Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0429/12.1BEPRT
Data do Acordão:11/27/2019
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ARAGÃO SEIA
Descritores:PRESCRIÇÃO
INTERRUPÇÃO
SUSPENSÃO
PLANO MATEUS
CITAÇÃO
DEDUÇÃO
OPOSIÇÃO
Sumário:I - Ao abrigo do disposto no artigo 34.º CPT, n.ºs 1, 2 e 3, o prazo de prescrição extintiva da dívida tributária era de 10 anos, contado desde o ano seguinte àquele em que tiver ocorrido o facto tributário, sendo que tal prazo se interromperia com a mera instauração da execução fiscal;
II - Esta interrupção inutilizou para a prescrição todo o tempo anteriormente decorrido;
III - A adesão ao Plano Mateus, implicava que, nos termos do n.º 10 do artigo 14.º do DL 124/96, enquanto o devedor reunisse as condições nele referidas, a suspensão dos processos de execução fiscal em curso, bem como a instauração de novos processos, quando não se tornem necessários para garantir o valor da dívida;
IV - Só a exclusão do plano autorizado de pagamento, por acto administrativo da mesma entidade, determina a exclusão do regime e, consequentemente, a cessação do efeito suspensivo do prazo de prescrição;
V - A citação postal a que alude o artigo 191º do CPPT não é idónea a produzir uma interrupção duradoura do prazo de prescrição em curso;
VI - Ao abrigo do artigo 49º, n.º 4 da LGT, o prazo de prescrição legal suspende-se em virtude de pagamento de prestações legalmente autorizadas, ou enquanto não houver decisão definitiva ou passada em julgado, que puser termo ao processo, nos casos de reclamação, impugnação, recurso ou oposição, quando determinem a suspensão da cobrança da dívida.
Nº Convencional:JSTA000P25227
Nº do Documento:SA2201911270429/12
Data de Entrada:05/15/2019
Recorrente:AT-AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Recorrido 1:A....., LDA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam os juízes da secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

A AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA, inconformada, interpôs recurso da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto (TAF do Porto) datada de 26 de Novembro de 2018, que julgou procedente a oposição deduzida por A………..Ldª, contra si instaurada pelo Serviço de finanças do Porto 4, por dívidas de 1992 a 1996, no valor total de € 31.046,67.

Alegou, tendo apresentado conclusões, como se segue:
A. Vem o presente recurso interposto da sentença proferida pelo Douto Tribunal a quo, que julgou procedente a oposição deduzida pela sociedade A………., Lda.” NIPC ………, à execução fiscal com o nº 3387199601019465 e aps. que corre termos no Serviço de Finanças do Porto 4 por dívidas relativas a IVA do ano de 1992, 1993, 1994, 1995 e 1996, totalizando a quantia exequenda e acrescidos o valor de €31.046,67.
B. A M.ma Juíza do Tribunal a quo na douta sentença recorrida, declarou a prescrição das dívidas exequendas, para tal, no que para este recurso mais importa, entendeu que “in casu, e como decorre do probatório, a contagem do prazo prescricional interrompeu-se com a instauração do processo de execução fiscal, ainda na vigência do CPT. No entanto, o PEF esteve parado por factos não imputáveis ao Oponente entre 30-09-2002 e 05-06-2006, uma vez que o SF não o exclui do plano de pagamentos, como deveria, quando ocorreu a omissão de pagamento de prestações, o que significa que tal causa interruptiva deixaria de produzir efeitos quanto à contagem do prazo prescricional, até à extinção do processo de execução fiscal. Mesmo que assim não fosse, acresce que a Oponente nunca foi citada pessoalmente, sendo que a citação postal, por não ser passível de demonstração quanto à sua recepção, não configura causa de interrupção da prescrição para efeitos do previsto na Lei Geral Tributária, como vem sendo reiteradamente decidido em sede de jurisprudência dos Tribunais Superiores.
C. Ora, com o assim decidido, e salvo o devido respeito por melhor opinião, não pode a Fazenda Pública conformar-se, porquanto, considera que o douto Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento, consubstanciado na errada interpretação e aplicação da lei.
D. Face à sucessão de leis, o prazo de prescrição aplicável é o prazo de 8 anos introduzido pela LGT, por ser o mais curto.
E. A contagem de tal prazo faz-se tendo em conta, interrupções decorrentes, designadamente, da instauração do processo executivo, no âmbito do CPT, no âmbito da LGT interrupção em virtude da citação no processo executivo, suspensões decorrentes da inexigibilidade das dívidas adveniente de pagamento a prestações legalmente autorizado, suspensão advinda da interposição do presente processo de Oposição Judicial.
F. Assim, considera-se que, in casu o prazo prescricional das dívidas exigidas no processo executivo que se reporta a IVA de 1992 (exemplo, por ser a dívida mais antiga a ser exigida), interrompeu-se por efeito da instauração da execução fiscal (eliminando o período decorrido até aí – já que os efeitos produzidos à face da lei antiga são respeitados pela nova lei (efeito instantâneo) - cfr. o nº 2 do art. 12º do CCivil) e obsta ao início de novo prazo até que o processo pare por mais de um ano por facto não imputável ao executado ou até ao termo do processo (efeito duradouro).
G. Antes da alteração do artigo 49º da LGT pela Lei nº 53-A/2006, as causas de interrupção eram cumulativas.
H. Mal andou o douto Tribunal a quo ao considerar que “…o PEF esteve parado por factos não imputáveis ao Oponente entre 30-09-2002 e 05-06-2006, uma vez que o SF não o exclui do plano de pagamentos…”
I. Ora conforme se retira da boa jurisprudência, por todos veja-se o douto Acórdão do STA de 12/10/2011, processo n.º 0593/11, “…a paragem decorrente da autorização de adesão ao regime do DL 124/96 é imputável ao contribuinte e só a exclusão daquele regime (que se processa apenas com o respectivo despacho de exclusão), determina o levantamento da suspensão da execução com a consequente cessação do seu efeito interruptivo do prazo de prescrição”.
J. “Nos termos do nº 5 do art. 5º do mesmo DL 124/96, o prazo de prescrição suspende-se durante o período de pagamento em prestações, entendendo-se período de pagamento aquele que foi concedido ao contribuinte para pagar e não apenas aquele em que efectivamente pagou. Só a exclusão daquele regime, que opera com o respectivo despacho de exclusão, determina o levantamento da suspensão da execução com a consequente cessação do seu efeito interruptivo do prazo de prescrição.”
K. Os processos de execução fiscal encontravam-se, pois, suspensos durante o decurso do plano de pagamento, encontrando-se suspensa a prescrição das dívidas.
L. A citação é o acto pelo qual se dá conhecimento ao devedor de que contra si foi proposta uma determinada execução e se insta o mesmo a vir ao processo assumir a sua defesa.
M. Já no âmbito da LGT, a citação da executada operou, igualmente, um efeito interruptivo próprio (dado que, a partir da alteração que a Lei nº 100/99, de 26/7, introduziu no nº 1 do art. 49º da LGT, a citação passou a constituir facto interruptivo da prescrição) eliminando o período decorrido até aí (efeito instantâneo) e obstando ao início de novo prazo até que o processo pare por mais de um ano por facto não imputável ao contribuinte ou até ao termo do processo (efeito duradouro).
N. A citação na execução fiscal (antes da alteração do n.º 3 do artigo 49.º da LGT, introduzida pela Lei 53-A/2006, da interposição da oposição), foi a última causa de interrupção, não começando a correr novo prazo enquanto não passar em julgado a decisão que puser termo ao processo.
O. E não se diga, conforme é referido na sentença que ora se recorre, que a citação postal, por não ser passível de demonstração quanto à sua recepção, não configura causa de interrupção da prescrição, na medida em que a situação fática analisada no acórdão citado é diferente da situação de facto dos presentes autos.
P. Em 31-01-1997 a Oponente aderiu ao plano de pagamento em prestações à luz do DL nº 124/96, de 10 de Agosto, no qual se incluiu a dívida exequenda, tendo pago 62 das 150 prestações autorizadas!
Q. Nos presentes autos, ao contrário da situação de facto plasmada no acórdão citado, a executada aderiu à Lei Mateus, DL 124/96, de 10 de Agosto, tendo a Oponente pago diversas prestações, não podendo por isso se considerar o seu desconhecimento da dívida, a sua falta de citação, nem mesmo os efeitos de uma falta de citação pessoal no processo (quanto muito a sua citação encontra-se demonstrada na data de adesão ao DL nº 124/96, de 10 de Agosto)!
R. O efeito interruptivo, nos casos de paragem do processo por mais de um ano por facto previsto no CPT, era de obstar a que suspensão do decurso da prescrição que derivava do facto interruptivo continuasse, pelo que, se não ocorrer essa paragem que implicava a cessação do efeito, este continua até ao termo do processo.
S. Conforme se retira do sumário do acórdão do STA de 23/11/2011, no sentido de que: “(i) As causas de interrupção da prescrição ocorridas antes da alteração do n.º 3 do artigo 49.º da LGT, introduzida pela Lei 53-A/2006, produzem os efeitos que a lei vigente no momento em que elas ocorreram associava à sua ocorrência: eliminação do período de tempo anterior à sua ocorrência e suspensão do decurso do prazo de prescrição, enquanto o respectivo processo estiver pendente ou não estiver parado por mais de um ano por facto não imputável ao contribuinte (ii) A degradação em suspensivo do efeito interruptivo da dedução de impugnação judicial, no caso de paragem do processo por mais de um ano por facto não imputável ao contribuinte (n.º 2 do artigo 49.º da LGT - antes de 1/1/2007), não tem influência no decurso do prazo de prescrição no caso de ocorrer anterior citação para a execução fiscal, já que esta configura facto com potencialidade interruptiva para, por si só, eliminar o período decorrido anteriormente e obstar ao decurso da prescrição até ao trânsito em julgado da decisão que venha a pôr termo ao processo; (iii) A paragem da execução fiscal por motivo de suspensão requerida pela executada é-lhe imputável (…)
T. Nos presentes autos não houve pois qualquer degradação, dos efeitos interruptivos da prescrição verificados no processo, em efeitos suspensivos da prescrição.
U. A presente Oposição deu entrada no SF de Porto 4 em 09-06-2011, à data, as dívidas exequendas não se encontravam prescritas, pelo que nos termos da al. b) do n.º 4 do art.º 49.º da LGT, o prazo de prescrição encontra-se suspenso!
V. Por tudo o exposto, não podia o douto Tribunal a quo considerar prescritas as dívidas executivas de IVA de 1992, o prazo de 8 (oito) anos para a prescrição se efectivar ainda não ocorreu e por maioria da razão não se encontram igualmente prescritas as dívidas executivas de IVA dos anos subsequentes.
W. Incorreu assim o douto Tribunal a quo em erro de julgamento de direito, devendo a sentença ser revogada e substituída por outra que declare a acção improcedente e ordene a prossecução dos processos de execução fiscal.

A recorrida não contra-alegou.

O Ministério Público pronunciou-se pela improcedência do recurso por entender que ocorreu a prescrição da dívida exequenda.

Colhidos os vistos legais cumpre decidir.

Na sentença recorrida deu-se como assente a seguinte factualidade concreta:
A) Contra a Oponente foi instaurado em 09-10-1996, no SF de Porto 4, o processo de execução fiscal nº 3387199601019465 e aps., por dívidas de IVA dos períodos de 1992 a 1996, no valor total de € 21.837,31.
B) A AT enviou à Oponente citação postal em 19-04-2006.
C) Em 31-01-1997 a Oponente aderiu ao plano de pagamento em prestações à luz do DL nº 124/96, de 10 de Agosto, no qual se incluiu a dívida exequenda, tendo pago 62 das 150 prestações autorizadas.
D) O processo de execução fiscal esteve parado desde 30-09-2002 (data do pagamento da 62ª prestação) até 05-06-2006, data em que foi proferido o despacho de exclusão da Oponente ao plano de pagamento em prestações supra mencionado.
E) A presente Oposição deu entrada no SF de Porto 4 em 09-06-2011.
Nada mais se deu como provado.

Há que conhecer o recurso que nos vem dirigido.
Coloca-se à nossa apreciação a questão de saber se já ocorreu ou não a prescrição da obrigação tributária -divida de IVA-, tal como decidido pela sentença recorrida.
Para tanto, releva no essencial, a seguinte matéria de facto, que balizará temporalmente o termo inicial e as causas de suspensão e interrupção que se possam ter reflectido sobre tal prazo:
-a recorrente encontrava-se em falta com dividas de IVA referentes aos anos de 1992 a 1996;
-no ano de 1996 foi instaurada contra si execução fiscal;
-em Janeiro de 1997 a recorrente aderiu ao Plano Mateus com vista ao pagamento dos montantes em falta em 150 prestações mensais;
-por incumprimento de tal plano de pagamentos a recorrente foi excluída do mesmo por despacho datado de 05.06.2006;
-em 19.04.2006 foi enviada à recorrida citação postal.

Como se percebe pelas datas dos diversos factos essenciais para o conhecimento da excepção da prescrição, a execução foi instaurada ainda no domínio do Código de Processo Tributário (CPT), uma vez que a Lei Geral Tributária só entrou em vigor em 01/01/1999.
Nos termos do disposto no artigo 34.º CPT, n.ºs 1, 2 e 3, o prazo de prescrição extintiva da dívida tributária era de 10 anos, contado desde o ano seguinte àquele em que tiver ocorrido o facto tributário, sendo que tal prazo se interromperia com a mera instauração da execução fiscal.
Conjugando as normas constantes deste preceito legal com a factualidade de que dispomos, podemos surpreender que o prazo prescricional de 10 anos relativamente a todas as dívidas dos anos de 1992 a 1996 se interrompeu em 09.10.1996 por força da instauração da execução fiscal.
Portanto, com tal interrupção inutilizou-se todo o tempo anteriormente decorrido. Como é sabido, no domínio do CPT as causas de interrupção aliam a um efeito instantâneo, de eliminação do período ocorrido anteriormente, um efeito duradouro, que se traduz em que a prescrição não corre enquanto o processo (cuja instauração constitui o facto interruptivo) não terminar (efeito duradouro típico dos factos suspensivos), cfr. acórdão datado de 21.08.2013, recurso n.º 01316/13.
Assim, nos termos daquele artigo 34º, n.º 3, …a instauração da execução interrompe a prescrição…inutilizando para a prescrição todo o tempo decorrido anteriormente (cfr. o n.° 1 do artigo 326.° do Código Civil) e não começando a correr novo prazo (igual ao primitivo - cfr. o n.° 2 do artigo 326.° do Código Civil) enquanto não passar em julgado a decisão que puser termo ao processo (cfr. o n.° 1 do artigo 327.° do Código Civil), cfr. acórdão deste STA, recurso n.º 0710/11, datado de 27/07/2011].
Ou seja, em Outubro de 1996, data da instauração da execução -relativamente às dívidas de IVA de 1996, foram posteriormente instaurados processos de execução fiscal no ano de 1997 em Janeiro, Março e Maio, que vieram a ser apensos ao primeiro processo de execução fiscal, sendo certo que tais dívidas também foram abrangidas pela adesão ao plano de pagamento prestacional-, e por força dessa instauração, ainda não havia decorrido qualquer fracção daquele prazo de 10 anos.

Posteriormente em Janeiro de 1997 a recorrida aderiu ao chamado Plano Mateus (DL n.º 124/96, de 10/08) com vista ao pagamento dos montantes em divida em 150 prestações mensais sucessivas.
A adesão a este plano de pagamento, implicava que, nos termos do n.º 10 do artigo 14.º do referido DL 124/96, enquanto o devedor reunisse as condições nele referidas, a suspensão dos processos de execução fiscal em curso, bem como a instauração de novos processos, quando não se tornem necessários para garantir o valor da dívida.
Do mesmo modo, por força do que dispõe o n.º 5 do artigo 5.º deste DL, o prazo de prescrição das dívidas suspendia-se durante o período de pagamento em prestações.
Ou seja, se à data da adesão àquele plano de pagamento prestacional da dívida fiscal ainda não havia decorrido qualquer tempo que aproveitasse ao prazo de prescrição por força da instauração da execução, e durante o período em que durou a adesão ao dito plano de pagamento, suspendeu-se o processo de execução e o prazo de prescrição das dívidas.
Portanto, o processo de execução fiscal e o prazo de prescrição só deixam de estar suspensos a partir de 05/06/2006 com a prolação do despacho de exclusão da recorrida do dito plano de pagamentos. Efectivamente, nos termos do nº 5 do art. 5º do Dec. Lei nº 124/96, de 10 de Agosto, o prazo de prescrição suspende-se durante o período de pagamento em prestações, entendendo-se por período de pagamento em prestações o período fixado por acto administrativo da entidade competente para a autorização do regime, e não apenas o período em que o contribuinte pagou pontualmente as prestações contidas no plano de pagamento autorizado. Só a exclusão do plano autorizado de pagamento, por acto administrativo da mesma entidade, determina a exclusão do regime e, consequentemente, a cessação do efeito suspensivo do prazo de prescrição, cfr. acórdão deste Tribunal datado de 07/05/2014, recurso n.º 01576/13.
Daqui se pode concluir, assim, que naquela data de 05.06.2006, ainda não havia decorrido qualquer fracção do prazo de prescrição das dívidas em execução.

Porém, como é sabido, em Janeiro de 1999 entrou em vigor a LGT que estabeleceu um prazo de prescrição mais curto, de oito anos.
Para determinar se o prazo de prescrição aplicável é o do CPT ou o da LGT apenas há que verificar se, no caso concreto, faltava em 1 de Janeiro de 1999 menos tempo para se completar o prazo de prescrição de 10 anos previsto na lei antiga do que o de 8 anos previsto na lei nova – única situação em que se deixará de aplicar o novo e encurtado prazo contido na LGT – cfr. acórdão datado de 07/09/2011, proferido no recurso n.º 0246/11, em dgsi.pt.
Como já vimos, naquela data, 01/01/1999, tanto o processo de execução fiscal, como o prazo de prescrição, se encontravam suspensos e este já havia sido interrompido por força da instauração da execução no domínio do CPT.
Assim, em 05.06.2006, ainda faltava decorrer todo o prazo de prescrição, quer o previsto no CPT, quer o previsto na LGT (art. 48º), e sendo este o mais curto -8 anos-, por contraposição ao mais longo -10 anos- do CPT (art. 34º), deve ser este o prazo a considerar, por ser o mais curto, cfr. art. 297º do Código Civil [A sucessão dos prazos de prescrição contidos no Código de Processo Tributário e na Lei Geral Tributária resolve-se pela aplicação do art.º 297.º do Código Civil, por força do disposto no art. 5.º, n.º 1, do DL n.º 398/98, de 17 de Dezembro, cfr. acórdão deste Supremo Tribunal, datado de 18/11/2009, recurso n.º 0629/09].
Como também já sabemos, neste caso em apreciação, o prazo de prescrição -8 anos- iniciou-se em 05.06.2006, ou seja, nessa data faltaria a totalidade dos 8 anos para o prazo se completar, terminando, portanto, caso não ocorressem quaisquer causas de suspensão ou de interrupção, no dia 05.06.2014.
“Sendo aplicável o prazo de prescrição previsto na LGT, à face da regra do art. 297º, nº 1 do Código Civil, cujo termo inicial ocorre, necessariamente, em 1 de Janeiro de 1999, e decorrendo, assim, todo o prazo prescricional na vigência da LGT, será esta lei a regular os efeitos dos factos interruptivos e suspensivos da prescrição, como decorre da regra contida no nº 2 do art. 12º do Código Civil. Pelo que os actos interruptivos anteriores a que a LGT não reconheça esse efeito – como é o caso da instauração da execução fiscal – não produzem efeitos sobre a contagem deste novo prazo de prescrição iniciado na referida data.”, cfr. acórdão deste STA, datado de 08/01/2014, recurso n.º 01843/13].

Dispunha à data o artigo 49º, n.º 1 da LGT que, a citação, a reclamação, o recurso hierárquico, a impugnação e o pedido de revisão oficiosa da liquidação do tributo interrompem a prescrição.
Sabemos que em 19.04.2006 foi enviada à recorrente uma citação postal, pelo que, há agora que saber se essa citação postal era ou não idónea a produzir aquele efeito interruptivo sobre o referido prazo de 8 anos.
Sobre a natureza, alcance e repercussão sobre o prazo de prescrição desta citação postal já se pronunciou este Supremo tribunal no acórdão datado de 11.10.2017, recurso n.º 0203/17 nos seguintes termos:
O efeito duradouro da interrupção do prazo prescricional em curso nos termos do disposto nos artigos 326º e 327º, n.º 1 do Código Civil - o novo prazo de prescrição não começa a correr enquanto não passar em julgado a decisão que puser termo ao processo -, como deste último artigo resulta, tem que resultar de um dos seguintes eventos interruptivos: citação, notificação ou acto equiparado e/ ou compromisso arbitral.
No caso dos autos só está em discussão o acto processual da citação e já não qualquer um dos outros enunciados no dito preceito legal.
Este artigo 327º, n.º 1 do Código Civil, sob a epígrafe "Duração da interrupção", refere-se à citação prevista no artigo 219º, n.º 1 do Código de Processo Civil, anterior artigo 228º, em que a citação se consubstancia no acto processual pelo qual se dá conhecimento pessoalmente ao réu, pessoa singular ou colectiva (arts. 225º e 246º), de que foi proposta contra ele determinada acção e se chama ao processo para se defender, indicando-se o prazo dentro do qual pode oferecer defesa e as respectivas cominações em caso de revelia, cfr. actual artigo 227º, n.º 2.
Ou seja, a citação, enquanto acto de chamamento ao processo, que o legislador previu como idóneo à interrupção duradoura do prazo de prescrição, consubstancia-se no meio pelo qual se dá ao visado a oportunidade de se defender activamente no processo que contra si foi instaurado e corresponde à citação pessoal que se encontra prevista no artigo 192º do CPPT e consequentemente, também, à citação a que se refere o artigo 49º, n.º 1 da LGT.
Assim, "A citação judicial, como meio interruptivo da prescrição, baseia-se em que, se o titular faz valer judicialmente o seu direito, mostra ele que exerce o direito, pelo que não deve já valer para a prescrição o tempo decorrido. A exigência da citação judicial da outra parte destina-se a dar-lhe conhecimento do exercício judicial do direito pelo titular, por não ser razoável que essa outra parte, que acaso contava com a prescrição, tenha de se sujeitar à interrupção, sem seu reconhecimento.", cfr. Vaz Serra, Prescrição Extintiva e Caducidade, pág. 392.
Já à citação a que alude o artigo 191º do mesmo CPPT não se lhe pode atribuir o mesmo efeito interruptivo duradouro.
…enquanto que a citação pessoal pressupõe que o citado executado assume no processo todos os direitos e obrigações que lhe permitam defender-se em juízo, com recurso a todos os expedientes processuais legalmente previstos, razão pela qual o prazo de prescrição só se iniciará novamente findo que esteja o processo com decisão transitada em julgado, já a citação postal prevista no artigo 191º não lhe garante os mesmos direitos e, nessa medida, não pode ter o mesmo alcance que a citação pessoal.
Sobre a natureza desta citação postal já este Supremo Tribunal se pronunciou no acórdão datado de 21.03.2012, recurso n.º 081/12 ao referir que a citação mediante postal simples ou postal registado, prevista no artigo 191.º do CPPT, constitui uma citação provisória, que dispensa a citação definitiva até ao momento em que seja efectuada a penhora de bens, essa citação provisória, pela falta de segurança de que se reveste, não é susceptível de abrir o prazo para a defesa do executado, designadamente o prazo de oposição à execução fiscal ou o prazo para o exercício de outros direitos que hajam de ser exercidos dentro daquele prazo, como resulta inequivocamente do disposto no artigo 203.º, n.º 1, alínea, a), do CPPT.
Assim, esta citação postal a que alude o artigo 191º do CPPT não pode ser idónea a produzir uma interrupção duradoura do prazo de prescrição em curso (na decisão recorrida atribuiu-se efeito interruptivo à citação a que se refere a alínea "C" do probatório porque, sendo o aviso-citação postal uma diligência conducente à eventual cobrança do conhecimento do devedor, constitui facto interruptivo da prescrição subsumível ao art. 63.º, n.º 3, da Lei 17/2000, de 8 de Agosto, no entanto, porque se trata já de um acto praticado no âmbito de um processo judicial, a execução fiscal -cfr. artigo 103º, n.º 1 da LGT- não parece poder ser subsumível às diligências administrativas a que se refere tal preceito legal, antes tendo que ser qualificada como um acto processual), uma vez que não assume as características próprias e especificas da citação a que se referem os artigos 326º e 327º, n.º 1 do Código Civil e 49º, n.º 1 da LGT
(…)
E, portanto, aqui chegados, teremos que concluir … que àquela citação postal não pode ser atribuído efeito interruptivo duradouro do prazo de prescrição.

Ou seja, face ao que aqui se deixou dito, não há dúvida que na vigência da LGT, e face à matéria de facto que vem dada como assente, e que não foi posta em causa pelas partes, não ocorreu qualquer facto idóneo a produzir um efeito interruptivo duradouro sobre o prazo de prescrição de 8 anos que se encontrava em curso.
Mas mesmo que se atribua efeito interruptivo instantâneo a tal citação, o mesmo prazo ter-se-ia iniciado sempre com a prolação do despacho que excluiu a recorrente do plano de pagamentos a que aderiu, uma vez que à data da citação o prazo de prescrição e a própria execução se encontravam suspensos.

Por último importa ainda relevar que a presente oposição deu entrada em juízo em 09.06.2011, sendo que à data dispunha o artigo 49º, n.º 4 da LGT que, o prazo de prescrição legal suspende-se em virtude de pagamento de prestações legalmente autorizadas, ou enquanto não houver decisão definitiva ou passada em julgado, que puser termo ao processo, nos casos de reclamação, impugnação, recurso ou oposição, quando determinem a suspensão da cobrança da dívida.
Não há dúvida que a dedução da presente oposição em Junho de 2011, preenchidos que estejam os pressupostos previstos nesta disposição legal, bem como o mesmo resultaria do disposto no artigo 169º, n.º 9 do CPPT, determinaria a suspensão do prazo de prescrição em curso que se iniciou com a exclusão da recorrida do plano de pagamento prestacional. No entanto, é essencial aferir se, e em que medida, a dedução desta oposição em conjugação com a eventual penhora ou cativação de saldos de contas bancárias da recorrida é idónea a produzir tal efeito suspensivo sobre o prazo prescricional em curso; efectivamente dispunha à data aquele 169º, n.º 1 do CPPT que, a execução fica suspensa até à decisão do pleito em caso de reclamação graciosa, a impugnação judicial ou recurso judicial que tenham por objecto a legalidade da dívida exequenda, desde que tenha sido constituída garantia nos termos do artigo 195.º ou prestada nos termos do artigo 199.º ou a penhora garanta a totalidade da quantia exequenda e do acrescido.
É certo que dos autos parece resultar a existência de tal penhora, mas uma vez que nada foi levado ao probatório sobre tal realidade, não podemos ter a certeza dos circunstancialismos fácticos que a rodearam, o que é essencial para que se possa conhecer com segurança da questão da prescrição, tanto mais que se trata de matéria de conhecimento oficioso e relativamente à qual incumbia ao tribunal a quo a recolha e análise de todos os circunstancialismos fácticos que possam ter implicação com o decurso de tal prazo.
Assim, impõe-se, no que respeita a esta última vertente da análise da questão da prescrição, que o tribunal a quo indague e aprecie a relevância de tal circunstancialismo ao abrigo do disposto naqueles artigos 49º, n.º 4 da LGT e 169º, n.º 9 do CPPT.

Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em conceder provimento ao recurso e, em consequência, ordenar a baixa dos autos ao tribunal a quo para que aí seja conhecida a questão da prescrição na vertente anteriormente apontada.
Custas pela recorrida, levando-se em conta que não contra-alegou.
D.n.

Lisboa, 27 de Novembro de 2019. – Aragão Seia (relator) – Suzana Tavares da Silva – Aníbal Ferraz.