Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:029/12.6BEBRG
Data do Acordão:06/23/2021
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ARAGÃO SEIA
Descritores:CONTRADITÓRIO
QUESTÃO NOVA
DÍVIDA
PRESCRIÇÃO
Sumário:I - Uma vez suscitada nos autos a questão da prescrição ao juiz incumbe aplicar as normas reguladoras da matéria que julgue mais adequadas para a decisão da questão, não tendo que ouvir as partes previamente sobre a aplicação de uma ou outra norma que as partes não invocaram nos seus articulados;
II - As normas respeitantes à prescrição -suspensão e interrupção- constantes da LGT e demais Leis Tributárias não são aplicáveis quando estejam em causa dívidas reguladas pelo Regulamento (CE, EURATOM) nº 2988/95, do Conselho, de 18 de Dezembro;
III - O prazo constante da norma do artigo 168º, n.º 4 do CPA, não se aplica quando esteja em causa a execução de actos administrativos consolidados na ordem jurídica.
Nº Convencional:JSTA00071179
Nº do Documento:SA220210623029/12
Data de Entrada:11/11/2020
Recorrente:IFAP – INSTITUTO DE FINANCIAMENTO DA AGRICULTURA E PESCAS, IP
Recorrido 1:A..............
Votação:UNANIMIDADE
Legislação Nacional:ART. 49.º LGT
ART. 168.º, N.º 4, CPA/2015
Legislação Comunitária:ART. 03.º REG CE/EURATOM 2988/95
Aditamento:
Texto Integral: Acordam os juízes da secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:


INSTITUTO DE FINANCIAMENTO DA AGRICULTURA E PESCAS IP (IFAP), inconformado, interpôs recurso da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga (TAF de Braga), datada de 03 de Abril de 2020, que julgou procedente a Oposição deduzida pelo Oponente contra a execução fiscal subjacente com fundamento na prescrição da execução da Decisão nela exequenda, pelo decurso do prazo de 3 anos a que alude o nº 2 do artº 3º do Regulamento (CE; EURATOM) nº 2899/95 do Conselho de 18 de Dezembro (R 2988/95).

Alegou, tendo apresentado as seguintes conclusões:
“1ª Comportando a tramitação dos presentes autos de Oposição à execução fiscal subjacente o conhecimento oficioso da prescrição da execução da decisão nela exequenda prevista no nº 2 do artº 3º do R 2988/95, cumpriria à Mº Juiz a quo facultar às partes a possibilidade de, querendo, se pronunciarem sobre tal concreta prescrição, de mais a mais quando tal concreta prescrição da execução da decisão exequenda na execução fiscal subjacente ainda não tinha sido suscitada nos autos nem neles tendo ainda sido objecto de contraditório;
2ª Todavia, nos presentes autos a Mª Juiz a quo conheceu, apreciou e decidiu oficiosamente questão - a prescrição de execução (de 3 anos) da decisão exequenda na execução fiscal subjacente a que alude nº 2 do artº 3º do R 2988/95 – relativamente à qual não concedeu previamente às partes a faculdade para, querendo, se pronunciarem sobre tal concreta prescrição por si oficiosamente suscitada a respeito da prescrição de execução da decisão exequenda na execução fiscal subjacente;
3ª Nessa medida, a decisão de procedência da Oposição constante da Sentença recorrida com fundamento na prescrição da execução da decisão de execução da decisão exequenda na execução fiscal subjacente com sustento no disposto nº 2 do artº 3º do R 2988/95, não poderá deixar de constituir uma verdadeira «decisão surpresa», processualmente inadmissível, de mais a mais em violação do princípio do contraditório;
4ª Por isso, a omissão processual da notificação às partes para, querendo, se pronunciarem sobre a concreta prescrição oficiosamente suscitada pela Mª Juiz a quo a respeito da prescrição de execução da decisão exequenda na execução fiscal subjacente, prevista no nº 2 do artº 3º do R 2988/95, também não poderá deixar de constituir nulidade processual, que aqui se argui para todos os devidos efeitos, sendo que a mesma poderá ser reparada pelo Mª Juiz a quo no quadro da admissibilidade do presente recurso;
5ª Mostrando-se provado nos presentes autos de Oposição:
• que a decisão exequenda na execução fiscal subjacente foi notificada ao Oponente em 14/09/2007 (cfr. Facto Provado 4. da Fundamentação de Facto da Sentença recorrida);
• que em 24/07/2009, o Oponente apresentou uma Reclamação (2ª) contra a decisão exequenda na execução fiscal subjacente, à qual anexou levantamento topográfico e na qual requereu a revogação da decisão “ou, quando não assim, mandar proceder a novo levantamento e medição, em dia e hora [a] designar com [suficiente] antecedência a fim de permitir que nela esteja presente técnico da confiança do aqui requerente” (cfr. Facto Provado 7. da Fundamentação de Facto da Sentença recorrida);
• que a DRAP Norte concluiu em Setembro de 2009 as diligências requeridas pelo Oponente (cfr. Facto Provado 8. da Fundamentação de Facto da Sentença recorrida);
• que em 29/11/2011 o Oponente foi citado à execução fiscal subjacente (cfr. Facto Provado 11. da Fundamentação de Facto da Sentença recorrida);
de concluir será que a prescrição da execução da decisão exequenda na execução fiscal subjacente de 14/09/2007 foi interrompida pela Reclamação do Oponente de 24/07/2009, sendo que até à citação do Executado/Oponente, em 29/11/2011, nunca decorreu o prazo a que alude o nº 2 do artº 3º do R 2988/95, designadamente não tendo decorrido tal prazo após a interrupção da prescrição ocorrida com a apresentação pelo Oponente da Reclamação de 24/07/2009;
6ª Consequentemente, tendo presente,
• por um lado, a factualidade tida por provada em 4., 7. e 11. da Fundamentação de Facto da Sentença recorrida,
• e, por outro lado, o disposto, conjugadamente, no nº 2 do artº 3º do R 2988/95, no nº 1 do artº 49º da LGT e no nº 1 do artº 326º do CC, de concluir também será que na data de citação do Executado/Oponente, em 29/11/2011, ainda não se encontrava prescrita a execução da decisão exequenda na execução fiscal subjacente;
7ª Resulta assim, que, tendo presente a factualidade tida por provada em 4., 5., 6., 7., 8., 9., 10., 11. e 15. da fundamentação de facto da sentença recorrida e o direito a ela aplicável, a decisão de procedência da Oposição viola o disposto o disposto, conjugadamente, no nº 2 do artº 3º do R 2988/95, no nº 1 do artº 49º da LGT e no nº 1 do artº 326º do CC, os quais impõem decisão contrária - de improcedência da oposição;
8ª Em tais circunstâncias, afigura-se que o Mº Juiz a quo ao julgar procedente a oposição, violou o disposto no nº 2 do artº 3º do R 2988/95, no nº 1 do artº 49º da LGT e no nº 1 do artº 326º do CC
9ª No caso em apreço, afigura-se ao IFAP que devam ser colocadas ao TJ, a título prejudicial, as seguintes questões sobre a interpretação da disposição constante do artº 3º do R 2988/95 a ser aplicada ao caso concreto nos presentes autos:
i) O disposto no nº 3 do artº 3º do R 2988/95 opõe-se a que, para efeitos de prescrição do procedimento de recuperação, seja aplicado o prazo de 5 anos previsto no ordenamento jurídico português, no artº 168º, nº 4 do Código de procedimento Administrativo (CPA), segundo o qual:
(…)
4 - Salvo se a lei ou o direito da União Europeia prescreverem prazo diferente, os atos constitutivos de direitos podem ser objeto de anulação administrativa no prazo de cinco anos, a contar da data da respetiva emissão, nas seguintes circunstâncias:
a) Quando o respetivo beneficiário tenha utilizado artifício fraudulento com vista à obtenção da sua prática;
b) Apenas com eficácia para o futuro, quando se trate de atos constitutivos de direitos à obtenção de prestações periódicas, no âmbito de uma relação continuada;
c) Quando se trate de atos constitutivos de direitos de conteúdo pecuniário cuja legalidade, nos termos da legislação aplicável, possa ser objeto de fiscalização administrativa para além do prazo de um ano, com imposição do dever de restituição das quantias indevidamente auferidas.
(…) ?
ii) Em caso de resposta afirmativa à questão formulada em i), o disposto no nº 3 do artº 3º do R 2988/95 opõe-se a que o referido prazo de 5 anos possa, também, ser aplicável aos casos de interrupção da prescrição para efeitos de determinação do dobro do prazo a que alude o 3º parágrafo do artº 3º do R 2988/95 (segundo o qual, “a prescrição tem lugar o mais tardar na data em que termina um prazo igual ao dobro do prazo de prescrição sem que a autoridade competente tenha aplicado uma sanção, excepto nos casos em que o procedimento administrativo tenha sido suspenso em conformidade com o nº 1 do artigo 6.º”)?
iii) E, ainda, em caso de resposta afirmativa à questão formulada em i), o disposto no nº 3 do artº 3º do R 2988/95, opõe-se a que o referido prazo de 5 anos possa ser aplicável ao caso previsto no nº 2 do preceito (segundo o qual “O prazo de execução da decisão que aplica a sanção administrativa é de três anos. Este prazo corre desde o dia em que a decisão se toma definitiva.”)?
iv) Considerando,
- por um lado, que os financiamentos concedidos aos Beneficiários finais no âmbito do FEADER, incluem uma «comparticipação nacional» a cargo dos orçamentos nacionais dos Estados membros;
- e, por outro lado, que o R 2988/95 visou instituir “uma regulamentação geral em matéria de controlos homogéneos e de medidas e sanções administrativas relativamente a irregularidades no domínio do direito comunitário” (artº 1º, nº 1) as quais, de acordo com o disposto no nº 2 deste preceito se traduzem em “qualquer violação de uma disposição de direito comunitário que resulte de um acto ou omissão de um agente económico que tenha ou possa ter por efeito lesar o orçamento geral das Comunidades ou orçamentos geridos pelas Comunidades, quer pela diminuição ou supressão de receitas provenientes de recursos próprios cobradas directamente por conta das Comunidades, quer por uma despesa indevida”.
a) o artº 3º deste R 2988/95, apenas se aplica à recuperação da «comparticipação comunitária» (no caso do FEADER)?
ou,
b) também se aplica à recuperação da «comparticipação nacional» a cargo dos orçamentos nacionais dos Estados membros?
v) No caso de resposta afirmativa às questões formuladas em iv)-a) e em iv)-b), o disposto no nº 3 do artº 3º do R 2988/95 opõe-se a que, para efeitos de prescrição do procedimento de recuperação da «comparticipação nacional» a cargo dos orçamentos nacionais dos Estados-membros, seja aplicado, no ordenamento jurídico português, o prazo de 5 anos previsto no artº 168º, nº 4 do CPA, transcrito em i)?
Termos em que, por via da procedência das Conclusões acabadas de serem extraídas, deverá ser concedido provimento ao presente recurso e, consequentemente, ser revogada a decisão de procedência da Oposição, constante da Sentença recorrida e substituída por outra decisão que julgue improcedente a Oposição a que respeitam os pressentes autos.

O Recorrido – A…………………. - veio apresentar contra-alegações, concluindo como segue:
“1) A sentença recorrida foi notificada ao Recorrente em 20/04/2020 (cfr. artigo 248º, nº 1 do CPC ex vi artigo 20º, nº 2 do CPPT), ou seja, durante o período de suspensão dos prazos judiciais em consequência da pandemia Covid 19, motivo pelo qual a contagem dos 30 dias previstos no artigo 282º do CPPT, para apresentação de alegações de recurso, só se iniciou em 03/06/2020 (cfr. Lei nº 16/2020, de 29 de maio).
2) Contados os 30 dias a partir desta data, incluindo o dia 03/06/2020, como deve suceder, conclui-se que o prazo terminou em 02/07/2020, sendo que o Recorrente somente apresentou as suas alegações de recurso em 03/07/2020, o que obrigatoriamente implica o pagamento de multa processual por um dia de atraso na apresentação do ato, tal como preceitua o artigo 139º, nº 5, al. a) do CPC ex vi artigo 20º, nº 2 do CPPT.
3) De acordo com o disposto no artigo 25º da Portaria nº 419-A/2009, de 17 de abril, “Nos casos legalmente previstos de pagamento imediato de multa consentâneo com a prática de acto processual, o pagamento deve ser autoliquidado juntamente com a taxa de justiça devida, utilizando para cada um dos pagamentos o correspondente DUC” .
4) Em conformidade com o nº 2 do diploma legal referido no número imediatamente anterior, tratando-se de multa fundamentada no artigo 139º do CPC, a mesma deverá ser paga no momento da prática do ato processual, o que, in casu, não sucedeu – neste sentido, vide o acórdão do TRG de 28/09/2017, processo nº 1278/09.0TBEPS-B.G1, in DGSI: “Este pagamento imediato não depende de qualquer despacho judicial, nem de notificação da secretaria, sendo um encargo que impende sobre a parte que pretenda ver praticado e validado o acto processual apresentado fora do prazo legal para o efeito”.
5) Mais se acrescenta que, conforme o disposto no nº 4 do artigo 28º do Regulamento de Custas Processuais (RCP), a multa é devida ainda que quem a tenha de pagar esteja isento de custas.
6) Pelo exposto, o não pagamento da multa a que se refere o artigo 139º, nº 5, al. a) do CPC equivale à falta de pagamento, o que conduz a que o ato praticado não tenha validade – vide, neste sentido, o acórdão do TRP de 09/10/2018, processo nº 1021/16.7T8OAZ-D.P1, in DGSI –, motivo pelo qual as alegações apresentadas pelo Recorrente se afiguram inválidas, o que desde já se argui para todos os efeitos, atento terem sido praticadas fora do prazo legal, não tendo o Recorrente procedido, como deveria, ao pagamento de respetiva multa por um dia de atraso no momento da apresentação do ato respetivo.
7) Invoca o Recorrente violação do princípio do contraditório, na sequência do conhecimento oficioso pelo tribunal a quo da questão acerca da prescrição da execução (de 3 anos) da decisão exequenda na execução fiscal subjacente a que alude o nº 2 do Regulamento (CE, EURATOM) nº 2988/95 do Conselho de 18 de dezembro, mas tal não corresponde à verdade.
8) Dúvidas não há de que a prescrição conhecida pelo tribunal a quo na decisão recorrida é de conhecimento oficioso, tal como bem fundamenta a Mª Juiz a quo, bem como reconhece o Recorrente nas suas alegações de recurso, pelo que o que aqui está em causa é perceber se se impunha ou não facultar às partes o exercício do princípio do contraditório antes de proferir a decisão final objeto do presente recurso.
9) De acordo com o disposto no nº 3 do artigo 3º do CPC ex vi artigo 2º do CPPT que “O juiz deve observar e fazer cumprir, ao longo de todo o processo, o princípio do contraditório, não lhe sendo lícito, salvo caso de manifesta desnecessidade, decidir questões de direito ou de facto, mesmo que de conhecimento oficioso, sem que as partes tenham tido a possibilidade de sobre elas se pronunciarem” [sublinhado nosso], sendo certo que a “manifesta desnecessidade” apenas poderá ser aferida pela jurisprudência, considerando cada caso em concreto.
10) Ora, considerando em concreto os presentes autos, sempre esteve em discussão o preceituado no Regulamento (CE, EURATOM) nº 2988/95 do Conselho de 18 de dezembro e, em específico, o estipulado no seu artigo 3º, sendo certo que aquilo que ambas as partes mais invocaram e debateram a propósito da prescrição foram os n.ºs 1 e 3 do referido normativo, mas isso não impede que o tribunal aprecie, como apreciou, a matéria da prescrição invocando o nº 2 desse mesmo artigo.
11) O exercício do princípio do contraditório, na situação sub Júdice, afigura-se desnecessário, pois a “questão nova” oficiosamente assumida pelo tribunal a quo não pressupõe a existência de novos factos, nem traz ao caso direito anteriormente não invocado, tratando, ao invés, a questão já antes assumida pelas partes – prescrição – mediante o diploma e a específica norma pelas partes invocado (artigo 3º), quer em sede de petição inicial e correspondente contestação, quer em sede de alegações escritas.
12) Em face do que antecede, afigura-se-nos razoável que as partes contem com o conhecimento oficioso do nº 2 do artigo por elas invocado, no âmbito da mesma questão jurídica de direito.
13) A decisão recorrida não comportou, pois, uma decisão jurídica que as partes não tinham obrigação de prever, nem tampouco colocou a discussão jurídica num plano diferente daquele que as partes o haviam feito.
14) A decisão recorrida não é, portanto, uma “decisão-surpresa”, não havendo, por isso, necessidade de facultar às partes o exercício do princípio do contraditório, motivo pelo qual, ao abrigo do disposto no artigo 195º do CPC ex vi artigo 2º do CPPT, não existe qualquer nulidade processual no caso dos autos, não merecendo a decisão recorrida qualquer censura neste sentido – vide, neste sentido, o acórdão do TRG de 30/05/2018, processo nº 681/12.2TBBGC-A.G1, in DGSI
15) O Recorrente invoca erro de direito na subsunção do direito aplicável à factualidade dada por provada nos pontos 4, 5, 6, 7, 8, 9, 10, 11 e 15 da sentença recorrida, alegando, em suma, que os factos provados em 4, 5, 6 e 7 refletem causas de interrupção da prescrição, na sequência das alegadas “reclamações” apresentadas pelo Recorrido ao Recorrente. Para o efeito, convoca o Recorrente o nº 1 do artigo 49º da LGT, mas, como se passará a demonstrar, também não tem qualquer razão.
16) A solicitação, pelo Recorrido, de remissão de novo ofício, bem como a iniciativa de o Recorrido proceder ao envio de novo levantamento topográfico não configuram qualquer tipo reclamação, tanto para mais quando o aqui Recorrente, por missiva datada de 14/09/2007, aplicou, a final, a sanção administrativa de devolução das quantias entregues, tendo vindo, nas missivas seguintes, somente a reiterá-la, pois em causa nunca esteve a alteração daquela decisão final entretanto já tomada, modificação essa apenas passível de ser concretizada mediante impugnação, que teria inclusivamente de vir a ser deferida, ou seja, nunca ao abrigo de meras missivas iria o Recorrente alterar a decisão final que tomou em setembro de 2007 e da qual foi o Recorrido devidamente notificado, não sendo, por isso, aplicável o artigo 49º da LGT, como pretende o Recorrente.
17) Sucede que, efetivamente, aquela decisão final foi alvo de impugnação contenciosa no âmbito do processo nº 2837/11.6BELSB, tendo o TAC de Lisboa decidido pela caducidade do direito de ação, atento que o aqui Recorrido apenas poderia ter impugnado aquela decisão final, datada de 14/09/2007, até ao dia 25/01/2008, momento temporal em que a decisão final se tornou definitiva, por impugnável. Assim, foi a decisão final tomada em setembro de 2007 julgada definitiva em janeiro do ano seguinte àquele.
18) Ainda que o trânsito em julgado desta decisão judicial tenha ocorrido posteriormente, o certo é que a decisão foi mantida e, atualmente, é caso julgado no ordenamento jurídico português que a decisão que aplicou a sanção administrativa se tornou definitiva em 25/01/2008, pelo que bem andou a decisão recorrida ao considerar tal data.
19) Portanto, a decisão tornou-se definitiva, indubitavelmente, em 25/01/2008, pelo que dispunha o Recorrente de três anos para executá-la em conformidade, ou seja, até 25/01/2011, conforme dispõe o nº 2 do artigo 3º do Regulamento (CE, EURATOM) nº 2988/95 do Conselho de 18 de dezembro.
20) De 25/01/2008 a 25/01/2011, não se vislumbram causas interruptivas ou suspensivas obstativas do decurso do aludido prazo de prescrição, como aliás consente o Recorrente, uma vez que apenas invocou interrupções em 09/10/2007 e em 24/07/2009, em consequência de meras missivas que o Recorrido lhe remeteu e para as quais logrou respostas de dois em dois anos.
21) Na tentativa de ultrapassar a inércia que acompanhou o Recorrente durante todo este período temporal, aquele alega ainda que, no caso, não deverá ser aplicado o prazo estipulado no artigo 3º do Regulamento (CE, EURATOM) nº 2988/95 do Conselho de 18 de dezembro, mas antes um prazo mais longo (de cinco anos ao invés de três), ao abrigo do disposto no artigo 168º, nº 4, al) c) do CPA, afastando a aplicação do dito Regulamento Europeu.
22) Ora, bem sabe o Recorrente que não lhe assiste razão, conforme acórdão proferido pelo TCA Sul em 10/10/2019, processo nº 34/19.1BECTB, in DGSI, em que o Recorrente é parte e onde o TCA Sul lhe nega provimento, julgando aplicáveis as normas comunitárias constantes no referido Regulamento por inexistir, no nosso direito interno, um prazo especialmente previsto para a restituição de ajudas comunitárias. Ademais, é o próprio preceito do CPA que o Recorrente invoca que consagra, logo no início, “Salvo se a lei ou o direito da União Europeia prescreverem prazo diferente […]”, e, de facto, o direito da UE prescreve prazo diferente, por via do Regulamento (CE, EURATOM) nº 2988/95 do Conselho de 18 de dezembro, no nº 2 do seu artigo 3º!
23) Não há manifesto erro resultante da decisão proferida pelo tribunal a quo, nem contradição entre a factualidade assente por provada e o resultado final, pois decorre dessa factualidade, no ponto 15, que é caso julgado no nosso ordenamento jurídico que a decisão do Recorrente de aplicação de sanção administrativa se tornou definitiva em 25/01/2008, no âmbito do processo nº 2837/11.6BELSB, que correu termos junto do TAC de Lisboa, motivo pelo qual deveria o Recorrente ter executado a sua decisão que aplicou aquela sanção até 25/01/2011 (nº 2 do artigo 3º do Regulamento (CE, EURATOM) nº 2988/95), o que não concretizou.
24) Finalmente, apoiando-se no disposto no artigo 267º do TFUE, entende o Recorrente que deverão ser colocadas ao TJUE, a título prejudicial, as questões sobre a interpretação da disposição constante no artigo 3º do Regulamento (CE, EURATOM) nº 2988/95 do Conselho de 18 de dezembro a ser aplicada ao caso concreto.
25) Mas, por outro lado e como bem refere o Recorrente, há dispensa de suscitar a questão prejudicial de interpretação quando:
“ i) a questão não for necessária, nem pertinente para o julgamento do litígio principal; ii) o Tribunal de Justiça já se tiver pronunciado de forma firme sobre a questão a reenviar, ou quando já exista jurisprudência sua consolidada sobre a mesma; iii) o Juiz Nacional não tenha dúvidas razoáveis quanto à solução a dar à questão de Direito da União, por o sentido da norma em causa ser claro e evidente”.
26) O Recorrido não tem dúvidas de que o nº 2 do artigo 3º do Regulamento (CE, EURATOM) nº 2988/95 do Conselho de 18 de dezembro é aplicável ao caso sub júdice, conforme se explanou acima e respetivamente se justificou legal e jurisprudencialmente – vide ainda, porque o raciocínio lógico é o mesmo, embora trate o nº 1 do artigo 3º referido acima, e não o nº 2, o acórdão do TCA Norte de 06/03/2015, processo nº 00660/10.4BEPNF-A.
27) Pretende o Recorrente afastar a aplicação do Regulamento europeu supra indicado para aplicar o disposto no artigo 168º, nº 4, al) c) do CPA, quando é o próprio normativo do CPA que afasta a sua aplicabilidade quando normas europeias prevejam outro prazo, que é o que sucede in casu.
28) Acrescenta-se, uma vez mais, que o acórdão proferido pelo TCA Sul em 10/10/2019, processo nº 34/19.1BECTB, in DGSI, em que o Recorrente é parte e onde lhe é negado provimento, julga aplicáveis as normas comunitárias constantes no referido Regulamento por inexistir, no nosso direito interno, um prazo especialmente previsto para a restituição de ajudas comunitárias.
29) Portanto, a pronúncia pelo TJUE apenas deverá ocorrer se o tribunal ad quem assim o considerar útil e necessário, por ter dúvidas razoáveis quanto ao caso, sendo que essa utilidade e essa necessidade não se afigura tão óbvia como tenta fazer crer o Recorrente, muito pelo contrário, entendendo o Recorrido que não existem quaisquer dúvidas e que o assunto já se encontra devidamente tratado, quer pelo TJUE, quer pelos tribunais portugueses.
Termos estes em que deve ser negado provimento ao recurso e, em consequência, ser a decisão recorrida confirmada.

O Ministério Público notificado, pronunciou-se no sentido da improcedência do recurso, mantendo-se a sentença recorrida.

Cumpre decidir.

Na sentença recorrida deu-se como assente a seguinte factualidade concreta:
“1. Em 20 de Dezembro de 2000, o Oponente apresentou ao ex IFADAP uma candidatura ao Regime de Apoio à Reconversão e Reestruturação da Vinha (abreviadamente também designado por VITIS) à qual foi atribuído o nº 2000.11.001676.3, nela havendo declarado pretender reestruturar 12.9991 ha de vinha – factualidade não controvertida.
2. Tal candidatura do Impugnante/Oponente foi apresentada ao Instituto ao abrigo do disposto no Regulamento (CE) nº 1493/99 do Conselho, de 17 de Maio e do Regulamento (CE) nº 1227/2000 da Comissão, de 31 de Maio, assim como da Portaria nº 685/2000, de 30 de Agosto (que Estabelece, para o continente, as normas complementares de execução do regime de apoio à reconversão e reestruturação das vinhas e fixa os procedimentos administrativos aplicáveis à concessão das ajudas previstas) – factualidade não controvertida.
3. Em 28 de maio de 2001, entre o Autor e o Instituto de Financiamento e Apoio ao Desenvolvimento da Agricultura e Pescas foi celebrado o Contrato de Atribuição de Ajuda ao Abrigo do VITIS – Regime de Apoio à Reconversão e Reestruturação das Vinhas – cfr. doc. de fls. 45 a 49 do suporte físico dos autos.
4. Por ofício registado e com aviso de recepção expedido em 14 de Setembro de 2007, para a morada do Autor, de referência 2546/DINV/SAG/2007, a entidade demandada comunicou ao Autor o seguinte:
“Finda a fase de instrução no procedimento administrativo relativo ao assunto supra identificado, cumpre tomar a decisão final, o que se faz, nos termos e com os fundamentos seguintes:
1. Através do nosso ofício 671/DINV/SAG/2007, de 20 de Junho de 2007, foi V. Ex.ª notificado, nos termos e para os efeitos dos artigos 100º e seguintes do Código do Procedimento Administrativo, da intenção deste Instituto de determinar a rescisão contratual, implicando a devolução do valor indevidamente auferido, no âmbito do VITIS – Programa de Apoio à Reconversão e Reestruturação das Vinhas;
2. Tal intenção encontrou fundamento nas conclusões do controlo físico e administrativo realizado pelo nosso Instituto, o qual permitiu apurar uma situação de incumprimento da legislação aplicável ao Programa acima identificado, mais concretamente, o facto da superfície de vinha reestruturada acrescida de 5% de tolerância (7,7002 ha) ser inferior à aprovada (12,9991 ha), o que confere um desvio de área inexecutada superior a 20%.
3. Em resposta, foi recepcionada neste Instituto a 04.07.2007 uma carta remetida por V. Ex.ª contestando a aludida intenção de rescisão contratual, e na qual solicita a realização de nova acção de controlo físico, por forma a apurar a superfície de vinha efectivamente reestruturada.
4. A coberto do ofício 2275/DINV/SAG/2007, de 30.07.2007, foi V. Ex.ª informado que, caso fosse do seu interesse, deveria remeter a este Instituto um levantamento da superfície de vinha reestruturada no âmbito do projecto em assunto, para que o mesmo fosse alvo de análise.
5. Atendendo a que até à data não foi recepcionada qualquer resposta ao supra mencionado ofício, determina-se a rescisão contratual com devolução do montante abaixo discriminado. No que respeita ao pagamento de juros, serve o presente para informar V. Ex.ª que, de acordo com os critérios actualmente vigentes, apenas serão calculados juros de mora sobre o capital em dívida, caso o pagamento não venha a ser efectuado no prazo concedido no presente ofício.
7. Nesta conformidade, para efeitos de reposição voluntária da quantia em dívida, no montante total de € 110.476,55 (€ 94.266,75 relativos às Ajudas/Incentivos e € 16.209,80 reportados ao Prémio de Compensação pela Perda de Receita), fica V. Ex.ª notificada de que a mesma poderá ser efectuada por meio de cheque a enviar para a tesouraria deste Instituto, fazendo referência ao número de processo indicado neste ofício, no prazo de 30 dias a contar da data de recepção do mesmo.
8. Caso se verifique o termo do prazo estipulado para o pagamento da quantia em causa, sem que o mesmo se concretize, será instaurado o processo de execução fiscal, com vista à cobrança coerciva do montante em dívida, no qual serão pedidos para além do capital, os juros de mora vencidos e vincendos, e/ou verificada a possibilidade de serem efectuadas compensações relativamente aos valores que se encontrarem em dívida sobre as ajudas que, eventualmente, venham a ser concedidas a V. Ex.ª” - cfr. doc. de fls. 4 do apenso e sentença proferida no processo 2837/11.6BELSB junta aos autos a fls. 311 e ss. do processo físico.
5. Por missiva datada de 09.10.2007, o Autor remeteu à entidade demandada a comunicação do seguinte teor:
“Em resposta ao vosso ofício n.º 2546/DINV/SAG/2007 de 13.09.2007, mas só agora recebida, tenho a dizer:
- Não recebi o ofício n.º 2275/DINV/SAG/2007 de 30/07/2007;
- Tenho residência permanente no Brasil, vindo periodicamente a Portugal; - Tenho funcionários permanentes que não receberam esse ofício.
Assim solicito a V. Ex.as que mo enviem novamente, para saber os termos em que terei de fazer o levantamento de superfície de vinha reestruturada. Fico admirado que não aceitem o parcelário P1 como levantamento das áreas e não façam vistoria física ao local” – cfr. sentença proferida no processo 2837/11.6BELSB junta aos autos a fls. 311 e ss. do processo físico.
6. Pelo ofício de referência 2217/DAI/UPRF/2009, expedido por carta registada com aviso de recepção, a entidade demandada remeteu ao Autor comunicação do seguinte teor:
“A coberto do ofício de Decisão Final de referência 2546/DINV/SAG/2007, de 12/09/2007, foi V. Ex.ª notificado da decisão deste Instituto de rescisão do contrato firmado no âmbito do VITIS – Regime de Apoio à Reconversão e Reestruturação das Vinhas e, da consequente obrigação de devolução da quantia de € 110.476,55, considerada como indevidamente recebida.
Em resposta, veio V. Ex.ª remeter uma carta com data de entrada neste Instituto a 10/10/2007, na qual vem comunicar que não recebeu o ofício a coberto do qual lhe foi dada a hipótese de remeter um levantamento topográfico com a indicação da superfície de vinha reestruturada, solicitando o seu reenvio, por forma a ter conhecimento em que termos terá que efectuar o mencionado levantamento. Relativamente às alegações prestadas por V. Ex.ª, cumpre informar que, de acordo com a documentação integrante do projecto, o ofício em questão foi recepcionado na morada em causa, pelo Sr. B………………. Importa ainda mencionar que este Instituto não considera o P1 como “levantamento das áreas”, na medida em que, o mesmo, é efectuado de acordo com as declarações prestadas por V. Ex.ª.
Desta forma, atendendo ao facto de não terem sido apresentados quaisquer argumentos de facto e de direito que permitam a alteração da decisão que lhe fora anteriormente, vimos pelo presente notificar V. Ex.ª que se mantém a decisão de rescisão contratual comunicada a coberto do ofício supra mencionado.
(…)”. - Cfr. doc. de fls. 58/59 do suporte físico dos autos.
7. Por carta expedida em 24.07.2009, o Autor remeteu aos serviços da entidade demandada requerimento na qual anexou levantamento topográfico e na qual conclui: “Termos em que requer a V.ª Ex.ª se digne revogar a decisão ou, quando não assim, mandar proceder a novo levantamento e medição, em dia e hora [a] designar com [suficiente] antecedência a fim de permitir que nela esteja presente técnico da confiança do aqui requerente” – cfr. sentença proferida no processo 2837/11.6BELSB junta aos autos a fls. 311 e ss. do suporte físico dos autos.
8. Pelo ofício de referência 023092/2011, recebido pelo Autor em 14.07.2011, a entidade demandada comunicou àquele o seguinte:
“1. A coberto do ofício de decisão final, com a referência 2546/DINV/SAG/2007, de 12/09/2007, foi notificado da decisão deste Instituto de rescisão do contrato firmado no âmbito do VITIS – Regime de Apoio à Reconversão e Reestruturação das Vinhas e, da consequente obrigação de devolução da quantia de € 110.476,55, considerada como indevidamente recebida, face ao incumprimento detectado na acção de controlo físico e administrativo ao projecto em apreço.
2. Em resposta, a 02/10/2009 foi recepcionada uma carta, onde veio apresentar nova reclamação à decisão final, demonstrando a sua discordância com a decisão proferida no mesmo, anexando para o efeito um levantamento topográfico da área de implantação da vinha e requerer a realização de nova medição.
3. Pelo exposto e dada a necessidade de apreciação do levantamento topográfico apresentado, por parte da DRAP, foi o projecto remetido aos referidos serviços para parecer técnico aos argumentos expostos.
4. Da análise efectuada ao levantamento topográfico datado de Setembro de 2009, a DRAP Norte, constatou que o mesmo foi realizado em data extemporânea (mais de 3 anos após a realização da visita), segundo critérios topográficos usuais e não de acordo com as normas e regras estabelecidas no programa VITIS.
5. Da comparação do levantamento topográfico apresentado, com o levantamento efectuado por GPS aquando da visita e sobreposto a uma planta aerofotogramétrica da exploração de 2006, os técnicos da DRAP, concluíram que a parcela com 18.530 m2 já existia e trata-se de uma vinha antiga, não pertencente ao projecto e, que parte da parcela com 21.1253 m2 não existia, tendo sido plantada posteriormente, assim como a parcela com 3.028 m2.
6. No sentido de clarificar melhor a situação, a DRAP Norte consultou o IVV, tendo apurado, de acordo com o RCV (Registo Central Vitícola) a existência de 13 parcelas de vinha plantadas em 1999, como tal atribuídas ao projecto em apreço, com a área total de apenas 6.52ha, área esta inferior à área apurada em sede de controlo (7.7002ha).
7. Atentas as alegações expostas, cumpre informar que as mesmas não aduziram quaisquer argumentos de facto e de direito, que permitissem a alteração da decisão que lhe fora anteriormente comunicada.
8. Nesta conformidade, vimos pelo presente notifica-lo que se mantém a decisão de rescisão contratual, comunicada a coberto do ofício de decisão final e da respectiva reposição voluntária da quantia em dívida, de € 126.881,56 (€ 94.266,75 relativos às ajudas/incentivos e € 16.209,80 de Prémio por Perda de Rendimento e € 16.405,01 reportados aos juros de mora contabilizados a partir de 20/10/2007 (…)” – cfr. doc. fls. 60/61 do suporte físico dos autos.
9. Em 25.10.2011, o aqui Oponente deduziu acção administrativa especial contra as decisões referidas nos pontos 4, 6 e 8, a qual foi autuada sob o nº 2837/11.6BELSB – factualidade não controvertida.
10. Em 26.10.2011, foi instaurado no Serviço de Finanças de Felgueiras contra o aqui Oponente o processo de execução fiscal n.º 1775201101055976, para cobrança coerciva de dívidas ao “IFAP, IP.”, no montante de €139.224,67, tituladas pela certidão de dívida emitida em 14.10.2011 pelo Director do Departamento Jurídico e de Devedores do IFAP, IP, à qual se encontra anexa a decisão referida no ponto 4 – cfr. fls. 1 a 5 do processo de execução fiscal apenso aos autos (doravante apenso).
11. O executado foi citado para a execução fiscal através de ofício remetido por carta registada com aviso de recepção recebida em 29.11.2011 – cfr. fls. 295/296 do suporte físico dos autos.
12. Em 29.11.2011, o executado, aqui Oponente, requereu a suspensão da execução fiscal, oferecendo, como garantia, diversos imóveis a fim de sobre os mesmos se constituir a necessária hipoteca – cfr. fls. 7 a 12 do apenso.
13. Sobre o requerimento referido no ponto anterior recaiu, em 31.11.2011, despacho do Chefe de Finanças a ordenar a constituição de hipoteca legal sobre os imóveis indicados pelo executado – cfr. fls. 7 do apenso.
14. Através de requerimento apresentado no SF de Felgueiras em 16.04.2013, o executado veio indicar mais um imóvel para reforçar a garantia prestada – cfr. fls. 209/2012 do suporte físico dos autos.
15. Em 21.01.2016, foi proferida sentença no processo nº 2837/11.6BELSB, transitada em julgado em 07.06.2017, que julgou verificadas as excepções dilatórias de caducidade do direito de acção e de inimpugnabilidade do acto administrativo impugnado e, em consequência, absolveu a entidade demandada da instância – cfr. fls. 311/334 e 352 do suporte físico dos autos.”.
Nada mais se deu como provado.


Há agora que conhecer das questões suscitadas pelas partes.

A primeira questão que o recorrente suscita, cfr. conclusões 1ª a 4ª, passa por saber se, nos presentes autos a Sra. Juiz a quo conheceu, apreciou e decidiu oficiosamente questão - a prescrição de execução (de 3 anos) da decisão exequenda na execução fiscal subjacente a que alude nº 2 do artº 3º do R 2988/95 – relativamente à qual não concedeu previamente às partes a faculdade para, querendo, se pronunciarem sobre tal concreta prescrição por si oficiosamente suscitada a respeito da prescrição de execução da decisão exequenda na execução fiscal subjacente.
Para fundamentar esta conclusão o recorrente alega no corpo das suas alegações:
Desde já se refira que o fundamento em que se fundou a decisão recorrida – a prescrição da execução da decisão exequenda na execução fiscal subjacente a que alude nº 2 do artº 3º do R 2988/95 – não foi objecto de invocação pela parte a quem poderia aproveitar (o que se compreende por tal questão – prescrição - poder ser objecto de conhecimento oficioso) nem, principalmente (o que já se não compreende), foi objecto de qualquer contraditório pelas partes no processo.
Com efeito, conforme se colhe dos autos, a/s prescrição/ões sobre a/s qual/quais as partes se pronunciaram foram:
- a prescrição da dívida (de 5 anos) a que alude o nº 1 do artº 40º do DL nº 155/92 - invocada pelo Oponente em 7º a 13º da sua Petição e contraditada pelo IFAP em 20. a 23. da sua Contestação;
- a prescrição do procedimento (de 4 anos) a que alude o nº 1 do artº 3º do R 2988/95 – “invocada” pelo Oponente em ulterior fase do processo mediante Requerimento de 07/05/2015 (cfr. fls. 278 dos autos - paginação electrónica) de junção aos autos de cópia do Acórdão nº 1/2015 do Pleno da 1ª Secção do STA (“por se lhe afigurar como tendo utilidade para a boa decisão a causa”, mas de cuja junção se dispensou de notificar o mandatário forense do IFAP), contraditada, ainda assim, pelo IFAP nas suas Alegações oferecidas nos termos do disposto no artº 120º do CPPT.
Ou seja: nos presentes autos a Mª Juiz a quo conheceu, apreciou e decidiu oficiosamente questão - a prescrição de execução (de 3 anos) da decisão exequenda na execução fiscal subjacente a que alude nº 2 do artº 3º do R 2988/95 – relativamente à qual não concedeu previamente às partes a faculdade para, querendo, se pronunciarem sobre tal concreta prescrição por si oficiosamente suscitada a respeito da prescrição de execução da decisão exequenda na execução fiscal subjacente.
Contrariamente ao alegado pelo recorrente, a questão apreciada na sentença recorrida passou precisamente por saber se a dívida estava ou não prescrita, quanto à prescrição do procedimento escreveu-se na sentença recorrida:
O prazo prescricional previsto no nº 1 da norma supra transcrita diz respeito ao procedimento que culmina com a aplicação da sanção/medida administrativa. Ora, a prescrição do procedimento constitui um vício da decisão que não pode ser apreciado em sede de oposição, por se tratar de questão que tem a ver com a legalidade do acto, não se verificando a condição de que a alínea h) do nº 1 do artigo 204º do CPPT faz depender a admissibilidade dessa discussão: “que a lei não assegure meio judicial de impugnação ou recurso contra o acto”, ou seja, na sentença recorrida apenas se apreciou a questão da prescrição da dívida exequenda e não a questão da prescrição do procedimento, mas por apelo a diferentes normas jurídicas, normas da União, o que era possível uma vez que é ao juiz que incumbe “dizer o direito”, cfr. artigo 5º, n.º 3 do CPC, além de que, esta questão na vertente resolvida pela sentença recorrida –por apelo às normas da União- foi discutida nas alegações de recurso pré-sentenciais, pelo que, sempre se impunha o seu conhecimento de modo a articular os diferentes preceitos legais invocados pelas partes, bem como outros que o juiz entendesse aplicáveis para a boa decisão da causa.
Não obtém, assim, provimento esta questão preliminar.

Suscitou também o recorrente, cfr. conclusões 5ª a 8ª, a questão de saber se após a notificação -em 14.09.2007- da decisão que lhe ordenou a reposição de quantias ocorreram circunstâncias susceptíveis de interromper ou suspender o prazo a que alude o artigo 3º, n.º 2 do Regulamento CE 2988/95, de 18.12.1995.
Dispunha esta norma:
2. O prazo de execução da decisão que aplica a sanção administrativa é de três anos. Este prazo corre desde o dia em que a decisão se toma definitiva.
Os casos de interrupção e de suspensão são regidos pelas disposições pertinentes do direito nacional.

Quanto a saber em que momento a decisão se tornou definitiva, de modo a determinar-se o termo inicial do referido prazo de 3 anos, na sentença recorrida reproduziu-se a sentença proferida no processo 2837/11.6BELSB a propósito da caducidade do direito de acção:
Segundo o disposto no art.º 59.º, n.º 1, do CPTA, o prazo de impugnação começa a correr a partir da notificação. Convertido aquele prazo em 90 dias, e sem para já considerar qualquer causa de suspensão, temos que o termo do prazo de impugnação ocorreria em 13 de Dezembro de 2007. Todavia, tendo o Autor apresentado reclamação em 09.10.2007, tal facto tem a virtualidade de suspender o prazo de impugnação, nos termos do art.º 59.º, n.º 4, do CPTA. O prazo esteve assim suspenso por 30 dias, altura em que se formou indeferimento tácito da reclamação (por ter sido este o primeiro evento a ocorrer nos termos da parte final do n.º 4 do art.º 59.º do CPTA – cfr. ainda acórdão do TCA Sul de 15.01.2009, proferido no processo n.º 04651/08), nos termos do art.º 165.º do CPA; portanto, o prazo de impugnação retomou o seu curso em 09 de Novembro de 2007. Tal prazo voltou a ficar suspenso no período de férias judiciais, que decorreu entre 22 de Dezembro de 2007 e 02 de Janeiro de 2008. Computados o termo inicial de contagem do prazo e as causas de suspensão ocorridas, temos que: entre 15.09.2007 e 08.10.2007 decorreram 24 dias; entre 09.11.2007 e 21.12.2007, decorreram mais 43 dias, pelo que até esta data estavam esgotados 67 dias; de 03.01.2008 a 25.01.2008 decorreram mais 23 dias, pelo que o dia 25.01.2008 foi o nonagésimo dia de prazo, e portanto o último em que o Autor poderia ter impugnado o acto com fundamento na sua anulabilidade.”.
Ou seja, o data em que se iniciou aquele prazo de 3 anos para a execução -para pagamento coercivo- da decisão exequenda foi o dia 25.01.2008.

Há agora que ver se após esse dia ocorreu alguma causa de suspensão ou de interrupção do prazo nos termos da legislação nacional, cfr. 2º parágrafo daquele n.º 2 do artigo 3º, que obstasse a que o prazo de 3 anos se completasse no dia 25.01.2011.

As causas de suspensão ou interrupção dos prazos de prescrição das dívidas como a dos autos, que não são dívidas fiscais, é regulado pelo disposto no Código Civil, nomeadamente pelo disposto nos artigos 318º a 325º. Lidos tais preceitos legais não se enquadram em tais normas, com efeitos relevantes determinantes da suspensão ou interrupção de tal prazo, qualquer um dos factos elencados pelo recorrente nas suas conclusões de recurso –mesmo que se devesse considerar tal prazo como um prazo de caducidade, cfr. artigos 328º e ss. do Código Civil, também neste caso não se vislumbra que tenha ocorrido qualquer facto que impedisse que tal prazo se completasse.
Ao contrário do que o recorrente alega, o disposto no artigo 49º da LGT não é aplicável ao caso dos autos uma vez que a divida em cobrança coerciva não é uma divida tributária tal como definida pelo artigo 1º da LGT:
1 - A presente lei regula as relações jurídico-tributárias, sem prejuízo do disposto no direito comunitário e noutras normas de direito internacional que vigorem directamente na ordem interna ou em legislação especial.
2 - Para efeitos da presente lei, consideram-se relações jurídico-tributárias as estabelecidas entre a administração tributária, agindo como tal, e as pessoas singulares e colectivas e outras entidades legalmente equiparadas a estas.
3 - Integram a administração tributária, para efeitos do número anterior, a Direcção-Geral dos Impostos, a Direcção-Geral das Alfândegas e dos Impostos Especiais sobre o Consumo, a Direcção-Geral de Informática e Apoio aos Serviços Tributários e Aduaneiros, as demais entidades públicas legalmente incumbidas da liquidação e cobrança dos tributos, o Ministro das Finanças ou outro membro do Governo competente, quando exerçam competências administrativas no domínio tributário, e os órgãos igualmente competentes dos Governos Regionais e autarquias locais.
Como o recorrente não se enquadra em qualquer uma das categorias de entidades definidas por tal preceito, nem a dívida resulta de uma relação jurídica-tributária tal como aí definida, está, assim, afastada a aplicação do artigo 49º, n.º 1.
Assim, pode-se afirmar com segurança que ao abrigo de tais preceitos legais o referido prazo de 3 anos não esteve suspenso, nem se interrompeu, após o dia 25.01.2008.

Por fim, quanto à questão colocada na conclusão 9ª, e respeitante ao reenvio prejudicial a mesma não pode obter provimento por duas ordens de razões:
-a norma do artigo 168º, n.º 4 do CPA (Salvo se a lei ou o direito da União Europeia prescreverem prazo diferente, os atos constitutivos de direitos podem ser objeto de anulação administrativa no prazo de cinco anos, a contar da data da respetiva emissão…) a que o recorrente faz referência, e da qual pretende aproveitar o prazo de cinco anos, não se encontrava em vigor à data em que se completou o referido prazo de 3 anos, 25.01.2011, uma vez que o CPA na versão actual apenas foi aprovado pelo Decreto-Lei n.º 4/2015 de 07.01;
-tal norma diz respeito aos prazos em que pode ocorrer a anulação administrativa dos actos e já não aos prazos em que devem ser executados os actos administrativos consolidados na ordem jurídica. A questão do prazo procedimental que regulava a prática do acto em execução, como já vimos, não foi objecto de apreciação na sentença recorrida, pelo que, não tem sentido a invocação daquela norma no presente caso concreto.
Ou seja, não sendo, face ao direito interno, tal norma do artigo 168º, n.º 4 aplicável ao caso concreto dos autos, porque muito posterior aos factos relevantes para a decisão, não faz sentido suscitar um reenvio prejudicial para saber da conformidade de tal norma, e respectivo prazo, face ao direito da União que regula a situação concreta dos autos.

Pelo exposto, acordam os juízes que compõem esta secção tributária do Supremo Tribunal Administrativo em negar provimento ao recurso.
Custas pelo recorrente.
D.n.

Lisboa, 23 de Junho de 2021


Assinado digitalmente pelo relator, que consigna e atesta que, nos termos do disposto no art. 15.º-A do Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13 de Março, aditado pelo art. 3.º do Decreto-Lei n.º 20/2020, de 1 de Maio, têm voto de conformidade com o presente acórdão os Conselheiros que integram a formação de julgamento. – Jorge Miguel Barroso de Aragão Seia (relator) - Nuno Filipe Morgado Teixeira Bastos – Gustavo André Simões Lopes Courinha.