava outro sujeito passivo com nome muito idêntico "G…………" que igualmente também tinha recebido uma indemnização e que era sócio gerente da …………, Ldª.

Assim, foi então contactado o Sr G…………, que nos confirmou, que o Sr A………… era seu irmão e que era ele que o representava em Portugal. Após explicação da situação o mesmo informou que efectivamente tanto ele como o irmão tinham recebido a referida indemnização, não tendo efectivamente declarado esse rendimento em sede de IRS, tendo-se desde logo e na presença do Técnico Oficial de Contas da ………… – Sr. H………… - TOC …… - NIF ……… - prontificado a apresentar as declarações de rendimentos que se encontravam em falta, bem como a proceder à alteração da residência do seu irmão A………….

Em 31/03/2010 deslocámo-nos à empresa Águas da Figueira, com o intuito de recolher e verificar os contratos formulados para a Rua ……… n.º ……, …… e ……, correspondente ao artigo n.º 2915 urbano da freguesia de ……….

Pela análise dos respectivos contratos, verificámos que o sr G…………, na qualidade de procurador de A…………, tinha adquirido o direito ao TRESPASSE do estabelecimento comercial designado por "………" de I…………, por escritura de trespasse efectuada em 27/12/2005, no Cartório Notarial de …………, na Figueira da Foz.

Verificou-se igualmente, que em 01 /02/2006 o sr G………… na qualidade de legal representante de seu irmão celebrou um contrato de cessão de exploração de estabelecimento comercial, pelo prazo de um ano e com início em 01/02/2006, com C…………, com o NIF: ………, referente ao estabelecimento comercial designado por …………, instalado no …… do n.º …… do prédio sito na Rua ……… - Figueira da Foz, com a licença de utilização n.º …….

A renda mensal da exploração era de € 375,00 acompanhada do equipamento em estado funcional, referido na cláusula 4.ª do referido contrato.

Em 12/01/2007, é celebrado entre A………… e C…………, um contrato de comodato, em virtude de no acordo judicial no proc.º n.º2391.06.0TBFIG do 1.º Juízo do Tribunal da Figueira da Foz ter acordado com os proprietários do mesmo D………… e mulher por transacção judicial efectuada a 04/01/2007, fazer cessar o contrato a 31/08/2007. Conforme referido na cláusula 3.ª do referido contrato de comodato o mesmo é celebrado pelo período de sete meses, tendo o seu início em 01/02/2007 e termo imperativo em 31/08/2007.

Face aos novos elementos obtidos, foi efectuada a 20/05/2010, uma reunião no gabinete de contabilidade do sr. H…………, onde estiveram presentes para além de mim, o coordenador da equipa L o sr. H………… e o sr. G…………, na qualidade de representante de seu irmão A…………, onde foram informados dos novos contratos e escrituras por nós obtidos, e explicado o respectivo enquadramento em sede de IRS, bem como os procedimentos a efectuar, nomeadamente, a nomeação de representante do sr A…………, o início de actividade na categoria "B" de rendimentos, pela cessão de exploração do estabelecimento com efeitos a 1/2/2006, bem como a apresentação da declaração de rendimentos mod. 3 de IRS, para os exercícios de 2006 e 2007, a indicar em 2006 os rendimentos referentes a esta cessão de exploração e em 2007 referente à cessão de exploração e à indemnização recebida.

O sr G………… e o seu técnico Oficial de Contas comprometeram-se a apresentar as declarações em falta, sem que até à presente data o tenham efectuado, não obstante tenham sido por diversas vezes contactados quer pessoalmente no gabinete do sr H…………, pelo coordenador da equipa L no dia 21/07/2010, quer por mim via telefone tanto para o sr A………… quer com o sr. H…………, sem que até à presente data tenha sido cumprida a entrega das declarações em falta.

2. - Enquadramento dos sujeitos passivos

Em conformidade com o preconizado no art.º 13.º do CIRS, ficam sujeitas a IRS as pessoas singulares que residam em território português e as que, nele não residindo, aqui obtenham rendimentos.

Conforme se verifica pela escritura de trespasse celebrada a 27/12/2005 e pelo contrato de cessão de exploração celebrado a 01/02/2006, os sujeito passivos são não residentes, que obtiveram rendimentos sujeitos a IRS, pelo que, em conformidade com o preconizado nos n.ºs 1 e 2 do art.º 130.º do CIRS deveriam para efeitos tributários, e na declaração de início de actividade, designar uma pessoa singular ou colectiva com residência ou sede em Portugal para os representar perante a Direcção-Geral dos Impostos e garantir o cumprimento dos seus deveres fiscais.

Em conformidade com a al. e) do n. 1 do art.º 18.º do CIRS, consideram-se obtidos em território português os rendimentos de actividade empresariais imputáveis a estabelecimento estável nele situado.

3 - CORRECÇÕES MERAMENTE ARITMÉTICAS

3.1. - IRS - Categoria B

3.1.1. - Início de actividade

A aquisição do direito de trespasse, de um estabelecimento comercial, pressupõe só por si a continuação de uma actividade de natureza comercial. Tanto que foi celebrado com o sr C…………, um contrato de cessão de exploração de estabelecimento comercial e não um contrato de arrendamento, pelo que, pelo menos, aquando da celebração do contrato de exploração celebrado com o sr C………… a 01/02/2006, o sujeito passivo A………… deveria ter comunicado o início de uma actividade de natureza comercial, em conformidade com o preconizado no n.º 1 do art.º 31.º do CIVA antes de iniciada a actividade. Em sede IRS e em conformidade com o preconizado nos n.ºs 2, 3 e 10, todos do art.º 28.º do CIRS, ficaria enquadrado no regime simplificado de tributação.

3.1.2. - Indemnização

Pela análise efectuada à situação, verificou-se que, o facto gerador da indemnização no montante de € 48.000,00 é a resultante da resolução do contrato de arrendamento adquirido pelo sr A…………, por escritura pública de trespasse, celebrada a 27/12/2005, no Cartório Notarial da Dr.ª …………, enquadrado em sede de IRS na al. d) do n.º 2 do art.º 3.º do CIRS.

3.1.3. - Renda mensal de exploração

As importâncias recebidas relativas à renda mensal de cessão de exploração do estabelecimento comercial, no montante de € 375,00 ficam enquadradas na categoria B de rendimentos, em conformidade com o preconizado na al. e) do n.º 2 do art.º 3.º do CIRS.

3.2. - Tributação pelo regime simplificado

3.2.1. -Ano de 2006

Conforme referido no ponto 2.2.2. e pelo contrato de cessão de exploração, encontram-se em falta os seguintes rendimentos:

A renda referente à cessão de exploração não declarada corresponde a € 375,00 x 11 meses (Fevereiro a Dezembro de 2006) = € 4.125,00.

Assim, temos:
Descrição dos rendimentos
Montantes
Rendimentos da cessão de exploração € 375 x 11 meses 1)
€ 4.125,00
Coeficiente a que se refere o n.º 2 do art.º 31 do CIRS 2)
65%
Montante apurado 3)=1x2
€ 2.681,25
Limite mínimo a que se refere a parte final do n.º 2 do art.º 31.º do CIRS (metade do salário mínimo nacional 4)
€ 5.402,60 x ½ = 2.701,30
Rendimentos Sujeitos a Tributação 5) o maior de 3 ou 4
€ 2.701,30

3.2.2. - Ano de 2007

Em conformidade com o preconizado no n.º 2 do art.º 31.º do CIRS temos os seguintes rendimentos sujeitos a tributação pela aplicação do coeficiente de 65%:

1 - A Indemnização de € 48.000,00 referida no ponto 2.2.1. foi recebida da seguinte forma - 30% em 4 de Janeiro de 2007 a que corresponde o montante de € 14.400,00 e 70% até 7 de Setembro de 2007 a que corresponde o montante de € 33.600,00, conforme consta nas cláusulas 3.ª e 4.ª do acordo de acção de preferência.

2 - A renda referente à cessão de exploração não declarada corresponde a € 375,00 x 1 mês (Janeiro de 2007).

Assim temos:
Descrição dos rendimentos
Montantes
Indemnização (14.400,00 + 33.600,00)
€ 48.000,00
Renda da cessão de exploração € 375 x 1 mês
€ 375,00
Total de rendimentos auferidos
€ 48.375,00
Coeficiente a que se refere o n.º 2 do art.º 31.º do CIRS
70%
Rendimentos Sujeitos a Tributação
33.862,50

4. - Apuramento do Rendimento Colectável

O Rendimento Colectável em IRS é em conformidade com o preconizado no art.º 22.º do CIRS, o que resulta do englobamento dos rendimentos das diversas categorias auferidas em cada ano, depois de feitas as deduções a que se refere o art.º 28.º do CIRS e abatimentos, tendo por base, em conformidade com o preconizado no art.º 76.º do CIRS, a declaração apresentada pelos sujeitos passivos ou, na falta desta terá por base os elementos que a DGCI disponha.

Em conformidade com o preconizado no art.º 15.º do CIRS, o IRS no caso de não residentes incide unicamente sobre os rendimentos obtidos em território português. Nos termos dos n.ºs 1 e 2 al. a) do art.º 13.º do CIRS, o agregado familiar é composto pelos sujeitos passivo "A" e "B''.
Rendimento Global
2006
2007
Categoria B (art.º 3.º do CIRS) 1)
€ 4.125,00
48.375,00
Coeficiente da al. a) do n.º 1 do art.º 28.º e n.º 2 do art.º 31.º do CIRS 2)
65%
70%
Montante mínimo a que se refere a parte final do n.º 2 do art.º 31.º do CIRS (metade do salário mínimo nacional) 3)
5.402,60 x ½ =

€ 2.701,30
Rendimento Colectável 4)
2.701,30
33.862,50

Face aos rendimentos declarados, o rendimento colectável apurado para os exercícios de 2006 e 2007, ascendem a € 2.701,30 e € 33.862,50, respectivamente.

IV. MOTIVOS E EXPOSIÇÃO DOS FACTOS QUE IMPLICAM O RECURSO A MÉTODOS INDIRECTOS

Não aplicável ao caso em apreço.

[…]”

(cf. doc. a fls. 35 a 46 do PA que aqui se dá, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzido).

H. Na informação referida na alínea anterior foi aposto despacho de concordância por parte do Sr. Chefe de Divisão de Justiça Tributária, datado de 11.10.2010, tendo-se determinado a notificação dos Impugnantes para “[…] exercerem o direito de audição prévia sobre as conclusões deste procedimento inspectivo […]” (cf. doc. a fls. 35 a 46 do PA que aqui se dá, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzido).

I. Do despacho e do projeto de relatório referido nas duas alíneas anteriores foi dado conhecimento aos representantes dos ora Impugnantes (cf. docs. a fls. 47 a 54 do PA que aqui se dão, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzidos).

J. Do «Relatório de Inspecção Tributária», datado de 26.10.2010, retira-se que:

“[…]”

3. Outras situações

Os sujeitos passivos em análise, são emigrantes no Canadá, e com residência ocasional no nosso país na Rua …………, n.º ……… - …… - 3080-…… Figueira da Foz, possuindo nesta habitação isenção de IMI ao abrigo do art.º 44.ºdo EBF (revogado pelo art.º 87.º do n.º 1 da Lei n.º 53-A/2006 de 29/12) - prédios adquiridos através do sistema «poupança emigrante».

Até à data de 13/07/2010, não obstante os sujeitos passivos saram Emigrantes encontrava-se o sujeito passivo A………… com domicílio fiscal em Portugal e a esposa B…………, desde 30/06/2009, que nomeou como representante "E…………, com o NIF: ………, com residência na Rua da ………, n.º …… - …… - 3080-Figueira da Foz.

III. DESCRIÇÃO DOS FACTOS E FUNDAMENTOS DAS CORRECÇÕES MERAMENTE ARITMÉTICAS À MATÉRIA TRIBUTÁVEL

1. Descrição dos factos

No âmbito de uma acção inspectiva a outros sujeitos passivos, verificou-se que os sujeitos passivos em análise no ano de 2007, auferiram rendimentos sujeitos a IRS, referentes a uma indemnização paga pela desocupação do estabelecimento comercial sito na fracção A da Rua ……… inscrito na matriz predial urbana da freguesia de ………, sob o artigo 2915, referentes a uma indemnização paga por D………… com o NIF: ……… e esposa F…………, ambos emigrantes e residentes em França, conforme consta do acordo extrajudicial em acções de preferência - Proc.º 2391.06.0TBFIG 1.º Juízo/Proc.º 2390.06.2TBFIG 3.º Juízo ambas do Tribunal Judicial da Figueira da Foz.

Assim, foi aberto o despacho n.º DI201000344 para averiguação da situação em análise, uma vez que o sujeito passivo A…………, constava no cadastro da DGCI como residente em Portugal, e pelo mesmo não constava no sistema informático da DGCI qualquer declaração de rendimentos em conformidade com o preconizado nos artigos 13.º 15.º e 16.º do código de IRS, pelo que estaríamos perante uma situação de sujeitos passivos não declarantes em sede de IRS.

Em 16/03/2010, deslocámo-nos à residência dos sujeitos passivos constante do cadastro da DGCI, onde fomos informados no local, que os senhores que procurávamos eram emigrantes, não sendo vistos já alguns meses no local. Pela análise ao acordo de acção de preferência verificámos que do mesmo constava outro sujeito passivo com nome muito idêntico "G…………" que igualmente também tinha recebido uma indemnização e que era sócio gerente da ………, Ldª.

Assim, foi então contactado o Sr G…………, que nos confirmou, que o Sr A………… era seu irmão e que era ele que o representava em Portugal. Após explicação da situação o mesmo informou que efectivamente tanto ele como o irmão tinham recebido a referida indemnização, não tendo efectivamente declarado esse rendimento em sede de IRS, tendo-se desde logo e na presença do Técnico Oficial de Contas da ……… – Sr. H………… - TOC …… - NIF ……… - prontificado a apresentar as declarações de rendimentos que se encontravam em falta, bem como a proceder à alteração da residência do seu irmão A………….

Em 31/03/2010 deslocámo-nos à empresa Águas da Figueira, com o intuito de recolher e verificar os contratos formulados para a Rua ……… n.º ……, …… e ……, correspondente ao artigo n.º 2915 urbano da freguesia de ……….

Pela análise dos respectivos contratos, verificámos que o sr G…………, na qualidade de procurador de A…………, tinha adquirido o direito ao TRESPASSE do estabelecimento comercial designado por "………" de I…………, por escritura de trespasse efectuada em 27/12/2005, no Cartório Notarial de …………, na Figueira da Foz.

Verificou-se igualmente, que em 01/02/2006 o sr G………… na qualidade de legal representante de seu irmão celebrou um contrato de cessão de exploração de estabelecimento comercial, pelo prazo de um ano e com início em 01/02/2006, com C…………, com o NIF: ………, referente ao estabelecimento comercial designado por ………, instalado no …… do n.º …… do prédio sito na Rua ……… - Figueira da Foz, com a licença de utilização n.º …….

A renda mensal da exploração era de € 375,00 acompanhada do equipamento em estado funcional, referido na cláusula 4.ª do referido contrato.

Em 12/01/2007, é celebrado entre A………… e C………, um contrato de comodato, em virtude de no acordo judicial no proc.º n.º 2391.06.0TBFIG do 1.º Juízo do Tribunal da Figueira da Foz ter acordado com os proprietários do mesmo D………… e mulher por transacção judicial efectuada a 04/01/2007, fazer cessar o contrato a 31/08/2007. Conforme referido na cláusula 3.ª do referido contrato de comodato o mesmo é celebrado pelo período de sete meses, tendo o seu início em 01/02/2007 e termo imperativo em 31/08/2007.

Face aos novos elementos obtidos, foi efectuada a 20/05/2010, uma reunião no gabinete de contabilidade do sr. H…………, onde estiveram presentes para além de mim, o coordenador da equipa L o sr. H………… e o sr. G…………, na qualidade de representante de seu irmão A…………, onde foram informados dos novos contratos e escrituras por nós obtidos, e explicado o respectivo enquadramento em sede de IRS, bem como os procedimentos a efectuar, nomeadamente, a nomeação de representante do sr A…………, o início de actividade na categoria "B" de rendimentos, pela cessão de exploração do estabelecimento com efeitos a 1/2/2006, bem como a apresentação da declaração de rendimentos mod. 3 de IRS, para os exercícios de 2006 e 2007, a indicar em 2006 os rendimentos referentes a esta cessão de exploração e em 2007 referente à cessão de exploração e à indemnização recebida.

O sr G………… e o seu técnico Oficial de Contas comprometeram-se a apresentar as declarações em falta, sem que até à presente data o tenham efectuado, não obstante tenham sido por diversas vezes contactados quer pessoalmente no gabinete do sr H…………, pelo coordenador da equipa L no dia 21/07/2010, quer por mim via telefone tanto para o sr A………… quer com o sr. H…………, sem que até apresente data tenha sido cumprida a entrega das declarações em falta.

2. - Enquadramento dos sujeitos passivos

Em conformidade com o preconizado no art.º 13.º do CIRS, ficam sujeitas a IRS as pessoas singulares que residam em território português e as que, nele não residindo, aqui obtenham rendimentos.

Conforme se verifica pela escritura de trespasse celebrada a 27/12/2005 e pelo contrato de cessão de exploração celebrado a 01/02/2006, os sujeito passivos são não residentes, que obtiveram rendimentos sujeitos a IRS, pelo que, em conformidade com o preconizado nos n.ºs 1 e 2 do art.º 130.º do CIRS deveriam para efeitos tributários, e na declaração de início de actividade, designar uma pessoa singular ou colectiva com residência ou sede em Portugal para os representar perante a Direcção-Geral dos Impostos e garantir o cumprimento dos seus deveres fiscais.

Em conformidade com a al. e) do n. 1 do art.º 18.º do CIRS, consideram-se obtidos em território português os rendimentos de actividade empresariais imputáveis a estabelecimento estável nele situado.

3 - CORRECÇÕES MERAMENTE ARITMÉTICAS

3.1. - IRS - Categoria B

3.1.1. - Início de actividade

A aquisição do direito de trespasse, de um estabelecimento comercial, pressupõe só por si a continuação de uma actividade de natureza comercial. Tanto que foi celebrado com o sr C…………, um contrato de cessão de exploração de estabelecimento comercial e não um contrato de arrendamento, pelo que, pelo menos, aquando da celebração do contrato de exploração celebrado com o sr C………… a 01/02/2006, o sujeito passivo A………… deveria ter comunicado o início de uma actividade de natureza comercial, em conformidade com o preconizado no n.º 1 do art.º 31.º do CIVA antes de iniciada a actividade. Em sede IRS e em conformidade com o preconizado nos n.ºs 2, 3 e 10, todos do art.º 28.º do CIRS, ficaria enquadrado no regime simplificado de tributação. 3.1.2. - Indemnização

Pela análise efectuada à situação, verificou-se que, o facto gerador da indemnização no montante de € 48.000,00 é a resultante da resolução do contrato de arrendamento adquirido pelo sr A…………, por escritura pública de trespasse, celebrada a 27 /12/2005, no Cartório Notarial da Dr.ª …………, enquadrado em sede de IRS na al. d) do n.º 2 do art.º 3.º do CIRS.

3.1.3. - Renda mensal de exploração

As importâncias recebidas relativas à renda mensal de cessão de exploração do estabelecimento comercial, no montante de € 375,00 ficam enquadradas na categoria B de rendimentos, em conformidade com o preconizado na al. e) do n.º 2 do art.º 3.º do CIRS.

3.2. - Tributação pelo regime simplificado

3.2.1. - Ano de 2006

Conforme referido no ponto 2.2.2. e pelo contrato de cessão de exploração, encontram-se em falta os seguintes rendimentos:

A renda referente à cessão de exploração não declarada corresponde a € 375,00 x 11 meses (Fevereiro a Dezembro de 2006) = € 4.125,00.

Assim, temos:

[…]

3.2.2. - Ano de 2007

Em conformidade com o preconizado no n.º 2 do art.º 31.º do CIRS temos os seguintes rendimentos sujeitos a tributação pela aplicação do coeficiente de 65%: - A indemnização de € 48.000,00 referida no ponto 2.2.1. foi recebida da seguinte forma - 30% em 4 de Janeiro de 2007 a que corresponde o montante de € 14.400,00 e 70% até 7 de Setembro de 2007 a que corresponde o montante de € 33.600,00, conforme consta nas cláusulas 3.ª e 4.ª do acordo de acção de preferência.

2 - A renda referente à cessão de exploração não declarada corresponde a € 375,00 x 1 mês (Janeiro de 2007).

Assim temos:

[…]

4. - Apuramento do Rendimento Colectável

O Rendimento Colectável em IRS é em conformidade com o preconizado no art.º 22.º do CIRS, o que resulta do englobamento dos rendimentos das diversas categorias auferidos em cada ano, depois de feitas as deduções a que se refere o art.º 28.º do CIRS e abatimentos, tendo por base, em conformidade com o preconizado no art.º 76.º do CIRS, a declaração apresentada pelos sujeitos passivos ou, na falta desta terá por base os elementos que a DGCI disponha.

Em conformidade com o preconizado no art.º 15.º do CIRS, o IRS no caso de não residentes incide unicamente sobre os rendimentos obtidos em território português. Nos termos dos n.ºs 1 e 2 al. a) do art.º 13.º do CIRS, o agregado familiar é composto pelos sujeitos passivo "A" e "B''.

[…]

Face aos rendimentos declarados, o rendimento colectável apurado para os exercícios de 2006 e 2007, ascendem a € 2.701,30 e € 33.862,50, respectivamente.

IV. MOTIVOS E EXPOSIÇÃO DOS FACTOS QUE IMPLICAM O RECURSO A MÉTODOS INDIRECTOS

Não aplicável ao caso em apreço.

[…]

IX – DIREITO DE AUDIÇÃO

O sujeito passivo A………… NIF: ………, através do seu representante G………… com o NIF: ………, foi notificado pelo ofício n.ºs 421-14580 de 11/10/2010, pelo registo n.º RC 4126 2690 1 PT, e B………… com o NIF: ………, através do seu representante E………… com o NIF: ………, foi notificado pelo ofício n.ºs 421-14582 de 11/10/2010, pelo registo n.º RC 4126 2691 5 PT, para exercerem no prazo de 10 dias o direito de audição nos termos dos art.ºs 60.º da LGT e 60.º do RCPIT.

Decorrido o prazo para o exercício do direito de audição, o mesmo não foi exercido, pelo que será de converter em proposta definitiva de tributação o projecto de relatório.

[…]”

(cf. doc. a fls. 55 a 81 do PA que aqui se dá, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzido).

K. No relatório referido na alínea anterior foi aposto despacho por parte do Sr. Chefe da Divisão de Inspeção Tributária I, com o seguinte teor: “Concordo com as conclusões do presente relatório e determino o(s) valore(s) proposto(s) para tributação” (cf. doc. a fls. 55 a 81 do PA que aqui se dá, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzido).

L. Aos representantes dos Impugnantes foi dado conhecimento do relatório e do despacho referidos nas duas alíneas anteriores (cf. docs. a fls. 83 a 88 do PA que aqui se dão, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzidos).

M. Foi elaborado pelos serviços da Impugnada os documentos de correção referentes ao IRS dos Impugnantes nos anos de 2006 e 2007 (cf. docs. a fls. 89 a 98 do PA que aqui se dão, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzidos).

N. Os Impugnantes receberam as notificações referentes às liquidações de IRS dos anos de 2006 e 2007 (cf. docs. a fls. 25 a 26 que aqui se dão, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzidos).

O. A petição inicial do presente meio processual foi remetida pelo Advogado dos Impugnantes, por meio de correio registado expedido em 18.03.2011 (cf. fls. 2 a 26 dos autos).

P. O primeiro Impugnante como forma de investir autorizou o Sr. G………… a adquirir o trespasse a que se alude na alínea «B».

Q. Os Impugnantes não exploraram o estabelecimento supra referido, nem tiveram esse intuito.



3. Dos fundamentos de Direito

3.1. Vem o presente recurso interposto da douta sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra que – concluindo que a rendas recebidas pela cessão de exploração de estabelecimento comercial e a indemnização recebida pela cessação do contrato do arrendamento do respetivo imóvel não tinham origem na exploração desse estabelecimento – julgou verificado o erro na qualificação e no enquadramento desses rendimentos na categoria “B” e anulou as liquidações respetivas.

Com o assim entendido não se conforma a Recorrente Fazenda Pública, por entender que os rendimentos em causa são tributáveis na categoria “B” do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares [doravante identificado pela abreviatura “CIRS”] a coberto das alíneas e) e d) do n.º 2 do seu artigo 3.º, mesmo que os Recorridos nunca tivessem explorado o estabelecimento nem tivessem intenção de o fazer.

A questão que a Recorrente coloca ao tribunal de recurso é, por isso, a de saber se rendas obtidas por nacionais residentes no estrangeiro com a cessão de exploração de um estabelecimento que nunca exploraram e nunca tiveram intenção de explorar e a importância recebida a título de indemnização pela cessação do contrato de arrendamento onde funcionava o referido estabelecimento devem ser qualificadas como rendimentos da categoria “B” a coberto das alíneas e) e d) do n.º 2 do artigo 3.º do CIRS.

Como é sabido e decorre do confronto entre os n.ºs 1 e 2 deste artigo 3.º, a categoria “B” engloba atualmente os rendimentos que são considerados empresariais e profissionais por natureza ou inerência e os rendimentos que são atraídos a esta categoria por apresentarem com os outros algum tipo de conexão. E que exprimem, no dizer da doutrina, o «carácter predominante»ou o «poder de atração»desta categoria de rendimentos. A estes últimos, optamos nós por designar de rendimentos empresariais e profissionais por conexão ou imputação. Por pressuporem sempre um elemento de conexão com os primeiros.

Assim, e embora não seja muito clara a posição da Recorrente, parece decorrer da sua alegação que as importâncias relativas à cessão temporária da exploração do estabelecimento não são enquadráveis em nenhuma outra categoria de rendimentos que não a categoria “B” do CIRS. E que não são, por isso, rendimentos conexos com esta categoria, mas inerentes a esta categoria de rendimentos.

Ou seja, a Recorrente terá alegado que a cessão temporária da exploração de um estabelecimento comercial é uma atividade empresarial em si mesma ou por inerência.

Também parece decorrer das doutas alegações do recurso que a Recorrente entende que as importâncias auferidas a título de indemnização pela cessação do contrato de arrendamento onde funcionava o estabelecimento são rendimentos conexos com o exercício da atividade comercial, desde logo, por apresentarem conexão com aquela outra atividade comercial, a de explorar o estabelecimento através da sua locação.

Ou seja, a Recorrente terá entendido que a compensação pela desocupação do imóvel onde funcionou o estabelecimento tem conexão com a atividade empresarial do locador por importar a cessação da sua locação.

Pelo que a questão primeira do presente recurso é a de saber se a cessão temporária de exploração de estabelecimento constitui uma atividade comercial em si mesma.

Questão que se analisará no ponto seguinte.

3.2. O legislador não diz o que entende por atividade comercial.

Em vez disso, enuncia o que considera atividades comerciais típicas. Isto é, recorre à técnica de tipificação legal com vista à individualização das características comuns, médias ou frequentes dos factos que a representam.

Assim, foram definidas como atividades comerciais típicas para efeitos fiscais, a compra e venda e certos serviços, como a empreitada, as atividades hoteleiras, a restauração, a venda ou exploração do direito real de habitação periódica, o agenciamento de viagens e de turismo (sendo as demais atividades mencionadas no n.º 1 do artigo 4.º do CIRS de natureza industrial ou agrícola).

A «cessão temporária da exploração de um estabelecimento comercial» não consta do elenco das atividades comerciais típicas mencionadas neste dispositivo legal.

O que, ainda assim, não pode considerar-se decisivo, porque decorre do advérbio de modo «designadamente», utilizado no referido dispositivo, que estamos perante um elenco meramente exemplificativo.

Todavia, é comum a todas as atividades ali mencionadas a ideia de reiteração (associada a atividade) e organização (associada a empresa). Assim, não é a compra e venda em si mesma que é uma atividade tipicamente comercial, mas o exercício reiterado e organizado dos atos correspondentes.

Pelo que, e numa primeira aproximação aos seus aspetos nucleares, somos levados a dizer que o elemento material de incidência do imposto rondará, aqui, o fenómeno de natureza económica que inclua o exercício reiterado ou profissional, por pessoas singulares, de atos que envolvam a alocação das capacidades de organização de fatores de produção do sujeito (nas profissões independentes relevará sobretudo a mobilização do saber adquirido na atividade intelectual necessária ao exercício da sua profissão).

Na verdade, o elemento material de incidência não se reconduz a elementos objetivos (porque não mobiliza o conceito de «ato de comércio») nem subjetivos (porque não mobiliza o conceito de «comerciante»), apontando sobretudo para elementos «dinamo-morfológicos» – para utilizar uma expressão da doutrina – que se manifestam na confluência entre a dinâmica empresarial (a atividade externa como expressão dinâmica da empresa) e a estrutura empresarial (a organização como representação estática ou instantânea da empresa). E que exprimem «o carácter bifronte do moderno jus commercii, direito necessariamente empresarial ou profissional – que tem na empresa o seu princípio «energético» [cit. Orlando de Carvalho, in «Critério e Estrutura do Estabelecimento Comercial – O problema da empresa como objeto de negócios», Edições Policopiadas, Coimbra 1967, pág. 177].

Por outras palavras: o elemento material de incidência do imposto, nesta categoria, mobiliza o conceito dínamo-morfológico de «empresa». Que envolve, na vertente dinâmica, o que podemos designar «atividade organizada ou estabelecida» com vista à produção de riqueza, que é o típico modo de atuação da empresa; e na vertente morfológica, os seus elementos estruturais (a organização de fatores produtivos a que é atribuído um certo valor intrínseco (o valor de posição de mercado) e a que imputada toda a riqueza produzida.

Sendo que ambas estas vertentes se complementam: em certos casos de fronteira, não é possível identificar uma atividade empresarial ou profissional sem a relacionar com os elementos morfológicos de uma empresa (como centro de imputação de atos mercantis reiterados ou profissionalizados); do outro lado do espectro, será a atividade em si mesma a expressão fenomenológica do modo de atuação empresarial e, por isso, um fortíssimo indicador da existência de uma organização empresarial.

E é por isso que, quando nos deslocamos das atividades comerciais ou profissionais por excelência (em particular, as figuras consideradas exemplares ou típicas dessa atividade inseridas no n.º 1 do artigo 4.º do Código) para as tais zonas de fronteira, onde encontramos as atividades comerciais ou profissionais por conexão (n.º 2 do seu artigo 3.º), o legislador apela a elementos estruturais para estabelecer essa conexão (património, capital, local da instalação e ao próprio estabelecimento). Na prática, isto significa que, quando o legislador alude a importâncias conexas com uma atividade empresarial ou profissional pressupõe também a conexão com uma certa organização empresarial como centro de imputação dessa atividade.

A «cessão temporária da exploração de um estabelecimento» é considerada um ato objetivamente comercial.

No sentido de que o objeto transacionado é uma estrutura adequada ao exercício do comércio e no sentido de que a transação correspondente é regulada pela lei comercial (ver o artigo 2.º, primeira parte, do Código Comercial). De salientar que o artigo 1109.º do Código Civil deve ser considerado uma disposição comercial avulsa, no sentido de que foi instituído para atender aos particulares interesses do comércio (no caso, o interesse do dono da empresa em reaver o estabelecimento findo o prazo estipulado – neste sentido, a propósito de disposição equivalente em versão anterior do Código, ver A. FERRER CORREIA, in Lições de Direito Comercial, Volume I, Edições Policopiadas da Universidade de Coimbra, 1973, pág. 85).

Mas daí não deriva que deva ser considerada uma atividade comercial (a tal atividade de cessão de exploração).

Porque lhe faltam os elementos dinâmicos que identificam a típica atividade comercial. Decerto que não é o recebimento periódico e passivo das rendas que lhes dá corpo, tarefa típica de qualquer proprietário que de disponha a rentabilizar o seu património e que até pode não ter nenhuma capacidade empresarial.

E porque lhe faltam os elementos morfológicos que traduzem a alocação de uma certa estrutura empresarial (seja ela constituída por elementos físicos ou imateriais) à conquista de uma posição no mercado. Aliás, o locador de um estabelecimento pode nem ter nenhuma estrutura empresarial e limitar-se a gerir o estabelecimento como se de património se tratasse. Isto é, como proprietário.

É claro que não será assim se o cedente se dedica reiteradamente à cedência destes bens e criou uma organização própria para tal. Mas esta é uma hipótese que não importa considerar aqui. Porque, não é isso, que resulta dos factos assentes.

Em suma, não constando a «cessão temporária da exploração de estabelecimento comercial» do elenco das atividades comerciais típicas mencionadas no artigo 4.º do CIRS e não partilhando com estas os elementos típicos de uma atividade comercial, não pode ser considerada, em si mesma, uma atividade comercial para os efeitos do Código.

Não sendo a «cessão temporária da exploração de estabelecimento comercial» uma atividade comercial em si mesma, não pode a conexão com uma atividade comercial das importâncias auferidas a título «compensação pela desocupação do estabelecimento comercial» ser surpreendida na sua relação com a exploração do estabelecimento através da sua locação.

Resta-nos, por isso, a questão de saber se qualquer destas importâncias tem conexão com uma outra atividade comercial.

Questão que analisaremos nos pontos seguintes.

3.3. Do confronto entre a alínea e) do n.º 2 do artigo 3.º com as demais alíneas daquele dispositivo deriva uma diferença fundamental: ao contrário do que sucede nas demais, naquela alínea não se relacionam as importâncias recebidas com uma atividade empresarial ou profissional a montante (que seria, no caso, a exploração do estabelecimento pelo cedente).

Relacionam-se as importâncias recebidas (as rendas) com a atividade empresarial ou profissional a jusante (a exploração do estabelecimento pelo cessionário).

Assim, numa interpretação literal do preceito (que deve constituir o ponto de partida da interpretação jurídica), parece poder concluir-se que o legislador pretendeu a inclusão na categoria “B” dos rendimentos com esta proveniência independentemente da conexão que tenham com o exercício da atividade empresarial ou profissional de quem os aufere.

Dizendo de outro modo: que pretendeu a sua inclusão na categoria “B” por causa da conexão que têm com o exercício da atividade empresarial ou profissional exercida no estabelecimento cedido. Como se o seu recebimento constituísse ainda um produto indireto dos rendimentos tirados dessa atividade ou o resultado de uma atividade exercida por intermédio de outrem.

E o elemento histórico parece confirmar esta interpretação: deriva dos artigos 9.º, n.º 2, alínea d), e 40.º, n.º 3, ambos na redação inicial do Código, que estas importâncias eram inicialmente inseridas na Categoria “F”. A redação posterior a 2000 não inclui ali disposições equivalentes e nenhumas outras que permitam tal enquadramento. O que indica que foi intenção do legislador arredar o recebimento destas rendas desta categoria e em qualquer circunstância.

Vai no mesmo sentido o elemento sistemático: os sócios das sociedades de simples administração de bens também são tributados nesta categoria, de acordo com o regime da transparência fiscal – artigo 6.º, n.º 1, alínea c), do CIRC. O que significa que as importâncias relativas à cessão temporária de um estabelecimento por essas sociedades são imputadas aos sócios em rendimentos da categoria “B”. Seria incongruente, por isso, que o mesmo não sucedesse com as importâncias relativas à cessão temporária do mesmo estabelecimento por pessoas singulares.

Por último, o elemento teleológico: a subordinação destes rendimentos à categoria “B” vai ao encontro do objetivo do legislador de atrair a esta categoria os rendimentos que se encontram associados geneticamente a uma atividade empresarial ou profissional e de os enquadrar no mesmo método de tributação (a tributação com base no lucro).

Tudo ponderado, somos levados a concluir que a Recorrente tem razão nesta parte, as rendas recebidas no âmbito da cessão temporária do estabelecimento são enquadradas na categoria “B”.

Não porque se relacionem com alguma «atividade de cessão de exploração» prosseguida pelo sujeito passivo (como pretendia a Fazenda Pública na contestação). Questão que já analisamos no ponto anterior.

Mas porque o legislador elegeu ali um elemento de conexão que não as relaciona com a atividade do sujeito passivo, mas com a atividade exercida no estabelecimento em si mesma.

Pelo que o recurso merece provimento nesta parte.

3.4. Passemos à importância recebida a título de indemnização pela cessação do contrato de arrendamento ou, para utilizar a expressão utilizada no acordo extrajudicial a que alude a alínea “E” dos factos provados, a título de «compensação pela desocupação do estabelecimento comercial» que funcionava no locado.

Não faz parte do objeto do recurso (nem esteve em discussão nos autos) a questão de saber se estamos perante uma indemnização tributável em IRS (do ponto de vista do direito interno), isto é, uma indemnização que gerou um acréscimo patrimonial líquido na esfera do sujeito passivo.

O que está em causa é o seu enquadramento na categoria “B” e, por conseguinte, a aplicação das normas de incidência real e de determinação da matéria tributável nesta categoria de rendimentos.

Residualmente, as indemnizações tributáveis em IRS são enquadradas na categoria “G” – artigo 9.º, n.º 1, alínea b), do CIRS.

Todavia, deriva da alínea d) do n.º 2 do artigo 3.º do CIRS, que são enquadradas na categoria “B” a importâncias auferidas a título de indemnização que apresentem conexão com a atividade exercida.

Já sabemos qual o sentido desta expressão («importâncias conexas») e o significado da sua inserção sistemática no n.º 2 daquele artigo 3.º: estamos perante rendimentos empresariais por conexão ou imputação, ou seja, rendimentos não contêm em si mesmos os elementos que permitam a sua qualificação como tal, dependendo esta de um elemento externo que com eles se conecte.

Também já sabemos que a expressão «atividade exercida» nos remete inequivocamente para o n.º 1 do mesmo artigo. Quer dizer, o elemento material a considerar no estabelecimento da conexão entre a indemnização recebida e esta categoria de rendimentos é o exercício da atividade empresarial ou profissional do seu titular.

E não – sublinhe-se – a atividade empresarial ou profissional do cessionário (a que é exercida no próprio estabelecimento cedido). Não há nenhum elemento interpretativo que nos permita relacionar esta alínea d) com a alínea seguinte.

Por outras palavras: o recebimento da indemnização tem que estar relacionado com a atividade empresarial do seu beneficiário.

Ou seja, são considerados rendimentos da categoria b), pela alínea d) do n.º 2 do artigo 3.º do CIRS, as importâncias auferidas, a título de indemnização, conexas com a atividade empresarial exercida por quem aufere essas importâncias.

Que assim é torna-se ainda mais evidente se atentarmos que o preceito tem origem na alínea e) do n.º 2 do artigo 4.º do mesmo Código, na redação anterior à que lhe foi introduzida pela Lei n.º 30-G/2000, de 29 de Dezembro, e que era a seguinte: «[a]s importâncias atribuídas a empresários individuais a título de indemnização pela suspensão ou redução da sua atividade ou pela mudança de local do respetivo exercício» (sublinhado nosso).

No caso dos autos, foi comprovado que os Recorridos cederam em 2006/02/01 a exploração de um estabelecimento que haviam adquirido em trespasse em 2005/12/27 mas que nunca chegaram a explorar, tendo em conta que se encontravam emigrados no Canadá, onde exerciam um outro negócio num outro ramo. Aliás, e de acordo com a factualidade provada, a aquisição do estabelecimento nunca teve em mira a sua exploração pelos adquirentes, que nele viram apenas «uma forma de investir» (alíneas “P” e “Q” dos factos provados).

Mais ficou provado que os Recorridos e os autores em duas ações de preferência que correram termos no Tribunal Judicial da Figueira da Foz acordaram, em 2007/01/04, na resolução do contrato de arrendamento onde do imóvel onde funcionava esse estabelecimento e na consequente desocupação do local, o que conduziu ao encerramento do estabelecimento em 2007/08/31, até então explorado pelos cessionários.

Ora, o que isto significa, na prática, é que os Recorridos não exerceram nenhuma atividade comercial em território nacional, no período em causa, e que, por isso, as importâncias auferidas a título de indemnização pela resolução do contrato de arrendamento do imóvel onde funcionava o estabelecimento comercial não tinham nem podiam ter nenhuma conexão com a atividade por eles exercida.

E que, por isso, a indemnização não teve em vista a compensação da cessação da atividade de exploração do estabelecimento comercial mas da perda total do investimento que resulta da extinção do direito ao arrendamento do imóvel e do inerente encerramento definitivo do estabelecimento.

Não estamos, por isso, perante rendimentos conexos com a atividade empresarial do sujeito passivo.

Pelo que, nesta parte, a douta sentença recorrida não padece do vício que lhe é imputado.



4. Conclusões

4.1. Consideram-se rendimentos empresariais, para os efeitos da alínea d) do n.º 2 do artigo 3.º do CIRS, as importâncias auferidas, a título de indemnização, conexas com a atividade empresarial do sujeito passivo;

4.2. Não tem conexão com nenhuma atividade empresarial do sujeito passivo a indemnização acordada com o senhorio para compensação do encerramento do estabelecimento comercial que sujeito passivo nunca explorou ou destinou a exploração.

4.3. Consideram-se rendimentos empresariais, para efeitos da alínea e) do n.º 2 do artigo 3.º do CIRS, as importâncias conexas com a cessão temporária da exploração do estabelecimento do sujeito passivo;

4.4. Tem conexão com a cessão temporária da exploração do estabelecimento do sujeito passivo a renda mensal a este devida pela exploração do dito estabelecimento cedida a terceiro.



5. Decisão

Nos termos e com os fundamentos expostos, acordam os juízes da Secção Tributária deste Tribunal em conceder parcial provimento ao recurso e, em consequência, revogar a sentença recorrida na parte relativa às importâncias recebidas a título de «renda mensal de cessão de exploração do estabelecimento comercial», julgando a impugnação improcedente nesta parte.

Na parte restante, nega-se provimento ao recurso.

Custas pela Recorrente e pelos Recorridos na proporção do decaimento, que se fixa em 90% e em 10%, respetivamente.

D.n.

Lisboa, 17 de Junho de 2020. – Nuno Bastos (relator) – Gustavo Lopes Courinha – Francisco Rothes.