Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0224/14.3BEPRT 0760/18
Data do Acordão:10/28/2020
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:NUNO BASTOS
Descritores:BANCO
PRINCIPIO DA NÃO RETROACTIVIDADE
CONTRIBUIÇÃO ESPECIAL
Sumário:Tendo a Contribuição sobre o Sector Bancário natureza jurídica de contribuição financeira, não ocorre inconstitucionalidade orgânica e material das normas do seu regime jurídico, por violação dos princípios constitucionais da legalidade, não retroatividade, da tutela da confiança e da segurança jurídica, da igualdade, capacidade contributiva e equivalência, pelo que também a respetiva autoliquidação, ainda que referente ao ano de 2001, não enferma de ilegalidade por alegada violação desses mesmos princípios.
Nº Convencional:JSTA000P26562
Nº do Documento:SA2202010280224/14
Data de Entrada:09/05/2018
Recorrente:A.............. SGPS, S.A.
Recorrido 1:AT-AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
1. Relatório

1.1. O Banco A……., S.A., sociedade aberta, NIPC ……….., com sede na Rua ………., n.º …….., …….., recorre da sentença proferida pela Mm.ª Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, que julgou improcedente a impugnação judicial, por si deduzida, contra a decisão de indeferimento da reclamação graciosa do ato de autoliquidação da contribuição sobre o sector bancário, relativo ao ano de 2011, no valor de € 13.954.075,76.

Recurso este que foi admitido com subida imediata nos próprios autos e com efeito devolutivo.

Notificada da sua admissão, apresentou alegações e formulou as seguintes conclusões: «(…)

A. Pelo elenco de fundamentos acima descritos, infere-se que a douta sentença, ora recorrida, julgou improcedente a presente impugnação deduzida contra o ato de indeferimento da reclamação graciosa interposta contra a autoliquidação da contribuição sobre o setor bancário relativa ao ano de 2011, com o n.º 26000001096, no valor de € 13.954.075,76.

B. O Tribunal a quo, cingindo, erradamente em nossa opinião, as questões a decidir, à inconstitucionalidade orgânica e material da Portaria n.º 121/2011, de 30 de Março, por violação, por um lado, do princípio de reserva de lei em matéria fiscal e por atribuir poderes discricionários ao governo para fixar a taxa e base de incidência da contribuição, e por outro, por violação do princípio da capacidade contributiva; decidiu pela improcedência da impugnação, mantendo a liquidação impugnada por não considerar verificadas nenhuma das acima apontadas inconstitucionalidades.

C. Ora, não pode a Impugnante conformar-se com o doutamente decidido, desde logo porque a decisão proferida padece do vício de omissão de pronúncia quanto ao vício de inconstitucionalidade material por violação do princípio da irretroatividade da lei fiscal - vício alegado nos artigos 13.º (em especial al. c)), e 57.º a 67.º da Petição Inicial, e nos artigos 5.º (al. c) e 6.º a 18.º das Alegações, o que a fere de nulidade, nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 125 do Código do Procedimento e Processo Tributário, dado que é manifesto tratar-se de questão que o Tribunal a quo deveria apreciar. Não o tendo feito, deverá a sentença ser declarada nula, com as consequências legais.

D. No que tange o vício de inconstitucionalidade orgânica, entendeu o douto tribunal a quo ser "[ ... ] inequívoco que a predita Lei [Lei n.º 55-A/2010] estabelece a taxa da referida contribuição. O facto de se permitir que o Ministro das Finanças fixe, através de Portaria, a concreta taxa aplicável, a qual pode variar entre uma percentagem e o seu quíntuplo e uma percentagem e o seu dobro não altera essa conclusão."

E. Com a ressalva do sempre devido respeito, tal entendimento merece censura, porquanto, de acordo com o número 2 do artigo 103.º da CRP, a criação de impostos e dos respetivos elementos essenciais é competência exclusiva da Assembleia da República, salvo autorização ao Governo [cf. alínea i) do número 1 do artigo 165.º da CRP], afastando-se terminantemente a possibilidade de definição de tais elementos por instrumentos normativos de inferior valor. Assim, apenas se afigura admissível a criação e definição dos elementos essenciais dos impostos através de Leis ou Decretos-Lei autorizados, revelando-se, por conseguinte, incompatível com a Constituição a definição de tais elementos através de portaria.

F. Acresce que, à face da redação atual da Lei constitucional, o princípio da legalidade exige que a lei determine a taxa dos impostos e não apenas os seus limites, como se previa anteriormente no artigo 70.º da Constituição de 1933, na redação conferida pela revisão de 1971. Com efeito, "A Constituição de 1976, ao eliminar a menção «ou dos seus limites», quis claramente reservar à própria lei a directa determinação da taxa dos impostos. Assim, a criação e determinação dos elementos essenciais dos impostos tem de constar de diploma legislativo (reserva de lei), sem margem para desenvolvimento regulamentar nem para discricionariedade administrativa quanto aos seus elementos essenciais." [Cf. Acórdão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, de 21/04/2017, proferido no processo n.º 142/14.5BEPRT].

G. Sendo certo que no Acórdão citado na douta decisão recorrida (Acórdão n.º 70/2004 do Tribunal Constitucional) se sanciona que "ao definir o factor de quantificação do imposto traduzido na taxa apenas através da indicação das suas respectivas balizas, mínima e máxima, não deixa o legislador parlamentar de actuar no exercício desse poder tributário", não é menos verdade que no mesmo Acórdão se considera que a habilitação legal de fixação de taxas de imposto através de portaria apenas se deve considerar conforme à constituição desde que estabelecida de acordo com um critério de "razoabilidade quanto ao intervalo dentro do qual o legislador regulamentar podia fixar a taxa efectiva cuja razão de ser só poderia corresponder à sua preocupação de que esse intervalo não fosse de tal modo amplo que criasse uma incerteza intolerável quanto ao grau de amputação de riqueza admissível e esvaziasse de real conteúdo o juízo de opção política expresso num tal modo de tributação exigido ao legislador parlamentar." (sublinhado nosso)." [O Tribunal pronunciava-se, neste âmbito, sobre a adequação constitucional do número 1 do artigo 73.º (atual artigo 92.º) do Código dos Impostos Especiais de Consumo, o qual estabelece que as taxas unitárias de imposto sobre os produtos petrolíferos são determinadas através de Portaria, dentro dos intervalos fixados por lei.]

H. Razoabilidade e adequação que não se encontram verificadas na definição do intervalo exageradamente amplo de taxas constante do artigo 4.º do regime da CSSB, o qual admite uma variação de 500% (atualmente 1100%) entre os montantes mínimo e máximo previstos na lei, como ainda faz depender aquela variação em função do valor apurado, No caso em concreto os limites definidos pela norma habilitante implicam que a contribuição devida possa variar entre € 2.790.815,15 e € 13.954.075,76, Perante estas cifras, é manifesto e evidente o grau de incerteza que semelhante intervalo de fixação de taxas cria na esfera dos sujeitos passivos, não se podendo considerar esta variação como razoável, adequada, garante da segurança e previsibilidade do dia-a-dia dos contribuintes sendo, portanto, geradora de um grau de incerteza intolerável, sobretudo quando analisada à luz do princípio da certeza jurídica.

I. Na douta sentença ora recorrida, refere-se ainda que "A impugnante limita-se a alegar que foram concedidos poderes discricionários ao Governo e que inexistem "critérios de fixação normativa a ter em conta na fixação efectiva da taxa", porém, não refere que o espaço de fixação da taxa, deixado à livre intervenção de regulamento, tenha sido irrazoável, nem indica que o resultado da aplicação da mesma foi excessivo ou desproporcionado em face dos objetivos a que a mesma visava alcançar.”, facto que não se afigura correto, como é manifesto pela leitura dos artigos 22 a 27 da petição inicial e bem assim, dos artigos 19 a 22 das alegações.

J. A Portaria que regulamente as taxas aplicáveis nos termos do n.º 4 do regime da CSSB aquele regime é, além do mais, ilegal por alterar a natureza da taxa prevista na norma habilitante de taxa progressiva para taxa proporcional: com efeito, determinando o artigo 4.º do regime da CSSB que as taxas do imposto variam "em função do valor apurado", é evidente que o legislador pretendia que a referida taxa fosse uma taxa progressiva, tendo a mesma sido transformada, através da referida portaria, numa taxa proporcional.

K. Pelo que o legislador ordinário arrogou-se o direito de impor sobre os contribuintes a cobrança de um montante de imposto sempre mais elevado do que aquele que lhe era permitido pelo legislador, pelo que a Portaria não pode deixar de ser considerada ilegal à luz da norma habilitante.

L. No entanto, a ilegalidade da Portaria n.º 121/2011 não se basta pela alteração da natureza da taxa aplicável: também na definição da base de incidência veio este instrumento normativo ultrapassar aquilo que se encontrava previsto na norma habilitante: de facto, pese embora a alínea a) do artigo 3.º do regime jurídico da CSSB previsse a dedução, à base de incidência, dos depósitos abrangidos pelo Fundo de Garantia de Depósitos, veio a Portaria n.º 121/2011 determinar, na alínea c) do número 2 do artigo 4.º que estes depósitos "relevam apenas na medida do montante efectivamente coberto por esse Fundo.". A imposição de tal limite através da Portaria n.º 121/2011 consiste, por conseguinte, num inadmissível vício de ilegalidade.

M. Por sua vez, no que se recorta ao vício de inconstitucionalidade por violação do princípio da igualdade, na douta sentença recorrida conclui-se que "a contribuição sobre o sector bancário reconduz-se a uma «contribuição financeira», visando suportar financeiramente a atividade do estado regulador e supervisor. E sendo assim, não tem de atender às exigências apontadas pela Impugnante."

N. Também neste aspeto não pode o ora Recorrente concordar com o doutamente decidido. Desde logo cumpre esclarecer que o princípio da equivalência é uma decorrência do princípio da igualdade, impondo que as contribuições "sejam repartidas de acordo com o custo provocado pelo contribuinte ou de acordo com o benefício que a administração lhe proporciona. [...] O sentido essencial do princípio da equivalência está em proibir que se introduzam nos tributos comutativos diferenciações alheias ao custo ou ao benefício, assim como em proibir que o valor destes tributos ultrapasse esse mesmo custo ou benefício, sacrificando os respectivos sujeitos passivos em proveito da comunidade.” (Sérgio Vasques in "O Princípio da Equivalência como Critério de Igualdade Tributária", Sinopse, Edições Almedina, 2008)

O. Ora, de acordo como preâmbulo da Portaria n.º 121/2011, a criação da CSSB assume o duplo objectivo de "reforçar o esforço fiscal feito pelo sector financeiro e de mitigar de modo mais eficaz os riscos sistémicos que lhe estão associados". Por outro lado, no relatório do Orçamento do Estado para 2011 esclarece-se que a CSSB é criada "com o propósito de aproximar a carga fiscal suportada pelo sector financeiro da que onera o resto da economia e de o fazer contribuir de forma mais intensa para o esforço de consolidação das contas públicas e de prevenção de riscos sistémicos, protegendo também, assim, os trabalhadores do sector e os mecanismos de segurança social".

P. A teleologia conducente à criação da CSSB assenta, assim, numa lógica de intencional acréscimo de oneração fiscal do sector financeiro, bem como na oneração da adoção de posições de risco. Conforme se retira dos excertos transcritos, a criação e definição da CSSB não é motivada e norteada exclusivamente pelos custos ou risco sistémico provocado pelo sector financeiros mas também, aqui residindo uma patente violação do principio da equivalência, pela intenção de aumentar a carga fiscal, ie, tributar mais intensamente o sector financeiro, chamando este sector a participar de forma mais intensa no esforço de consolidação de contas públicas.

Q. Com efeito, a satisfação das necessidades financeiras do Estado, enquanto propósito orientador da criação do sistema fiscal, deve assentar numa justa distribuição dos encargos tributários não devendo, portanto, onerar de forma mais gravosa, um grupo específico e pré determinado de contribuintes, apenas e tão só em função das atividades por eles desempenhadas.

R. E pese embora assim o seja, não se entende qual o motivo para que tal oneração e presunção de criação de risco seja imputada exclusivamente ao sector bancário. Pese embora a prevenção de situações de tomada de posições de risco excessivo tenha estado na génese das propostas apresentadas a nível internacional para a criação de tributos adicionais sobre o sector financeiro," [neste sentido, ver Leaders Statement, The Pittsburgh Summit, September 24-25, 2009, parágrafo 13-16, disponível em http://www.g20.org/documents/finaI-communique.pdf, bem como A fair and substantial contribution by lhe financial sector - Final Repore for the G-20, preparado pelo Fundo Monetário Internacional em Junho de 2010, disponível em http://www.imf.org/external/np/g20/pdf/062710b.pdf. Ao nível comunitário, ver (2010) 549/5, {SEC(2010) 1166}, disponível em http://ec.curopa.eu/taxationcustoms/resources/documents/taxation/com20100549en.pdf.) a solução adotada no plano nacional parece-nos ficar aquém daqueles objetivos, introduzindo, conforme já se aludiu, injustificadas desigualdades em matéria tributária: porquanto a CSSB incide apenas, em termos subjetivos, sobre as instituições de crédito, excluindo, assim, outros agentes económicos com forte intervenção no mercado financeiro, tais como as sociedades financeiras (conforme definidas, quanto à sua espécie e atividade, nos artigos 4.°, 5.° e 6.° do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras - de ora em diante RGICSF); e porque ignora, por completo, que o risco sistémico inerente ao mercado financeiro não é matéria de exclusiva responsabilidade das instituições de crédito: além das instituições de crédito e das sociedades financeiras, são também intervenientes no mercado financeiro, em maior ou menor medida, todos os agentes económicos que pratiquem ou participem em operações de financiamento, bem como de investimento e negociação em valores mobiliários, entre outras].

S. Finalmente, entende o ora Recorrente ser evidente a violação do princípio da não retroatividade da lei fiscal, vício sobre o qual o douto tribunal a quo não se pronunciou, princípio este consagrado no número 3 do artigo 103.º da CRP, bem como no número 1 do artigo 12.º da LGT.

T. Ora, de acordo com o número 2 do artigo 6.º da Portaria n.º 121/2011, a base de incidência da CSSB "é calculada por referência à média anual dos saldos finais de cada mês", sendo a CSSB paga até ao final do mês de Junho do exercício seguinte. Tal significa que no primeiro ano de vigência da CSSB - aprovada, relembre-se, através da Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro, entrando em vigor em 1 de Janeiro de 2011 - este imposto incidiu sobre os passivos apurados durante o ano de 2010.

U. Por outras palavras, a CSSB incidiu, no ano de 2011, sobre factos tributários ocorridos e consolidados na esfera dos sujeitos passivos durante o exercício anterior, isto é, antes ainda da lei que instituiu a CSSB ter entrado em vigor. Sucede, além do mais, que, a taxa de 0,05%, prevista no n.º 1 do artigo 5.º da Portaria n.º 121/2011 de 30 de Março, incidente sobre uma base de incidência, composta, como vimos, por factos tributários ocorridos e consolidados no exercício anterior, e utilizada pelo sujeito passivo na autoliquidação da CSSB relativa ao exercício de 2010, foi publicada apenas em 30 de Março de 2011, entrando por conseguinte em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.

V. Encontramo-nos, portanto, perante um caso em que tendo já ocorrido o facto tributário que deu origem à obrigação tributária (e.g. contratação de dívida, receção de depósitos ou negociação de instrumentos financeiros derivados), ocorre a introdução de um novo tributo com eficácia retroativa, o que à luz do nosso normativo constitucional se figura intolerável.

W. A imposição da CSSB no caso concreto da contribuição cuja base de incidência é apurada por referência ao exercício de 2010, objecto do presente recurso, é, por conseguinte, incompatível com o princípio da não retroatividade da lei fiscal, uma vez que onera factos tributários já ocorridos, em claro desrespeito pela segurança jurídica e confiança dos sujeitos passivos devendo, por isso, ser considerada inconstitucional.

X. Pelo exposto se demonstra que o douto Tribunal a quo, esteou a sua fundamentação na errónea apreciação das razões de direito, em clara e manifesta violação e interpretação do normativo legal e constitucional vindos a referir.».

Pediu fosse concedido provimento ao recurso, fosse revogada a sentença recorrida e fosse a mesma substituída por decisão que julgasse procedente a presente impugnação judicial, condenando a Recorrida no reembolso do montante de € 13.954.075,76, acrescido dos respetivos juros indemnizatórios pagos à taxa legal, com as demais consequências legais.

A Recorrida não contra-alegou.

1.2. Recebidos os autos neste tribunal, foi ordenada a abertura de vista ao Ministério Público.

A Ex.ma Senhora Procuradora-Geral Adjunta emitiu douto parecer nos termos que, a seguir, se transcrevem parcialmente:

«(…)

4 – Analisando a matéria controvertida no presente recurso, oferece-nos dizer:

A) Relativamente ao invocado vício de omissão de pronúncia gerador de nulidade nos termos do disposto no artigo 125º do CPPT, somos de parecer não assistir razão à recorrente.

Na verdade, muito embora na douta sentença recorrida não seja debatido com pormenor e especificidade a questão de uma eventual retroactividade da norma posta em causa, o certo é que na globalidade ressalta da leitura da sentença que essa questão foi tratada. E, como bem salienta, na justificação, no despacho de sustentação, com o qual se concorda e aqui se adere, decorre dos citados parágrafos o conhecimento sintético da aludida questão.

“A nulidade da sentença por omissão de pronúncia a que se refere o artigo 125º, nº 1 do CPPT, só ocorre quando haja uma omissão absoluta, isto é, quando o juiz não conheceu de determinada questão suscitada pelas partes silenciando totalmente a razão pelo qual não o fazia.” – ver sumário do Ac. Deste STA, de 09.05.2018, in proc. n.º 01065/17. O que não se mostra ter ocorrido no caso presente.

B) A questão a dirimir no presente recurso incide sobre se as normas que fundamentam a autoliquidação de Contribuição sobre o Sector Bancário (CSB) do ano de 2011, no valor de € 13.954.075,76 e que foi posta em causa nos presentes autos, se mostram feridas de ilegalidade constitucional, orgânica e material.

A contribuição em causa foi criada pela Lei nº 55-A/2010, de 31.12 (Lei do Orçamento do Estado para o ano de 2011) e cujo regime foi fixado no seu artigo 141º que no seu desenvolvimento diz serem, as taxas aplicáveis bem como as regras de liquidação, cobrança e pagamento, objecto de regulamentação por portaria do Ministro das Finanças, ouvido o Banco de Portugal. A citada Portaria é a nº 121/2011, de 30.03.

A CSB incide sobre as instituições de crédito sediadas em Portugal e sobre as filiais e sucursais de instalações de crédito com sede fora de território português – incidência subjectiva – e a incidência objectiva vem prevista nos artigos 3º e 4º do referido artigo 141º.

A lei distingue três categorias de tributos: os impostos, as taxas e as contribuições financeiras a favor de outras entidades públicas.

E, é nesta última categoria que cai a mencionada CSB. Pois, por um lado, nela não se verifica o carácter sinalagmático das taxas, não há uma contrapartida específica e directa para os sujeitos que suportam a prestação tributária. Por outro lado, também não é de incluir no conceito de imposto já que a sua finalidade não é a de obter receita para satisfazer gastos gerais do Estado, como o imposto, mas antes “reforçar o esforço fiscal feito pelo sector financeiro e de mitigar de modo mais eficaz os riscos sistémicos que lhe estão associados” – ver preâmbulo da Portaria nº 121/2011.

É, pois o tributo aqui em discussão de classificar como contribuição financeira e de património próprio por enquadrável no disposto no artigo 153º F, nº 1 al. a) e B, nº 1, 3 do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras (DL nº 298/92, de 31.12).

Partindo desta premissa, que temos por ser a que se coaduna com a interpretação teleológica adequada, bem andou o Mº Juiz ao decidir no sentido em que decidiu.

O facto da base de incidência, as taxas aplicáveis, as regras de liquidação, de cobrança e pagamento só terem sido determinadas pela Portaria 121/2011 e esta ter sido publicada em 30.03, quanto a nós, em nada vai colidir com os princípios da legalidade, da irretroactividade da lei fiscal, pois é certo que tais circunstâncias já vinham pré-definidas no artigo 141º da Lei nº 55-A/2010, de 31.12, basta cotejar os artigos 2º e 3º deste e daquele outro diploma. A este propósito, reitera-se o exposto pelo Mº Pº no parecer de fls. 108 a 110 a que se adere sem reserva por com ele se concordar e que nos abstemos de repetir, bem como a argumentação decorrente da motivação da douta sentença recorrida que, entendemos fez correcta análise fáctico- jurídica.

5 – Nestes termos, emite-se parecer no sentido da improcedência do recurso, devendo manter-se o julgado»

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

2. Dos fundamentos de facto

Na douta sentença recorrida foram julgados provados os seguintes factos: «(...)

1. Em 28 de Junho de 2011, a Sociedade Impugnante, Banco A………, S.A., procedeu à autoliquidação e pagamento no montante de €13 954 075. 76, a título de contribuição sobre o sector bancário – cf. modelo 26 da Declaração de Contribuição Sobre o Sector Bancário e cópia do comprovativo de pagamento, documentos constantes de fls. 24, 26 e 27 dos autos, numeração referente ao processo físico, para os quais se remete e cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais;

2. Em 01 de Julho de 2013 o Impugnante apresentou reclamação graciosa contra a liquidação identificada em 1. – cf. requerimento de Reclamação Graciosa a fls. 6 do processo de reclamação graciosa constante do processo administrativo apenso aos autos;

3. A 18 de Novembro de 2013, a Divisão de Gestão e Assistência Tributária, da Unidade dos Grandes Contribuintes, elaborou a informação nº 227-AIR1/2013, propondo o indeferimento da reclamação graciosa – cf. informação constante de fls. 28 a 32 do processo de reclamação graciosa constante do processo administrativo apenso aos autos, a qual se dá por integralmente reproduzida para todos os efeitos legais;

4. Em 26.12.2013 foi proferido despacho de indeferimento da reclamação graciosa, considerando-se aqui reproduzido todo o seu teor, bem assim como informação que lhe subjaz – cf. despacho constante de fls. 35 e seguintes do processo de reclamação graciosa constante do processo administrativo apenso aos autos;

5. Pelo ofício n.º 3748 de 30 de Dezembro de 2013 foi o Impugnante notificado do indeferimento da reclamação graciosa – cf. notificação constante de fls. 39 do processo de reclamação graciosa constante do processo administrativo apenso aos autos;

6. Os presentes autos de Impugnação Judicial deram entrada neste Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto em 30 de Janeiro de 2014 – cf. data constante do comprovativo de entrega de documento constante de fls. 2 dos autos, numeração referente ao processo físico.

3. Dos fundamentos de Direito

Vem o presente recurso interposto da douta sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto que julgou integralmente improcedente a impugnação judicial da decisão de indeferimento da reclamação graciosa do ato de autoliquidação da contribuição sobre o setor bancário relativa ao ano de 2011, no valor de € 13.954.075,76.

Com o assim decidido não se conforma a Recorrente, por entender que a sentença recorrida padece dos seguintes vícios: [1.º)] vício de omissão de pronúncia [conclusão “C”]; [2.º)] erro de julgamento quanto ao vício da inconstitucionalidade orgânica [conclusões “D” a “I”]; [3.º)] erro de julgamento quanto às ilegalidades imputadas à Portaria n.º 121/2011 [conclusões “J” a “L”]; [4.º)] erro de julgamento quanto ao vício de inconstitucionalidade por violação do princípio da igualdade [conclusões “M” a “R”]; violação do princípio da não retroatividade [conclusões “S” e seguintes].

Quanto ao vício de omissão de pronúncia imputado à sentença recorrida, deve reconhecer-se desde já que, na fundamentação da sua decisão, a Mm.ª Juiz a quo, não aludiu especificamente à violação do princípio da não retroatividade fiscal nem confrontou diretamente as questões suscitadas na douta petição inicial a este respeito, tendo-se ficado por uma alusão genérica no sentido de que a liquidação em causa não padece das aludidas inconstitucionalidades.

Mas, como refere a Ex.ma Senhora Procuradora-Geral Adjunta no seu douto parecer, que se transcreve parcialmente no ponto 1.2. supra, a nulidade da sentença por omissão de pronúncia só ocorre quando há uma omissão absoluta, isto é, quando o tribunal pura e simplesmente não toma posição sobre uma questão que devesse ter apreciado. E é incontroverso que a Mm.ª Juiz, ainda que sem analisar detalhadamente todas as questões de inconstitucionalidade suscitadas na douta petição inicial, tomou posição no sentido de que as disposições correspondentes não padeciam de inconstitucionalidade. Sendo que, nestes casos, em que o juiz toma posição num determinado sentido mas sem justificar devidamente ou sem contrapor às razões do impugnante ou parte delas, a questão já não deve colocar-se do ponto de vista da existência de uma pronúncia, mas da existência ou suficiência dos fundamentos que a sustentem. Tudo ponderado, concluímos pela improcedência do recurso neste particular.

Quanto aos demais vícios imputados, deve adiantar-se desde já que a sentença recorrida alinhou, globalmente, com o entendimento firmado no Acórdão desta Secção, de 19 de junho de 2019 (processo nº 02340/13.1BEPRT), tirado em julgamento ampliado do recurso, realizado ao abrigo do disposto no artigo 148.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos e onde se concluiu que «[t]endo a Contribuição sobre o Setor Bancário natureza jurídica de contribuição financeira, não ocorre inconstitucionalidade orgânica e material das normas do seu regime jurídico, por violação dos princípios constitucionais da não retroatividade, da tutela da confiança e da segurança jurídica, da igualdade, capacidade contributiva e equivalência, pelo que também a respetiva autoliquidação, ainda que referente ao ano de 2011, não enferma de ilegalidade por alegada violação desses princípios».

Trata-se de um acórdão tirado em julgamento ampliado do recurso nos termos do artigo 148.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos e que, por isso, teve em vista assegurar a uniformidade da jurisprudência. Trata-se também de um acórdão votado por unanimidade e cujo entendimento foi reiterado em toda a jurisprudência que se lhe seguiu, como se alcança, designadamente, dos acórdãos deste Supremo Tribunal de 3 de julho de 2019 (processos n.ºs 02132/14.9BELRS e 02135/15.6BEPRT), de 11 de julho de 2019 (processos n.ºs 02666/16.0BELRS, 03125/16.7BELRS, 02133/14.7BELRS, 0837/15.6BELRS e 0251/14.0BEFUN), de 4 de setembro de 2019 (processos n.ºs 02130/14.2BELRS e 02456/16.0BELRS), de 11 de setembro de 2019 (processo n.º 02697/13.2BEPRT), de 18 de setembro de 2019 (processo n.º 02883/16.3BELRS), de 25 de setembro de 2019 (processo n.º 0498/12.4BELRS), de 30 de outubro de 2019 (processo n.º 1270/14.2BELRS), de 27 de novembro de 2019 (processo n.º 02867/16.1BELRS), de 17 de dezembro de 2019 (processo n.º 02708/16.0BEPRT) e de 5 de fevereiro de 2020 (processos n.ºs 02631/16.8BELRS, 02923/12.5BELRS e 02993/15.4BELRS). A especial autoridade da formação, o objetivo de uniformidade da jurisprudência visado com o julgamento ampliado e a reiteração do seu teor nas decisões subsequentes justificam, por si só que a posição ali firmada seja também adotada no presente recurso.

De salientar que o referido acórdão também analisou as questões de legalidade da Portaria n.º 121/2011, de 30/03, tendo concluído, no seu ponto 4.4.2., que «se limitou à densificação das características essenciais do regime jurídico (base de incidência, taxas, regras de liquidação, de cobrança e de pagamento), cumprindo o escopo regulamentar prescrito no próprio regime jurídico da CSB». Decisão, que, pelas razões já aduzidas, aqui se reitera também, desta feita por mera remissão para o teor do citado aresto, ao abrigo do disposto no artigo 663.º, n.º 5, do Código de Processo Civil, aplicável ex vi artigo 2.º alínea e) do Código de Procedimento e de Processo Tributário. Não se procedendo à junção do referido acórdão por se encontrar disponível para consulta, em redação integral, em www.dgsi.pt.

Importa, assim, negar provimento ao recurso.

A circunstância de a fundamentação do recurso ter acolhido, por remissão, a fundamentação de precedente acórdão proferido em julgamento ampliado, determinando menor complexidade na solução jurídica das questões decidendas, conjugada com o facto de o montante da taxa de justiça devida (nos termos da tabela I-B anexa ao Regulamento das Custas Processuais) ser manifestamente desproporcionado em face do concreto serviço prestado, quebrando a relação sinalagmática inculcada no pagamento da taxa, justifica a dispensa total do pagamento do remanescente da taxa de justiça, nesta instância (artigo 6.º n.º 7, do Regulamento das Custas Processuais).

4. Conclusão

Tendo a Contribuição sobre o Sector Bancário natureza jurídica de contribuição financeira, não ocorre inconstitucionalidade orgânica e material das normas do seu regime jurídico, por violação dos princípios constitucionais da legalidade, não retroatividade, da tutela da confiança e da segurança jurídica, da igualdade, capacidade contributiva e equivalência, pelo que também a respetiva autoliquidação, ainda que referente ao ano de 2001, não enferma de ilegalidade por alegada violação desses mesmos princípios.

5. Decisão

Nos termos e com os fundamentos expostos, acordam os juízes da Secção Tributária deste Tribunal em negar provimento ao recurso.

Custas pela Recorrente, com dispensa total do pagamento do remanescente da taxa de justiça nesta instância.

D.n.

Lisboa, 28 de outubro de 2020. – Nuno Filipe Morgado Teixeira Bastos (relator) – Gustavo André Simões Lopes Courinha – Anabela Ferreira Alves e Russo.