Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo | |
Processo: | 02051/13.6BELRS 044/17 |
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Data do Acordão: | 06/17/2020 |
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Tribunal: | 2 SECÇÃO |
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Relator: | FRANCISCO ROTHES |
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Descritores: | CONTRIBUIÇÃO FINANCEIRA BANCO INCONSTITUCIONALIDADE |
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Sumário: | I - A Contribuição sobre o Sector Bancário tem natureza jurídica de contribuição financeira. II - As normas que aprovam o regime jurídico da Contribuição sobre o Sector Bancário não enfermam de inconstitucionalidade orgânica, nem material, não violando os princípios constitucionais da legalidade e da equivalência. |
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Nº Convencional: | JSTA000P26072 |
Nº do Documento: | SA22020061702051/13 |
Data de Entrada: | 01/18/2017 |
Recorrente: | BANCO A………, S.A. |
Recorrido 1: | AT-AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA. |
Votação: | UNANIMIDADE |
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Aditamento: | ![]() |
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Texto Integral: | Recurso jurisdicional da sentença proferida no processo de impugnação judicial com o n.º 2051/13.6BELRS (44/17)
1. RELATÓRIO 1.1 A sociedade acima identificada recorreu para o Supremo Tribunal Administrativo da sentença do Tribunal Tributário de Lisboa, que julgou improcedente a impugnação judicial por ela apresentada na sequência do indeferimento tácito da reclamação graciosa que deduziu contra a autoliquidação da Contribuição sobre o Sector Bancário (CSB) relativamente ao ano de 2013. 1.2 O recurso foi admitido, a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito suspensivo e a Recorrente apresentou as alegações, com conclusões do seguinte teor: «(a) Concluíra o Recorrente nos presentes autos que a discricionariedade concedida ao Governo no exercício do poder regulamentar pelo Regime que cria a Contribuição sobre o Sector Bancário viola o princípio da reserva de lei parlamentar, o que o toma organicamente inconstitucional por violação do princípio da reserva de lei em matéria de elementos essenciais dos tributos, que o tributo em causa carece de justificação com base no princípio da equivalência, o que o toma materialmente inconstitucional, e que tem direito a juros indemnizatórios apurados nos termos da lei. (b) O Tribunal a quo julgou improcedente a impugnação, não considerando verificados os vícios de inconstitucionalidade orgânica e material das normas que introduziram e regulamentaram a Contribuição sobre o Sector Bancário, não se pronunciando a propósito do pedido de juros indemnizatórios, que por aquela decisão ficou prejudicado. (c) Em síntese, considerou o Tribunal a quo a propósito da inconstitucionalidade orgânica do Regime que cria a Contribuição sobre o Sector Bancário invocada pelo Recorrente que, “[n]ão sendo a existência de um regime geral pressuposto necessário da criação de taxas, nem de contribuições financeiras, não tem qualquer suporte no texto constitucional, na ausência daquele regime, estender-se a competência reservada da Assembleia da República ao acto de aprovação de contribuições financeiras individualizadas, criando-se assim uma reserva integral de regime onde esta não existe”, donde conclui que “[a] ausência da aprovação de um regime geral das contribuições financeiras pela Assembleia da República não pode impedir o Governo de aprovar a criação de contribuições financeiras individualizadas no exercício de uma competência concorrente, sem prejuízo da Assembleia sempre poder revogar, alterar ou suspender o respectivo diploma, no exercício dos seus poderes constitucionais”. (d) O Recorrente considera que a decisão recorrida enferma de erro quanto à solução de direito nela preconizada, já que a base tributável e as taxas da Contribuição sobre o Sector Bancário, que são dois dos seus elementos (mais) essenciais, foram fixadas por portaria (a Portaria n.º 121/2011, de 30 de Março), quando, por força do princípio da reserva de lei previsto no artigo 165.º da Constituição da República Portuguesa, o teriam que ser por lei da Assembleia da República ou por Decreto-Lei autorizado do Governo. (e) De acordo com o disposto no artigo 165.º da Constituição da República Portuguesa, a criação de impostos é da exclusiva competência da Assembleia da República, salvo nos casos em que é concedida a devida autorização ao Governo. (f) Quer isto dizer que os elementos estruturantes dos impostos (como a taxa, a incidência, os benefícios fiscais e as garantias dos contribuintes) não são podem ser deixados ao critério do Governo, sem o devido enquadramento da autorização parlamentar. (g) E, enquanto não for dada concretização ao disposto na alínea i) do número 1 do artigo 165.º da Constituição da República Portuguesa, que prevê a criação de um regime geral para as “demais contribuições financeiras a favor das entidades públicas”, tais tributos deverão ser tratados, para efeitos de aplicação do princípio da reserva de lei, como impostos. (h) Considera o Tribunal a quo que não existe de reserva de lei parlamentar nas matérias relevantes na presente acção (os elementos essenciais do tributo), mas tal entendimento esvaziaria de conteúdo a parte final da norma antes citada, ou seja, torná-la-ia letra morta, transformando a circunstância de inexistir, até à data (quase dezanove anos depois da introdução da norma), um regime geral das contribuições financeiras numa “carta branca”, uma autorização parlamentar em aberto, para o Governo legislar nessa matéria sem qualquer limite e como se nenhuma reserva de lei existisse. (i) Uma interpretação conforme à Constituição da República Portuguesa exige antes, necessariamente, a conclusão inversa: a inexistência do regime geral das contribuições financeiras a que alude a alínea i) do número 1 do artigo 165.º da Constituição da República Portuguesa exige que os elementos essenciais de tais tributos sejam casuisticamente definidos pela Assembleia da República em toda a extensão relevante ou que, pelo menos, exista uma autorização legislativa que cumpra os requisitos que a própria Constituição da República Portuguesa prevê como salvaguarda do princípio da legalidade. (j) É que, tal como a liquidação e cobrança de impostos, também os actos tributários relativos a contribuições financeiras constituem restrições ao direito de propriedade dos respectivos sujeitos passivos, que não podem deixar de estar sujeitos ao princípio da legalidade (“no taxation without representation”). (k) É este o entendimento da doutrina citada nas presentes alegações pelo Recorrente, que conclui inequivocamente que relativamente aos elementos essenciais de tributos com a natureza de contribuições financeiras, a respectiva conformidade legal e constitucional está dependente do cumprimento do princípio de reserva de lei formal. (l) E, no caso concreto, apenas a Portaria n.º 121/2011, de 30 de Março, vem verdadeiramente criar, no seu artigo 4.º, a base de incidência da Contribuição sobre o Sector Bancário, através da definição e delimitação, para o efeito, dos conceitos de “passivo” e de “instrumento financeiro derivado” ou da determinação do “valor dos fundos próprios” ou da medida de relevância dos “depósitos abrangidos pela garantia do Fundo de Garantia de Depósitos, pelo Fundo de Garantia do Crédito Agrícola Mútuo ou por um sistema de garantia de depósitos oficialmente reconhecido”, sem qualquer comando ou critério parlamentar prévio, tratando-se dum exercício totalmente discricionário da parte do Governo. (m) O mesmo se diga em relação às taxas da Contribuição sobre o Sector Bancário, que são fixadas a Portaria n.º 121/2011, de 30 de Março, ao arrepio do princípio da reserva de lei. (n) É certo que as taxas em causa se contêm nos limites superiores das margens estabelecidas no Regime que cria a contribuição sobre o sector bancário, aprovado por uma lei da Assembleia da República: actualmente 0,11% no caso do passivo, em que a lei prevê taxas de entre 0,01% e 0,11%, e 0,000 3%, no caso do valor nacional dos instrumentos financeiros derivados fora do balanço, em que a lei previa taxas de entre 0,000 1% e 0,000 3%. (o) No entanto, e como o Tribunal Constitucional expressamente salientou como condição para a aceitação da conformidade constitucional das normas que permitiam ao Governo fixar por portaria as taxas do imposto sobre os produtos petrolíferos entre um mínimo e um máximo, é necessário, para estes efeitos, que o legislador parlamentar balize adequadamente a actuação do Governo. (p) No caso do imposto sobe os produtos petrolíferos antes referido, objecto do acórdão n.º 70/2004, de 28 de Janeiro de 2004, o Tribunal Constitucional concluiu que o facto de o legislador parlamentar, ao determinar que a fixação das taxas deveria “[tomar] em consideração os diferentes impactos ambientais de cada um dos combustíveis, favorecendo gradualmente os menos poluentes”, permitia-lhe “ano a ano, reponderar a não só a avaliação política tomada quanto à bondade da solução da devolução para o legislador regulamentar do poder tributário de fixar as taxas unitárias efectivas do imposto como a justeza da leitura feita por este do princípio de liberdade de mercado e das técnicas tributárias próprias deste tipo de tributo, que lhe são apontados como critérios de decisão normativa a ter em conta na fixação efectiva da taxa do imposto”. Tal permitiria de alguma forma ultrapassar a proibição constitucional. (q) Não é este, no entanto, o caso da Contribuição sobre o Sector Bancário, já que o legislador parlamentar não fixou, sequer indiciou, nas suas quatro intervenções neste âmbito (na Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro, na Lei n.º 83-C/2013, de 31 de Dezembro, na Lei n.º 82-B/2014, de 31 de Dezembro, e na Lei n.º 7-A/2016, de 30 de Março), os “critérios de decisão normativa a ter em conta na fixação efectiva da taxa”, tendo ao invés permitido na redacção originária da norma que fosse fixada uma taxa entre uma percentagem e o seu quíntuplo (no caso do passivo, entre 0,01 e 0,05%) e entre uma percentagem e o seu dobro (no caso do valor nocional dos instrumentos financeiros derivados fora de balanço, entre 0,000 1% e 0,000 2%), na segunda redacção, mediante a qual foram aumentados os limites máximos, de 0,05% para 0,07%, no caso do passivo, e de 0,000 2% para 0,000 3%, no caso do valor nocional dos instrumentos financeiros derivados fora de balanço, que fosse fixada uma taxa entre uma percentagem e o seu séptuplo (no caso do passivo) e entre uma percentagem e o seu triplo (no caso do valor nocional dos instrumentos financeiros derivados fora de balanço), na terceira redacção, mediante a qual foram aumentados os limites máximos no caso do passivo, de 0,07% para 0,085%, que fosse fixada uma taxa entre uma percentagem e oito vezes e meia a mesma percentagem; e na quarta redacção, mediante a qual foram novamente aumentados os limites máximos no caso do passivo, de 0,085% para 0,11%, que seja fixada uma taxa entre uma percentagem e onze vezes a mesma percentagem. (r) Estamos assim perante a atribuição de poderes totalmente discricionários ao Governo, e não, nas palavras do Tribunal Constitucional no acórdão n.º 70/2004, de 28 de Janeiro de 2004, perante o cumprimento da “exigência de razoabilidade quanto ao intervalo dentro do qual o legislador regulamentar pod[e] fixar a taxa efectiva cuja razão de ser só poderia corresponder à sua preocupação de que esse intervalo não fosse de tal modo amplo que criasse uma incerteza intolerável quanto ao grau de amputação de riqueza admissível e esvaziasse de real conteúdo o juízo de opção política expresso num tal modo de tributação exigido ao legislador parlamentar”. (s) E tão discricionários são os poderes conferidos pela lei que o Governo nem sequer se sentiu na obrigação de justificar os critérios seguidos a este respeito, a propósito dos quais o preâmbulo da Portaria n.º 121/2011, de 30 de Março, é completamente omisso, como omissos são os documentos que explicam as opções que foram sendo tomadas a propósito dos aumentos das taxas. (t) O mesmo se diga, mutatis mutandis, quanto à determinação da base tributável: a delimitação dos conceitos de “passivo” e de “instrumento financeiro derivado” constante do artigo 4.º da Portaria n.º 121/2011, de 30 de Março, contém uma série de excepções e especificações que restringem ou alargam aqueles conceitos, tal como os mesmos devem ser interpretados à luz quer do Regime que cria a contribuição sobre o sector bancário, quer das normas de contabilidade aplicáveis, mas a explicação que a este respeito consta do preâmbulo respectivo é notoriamente insuficiente: tal é feito, afirma-se, com o objectivo de “mitigação de riscos sistémicos”, riscos estes não concretamente identificados nem especificamente relacionados com a decisão do Governo. (u) Neste contexto, há que concluir, como no acórdão n.º 152/2013 do Tribunal Constitucional, que não estão “suficientemente recortados” por lei parlamentar alguns dos elementos essenciais da Contribuição sobre o Sector Bancário, como a incidência e a taxa. (v) É assim subvertido o princípio da legalidade fiscal que dá substância à reserva de lei, a pretexto de uma facilitação do processo normativo que transforma a Contribuição sobre o Sector Bancário no tributo “que o Governo quiser”. (w) O que, e em suma, torna organicamente inconstitucional a Portaria n.º 121/2011, de 30 de Março, por violação do princípio da reserva de lei previsto no artigo 165.º da Constituição da República Portuguesa e, consequentemente, determina a anulabilidade da autoliquidação da Contribuição sobre o Sector Bancário em crise nos presentes autos, devendo a sentença recorrida ser revogada neste passo, por erro de julgamento, com as legais consequências. (x) Argumentou o Recorrente nos presentes autos que as normas que introduziram e regulamentaram a Contribuição sobre o Sector Bancário são também materialmente inconstitucionais por não serem identificáveis as prestações presumidas cuja provocação ou aproveitamento se podem dizer seguros quanto ao grupo que o Recorrente integra e prováveis quando referidos ao Recorrente cuja compensação justifica a imposição de contribuições. (y) Afirmando que “a Contribuição sobre o Sector Bancário, sendo uma contribuição especial não subsumível ao conceito de imposto ou taxa é também uma contribuição que reverte a favor de entidade pública e se enquadra na categoria de contribuição financeira (…)”, o Tribunal a quo afasta igualmente a inconstitucionalidade material invocada pelo Recorrente mediante o entendimento de que “as prestações presumidas traduzir-se-ão no apoio financeiro às medidas de resolução que vierem a ser adoptadas pelo Banco de Portugal”, razão pela qual conclui que “a Contribuição sobre o Sector Bancário tem justificação com base no princípio da equivalência, (...) pelo que não viola este princípio constitucional”. (z) Considera a doutrina mais relevante a propósito do conceito de contribuição, o tributo pelo qual o legislador parlamentar optou no caso em análise, que “[a]s contribuições constituem prestações pecuniárias e coactivas exigidas por uma entidade pública em contrapartida de prestações presumivelmente provocadas ou aproveitadas pelo sujeito passivo (…)” e que “[o] que distingue as contribuições é o visarem a compensação de prestações presumidas, cuja provocação ou aproveitamento se podem dizer seguros quanto a determinado grupo mas apenas prováveis quando referidos ao indivíduo que o integra”. (aa) A respeito deste tipo de tributos, afirmou reiteradamente o Tribunal Constitucional (por exemplo nos acórdãos n.º 365/08, de 2 de Julho, e n.º 135/2012, de 7 de Março, entre outros) que “[a] criação de tais contribuições a favor de determinadas pessoas coletivas públicas distintas da Administração estadual, regional ou local, visam (sic) o seu sustento financeiro, escapando à disciplina jurídica clássica, como forma de evitar o crescimento do défice das contas públicas e contornar a rigidez do regime dos impostos, através de meios financeiros mais dúcteis”. (bb) Mas tal “menor rigidez” e “maior ductilidade” não significam, nem podem significar, que as contribuições financeiras possam ser criadas a bel-prazer do legislador, seja ele o Governo ou a Assembleia da República. (cc) O Tribunal Constitucional já teve oportunidade de deixar vincado o entendimento segundo o qual a tributação de um benefício meramente potencial ou não efectivo remete para a figura da contribuição financeira, por oposição à figura da taxa, por exemplo no acórdão n.º 152/2013, de 20 de Março, o mesmo se aplicando quando o benefício respeita a um grupo ou conjunto, não havendo na contribuição financeira o sinalagma directo que caracteriza a taxa, i.e., não existe na contribuição financeira “uma verdadeira relação comutativa, a não ser de forma difusa” (cfr. acórdão do Tribunal Constitucional n.º 80/2014, de 22 de Janeiro). (dd) Em todo o caso, seja potencial, presumido ou mais ou menos difuso, certo é que o benefício e/ou a relação estabelecida entre o sujeito passivo de uma contribuição financeira e o respectivo sujeito activo tem de existir e ser perceptível, de uma forma que não é comparável ao circunstancialismo de um imposto. (ee) É que os impostos estão dissociados de qualquer prestação administrativa ou compensação, directa ou difusa, por parte do Estado ou outra entidade pública, razão pela qual são caracterizados como tributos rigorosamente unilaterais. (ff) Ora, resulta clara da sentença recorrida a dificuldade do Tribunal a quo em encontrar o fundamento da Contribuição sobre o Sector Bancário que permita validá-la à luz do princípio da equivalência, mediante a validação da afirmação de que “os critérios de igualação ou diferenciação eleitos pelo legislador, na delimitação da sua incidência subjectiva e, bem assim, na determinação do critério de cálculo do valor da contribuição em causa, [não] se apresentam como materialmente infundados”: (gg) Com efeito, o Tribunal a quo limita-se, na prática, a afirmar que o Recorrente “terá o apoio financeiro do Fundo de Resolução” se lhe for aplicada uma medida de resolução e, “se não lhe foi aplicada uma medida de resolução” (e não foi), “não beneficiará do apoio financeiro do Funda (sic) de Resolução”, daqui retirando o “carácter presumido das concretas prestações do referido Fundo”. (hh) No entanto, se o “apoio financeiro do Fundo de Resolução” é a prestação presumida que para o Tribunal a quo justifica a incidência subjectiva da Contribuição sobre o Sector Bancário, não se vê de onde é retirada a probabilidade de aproveitamento pelo Recorrente que a justifica. (ii) E, no caso de um tributo com o cunho selectivo da Contribuição sobre o Sector Bancário, através do qual se isola um grupo limitado de contribuintes para lhes exigir um pagamento do qual se dispensa o resto da comunidade, o princípio da equivalência exige que seja demonstrado um benefício claramente superior do que aquele que é usufruído pelo todo da comunidade. (jj) E essa demonstração não foi feita pelo legislador e muito menos o foi pelo Tribunal a quo. (kk) Aliás, a natureza difusa do benefício com que se vem pretendendo justificar a Contribuição sobre o Sector Bancário é tão evidente que o Tribunal de Contas afirma, taxativamente, que o tributo em causa “é um imposto e, como tal, uma receita do Estado. Deste modo, a afectação dessa receita ao Fundo traduz-se numa transferência do OE, com a finalidade de dotar o Fundo dos meios necessários à prossecução dos fins para que foi criado.” (cfr. Tribunal de Contas, Parecer sobre a Conta Geral do Estado de 2014, pág. 72). (ll) O Recorrente não partilha do entendimento do Tribunal de Contas quanto à qualificação da Contribuição sobre o Sector Bancário como imposto. (mm) No entanto, considera que a afirmação taxativa que citou demonstra que o Tribunal de Contas não encontra no tributo em causa qualquer bilateralidade, ainda que difusa, que justifique a incidência subjectiva prevista na lei, limitada a um grupo de que o Recorrente faz parte. (nn) Por outro lado, o Tribunal a quo não refere, sequer alude à adequação do “critério de cálculo do valor da contribuição em causa” por forma a concluir se o mesmo é ou não “materialmente infundado””, a segunda vertente da aferição do princípio da equivalência. (oo) Mas, se o tivesse feito, não poderia deixar de concluir que o verdadeiro fundamento da Contribuição sobre o Sector Bancário é apenas um: a obtenção de receita fiscal, em especial junto do “sector financeiro”. (pp) E aquele objectivo foi o declarado pelo legislador quando da criação da Contribuição sobre o Sector Bancário e foi afirmado pelo legislador quando da alteração (sempre no sentido do aumento) das taxas previstas no Regime que cria a contribuição sobre o sector bancário, que a foi justificando de forma incongruente e errática e, de facto, sem a demonstração da conformidade com o princípio da equivalência. (qq) E se dúvidas ainda houvesse quanto ao verdadeiro objectivo da criação da Contribuição sobre o Sector Bancário, elas teriam deixado de existir perante os aumentos das taxas introduzidos pela Lei n.º 83-C/2013, de 31 de Dezembro, e pela Portaria n.º 64/2014, de 12 de Março, pela Lei n.º 82-B de 31 de Dezembro, e pela Portaria n.º 176-A/2015, de 12 de Junho, e pela Lei n.º 7-A/2016, de 30 de Março, e pela Portaria n.º 165-A/2016, de 14 de Junho, que têm subjacente uma lógica de puro aumento da receita. (rr) Conclui assim o Recorrente que a Contribuição sobre o Sector Bancário carece de justificação com base no princípio da equivalência, o que torna o Regime que cria a contribuição sobre o sector bancário e a Portaria n.º 121/2011, de 30 de Março, materialmente inconstitucionais, inconstitucionalidade esta que se reflecte na autoliquidação contestada, devendo a sentença recorrida ser revogada, por erro de julgamento, com as legais consequências. (ss) Uma vez que, conforme antes demonstrado, a liquidação contestada é ilegal, ilegalidade essa que não é imputável ao Recorrente, assiste-lhe o direito a juros indemnizatórios, direito esse que aqui deverá ser reconhecido. Nestes termos, e nos mais de Direito que Vossas Excelências suprirão, deve o presente recurso ser dado como procedente, por provado e, em consequência, ser revogada a decisão recorrida, por ilegal, e substituída por outra que determine a procedência total da impugnação, com as legais consequências». 1.3 Não foram apresentadas contra alegações. 1.4 Recebidos os autos neste Supremo Tribunal Administrativo, foi dada vista ao Ministério Público e o Procurador-Geral-Adjunto emitiu parecer no sentido de que o recurso não merece provimento, com a seguinte fundamentação: «[…] 1.5 Cumpre apreciar e decidir. * * * 2. FUNDAMENTAÇÃO 2.1 DE FACTO O Juiz do Tribunal Tributário de Lisboa deu como provados os seguintes factos: «A) A impugnante é uma instituição de crédito, desenvolvendo a actividade típica deste tipo de entidades. (Conforme resulta da reclamação graciosa em apenso, informação n.º 147-AIR1/2013) B) Está colectada pelo exercício da actividade de “outra intermediação monetária” – com o código CAE 084190, estando enquadrada, em sede de IRC, no regime geral de tributação, e, em IVA no regime normal mensal. (Conforme resulta da reclamação graciosa em apenso, informação n.º 147- AIR1/2013) C) Em 27 de Junho de 2013, procedeu á autoliquidação (no montante de 4.834.482,90) da Contribuição sobre o Sector Bancário. (Conforme resulta de fls. 22 a 24) D) Procedeu ao pagamento da Contribuição sobre o Sector Bancário em 01/07/2013. (Conforme resulta de fls. 24) E) Mediante a entrega da declaração modelo 26, na qual declarou os seguintes montantes: F) Reclamou graciosamente em 5 de Julho de 2013, tendo nessa instância solicitado o pagamento de juros indemnizatórios. (Conforme resulta de fls. 26 a 28) G) Na Unidade dos Grandes Contribuintes foi prestada a informação n.º 147-AIR1/2013, que consta do processo de reclamação graciosa em apenso e que aqui se dá por integralmente reproduzida. H) Considerou a Administração Fiscal na informação a que se refere a alínea anterior I) Continua a Administração Fiscal: J) Concluiu a Administração Fiscal: K) Sobre a referida informação recaiu o projecto de despacho de indeferimento. L) A impugnante, devidamente notificada, não exerceu o direito de audição. M) Pela INFORMAÇÃO N.º 206-A1R1/2013, foi proposto converter em definitivo o projecto de despacho de reversão. N) Por despacho de 2013/11/04, em concordância com a informação a que se refere a alínea anterior, foi totalmente indeferida a reclamação graciosa, nos termos seguintes: O) Em 7 de Novembro de 2013, a Impugnante foi notificado do Ofício n.º 2882, de 5 de Novembro de 2013, através do qual lhe foi comunicado o indeferimento da reclamação apresentada em 5 de Julho de 2013. P) No seguimento da notificação do indeferimento da reclamação graciosa, veio o sujeito passivo, em 11 de Novembro de 2013 apresentar a presente impugnação judicial. Q) Em 02/12/2016, a Impugnante apresentou requerimento superveniente invocando a incompetência do autor do despacho de indeferimento da reclamação graciosa e a não especificação da delegação de competências. * 2.2 DE DIREITO 2.1.1 AS QUESTÕES A APRECIAR E DECIDIR As questões a apreciar e decidir que se prendem com a natureza jurídica da CSB e a alegada violação dos princípios constitucionais da legalidade, por violação da reserva de lei formal e por não cumprimento do comando constitucional do art. 103.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa (CRP), e do princípio da equivalência foram já circunstanciadamente analisadas e apreciada a conformidade constitucional dos diplomas que regem a tributação aqui em causa, no acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 19 de Junho de 2019, proferido no processo n.º 2340/13.0BELRS (683/17) (Disponível em 2.1.2 DA DISPENSA DO REMANESCENTE DA TAXA DE JUSTIÇA Cumpre agora averiguar da possibilidade de dispensar o Recorrente do pagamento do remanescente da taxa de justiça devida pelo presente recurso, ao abrigo do disposto no n.º 7 do art. 6.º do Regulamento das Custas Processuais (RCP). 2.2.3 CONCLUSÕES Preparando a decisão, formulamos as seguintes conclusões:
I - A Contribuição sobre o Sector Bancário tem natureza jurídica de contribuição financeira. II - As normas que aprovam o regime jurídico da Contribuição sobre o Sector Bancário não enfermam de inconstitucionalidade orgânica, nem material, não violando os princípios constitucionais da legalidade e da equivalência. * * * 3. DECISÃO Em face do exposto, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo acordam, em conferência, em negar provimento ao recurso e confirmar a decisão recorrida com a presente fundamentação. Custas pela Recorrente, que ficou vencida, com dispensa do remanescente da taxa de justiça [cf. art. 527.º, n.ºs 1 e 2, do CPC, aplicável ex vi da alínea e) do art. 2.º do CPPT e art. 6.º, n.º 7, do RCP]. * |