Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0216/14.2BEBRG 0134/18
Data do Acordão:02/20/2019
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:FRANCISCO ROTHES
Descritores:OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO FISCAL
REVERSÃO
INSOLVÊNCIA
CPPT
Sumário:I - Cessado o processo de insolvência, pode prosseguir contra o insolvente uma execução fiscal por crédito vencido posteriormente à declaração de insolvência ainda que, de acordo com a restrição prevista no n.º 5 do art. 180.º do CPPT, apenas relativamente a bens adquiridos após essa declaração e sem prejuízo das obrigações contraídas pela Fazenda Pública no âmbito do processo de insolvência e da prescrição.
II - Se a Fazenda Pública não tiver logrado o pagamento dos seus créditos exequendos provenientes de dívidas tributárias pela massa insolvente da sociedade originária devedora, a lei admite a prossecução da execução fiscal em ordem a conseguir esse pagamento pelo património dos responsáveis subsidiários (cf. art. 24.º da LGT), ao abrigo do disposto nos arts. 180.º, n.º 4 e 153.º, n.º 2, do CPPT.
III - A essa reversão não obsta o facto de o chamado como responsável subsidiário ter sido também ele declarado insolvente mas, nesse caso, após a reversão, a execução fiscal deve ser imediatamente remetida à insolvência; cessado esse processo, se o crédito aí não logrou integral pagamento, a execução fiscal pode prosseguir contra o revertido, mas com a referida restrição prevista no n.º 5 do art. 180.º do CPPT.
Nº Convencional:JSTA000P24245
Nº do Documento:SA2201902200216/14
Data de Entrada:02/14/2018
Recorrente:A........
Recorrido 1:AT- AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Recurso jurisdicional de sentença proferida em processo de oposição à execução fiscal

1. RELATÓRIO

1.1 O Recorrente acima identificado (doravante também Executado por reversão ou Oponente) interpõe recurso para o Supremo Tribunal Administrativo da sentença por que o Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga julgou improcedente a oposição que deduziu à execução fiscal que, instaurada contra uma sociedade, reverteu contra ele por o Serviço de Finanças de Guimarães 1 o ter considerado responsável subsidiário pela dívida exequenda, proveniente de Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC).

1.2 O recurso foi admitido, para subir de imediato, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo e o Recorrente apresentou as alegações de recurso, com conclusões do seguinte teor:

«a) Nos presentes autos, o Oponente, aqui Apelante, deduziu oposição à execução fiscal contra si revertida e fundamentou a sua posição, alegando em resumo, a falta de pressupostos da reversão por a administração tributária não ter demonstrado a insuficiência de bens, falta de culpa pela insuficiência de bens e impossibilidade de prosseguimento da execução por ter sido declarado insolvente.

b) Foi proferida sentença que julgou improcedente a oposição, falecendo todos os argumentos invocados pelo Oponente.

c) Dissonante do decidido, entende o Apelante que a sentença incorreu em erro de julgamento em matéria de direito, por errada interpretação da norma contida no n.º 5 do artigo 180.º do CPPT, porquanto, na óptica do recorrente, a execução fiscal só pode prosseguir contra o responsável subsidiário se este tivesse adquirido bens após a sua declaração de insolvência.

d) E não como entende o Tribunal a quo, no argumento de que, declarada a insolvência do revertido/oponente, poderia ser efectuada a reversão, de que esta não acarreta a impossibilidade legal do acto de reversão da execução contra si.

e) Ora, é aqui que está o cerne da questão, nos termos do n.º 5 do artigo 180.º do CPPT, a execução fiscal só poderá prosseguir contra o responsável subsidiário se este tivesse adquirido bens após a sua declaração de insolvência, mas para o Tribunal a quo, a interpretação e a motivação para decidir como decidiu, é a de que a declaração de insolvência não acarreta a impossibilidade legal do acto de reversão da execução.

f) Mas, a reversão fiscal é um mecanismo que consiste no chamamento do responsável subsidiário à execução fiscal, como decorre dos arts. 22.º e ss. da Lei Geral Tributária (LGT).

g) Preenchidos estes requisitos, se a decisão proferida for no sentido de determinar a reversão do processo de execução fiscal, a mesma deverá ser notificada ao revertido.

h) Tal notificação deverá ser acompanhada de fundamentação quer quanto aos seus pressupostos, quer dos elementos essenciais da liquidação, e, simultaneamente, da citação para a execução.

i) Com a notificação do despacho de reversão é o revertido citado para o processo execução fiscal.

j) No que diz respeito às ilegalidades referentes ao despacho de reversão, deverão ser apreciadas judicialmente por meio de oposição à execução, no prazo de 30 dias.

k) Os efeitos da decisão judicial de oposição à execução podem ser de anular ou não o despacho de reversão, e se anular, será extinta a execução quanto ao opoente, formando caso julgado.

l) Ora, quando o Oponente diz que a execução não podia prosseguir, diz respeito à ilegalidade que lhe está associada, e que este invocou, a de que a execução fiscal só podia prosseguir contra o responsável subsidiário se este tivesse adquirido bens após a sua declaração de insolvência.

m) O que não foi provado em sede de reversão pela Administração Tributária.

n) Logo, o despacho de reversão enferma de ilegalidade, contrariamente ao decidido pelo Tribunal a quo.

o) A insolvência do Recorrente modifica obrigatoriamente a decisão em causa, quando submetida ao respectivo regime legal (art. 180.º n.º 5 do CPPT).

p) Nos termos do mesmo art. 180.º n.º 5 do CPPT, para que houvesse a reversão teria de ficar provado que o responsável subsidiário tinha adquirido bens depois de declarada a falência, o que não aconteceu.

q) Ao surgir a reversão, objecto da presente oposição, existe uma violação do número 5 do artigo 180.º do CPPT, o que determina a nulidade de toda a sua tramitação que conduz à ilegalidade da reversão efectuada.

r) A referida restrição, só tem razão de ser se a empresa, o falido ou o responsável subsidiário, mencionados na norma legal (n.º 5 do art. 180.º do CPPT) forem o executado, ao tempo e em relação ao qual, a declaração de insolvência determina a sustação da execução, e remessa ao tribunal judicial competente para apensação ao processo de recuperação ou de falência, nos termos do art. 180.º n.ºs 1 e 2 do CPPT.

s) Só em relação a esses se compreende que a cobrança coerciva, do que ainda se mostre em dívida à Administração Tributária, fique restrita a bens ulteriormente por eles adquiridos, em respeito à intangibilidade do acervo de bens e de direitos da massa falida/insolvente e ao princípio da universalidade da instância falimentar.

t) É que só então, porque tais bens não podiam ter integrado a massa insolvente, a execução fiscal poderá prosseguir em relação ao insolvente sobre bens não apreendidos no processo de insolvência, não saindo prejudicada a aludida finalidade universal do processo em relação ao insolvente, nem à intangibilidade do acervo de bens e de direitos da massa insolvente.

u) No caso sub judice, o Recorrente foi declarado insolvente, pelo que faz todo o sentido convocar, relativamente a ele, o disposto no n.º 5 do art. 180.º do CPPT.

v) E, consequentemente, deverá excluir-se a responsabilidade subsidiária do Recorrente, em sede de reversão fiscal, por ilegal, dado não se mostrarem preenchidos todos os seus pressupostos, sendo por isso, parte ilegítima na execução.

w) O que se invoca para os devidos e legais efeitos.

x) Deve a douta decisão recorrida ser revogada e substituída por outra que aprecie os vícios alegados, com efeitos na extinção da execução fiscal.

Nestes termos e nos demais de direito, e com o douto suprimento de Vossas Excelências, deve a decisão recorrida ser revogada e substituída por outra que aprecie os vícios alegados, com efeitos na extinção da execução fiscal».

1.3 Não foram apresentadas contra-alegações.

1.4 Recebidos neste Supremo Tribunal Administrativo, os autos foram com vista ao Ministério Público e a Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer no sentido de que seja negado provimento ao recurso e mantida a sentença, com a seguinte fundamentação: «[…]

Veio, pois, o Recorrente invocar que a sentença em crise efectuou uma errada interpretação da já aludida disposição legal [art. 180.º, n.º 5, do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT)], convocada pelo tribunal a quo para a solução do caso vertente.
Ab initio, o Ministério Público vem enfatizar que, pese embora a sentença recorrida se tenha ancorado na sagaz jurisprudência dimanada deste Colendo STA, que citou e reproduziu, paradoxalmente, o Recorrente, pura e simplesmente, desconsiderou e escamoteou esse facto, persistindo numa exegese do preceito que se mostra desprovida de qualquer suporte doutrinário e/ou jurisprudencial.
Efectivamente, este Colendo Supremo Tribunal já se debruçou sobre a concreta questão decidenda, recortada na motivação em análise, mormente, no douto Acórdão tirado em 11/05/2016, no âmbito do Processo n.º 01017/14.
Sucede que, conforme decorre da fundamentação da sentença sob recurso, a mesma adoptou a solução consagrada no citado douto aresto deste Colendo STA, quanto à vexata quaestio da interpretação da norma do n.º 5 do artigo 180.º do CPPT.
Efectivamente, nos termos do citado aresto, «I- A declaração de insolvência do responsável subsidiário não acarreta a impossibilidade legal do acto de reversão da execução contra si ou a irregularidade/ nulidade deste acto, o qual constitui, aliás, uma condição para que a administração tributária possa apresentar-se, perante os demais credores deste devedor, a reclamar e a cobrar o montante exequendo no respectivo processo de insolvência. // II- Só com o acto de reversão passa a dívida tributária exequenda a onerar o património do responsável subsidiário insolvente, dívida que sem esse acto nunca poderia obter pagamento no respectivo processo de insolvência. Antes da prolação desse acto, não existe sequer processo de execução contra o responsável subsidiário que importasse sustar, razão por que não tem cabimento legal a tese de que a reversão da execução contra responsável já declarado insolvente afronta o disposto no artigo 88.º do CIRE. // III- O acto administrativo de reversão, enquanto acto lesivo, não pode deixar de ser levado ao conhecimento do revertido antes da remessa da execução fiscal para o seu processo de insolvência. Não só porque disso depende a efectiva produção de efeitos do acto de reversão, isto é, a eficácia deste acto e a exigibilidade da dívida que ele incorpora relativamente ao devedor subsidiário, como, também, porque só depois dessa notificação (que é necessariamente levada a cabo através do acto de citação) este adquire a qualidade de devedor e executado, ficando habilitado, por um lado, a apresentar os meios legais de defesa no que toca à legalidade da liquidação donde emerge a dívida exequenda (art. art. 22.º, n.º 5, da LGT), e, por outro lado, a contestar a sua responsabilização por tal dívida (art. 204.º do CPPT) (…)» (disponível in www.dgsi.pt, tal como o que citaremos de imediato).
Acresce que esta posição doutrinal segue na esteira do douto Acórdão do Pleno da Secção do CT do STA, de 17/02/2016, no Recurso n.º 0122/15, onde se consagrou o seguinte entendimento: «(...) IV- É legalmente viável a instauração de processo de execução fiscal contra a sociedade devedora após a declaração judicial da sua insolvência, pese embora as execuções instauradas para cobrança de créditos vencidos antes da declaração de insolvência devam ser imediatamente sustadas e avocadas pelo tribunal judicial para apensação ao processo de insolvência, e as instauradas para cobrança de créditos vencidos após a declaração de insolvências devam prosseguir somente com a penhora de bens não apreendidos no processo de insolvência. // V - É também legalmente viável a prossecução da execução fiscal contra o responsável subsidiário, por reversão realizada (ao abrigo do art. 24.º da LGT) antes ou depois da declaração de insolvência da sociedade devedora, com a penhora de bens do revertido independentemente da data da sua aquisição, na medida em que só relativamente à entidade insolvente fica a possibilidade de penhora limitada a bens ulteriormente adquiridos, não fazendo sentido invocar a restrição do n.º 5 do art. 180.º do CPPT relativamente ao responsável subsidiário caso inexista declaração de insolvência quanto a si».
De resto, a título final, permitimo-nos realçar o facto de a M.ma Juíza de Direito, validando embora o acto de reversão, ser peremptória ao aludir à necessidade de a Fazenda Pública dar oportuno e cabal cumprimento ao disposto no n.º 5 do artigo 180.º do CPPT, se o processo de execução vier a prosseguir para cobrança do que se mostre em dívida, sem prejuízo das obrigações contraídas no âmbito do processo de recuperação e, bem assim, da prescrição, ficando, de todo o modo, a possibilidade de penhora circunscrita, apenas, aos bens ulteriormente adquiridos pelo Oponente (assim, cfr. fls. 111 verso in fine e 112 do p.f.).
Acresce que, se acaso a Fazenda Pública viesse a proceder à penhora de quaisquer bens na titularidade do Executado/Revertido, fora e para além desse estrito circunstancialismo, nem assim os direitos do aqui Recorrente ficariam minimamente coarctados ou cerceados, podendo, nessa hipótese, lançar mão da reclamação de actos do órgão de execução fiscal, regulada nos artigos 276.º a 278.º do CPPT.
Em suma, a reversão da dívida exequenda contra o Oponente insolvente, na sua qualidade de responsável subsidiário e nas circunstâncias enunciadas na presente oposição, é legal, não contende com os seus legítimos direitos e interesses e, ademais, mostra-se ancorada na jurisprudência dimanada deste Colendo Supremo Tribunal.
Nesta conformidade, na óptica do Ministério Público, urge concluir que a decisão judicial em crise não merece censura, na interpretação e aplicação que fez da norma do n.º 5 do artigo 180.º do CPPT, alegadamente violada».

1.5 Colhidos os vistos dos Conselheiros adjuntos, cumpre apreciar e decidir se a Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga fez correcto julgamento quando julgou improcedente a oposição à execução fiscal, o que passa por indagar se para que a execução fiscal possa reverter contra o responsável subsidiário, quando a sociedade originária devedora e o chamado por reversão foram ambos declarados insolventes, se exige a prévia demonstração de que este adquiriu bens após a declaração de insolvência.


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2. FUNDAMENTAÇÃO

2.1 DE FACTO

A sentença efectuou o julgamento da matéria de facto nos seguintes termos:

«A) Em 23/10/2012, foi instaurado o P.E.F. n.º 0418201201122347, contra a sociedade “B…….. - …………, Lda.”, para cobrança de dívida de I.R.C. do exercício de 2011 – fls. 34 a 38 do P.E.F. junto aos autos.

B) A data limite de pagamento voluntário da liquidação subjacente à divida exequenda foi 28/09/2012 – fls. 36 do P.E.F. junto aos autos.

C) Por sentença proferida em 16/01/2013, no processo n.º 95/13.7TBGMR do 2.º Juízo do Tribunal de Guimarães, a sociedade “B……... - ……….., Lda.” foi declarada insolvente e da mesma consta o seguinte: “… Determino a avocação dos processos fiscais pendentes contra a insolvente, nos termos e para os efeitos do artigo 180.º n.º 2 do Código de Procedimento e de Processo Tributário...” – fls. 20 a 24.

D) Por sentença proferida em 29/04/2013, no processo n.º 544/13.4TBGMR do 3.º Juízo Cível do tribunal Judicial de Guimarães, o Oponente foi declarado insolvente – fls. 66 a 69 e 91.

E) Em 11/10/2013 foi proferido despacho de reversão contra o Oponente, com o seguinte teor: “DESPACHO
Face às diligências efectuadas, e estando concretizada a audição do(s) responsável subsidiário(s), prossiga-se com a reversão da execução fiscal contra A………, (...), na qualidade de Responsável Subsidiário, pela dívida abaixo discriminada. Atenta a fundamentação infra, a qual tem de constar da citação, proceda-se à citação do(s) executado(s) por reversão, nos termos do Art. 160.º do C.P.P.T para pagar no prazo de 30 (trinta) dias, a quantia que contra si reverteu sem juros de mora nem custas (n.º 5 do Art. 23.º da L.G.T.)
FUNDAMENTOS DA REVERSÃO
Fundamentos de emissão central
Insuficiência de bens da devedora originária (art. 23.º/2 e 3 da LGT): decorrente de situação líquida negativa (SLN) declarada pela devedora originária na última declaração referente à Informação Empresarial Simplificada (IES) e/ou em face de insolvência declarada pelo Tribunal.
Gerência (administrador; gerente, ou director), de direito (art. 24.º/1 b da LGT), no terminus do prazo legal de pagamento ou entrega do imposto em questão, conforme cadastro da Autoridade Tributária e Aduaneira (AT).
Gerência de facto decorrente da remuneração da categoria A, auferida ao serviço da devedora originária no período em questão” – fls. 74 do P.E.F. junto aos autos.

F) Em 27/11/2013 foi elaborada “Certidão de Citação”, assinada pelo Oponente, com o seguinte teor:
Certifico que citei hoje, pelas 15 horas e 30 minutos, A…………, … executado por reversão nos termos do artigo 160.º do CPPT, na qualidade de responsável subsidiário, … tendo-lhe sido entregue neste acto a respectiva nota de citação...” – fls. 33 dos autos e fls. 84 do P.E.F. junto aos autos».


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2.2 DE FACTO E DE DIREITO

2.2.1 A QUESTÃO A APRECIAR E DECIDIR

Foi instaurada uma execução fiscal contra uma sociedade que, ulteriormente, foi declarada insolvente.
O órgão de execução fiscal reverteu a execução contra o ora Recorrente, que entendeu ser responsável subsidiário pelas dívidas exequendas, o qual foi declarado insolvente ainda antes da reversão.
Este veio defender-se, mediante oposição, pedindo a extinção da execução fiscal quanto a ele com fundamento i) na impossibilidade de ser responsabilizado pelas dívidas exequendas, por a AT não ter demonstrado que adquiriu novos bem após a declaração de insolvência, ii) por a AT não ter demonstrado a insuficiência de bens da sociedade originária devedora em que fundamenta a reversão e iii) por não ter culpa pela insuficiência do património social da originária devedora.
A Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga julgou improcedentes todos os fundamentos invocados, sendo que ora nos interessa considerar apenas o primeiro, pois é o único que o Recorrente põe em causa, motivo por que a sentença transitou quanto aos demais.
Quanto a esse, alicerçando-se na jurisprudência deste Supremo Tribunal, que citou, a sentença, em síntese, considerou que nem a insolvência da originária devedora nem a insolvência do Oponente, ulteriores à data em que se venceram os créditos em cobrança coerciva, impediam a reversão contra este enquanto responsável subsidiário; mais, que a reversão era necessária para permitir à AT cobrar esses créditos na insolvência. No entanto, logo salientou que a execução fiscal deve ser sustada imediatamente após a reversão e remetida à insolvência, caso o respectivo processo ainda não esteja encerrado e que, após o encerramento, podendo o órgão da execução fiscal fazê-la prosseguir, para cobrança do montante que não houver logrado pagamento na insolvência, só poderão ser executados bens adquiridos pelo Oponente após a insolvência.
O Oponente discorda desse entendimento. Considera, em síntese, que resulta do n.º 5 do art. 180.º do CPPT que a possibilidade da reversão contra ele, que foi declarado insolvente, depende da AT demonstrar que adquiriu bens após a insolvência, demonstração que nem sequer ensaiou.
Como resulta do que ficou exposto, a questão que cumpre apreciar e decidir é a de saber se, em face das declarações de insolvência da sociedade originária devedora e do responsável subsidiário, a prossecução da execução fiscal contra este (mediante reversão) para cobrança coerciva de dívidas vencidas antes da data em que foi declarada a sua insolvência só é possível no caso de o órgão de execução fiscal demonstrar que o responsável subsidiário adquiriu bens ulteriormente àquela data.


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2.2.2 DA POSSIBILIDADE DE PROSSECUÇÃO DA EXECUÇÃO FISCAL APÓS A DECLARAÇÃO DE INSOLVÊNCIA

Recordemos o que disse a sentença sobre a questão:

«Nos presentes autos está em causa a reversão contra o Oponente efectuada no âmbito do P.E.F. n.º 0418201201122347, que corre termos no Serviço de Finanças de Guimarães 1, originariamente instaurado contra a sociedade “B……. - ………., Lda.”, para cobrança de dívidas relativas a I.R.C. do exercício de 2011, ascendendo a quantia exequenda a € 4.555,72.
O impetrante começa por invocar que não poderia ocorrer a reversão da dívida exequenda contra si, porquanto quer a sociedade quer ele próprio já tinham sido declarados insolventes quando a reversão ocorreu e a A.T. não demonstrou a existência de novos bens após essas declarações.
Vejamos se lhe assiste razão.
No que concerne à insolvência da sociedade, decorre dos n.ºs 1 e 2 do artigo 180.º do C.P.P.T. que, declarada a insolvência, serão sustados os processos de execução fiscal que se encontrem pendentes e avocados pelo tribunal judicial para apensação ao processo de insolvência, só sendo devolvidos quando o processo terminar, devolução essa que tem como finalidade a possibilidade de, em caso da sociedade insolvente adquirir bens, prosseguirem os processos para cobrança do que esteja em dívida à Fazenda Pública (cfr n.ºs 4 e 5 do artigo 180.º do C.P.P.T.).
No entanto, é legalmente viável a prossecução da execução fiscal contra o responsável subsidiário, por reversão realizada antes ou depois da declaração de insolvência da sociedade devedora (neste sentido, vide Acórdãos do S.T.A. de 16/03/2016 e de 17/02/2016, proferidos nos processos n.ºs 0647/15 e 0122/15, respectivamente) [( Disponíveis, respectivamente, em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/d5f8633861d97a4480257f85004e9f1e e em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/181875ffe0a8924580257f630043bb38.)].
No que respeita à declaração de insolvência do próprio responsável subsidiário, esta também não acarreta a impossibilidade legal do acto de reversão da execução contra si ou a irregularidade/nulidade deste acto, o qual constitui, aliás, uma condição para que a A.T. possa apresentar-se, perante os demais credores deste devedor, a reclamar e a cobrar o montante exequendo no respectivo processo de insolvência.
De facto, só com o acto de reversão, é que a dívida tributária exequenda passa a onerar o património do responsável subsidiário insolvente, dívida que sem esse acto nunca poderia obter pagamento no respectivo processo de insolvência.
Efectivamente, antes da prolação do despacho de reversão, não existe sequer processo de execução contra o responsável subsidiário que importasse sustar.
O acto administrativo de reversão, enquanto acto lesivo, não pode deixar de ser levado ao conhecimento do revertido antes da remessa da execução fiscal para o seu processo de insolvência, não só porque disso depende a efectiva produção de efeitos do acto de reversão, isto é, a eficácia deste acto e a exigibilidade da dívida que ele incorpora relativamente ao devedor subsidiário, como, também, porque só depois dessa notificação (que é necessariamente levada a cabo através do acto de citação) este adquire a qualidade de devedor e executado, ficando habilitado, por um lado, a apresentar os meios legais de defesa no que toca à legalidade da liquidação donde emerge a dívida exequenda (n.º 5 do artigo 22.º da L.G.T.), e, por outro lado, a contestar a sua responsabilização por tal dívida (artigo 204.º do C.P.P.T.).
Neste sentido, Acórdão do S.T.A. de 11/05/2016, proferido no processo n.º 01017/14 [( Disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/03886e69453d0b2f80257fb70047908c. )].
Face ao exposto, o argumento de que, declaradas as insolvências da devedora originária e do revertido/Oponente, não poderia ser efectuada a reversão, não merece acolhimento.
Contudo, sempre se diga que, após a realização da reversão, deve o processo de execução ser sustado e remetido ao processo de insolvência do Oponente, caso este ainda não esteja encerrado; e, quando for encerrado, deverá ser devolvido ao Serviço de Finanças para que prossiga para cobrança do que se mostre em dívida à Fazenda Pública, sem prejuízo das obrigações contraídas por esta no âmbito do processo de recuperação, bem como sem prejuízo da prescrição, mas ficando a possibilidade de penhora limitada a bens ulteriormente adquiridos pelo Oponente (n.º 5 do artigo 180.º do C.P.P.T.)».

Diga-se desde já que concordamos integralmente com a fundamentação que vimos de reproduzir, a qual se mostra de acordo com a jurisprudência deste Supremo Tribunal, nela citada.
Se bem interpretamos a motivação do recurso, o Recorrente entende que a reversão contra ele, enquanto responsável subsidiário que foi declarado insolvente, só poderia ocorrer se a AT demonstrasse que ele adquiriu bens após a sua declaração de insolvência.
Salvo o devido respeito, não é assim.
A reversão tem de ocorrer contra ele como único modo de a AT poder fazer valer no processo de insolvência o direito de crédito que se arroga. Como ficou dito no já referido acórdão da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo de 11 de Maio de 2016, proferido no processo n.º 1017/14, «[s]ó com o acto de reversão passa a dívida tributária exequenda a onerar o património do responsável subsidiário insolvente, dívida que sem esse acto nunca poderia obter pagamento no respectivo processo de insolvência. Antes da prolação desse acto, não existe sequer processo de execução contra o responsável subsidiário».
No entanto, como bem alertou a sentença, logo que efectuada a reversão, deve o processo de execução ser sustado e remetido ao processo de insolvência do Oponente, caso este ainda não esteja encerrado; se ou quando for encerrado, deverá ser a execução fiscal ser devolvida ao Serviço de Finanças, para que prossiga para cobrança do que se mostre em dívida à Fazenda Pública, sem prejuízo das obrigações contraídas por esta no âmbito do processo de recuperação, bem como sem prejuízo da prescrição, mas apenas poderão ser executados bens que tenham advindo ao património do Oposição após a insolvência, ficando a possibilidade de penhora limitada a tais bens, tudo como decorre do n.º 5 do art. 180.º do CPPT.
Com o Recorrente e a jurisprudência deste Supremo Tribunal, podemos concluir que “faz todo o sentido” convocar, para resolver a questão de que nos ocupamos, o n.º 5 do art. 180.º do CPPT. No entanto, da convocação desse preceito resulta, não a impossibilidade da reversão – como defende o Recorrente –, mas a inviabilidade da execução fiscal prosseguir sobre outros bens que não os que o ora Recorrente tenha adquirido após a insolvência.
Se o órgão da execução fiscal vier a desrespeitar esse comando, o Executado terá ao seu dispor os meios judiciais de reacção contra a penhora, designadamente, a reclamação prevista no art. 276.º e segs. do CPPT.
O recurso não pode, pois, ser provido, devendo manter-se a sentença que fez correcta interpretação e aplicação da lei.


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2.2.3 CONCLUSÕES

Preparando a decisão, formulamos as seguintes conclusões:
I - Cessado o processo de insolvência, pode prosseguir contra o insolvente uma execução fiscal por crédito vencido posteriormente à declaração de insolvência ainda que, de acordo com a restrição prevista no n.º 5 do art. 180.º do CPPT, apenas relativamente a bens adquiridos após essa declaração e sem prejuízo das obrigações contraídas pela Fazenda Pública no âmbito do processo de insolvência e da prescrição.
II - Se a Fazenda Pública não tiver logrado o pagamento dos seus créditos exequendos provenientes de dívidas tributárias pela massa insolvente da sociedade originária devedora, a lei admite a prossecução da execução fiscal em ordem a conseguir esse pagamento pelo património dos responsáveis subsidiários (cf. art. 24.º da LGT), ao abrigo do disposto nos arts. 180.º, n.º 4 e 153.º, n.º 2, do CPPT.
III - A essa reversão não obsta o facto de o chamado como responsável subsidiário ter sido também ele declarado insolvente mas, nesse caso, após a reversão, a execução fiscal deve ser imediatamente remetida à insolvência; cessado esse processo, se o crédito aí não logrou integral pagamento, a execução fiscal pode prosseguir contra o revertido, mas com a referida restrição prevista no n.º 5 do art. 180.º do CPPT.


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3. DECISÃO

Em face do exposto, os juízes deste Supremo Tribunal Administrativo, em conferência, acordam em negar provimento ao recurso.

Custas pela Recorrente.


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Lisboa, 20 de Fevereiro de 2019. – Francisco Rothes (relator) – Aragão Seia – Dulce Neto.