Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo | |
Processo: | 0570/17 |
Data do Acordão: | 09/12/2018 |
Tribunal: | 2 SECÇÃO |
Relator: | FRANCISCO ROTHES |
Descritores: | IVA CESSÃO DE POSIÇÃO CONTRATUAL VALOR TRIBUTÁVEL |
Sumário: | I - Nos termos do disposto no art. 16.º, n.º 1, do CIVA, «o valor tributável das transmissões de bens e das prestações de serviços sujeitas a imposto será o valor da contraprestação obtida ou a obter do adquirente, do destinatário ou de um terceiro» (redacção aplicável). II - Na cessão da posição contratual de locatária num contrato de locação financeira, o valor tributável para efeitos de IVA é, em princípio, o valor da contraprestação obtida ou a obter do adquirente, ou seja, é o preço estipulado para a cessão e que a cessionária terá de pagar à cedente. |
Nº Convencional: | JSTA000P23565 |
Nº do Documento: | SA2201809120570 |
Data de Entrada: | 05/18/2017 |
Recorrente: | AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA |
Recorrido 1: | A... LDA |
Votação: | UNANIMIDADE |
Aditamento: | |
Texto Integral: | Recurso jurisdicional da sentença proferida no processo de impugnação judicial com o n.º 1279/09.8BEVIS
1. RELATÓRIO 1.1 O Representante da Fazenda Pública junto do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu recorreu para o Supremo Tribunal Administrativo da sentença proferida naquele Tribunal, que, julgando procedente a impugnação judicial deduzida pela acima identificada sociedade, anulou a liquidação adicional de Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) efectuada na sequência da correcção da matéria tributável, formulando conclusões do seguinte teor: «a) Incide o presente recurso sobre, a aliás douta sentença, que julgou procedente a presente impugnação, com a consequente anulação da liquidação adicional de IVA, do exercício de 2006, e correspondentes juros compensatórios, no valor global de € 7.380,23; b) Considerou o Tribunal a quo que, para efeitos do n.º 1 do art. 16.º do CIVA, o valor da contraprestação foi “aquele que o adquirente pagou e que diziam respeito às rendas em atraso à data da cessão contratual, pois foi o valor estabelecido pelas partes”; c) Ressalvado o devido respeito, que é muito, não pode, porém, a Fazenda Pública, sufragar tal entendimento; d) Note-se que o valor da contraprestação reside na contrapartida obtida e a obter pelo cedente; e) Ora, é inegável que uma das contrapartidas que o cedente passa a obter com a cessão da sua posição contratual consiste, precisamente, na desoneração das obrigações que assumiu no âmbito do contrato transmitido; f) Assim e salvo melhor douta opinião, entende a Fazenda que o valor tributável da prestação de serviço ora em causa é composto pelo valor recebido pelo cedente e pelo somatório das rendas ainda não pagas de que este se desonera; g) Pois, o valor da contraprestação em concreto, por parte do cedente, consistiu no valor da cedência propriamente dito (valor recebido pelo cedente) e ainda no valor das rendas não pagas e que, em virtude do contrato, deixou de ter obrigação de pagar; h) Devendo, por isso, a leitura do art. 16.º, n.º 1 do CIVA a respeito de que deve entender-se por contraprestação, englobar quer o valor recebido pelo cedente, quer aquele que deixou de pagar em virtude da operação praticada; i) Em suma, o Julgador, ao decidir como decidiu, incorreu em erro de julgamento, por errada aplicação da lei, mormente o disposto no art. 16.º n.º 1 do CIVA. Termos em que, deve ser dado provimento ao presente recurso, ordenando-se, em consequência, a substituição da douta sentença recorrida, por outra em que se julgue improcedente, por não provado, o vício de violação de lei imputado à liquidação impugnada, com as legais consequências». 1.2 A Recorrida não contra-alegou. 1.3 Recebidos neste Supremo Tribunal Administrativo, os autos foram com vista ao Ministério Público e o Procurador-Geral Adjunto proferiu parecer no sentido de que seja negado provimento ao recurso, com a seguinte fundamentação: «[…] Em causa está a questão do valor tributável para efeitos de IVA decorrente da operação de cessão da posição contratual nos contratos de locação financeira a que alude o ponto 3 do probatório sustentando a ora Recorrente que o valor tributável a considerar, para efeitos de IVA, é composto pelo valor recebido pelo cedente e pelo somatório das rendas ainda não pagas de que se desonera. 1.4 A questão que cumpre apreciar e decidir é a de saber se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento quando considerou que, para efeitos de tributação em IVA, o valor a considerar na cessão da posição contratual do locatário no âmbito de um contrato de locação financeira de bens móveis era o do valor recebido do cessionário pelo cedente e não, como sustentou a AT em suporte do acto impugnado, esse valor acrescido do montante das rendas ainda não pagas. * * * 2. FUNDAMENTAÇÃO 2.1 DE FACTO Na sentença recorrida o julgamento da matéria de facto foi efectuado nos seguintes termos: «1. Em cumprimento da Ordem de Serviço n.º OI 200900083, de 11.02.2009, a Divisão de Inspecção Tributária 1, da Direcção de Finanças de Viseu, levou a cabo uma acção de inspecção à Impugnante, de âmbito parcial IVA, relativa ao exercício económico do ano 2006, que teve início em 23.02.2009 e fim em 05.05.2009, no decurso da qual elaborou o Projecto de Correcções, datado de 05.05.2009, constante de fls. 13 e ss. do processo administrativo apenso, doravante PA, para cujo teor se remete por uma questão de brevidade, dando-se aqui por integralmente reproduzido. 2. A Impugnante foi notificada do projecto de Correcções para exercer o direito de audição através do ofício 5532, de 11.05.2009, tendo a notificação sido devolvida com a menção de “recusada”. – Cfr. fls. 19 e 20 e 55., concretamente 27 do PA, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido. 3. No âmbito da acção de inspecção foi o Relatório/Conclusões, sancionado por despacho em 28.05.2009, no qual se apuraram correcções à matéria tributável meramente aritméticas, relativas ao IVA, referente ao exercício económico do ano 2006, para o qual se remete por uma gestão de brevidade e do qual se extrai, o seguinte:
4. A Impugnante foi notificada do Relatório/Conclusões através de ofício n.º 6354 de 29.05.2009, enviado por correio registado com aviso de recepção, tendo sido devolvido com a menção “pediu aviso”. – Cfr. fls. 29/31 do PA, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido. 5. Foi enviada uma segunda notificação à Impugnante do Relatório/Conclusões, através de ofício n.º 6904, de 16.06.2009, enviado através de correio registado com aviso de recepção, assinado em 17.06.2009. – Cfr. fls. 32/33 do PA, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido. 6. Na sequência da inspecção tributária foram emitidas as liquidações de IVA e juros compensatórios, relativas ao exercício económico de 2006, ora, impugnadas, no valor global de € 7.380,23 euros, com data limite para pagamento voluntário em 31.08.2009. – Cfr. fls. 8/9 do processo físico». 2.2 DE FACTO E DE DIREITO 2.2.1 A QUESTÃO A APRECIAR E DECIDIR Está em causa o valor tributável para efeitos de IVA respeitante à cessão da posição contratual no âmbito de um contrato de locação financeira de bens móveis, cessão que o CIVA considera como prestação de serviços (Como salienta CLOTILDE CELORICO PALMA, «[o] conceito de prestação de serviços acolhido no Código do IVA não corresponde ao civilístico, de acordo com o qual o contrato de prestação de serviços é aquele mediante o qual uma das partes se obriga a proporcionar à outra certo resultado do seu trabalho intelectual ou manual, com ou sem retribuição (artigo 1154.º do Código Civil)» (Introdução ao Imposto sobre o Valor Acrescentado, Cadernos IDEFF, n.º 1, Almedina, 6.ª edição, pág. 82).) para efeitos da incidência do imposto (cfr. art. 4.º, n.º 1, do Código). Na verdade, a vocação de universalidade do IVA «implica que se entenda que qualquer tipo de atribuição patrimonial que não seja uma contrapartida de uma transmissão de bens tenha subjacente uma prestação de serviços tributável» (CLOTILDE CELORICO PALMA, ob. e loc. cit.); assim, para efeitos de incidência do imposto, a cessão de direitos constitui prestação de serviços. 2.2.2 DO VALOR TRIBUTÁVEL O art. 16.º do CIVA, que consagra as regras para a determinação do valor tributável nas operações internas, estabelecia no seu n.º 1, na redacção aplicável, que é a anterior à republicação operada pelo Decreto-Lei n.º 102/2008, de 20 de Junho: «Sem prejuízo do disposto no n.º 2, o valor tributável das transmissões de bens e das prestações de serviços sujeitas a imposto será o valor da contraprestação obtida ou a obter do adquirente, do destinatário ou de um terceiro». 2.2.3 CONCLUSÕES Preparando a decisão, formulamos as seguintes conclusões: I - Nos termos do disposto no art. 16.º, n.º 1, do CIVA, «o valor tributável das transmissões de bens e das prestações de serviços sujeitas a imposto será o valor da contraprestação obtida ou a obter do adquirente, do destinatário ou de um terceiro» (redacção aplicável). II - Na cessão da posição contratual de locatária num contrato de locação financeira, o valor tributável para efeitos de IVA é, em princípio, o valor da contraprestação obtida ou a obter do adquirente, ou seja, é o preço estipulado para a cessão e que a cessionária terá de pagar à cedente. * * * 3. DECISÃO Em face do exposto, decide-se negar provimento ao recurso. Custas pela Recorrente. * |