Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:02104/15.6BEPNF 0915/16
Data do Acordão:09/16/2020
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:FRANCISCO ROTHES
Descritores:EMBARGOS
CADUCIDADE DO DIREITO DE ACÇÃO
DEDUÇÃO
VENDA
CPPT
Sumário:I - O prazo para a dedução de embargos de terceiro, de «30 dias contados desde o dia em que foi praticado o acto ofensivo da posse ou direito ou daquele em que o embargante teve conhecimento da ofensa» (art. 237.º, n.º 3, do CPPT), não se aplica (nem faria sentido que se aplicasse) aos embargos de terceiro com função preventiva, uma vez que o art. 350.º, n.º 1, do CPC, aplicável ex vi do art. 167.º do CPPT, estabelece um outro prazo para deduzir estes embargos: «antes de realizada, mas depois de ordenada, a diligência a que se refere o artigo 342.º».
II - Os embargos de terceiro com função preventiva poderem ser deduzidos no período entre o despacho que ordenou alguma das diligências previstas no n.º 1 do art. 342.º do CPC e a sua realização, mas nunca depois dos atinentes bens serem vendidos na execução fiscal (cfr. art. 237.º, n.º 3, do CPPT).
Nº Convencional:JSTA000P26360
Nº do Documento:SA22020091602104/15
Data de Entrada:03/12/2020
Recorrente:A..........., S.A.
Recorrido 1:BANCO B........... (PORTUGAL), SA (E OUTROS)
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Recurso jurisdicional da sentença proferida no processo de embargos de terceiro com o n.º 2104/15.6BEPNF

Recorrente: A………………. S.A.
Recorridos: Fazenda Pública e Banco B………………….

1. RELATÓRIO

1.1 A sociedade acima identificada como Recorrente interpôs recurso para o Supremo Tribunal Administrativo da sentença por que a Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel, julgando caducado o direito de embargar de terceiro, por a apresentação da petição inicial ser ulterior à venda, absolveu a Fazenda Pública do pedido nos embargos de terceiro que aquela sociedade deduziu contra a ordem de entrega do imóvel vendido em execução fiscal.

1.2 O recurso foi admitido, com subida imediata, nos próprios autos e efeito suspensivo e a Recorrente apresentou as alegações, que resumiu em conclusões do seguinte teor:

«1- Foi ordenada nos autos de execução, a entrega ao Banco B……………. (Portugal) dos imóveis correspondentes aos artigos urbanos 4528 e 1495- A, que lhe foram adjudicados.

2- A embargante é titular de direito real de gozo que lhe advém de contrato de arrendamento para fins não habitacionais, celebrado em 30-08-2008, com a executada, tendo por objecto os dois sobreditos artigos matriciais urbanos.

3- Os aludidos artigos matriciais não dispõem de entrada autónoma para o Largo ………….., tendo por tal motivo a embargante celebrado com C………….., um outro contrato de arrendamento para fins não habitacionais, tendo como objecto o artigo matricial urbano 3422, com entrada pelo referido largo, permitindo dessa forma a circulação, pelo interior, de pessoas e bens desde a sua entrada até ao extremo oposto dos imóveis tomados de arrendamento à executada.

4- É referido no texto da sentença, que no dia 18-03-2010, se procedeu à abertura das propostas em carta fechada.

5- Bem como que o B…….. obteve para si a adjudicação dos referidos artigos urbanos, mediante o pagamento à Fazenda Pública, do preço no valor de 936.000,00 €.

6- Encontra-se fixado na sentença, que por ofício n.º 1893/1813-30, de 19/06/2015, o Serviço de Finanças do Marco de Canavezes notificou a embargante para proceder à entrega até 27-07-2015 dos imóveis artigos urbanos 4528 e 1495-A, ao B………….

7- A embargante na sua p.i., alegou que os presentes embargos não são intentados contra qualquer “(...) outra providência executiva anterior – penhora ou venda – ofensiva da sua posse ou direito (...)”.

8- A sentença ora em crise decidiu, além do mais, pela intempestividade da propositura dos embargos de terceiro.

9- No que ora interessa, não se revê a embargante na fundamentação da invocada intempestividade da propositura dos embargos.

10- Encontramo-nos no âmbito de embargos de terceiro de natureza preventiva (conservatória) relativamente à posse pela embargante, mercê de um direito real de gozo, titulado por arrendamento.

11- Regula este muito concreto embargo de terceiro, o art. 350.º do CPC, artigo, este, que encerra a subsecção III, da secção III, do capítulo III do CPC.

12- A subsecção III regula a Oposição mediante de embargos de terceiro.

13- Terceiro, refere-se a quem não sendo parte na causa principal, vê surtir desta, prejuízo para a posse ou um direito de que seja legítimo titular, incompatível com a realização ou o âmbito da diligência.

14- Conforme se encontra bem salientado nos autos, a posse da embargante sobre o prédio art. 3422, é ofendida pela execução da diligência de entrega ordenada, mas não realizada, das fracções adquiridas pelo B……………….

15- Entendemos que o art. 350.º, pela sua colocação sistemática no final da sobredita subsecção III, contém um regime próprio, com alguma especialidade relativamente ao regime que lhe antecede na subsecção em causa. Daí a sua razão de existir na lei.

16- Sucede que a sentença centrou a atenção na questão da tempestividade de dedução dos embargos, tendo sido decisiva e apreciação que sobre a mesma recaiu.

17- Sendo certo que no nosso entendimento, com o devido respeito, o direito foi mal aplicado tendo em conta a factualidade fixada.

18- Aqui ressalta que a Fazenda Pública recebeu no dia 18-03-2010 o preço no valor de 936.000,00 €, relativo aos artigos urbanos 4528 e 1495-A, adjudicados ao B………….

19- Formalmente a Fazenda Pública encontra-se paga pelo valor atribuído aos imóveis artigos urbanos 4528 e 1495-A, que tomou de garantia mediante a imposição do ónus de penhora sobre os mesmos.

20- Sobre estes imóveis já a Fazenda Pública não tem a possibilidade de fazer valer qualquer pretensão própria, atinente à satisfação da dívida exequenda, na medida em que mediante a sua adjudicação já não a garantem.

21- No entanto, faz parte da fundamentação da sentença, que a preocupação aí referida reiteradamente, para também ela fundamentar a intempestividade dos embargos, vai no sentido de estes poderem prejudicar a satisfação da dívida tributária.

22- Salvo o devido respeito, nesta fase, nestes autos como em muitos outros de embargo de terceiro preventivo, conservatória da posse, tal argumento carece de sustentação, peia própria natureza das coisas, tendo sido a própria Fazenda Pública a desenvolver os trâmites legais e processuais conducentes à venda dos referidos artigos urbanos.

23- Sendo nosso entendimento que, atenta tal natureza das coisas e fase processual, que o art. 350.º do CPC se revela como estatuindo um regime especial relativamente ao regime que o antecede em matéria de oposição mediante embargos.

24- Razões quanto a nós suficientes para se enquadrarem os presentes embargos no regime especial do art. 350.º do CPC, que estabelece como que uma cláusula de salvaguarda de terceiros afectados, por o regime geral dos embargos não permitir uma salvaguarda tão “alargada” dos mesmos para, perante situação específica, tentarem proteger a sua posse ou direito, potencialmente atingidos por diligência judicial ordenada mas ainda não realizada.

25- O que se constata da sentença em causa, é que por via do raciocínio nela seguido, se retira razão de existência ao art. 350.º do CPC, remetendo para a regulação geral, salvo a questão do prazo de trinta dias para a sua dedução, dos preceitos que o antecedem, ao arrepio das realidades do comércio jurídico, que existem e deram a razão de ser do referido regime especial.

26- Determinando a parte final do n.º 1 do referido preceito legal, que se aplicam a estes embargos o disposto nos artigos anteriores, “com as necessárias adaptações”, diremos nós atenta a especialidade da situação que determina a dedução de embargos desta natureza, a sentença na prática e salvo o devido respeito, submete os embargos em causa, apenas ao regime geral dos artigos que antecedem o art. 350.º, ao arrepio da natureza dos factos dados como provados.

27- Conforme se retira a págs. 18 “in fine” da sentença, onde é afirmado que atento o disposto no art. 344.º n.º 2 do CPC, resulta de modo cristalino que “(...) os embargos serão sempre de rejeitar se foram apresentados depois dos respectivos bens terem sido judicialmente vendidos ou adjudicados”.

28- Este entendimento, que não perfilhamos, equivale a uma derrogação do regime do art. 350.º do CPC, já não a uma adaptação a este, do regime geral, esvaziando o artigo de razão de ser.

29- Na sentença é invocado o Acórdão do STA de 10/10/2012, proferido que foi no Processo n.º 0933/12, discordando o julgador do sentido no mesmo expendido.

30- Não por uma questão oportunística, mas porque como conclusão legítima de quanto vimos a alegar, concordamos com tal Acórdão.

31- Não colhe quanto a nós e salvo o devido respeito, a apreciação que sobre o aludido Acórdão se encontra inserta na pág. 22, a final, da sentença, no sentido de que o mesmo recaiu sobre embargos deduzidos em execução para entrega de coisa certa, “(...) e, consequentemente, não se colocando a questão em concreto da dedução dos embargos após a venda.”. “Deste modo, consideramos ser de acolher a jurisprudência constante do citado Acórdão da Relação do Porto, que se debruçou sobre uma situação similar à dos presentes autos, ponderando devidamente todos os interesses envolvidos, acrescendo, ainda, conforme referido, o interesse público subjacente à cobrança dos créditos tributários, tudo razões que nos levam a concluir pela intempestividade dos presentes embargos de terceiro”.

32- Cabe aqui e a este propósito realçar, novamente, que os bens já foram adjudicados e o respectivo preço pago, pelo que os imóveis já não garantem a dívida exequenda.

33- Por outro lado, sendo certo que o efeito pretendido nos autos poderia eventualmente ser prosseguido por outro meio processual, certo é que, seja nestes autos ou em outro meio processual, estaria sempre em causa a posse da embargante sobre imóveis adjudicados ao B…………… e não a venda, ou a cobrança do crédito tributário, razão pela qual falece, quanto a nós o argumentário a favor, “in casu”, da intempestividade dos embargos. Prevalecendo o princípio da economia processual, no aproveitamento dos presentes autos.

34- Quanto à questão acima citada e suscitada na sentença, de que não se trata aqui de uma execução para entrega de coisa certa, mas antes de uma execução para pagamento de quantia certa, sempre se dirá, novamente, que tendo os bens já sido adjudicados e o respectivo preço pago, bem como determinada a entrega dos mesmos ao B……….., a execução não formalmente, mas na prática, como que se transmutou em execução para entrega de coisa certa.

35 - Resulta assim do alegado, que a sentença ora em recurso violou o preceituado no art. 350.º do CPC, resultando, salvo o devido, numa deficiente aplicação do Direito, no caso em concreto.

Termos em que, sufragando-se a pretensão exarada nas presentes alegações, se pugna, venerandos Juízes do Supremo Tribunal Administrativo, pela revogação da sentença proferida nos autos, determinando-se o prosseguimento dos embargos».

1.3 Não foram apresentadas contra alegações.

1.4 Neste Supremo Tribunal Administrativo os autos foram com vista ao Ministério Público e o Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de que seja negado provimento ao recurso. Isto, após ter feito uma resenha da situação processual, com a seguinte fundamentação: «[…]

A Mm.ª Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel julgou os embargos intempestivos porque deduzidos após a venda, em violação do disposto na parte final do n.º 3 do artigo 237.º do CPPT, motivo por que absolveu a Fazenda Pública do pedido
Para tanto, em síntese, considerou que não sendo aplicável o prazo de 30 dias previsto na primeira parte do n.º 3 do artigo 237.º do CPPT aos embargos preventivos,
Antes podendo estes ser deduzidos desde a data em que for ordenada a diligência e até que ela seja realizada,
Já o é o limite fixado na parte final da mesma norma, qual seja a venda ou adjudicação dos bens; que não há motivo para tratar diferentemente os embargos preventivos dos repressivos no que concerne à impossibilidade de serem deduzidos após a venda.
Louvou-se na doutrina expendida no acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 11 de Julho de 2012, proferido no processo n.º 801-B/2002.P1 e disponível em www.dgsi.pt.
Assim, a questão que cumpre apreciar e decidir é a de saber se no caso de embargos de terceiro com função preventiva é aplicável (como o é no caso dos embargos com função repressiva) a restrição prevista na parte final do n.º 3 do art. 237.º do CPPT
Ou seja, se os embargos só podem ser deduzidos até à venda.
Sendo certo que a Embargante, ora Recorrente, argumenta que não tendo sido ainda entregue o imóvel ao adquirente pela venda judicial, sempre estaria em tempo para a dedução dos presentes embargos.
Vejamos:
O art. 359.º, n.º 1, determina que se apliquem aos embargos de terceiro com função preventiva as disposições dos artigos anteriores, atinentes aos embargos com função repressiva, porém, com as necessárias adaptações.
Já demos conta de uma dessas adaptações, respeitante ao prazo de dedução dos embargos, em que há diferenças assinaláveis.
O mesmo não acontece com a última parte do n.º 2 do art. 353.º, cuja aplicação aos embargos com função preventiva se nos afigura plena.
Se faz todo o sentido a imposição legal de não ultrapassagem da venda judicial ou da adjudicação pela dedução de embargos repressivos, não vemos motivo – e a recorrente também não o encontrou – para que essa regra deixe de funcionar nos embargos com função preventiva.
Naquele caso, se a diligência só chega ao conhecimento do embargante numa altura em que os bens já foram vendidos ou adjudicados, os embargos já não são admissíveis.
O mesmo acontece se o embargante tiver conhecimento da diligência judicial ofensiva da posse quando faltam menos de 30 dias para a venda ou adjudicação; em tal hipótese o embargante já não dispõe desse prazo para a dedução; há-de deduzir os embargos antes de os bens respectivos serem vendidos ou adjudicados [10].
O legislador quis conferir estabilidade e consistência à acção executiva, atento o seu fim, pelo menos a partir do momento em que ali são transmitidos bens ou direitos.
Tinha que haver um momento a partir do qual deixa de ser admissível discussão sobre o que pode ou não pode ser penhorado e sobre a valência de direitos de terceiros, sejam eles credores ou não, na execução.
É suposto que a venda e adjudicação de bens representam uma fase de ultrapassagem daquela discussão, um momento em que se esgotou e se decidiu já a controvérsia admissível e se dê realização efectiva ao crédito exequendo e aos créditos reconhecidos e graduados, segundo a graduação, tutelando simultaneamente o interesse do adquirente dos bens executados.
Ocorre nos embargos de terceiro um efeito algo semelhante ao que a lei prevê para a oposição do executado à execução.
Quando a oposição não suspende a execução, nem o exequente nem qualquer outro credor pode obter pagamento enquanto a oposição não estiver decidida, sem prestar caução (art. 818.º, n.º 3).
Poderão, posteriormente, prosseguir as diligências de pagamento. Como resulta do art. 824.º, n.º 1, do Código Civil, a venda em execução transfere para o adquirente os direitos do executado sobre a coisa vendida.
Não significa isto que terceiros fiquem impedidos de exercer direitos relativos aos bens vendidos ou adjudicados, mas apenas que já não o poderão fazer no processo de execução.
A entrega do bem ao respectivo adquirente na execução através da venda executiva (seja ela através de venda por negociação particular ou de outra modalidade legal – art. 886.º) é um efeito natural desse mesmo acto e da transmissão da propriedade da coisa (art. 874.º e 879.º, al. b), do Código Civil).
Não representa já um acto de entrega de bens que seja susceptível de ser atacado na execução por via de embargos de terceiro, sejam eles repressivos ou preventivos, pois a estabilidade e consistência concedidas à execução pela norma do art. 353.º, n.º 2, parte final, ocorre independentemente da natureza preventiva ou repressiva dos embargos, sendo que uns ou outros teriam o mesmo efeito sobre a execução, que o legislador quis evitar a partir de determinada fase (venda ou adjudicação de bens) considerando-os extemporâneos (…)”- Acórdão da Relação do Porto, de 11/07/2012, proc. 801/B/002-P1.
Ora, a fundamentação expendida neste douto Acórdão é transponível para o caso em análise, atenta a necessidade de proteger a necessidade de proteger a estabilidade das vendas em execução fiscal.
E encontra apoio na jurisprudência deste STA que vai no sentido de considerar:
Apesar de os embargos de terceiro com função preventiva poderem ser deduzidos no período entre o despacho que ordenou alguma das diligências previstas no n.º 1 do art. 342.º do CPC e a sua realização, nunca o poderão ser depois dos atinentes bens serem vendidos na execução fiscal (cfr. art. 237.º, n.º 3, do CPPT) ”- Acórdão do STA de 26/10/2016, proferido no processo n.º 1742/14.9BEBRG, disponível em www.dgsi.pt.
Do exposto, afigura-se-nos que o recurso não merece provimento».

1.5 Cumpre apreciar e decidir.


* * *

2. FUNDAMENTAÇÃO
2.1 DE FACTO

A Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel deu como provados os seguintes factos:

«A) Em 25/09/1995, D………… e E………….. celebraram o contrato promessa de permuta de fls. 24 a 25 dos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido – cfr. contrato de fls. 24 a 25 dos autos;

B) Em data não concretamente apurada no ano de 2008, o Serviço de Finanças de Marco de Canaveses instaurou o processo de execução fiscal (PEF) n.º 1813200801003860 e apensos, contra a sociedade “F…………, Lda.”, NIPC ………….., por dívidas de IRS, Coimas, IMI e IVA – cfr. informação de fls. 34 e ss. dos autos;

C) No âmbito do supramencionado PEF e apensos, em 06/11/2008 o SF de Marco de Canaveses procedeu à penhora automática (via aplicação informática SIPA) dos seguintes prédios:

C.1) Prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial do Marco de Canaveses sob o n.º 735/19970217, da freguesia de …………., concelho de Marco de Canaveses, inscrito na matriz predial urbana da referida freguesia sob o artigo 1238;

C.2) Prédio urbano constituído pela fracção autónoma descrita na Conservatória do Registo Predial do Marco de Canaveses sob o n.º 732/19970217-A, freguesia de ………….., concelho de Marco de Canaveses, inscrito na matriz predial urbana da referida freguesia sob o artigo 1495-A – cfr. informação de fls. 34 e ss. dos autos;

D) Os imóveis penhorados encontravam-se afectos à actividade de restauração – cfr. informação de fls. 34 dos autos;

E) Por despacho de 19/11/2009, o Chefe do SF de Marco de Canaveses designou o dia 18/03/2010, pelas 11h30, para venda dos bens penhorados descritos em C.1) e C.2) – cfr. informação de fls. 34 e ss. dos autos;

F) Pelo que em 18/03/2010 o SF de Marco de Canaveses procedeu à abertura das propostas apresentadas por carta fechada – cfr. informação de fls. 34 e ss. dos autos;

G) Tendo os ditos imóveis sido adjudicados ao B………….., nessa data, pelo valor global de € 936.000,00 – cfr. informação de fls. 34 e ss. dos autos e autos de adjudicação de fls. 38 e 39;

H) Os imóveis foram registados pelo B…………... em 25/03/2010 – cfr. docs. 4 e 5, juntos com a contestação do B…………….;

I) Em 13/01/2015, a sociedade “F…………..., Lda.” foi declarada insolvente por sentença proferida no âmbito do proc. 607/14.9TBMCN, e nomeado como Administrador da Insolvência, ……………… - cfr. anúncio de fls. 30 dos autos;

J) Por ofício n.º 1893/1813-30, de 19/06/2015, o Serviço de Finanças de Marco de Canaveses, notificou a Embargante, entre o mais, para “proceder voluntariamente, até ao dia 27 de Julho de 2015, à desocupação e entrega das chaves dos prédios” descritos em C) ao B…………….., nos termos constantes de fls. 11, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido – cfr. ofício de fls. 11 dos autos (doc. 1, junto com a petição inicial de embargos);

K) A Embargante é titular do estabelecimento comercial instalado no prédio urbano inscrito na matriz predial sob o artigo 3422, do qual é proprietária C……………. – cfr. caderneta predial urbana, de fls. 262 dos autos;

L) Estabelecimento comercial que também se encontrou instalado, entre Junho de 2008 e até Julho de 2015, nos prédios adjudicados ao B………….. – facto admitido por acordo entre as Partes (cfr. ponto 11.º da petição inicial)

M) Entre o imóvel descrito na alínea anterior e os adjudicados ao B………., descritos em C), não existe qualquer parede divisória – facto admitido por acordo entre as Partes;

N) A petição dos presentes embargos deu entrada em juízo no dia 23/07/2015 – cfr. comprovativo de entrega de documentos, de fls. 3 dos autos».

2.2 DE FACTO E DE DIREITO

2.2.1 A QUESTÃO A APRECIAR E DECIDIR

Na execução fiscal referida em B), foram penhorados em 2008 e vendidos em 2010 os bens imóveis identificados em C.1) e C.2).
Veio a sociedade ora Recorrente deduzir embargos de terceiro em 2015 contra a ordem de entrega dos imóveis vendidos, que lhe foi dada pelo órgão da execução fiscal nesse mesmo ano. Alega, em síntese, que celebrou com a Executada um contrato de arrendamento para fins não habitacionais, com vista ao uso e fruição dos dois imóveis identificados em C) para a prossecução do seu objecto social, bem como, com a mesma finalidade, celebrou também contrato de arrendamento para fins não habitacionais com C………………, para uso e fruição do imóvel inscrito sob o n.º 3244; que os três referidos imóveis, de que desde então passou a deter o uso e fruição, estão completamente interligados entre si, sem qualquer divisão ou barreira arquitectónica; por isso, a entrega dos dois imóveis vendidos, não só significa que o seu espaço respeitante ao imóvel inscrito sob o art. 3244 ficaria sujeito a invasão e devassa, como também a privaria da possibilidade de exercício da sua actividade.
Os referidos embargos de terceiro foram, pois, deduzidos com o propósito de obviar à entrega do prédio, ou seja, são embargos com função preventiva, tal como os prevê o art. 350.º, n.º 1, do Código de Processo Civil (CPC), que dispõe: «Os embargos de terceiro podem ser deduzidos, a título preventivo, antes de realizada, mas depois de ordenada, a diligência a que se refere o artigo 342.º, observando-se o disposto nos artigos anteriores, com as necessárias adaptações». As diligências a que se refere o art. 342.º do CPC, que tem disposição paralela no n.º 1 do art. 237.º do CPPT, são «a penhora, ou qualquer acto judicialmente ordenado de apreensão ou entrega de bens» que ofenda «a posse ou qualquer direito incompatível com a realização ou o âmbito da diligência, de que seja titular quem não é parte na causa».
A Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel julgou os embargos intempestivos porque deduzidos após a venda, em violação do disposto na parte final do n.º 3 do art. 237.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), motivo por que absolveu a Fazenda Pública do pedido. Para tanto, em síntese e louvando-se no acórdão deste Supremo Tribunal proferido em 26 de Outubro de 2016, no processo n.º 1279/15 (Disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/05e45f1fd92c5d198025806000348b31.), considerou que não sendo aplicável o prazo de 30 dias previsto na primeira parte do n.º 3 do art. 237.º do CPP aos embargos preventivos – podendo estes ser deduzidos desde a data em que for ordenada a diligência e até que ela seja realizada –, já o é o limite fixado na parte final da mesma norma, qual seja a venda ou adjudicação dos bens; que não há motivo para tratar diferentemente os embargos preventivos dos repressivos no que concerne à impossibilidade de serem deduzidos após a venda. Louvando-se na doutrina expendida no acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 11 de Julho de 2012, proferido no processo n.º 801-B/2002.P1 (Disponível em
http://www.dgsi.pt/jtrp.nsf/56a6e7121657f91e80257cda00381fdf/6201a2128e2a68f580257a70004dec8b.), considerou, sempre em síntese, que o legislador «quis conferir estabilidade e consistência à acção executiva, atento o seu fim, pelo menos a partir do momento em que ali são transmitidos bens ou direitos» e que «[n]ão significa isto que terceiros fiquem impedidos de exercer direitos relativos aos bens vendidos ou adjudicados, mas apenas que já não o poderão fazer no processo de execução. A entrega do bem ao respectivo adquirente na execução através da venda executiva (seja ela através de venda por negociação particular ou de outra modalidade legal – art. 886.º) é um efeito natural desse mesmo acto e da transmissão da propriedade da coisa (art. 874.º e 879.º, al. b), do Código Civil). Não representa já um acto de entrega de bens que seja susceptível de ser atacado na execução por via de embargos de terceiro, sejam eles repressivos ou preventivos, pois a estabilidade e consistência concedidas à execução pela norma do art. 353.º [hoje, 344.º], n.º 2, parte final, ocorre independentemente da natureza preventiva ou repressiva dos embargos, sendo que uns ou outros teriam o mesmo efeito sobre a execução, que o legislador quis evitar a partir de determinada fase (venda ou adjudicação de bens) considerando-os extemporâneos». Considerou ainda que a referida doutrina «é, por maioria de razão, transponível para o caso dos autos, atenta a necessidade de proteger a estabilidades das vendas em execução fiscal, que incrementa a segurança dos compradores, fomentando o aparecimento de um maior número de interessados e a obtenção de melhores preços, com vista à salvaguarda do interesse público subjacente à cobrança dos créditos tributários» e que «[a] não ser assim, correr-se-ia o risco de eternizar a discussão sobre o que pode ou não pode ser penhorado e sobre a valência de direitos de terceiros, em prejuízo manifesto dos interesses do legítimo adquirente e, em última análise, do próprio interesse público».
Pondera ainda a existência de um acórdão do Supremo Tribunal Administrativo – proferido em 10 de Outubro de 2012, no processo n.º 933/12 (Publicado no Apêndice ao Diário da República de 8 de Novembro de 2013
(http://www.dre.pt/pdfgratisac/2012/32240.pdf), págs. 2959 a 2967, também disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/f45f70c1387aa17d80257aa00045c5bc.) – que decidiu em sentido contrário ao da sentença, mas salienta que o mesmo se alicerçou num acórdão do Supremo Tribunal de Justiça (O acórdão proferido em 9 de Fevereiro de 2006, no processo n.º 06B014, disponível em
http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/4ea6cec67d5c35aa802571a9004e5182.) no qual se não colocava a questão da dedução dos embargos após a venda executiva.
Finalmente, chama à colação em favor da sua tese o já referido acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 26 de Outubro de 2016, proferido no processo 1279/15, citando parte dos respectivos fundamentos.
Tudo para concluir que «apesar de os embargos de terceiro com função preventiva poderem ser deduzidos no período entre o despacho que ordenou alguma das diligências previstas no n.º 1, do artigo 342.º do CPC e a sua realização, nunca o poderão ser depois de os atinentes bens serem vendidos na execução fiscal (cfr. artigo 237.º, n.º 3, do CPPT e artigo 344.º, n.º 2, do CPC, ex vi artigo 350.º, n.º 1, in fine, do CPC), pelo que a venda constitui sempre o limite a partir do qual não mais serão admissíveis os embargos preventivos» e, assim, que os embargos foram deduzidos quando se mostrava já caducado o direito de embargar.
A Embargante recorre da sentença. Sustenta, em resumo, que aos embargos preventivos «não é aplicável o prazo de caducidade previsto no n.º 3 do art. 237.º do CPPT, que se aplica apenas aos embargos de função repressiva», invocando a favor da sua tese o referido acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, proferido em 10 de Outubro de 2012, no processo n.º 933/12.
Assim, a questão que cumpre apreciar e decidir é a de saber se no caso de embargos de terceiro com função preventiva é aplicável (como o é no caso dos embargos com função repressiva) a restrição prevista na parte final do n.º 3 do art. 237.º do CPPT, ou seja, se os embargos só podem ser deduzidos até à venda. Isto, como é óbvio, no pressuposto de que os embargos se referem a diligência ordenada (e ainda não praticada) no processo de execução fiscal.

2.2.2 DA CADUCIDADE DO DIREITO DE EMBARGAR DE TERCEIRO

Recordemos a redacção do n.º 3 do art. 237.º do CPPT: «O prazo para dedução de embargos de terceiro é de 30 dias contados desde o dia em que foi praticado o acto ofensivo da posse ou direito ou daquele em que o embargante teve conhecimento da ofensa, mas nunca depois de os respectivos bens terem sido vendidos».
Antes do mais, cumpre ter bem presente que nos autos não se discute a inaplicabilidade aos embargos de terceiro com função preventiva da primeira parte do referido n.º 3 do art. 237.º do CPPT, onde se estipula que o prazo para a dedução de embargos de terceiro, de «30 dias contados desde o dia em que foi praticado o acto ofensivo da posse ou direito ou daquele em que o embargante teve conhecimento da ofensa», admitindo a sentença que a aplicação daquela parte do preceito está restringida aos casos de embargos de terceiro com função repressiva. Isto porque o art. 350.º, n.º 1, do CPC, aplicável ex vi do art. 167.º do CPPT, estabelece um outro prazo para deduzir os embargos com função preventiva: «antes de realizada, mas depois de ordenada, a diligência a que se refere o artigo 342.º». Aliás, não faria sentido que se aplicasse esse prazo a estes embargos sob pena de inutilizar o escopo preventivo dos mesmos. De tudo isso bem deu conta a Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel.
A questão que cumpre apreciar e decidir refere-se tão-só à parte final daquele n.º 3 do art. 237.º do CPPT, i.e., ao segmento da norma que veda a dedução de embargos de terceiro para além da venda.
A sentença defende que essa proibição se refere não só aos embargos com função repressiva, mas também aos embargos com função preventiva. E, a nosso ver, faz a melhor interpretação da lei.
Desde logo, há que ter presente que a norma (tal como aquela que lhe corresponde no CPC, o art. 344.º, n.º 2) não distingue os embargos preventivos dos embargos repressivos para efeito daquela limitação (É certo que também não o faz relativamente à primeira parte do art. 237.º, n.º 3, do CPPT, mas a distinção para os efeitos aí previstos resulta da natureza das coisas (da natureza preventiva do meio processual) e, decisivamente, da existência de norma expressa a fixar prazo diferente para a dedução dos embargos com função preventiva, qual seja o art. 350.º, n.º 1, do CPC.). Ora, ubi lex non distinguet nec nos distinguire debemus.
Mas não é só a letra da lei a apontar nesse sentido (Note-se que, não devendo a interpretação cingir-se à letra da lei, mas reconstituir a partir dela o “pensamento legislativo” (cfr. art. 9.º, n.º 1, do Código Civil), o enunciado linguístico constitui o ponto de partida da tarefa hermenêutica, não devendo o intérprete afastar-se do sentido mais natural e directo da letra a menos que «razões ponderosas, baseadas noutros subsídios interpretativos» levem à conclusão de que não é esse sentido que deve ser acolhido, tanto mais que o intérprete deve presumir que o legislador «soube exprimir o seu pensamento em termos adequados» (cfr. art. 9.º, n.º 3, do Código Civil). Neste sentido, J. BAPTISTA MACHADO, Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, Almedina, 1983, págs. 188 e 189.).
Também a ratio legis (A razão de ser da lei, o fim visado pelo legislador ao elaborar a norma constitui um subsídio da maior importância para determinar o sentido da norma. Neste sentido J. BAPTISTA MACHADO, ob. cit., págs. 182 e 183.) indica ser esse o sentido da norma: «A restrição à possibilidade de deduzir embargos de terceiro após a venda dos bens, essa, tem uma justificação evidente, que é a de protecção da estabilidade das vendas em execução, que incrementa a segurança dos compradores, fomentando o aparecimento de um maior número de interessados e a obtenção de melhores preços. Trata-se, aqui, de um interesse público, oposto ao que o embargante tem em defender o seu direito, que justifica uma restrição deste, independentemente da formulação de um juízo negativo sobre a diligência do embargante em defender os seus direitos» (JORGE LOPES DE SOUSA, Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado, Áreas Editora, 6.ª edição, III volume, anotação 6 a) ao art. 167.º, pág. 157.).
Ou seja, como também bem realçou a sentença recorrida, o propósito de conferir estabilidade à execução e às vendas aí realizadas impõe que se estabeleçam limites no tempo à possibilidade de deduzir embargos de terceiro, não permitindo que a discussão sobre a eventual ofensa de direitos de terceiros se faça no seio da acção executiva após a venda dos bens.
Na ponderação dos interesses público da estabilidade das vendas em execução fiscal (que tem por escopo principal que não deixem de ser recolhidos os montantes destinados à satisfação das necessidades financeiras do Estado e de outras entidades públicas) e de fomentar a segurança dos compradores (de modo a potenciar o surgimento de mais interessados e a obtenção de melhor preço) e dos interesses privados de protecção da boa-fé e confiança dos compradores, por um lado, e do interesse privado de terceiros eventualmente prejudicados por algum diligência ordenada no processo de execução fiscal, por outro lado, o legislador optou legitimamente por dar prevalência aos primeiros. Tanto mais que aos terceiros, apesar de lhes ficar vedado o recurso aos embargos após a venda, sempre está assegurado o acesso a outros meios judiciais, fora do âmbito da execução, para defesa de direitos ou interesses legítimos eventualmente lesados por qualquer diligência praticada ou ordenada relativamente aos bens em causa.
Este Supremo Tribunal Administrativo já se pronunciou nesse sentido, no acórdão de 14 de Março de 2012, proferido no processo n.º 60/12 (Disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/672d4a8d10b45db4802579d10044e66e. ), onde, em situação semelhante à dos autos, e ajuizando da possibilidade de dedução de embargos preventivos após a venda se deixou dito, nos termos do respectivo sumário, que «o direito a um processo justo e equitativo consagrado no art. 20.º, n.ºs 1 e 4, da CRP não impede o legislador de estabelecer prazos de caducidade para levar as questões a tribunal, ponto é que tais prazos não sejam arbitrariamente curtos ou arbitrariamente desadequados, dificultando irrazoavelmente a acção judicial» e que a «restrição da possibilidade de deduzir embargos de terceiro após a venda consagrada no n.º 3 do art. 237.º do CPPT afigura-se materialmente fundada e adequada e proporcional à protecção de outros bens constitucionalmente protegidos, tais como o interesse público na protecção da estabilidade das vendas em execução, que incrementa a segurança dos compradores, fomentando o aparecimento de um maior número de interessados e a obtenção de melhores preços, bem como a necessidade de proteger a boa-fé e a confiança dos adquirentes de bens em hasta pública, pelo que o referido preceito não viola o disposto no art. 20.º, n.ºs 1 e 4, da CRP», concluindo-se que «[t]endo os embargos sido deduzidos depois da venda dos bens, não obstante a embargante alegar só ter tido conhecimento da ofensa do seu alegado direito depois de tal venda, são os mesmos manifestamente intempestivos».
Subscrevemos a fundamentação expendida nesse aresto, para a qual também remetemos e que foi também adoptada no já referido acórdão de 26 de Outubro de 2016, proferido no processo com o n.º 1279/15.
É certo que o acórdão deste Supremo Tribunal invocado pela Recorrente – de 10 de Agosto de 2012, proferido no processo n.º 933/12 – decidiu em sentido diferente. Mas, como bem salientou a sentença, na sua fundamentação remete para um acórdão do Supremo Tribunal de Justiça onde a questão tratada tinha contornos bem diferentes: é que os embargos preventivos aí deduzidos não se dirigiam a uma diligência ordenada no âmbito de um processo de execução para cobrança de uma quantia certa – como o é sempre o processo de execução fiscal –, mas antes num processo de execução para entrega de coisa certa, motivo por que não se colocava, nem podia colocar, a questão da admissibilidade dos embargos após a venda dos bens atinentes.
Aliás, esse acórdão deste Supremo Tribunal conta com um voto de vencido, em que bem se dá conta da existência de jurisprudência anterior em sentido contrário, designadamente o referido aresto de 14 de Março de 2012, proferido no processo n.º 60/12.
É certo que nesse acórdão proferido no processo n.º 933/12 se cita profusamente o acórdão, também desta Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, de 12 de Setembro de 2012, proferido no processo n.º 995/11 (Disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/8dfd76c430e55cb580257a7f004c479f.), mas, a nosso ver, o mesmo não permite que dele se extraia argumento em favor da tese da Recorrente. O que nesse acórdão se afirma é que «é controverso que aos embargos de função preventiva seja aplicável o prazo de caducidade previsto no n.º 3 do artigo 237.º do CPC não só quando estipula o prazo de 30 dias «contados desde o dia em que foi praticado o acto ofensivo da posse ou direito ou daquele em que o embargante teve conhecimento da ofensa», como, ainda, quando estipula que os embargos nunca podem ser deduzidos «depois de os respectivos bens terem sido vendidos»», razão por que nunca poderia a intempestividade com fundamento na aplicação do limite decorrente da venda erigir-se em fundamento de indeferimento liminar dos embargos com função preventiva. Isto porque, como também aí se deixou referido, o indeferimento liminar com base em intempestividade só deverá ser decretado quando resulte, com força irrecusável e sem margem para dúvidas, que o processo é manifestamente extemporâneo e, assim, que não fará sentido a sua prossecução. Mas no acórdão não se toma posição relativamente à questão de que ora nos ocupamos, apenas se dando conta de que a solução a dar à mesma é controversa.
Também o Supremo Tribunal de Justiça vem entendendo que aos embargos com função preventiva é aplicável o regime de caducidade previsto na parte final do art. 344.º, n.º 2, do CPC, que impede a sua dedução depois de terem sido vendidos ou adjudicados os bens (Vide o seguinte acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
- de 30 de Março de 2017, proferido no processo com o n.º 149/09.4TBGLG-E.E1-A.S1, disponível em
http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/44b4a1bb46d98d72802580f40045e09e.).
Assim, bem andou a Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel quando julgou os embargos intempestivos.
Consequentemente, negaremos provimento ao recurso, confirmando a sentença recorrida.

2.2.3 CONCLUSÕES

Preparando a decisão, formulamos as seguintes conclusões:
I - O prazo para a dedução de embargos de terceiro, de «30 dias contados desde o dia em que foi praticado o acto ofensivo da posse ou direito ou daquele em que o embargante teve conhecimento da ofensa» (art. 237.º, n.º 3 do CPPT), não se aplica (nem faria sentido que se aplicasse) aos embargos de terceiro com função preventiva, uma vez que o art. 350.º, n.º 1, do CPC, aplicável ex vi do art. 167.º do CPPT, estabelece um outro prazo para deduzir estes embargos: «antes de realizada, mas depois de ordenada, a diligência a que se refere o artigo 342.º».
II - Apesar de os embargos de terceiro com função preventiva poderem ser deduzidos no período entre o despacho que ordenou alguma das diligências previstas no n.º 1 do art. 342.º do CPC e a sua realização, nunca o poderão ser depois dos atinentes bens serem vendidos na execução fiscal (cfr. art. 237.º, n.º 3, do CPPT).


* * *

3. DECISÃO

Em face do exposto, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo acordam, em conferência, em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.

Custas pela Recorrente [cf. art. 527.º, n.ºs 1 e 2, do CPC, aplicável ex vi da alínea e) do art. 2.º do CPPT].


*

Lisboa, 16 de Setembro de 2020. – Francisco António Pedrosa de Areal Rothes (relator) – Joaquim Manuel Charneca Condesso – Paulo José Rodrigues Antunes.