Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0793/16
Data do Acordão:02/15/2017
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:FRANCISCO ROTHES
Descritores:IMPOSTO MUNICIPAL SOBRE TRANSMISSÃO ONEROSA DE IMOVEIS
ISENÇÃO
INSOLVÊNCIA
Sumário:A isenção de IMT prevista pelo n.º 2 do art. 270.º do CIRE aplica-se, não apenas às vendas ou permutas de empresas ou estabelecimentos enquanto universalidade de bens, mas também às vendas e permutas de imóveis (enquanto elementos do seu activo), desde que enquadradas no âmbito de um plano de insolvência ou de pagamento, ou praticados no âmbito da liquidação da massa insolvente.
Nº Convencional:JSTA000P21481
Nº do Documento:SA2201702150793
Data de Entrada:06/23/2016
Recorrente:FAZENDA PÚBLICA
Recorrido 1:A...
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Recurso jurisdicional da sentença proferida no processo de impugnação judicial com o n.º 825/15.2BEPNF

1. RELATÓRIO

1.1 A Fazenda Pública (adiante Recorrente) recorreu para este Supremo Tribunal Administrativo da sentença por que o Juiz do Tribunal Administrativo de Penafiel, julgando procedente a impugnação judicial deduzida por A…………. (a seguir Impugnante ou Recorrido), anulou a liquidação de Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis (IMT) efectuada a estas com referência à aquisição de um imóvel, ocorrida no âmbito de um processo de insolvência.

1.2 O recurso foi admitido, para subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo e a Recorrente apresentou as alegações, que sintetizou em conclusões do seguinte teor:

«A. Salvo o devido respeito, entende a Fazenda Pública que a sentença recorrida padece de erro de julgamento quanto à matéria de direito, por errada interpretação e aplicação da lei.

B. Concluiu o douto Tribunal a quo que: “Em concreto, e com relevância para o caso dos autos, está isenta de IMT a venda da empresa ou estabelecimento dela integrada, matizada no âmbito da liquidação da massa insolvente.
(...) Sendo a situação destes autos idênticas à desse acórdão, este tribunal adere à fundamentação do Colendo Supremo Tribunal Administrativo e julga isenta a aquisição dum imóvel na liquidação da massa insolvente.
Aqui cumpre apenas referir que relevou o facto do imóvel transmitido pertencer à massa insolvente duma sociedade comercial e ser constituído por um prédio destinado a indústria e armazém...
Por consequência a liquidação impugnada padece de vício de violação de lei por infracção do art. 270.º, n.º 2, do CIRE.

C. Estabelece o n.º 2 do art. 270.º do CIRE que “Estão igualmente isentos de imposto municipal sobre as transmissões onerosas de imóveis os actos de venda, permuta ou cessão da empresa ou de estabelecimentos desta integrados no âmbito de planos de insolvência, de pagamentos ou de recuperação ou praticados no âmbito da liquidação da massa insolvente”.

D. Assim, para que a aquisição do imóvel em questão seja isenta de IMT é necessário que o objecto se refira a empresa” ou “estabelecimento” e, ainda, que tal negócio tenha sido realizado no âmbito de plano de insolvência ou de pagamentos ou de recuperação ou praticados no âmbito da liquidação da massa insolvente.

E. Se quanto ao segundo requisito dúvidas não existem quanto à sua verificação, tal já não se poderá dizer quanto ao primeiro requisito, uma vez que se depreende da letra da lei que a isenção de IMT depende de os bens (imóveis) adquiridos se poderem qualificar como empresa ou estabelecimento daquela, sendo evidente que, no caso em apreço, não estamos perante a aquisição da empresa na sua totalidade.

E. Resta-nos, portanto, averiguar se o acto tributário em análise se poderá qualificar como “venda de estabelecimento” da mesma empresa, o que, desde logo, implica que se precise este último conceito que surgiu no domínio do Direito Comercial, sendo muitas vezes utilizado o para designar o fenómeno jurídico empresarial, paralelamente com a palavra empresa.

G. Mas, independentemente da querela sobre se os conceitos referidos são sinónimos – se em tempos a resposta era afirmativa, actualmente defende-se posição contrária – por estabelecimento deve entender-se o complexo de elementos activos e passivos, corpóreos e incorpóreos, com que o comerciante ou industrial exerce a sua actividade: edifícios, máquinas, móveis mercadorias, dívidas a receber e a pagar, dinheiro, etc.

H. No caso em apreço, o que se verificou foi a aquisição, em singelo, de um prédio urbano desacompanhado, portanto, de quaisquer outros bens ou elementos – o que, na perspectiva da Fazenda Pública, impõe que se conclua que tal aquisição não se enquadra em nenhuma das situações previstas no n.º 2 do art. 270.º do CIRE, verificando-se apenas a aquisição de um dos elementos corpóreos do estabelecimento a saber, o referido imóvel (sublinhado nosso).

I. Repare-se que a isenção de IMT, prevista no art. 270.º n.°2 do CIRE tem, no nosso entender, um âmbito mais restrito comparativamente com a isenção de Imposto de Selo prevista no art. 269.º, al. e) do CIRE, de acordo com o qual “estão isentos de imposto do selo (...) a venda (...) de elementos do activo da empresa”, ou seja, enquanto o art. 269.º al. e) do CIRE abrange a transmissão (venda, permuta ou cessão) de elementos do activo da empresa separada do estabelecimento de que faz parte, o art. 270.º n.º 2 do CIRE não abrange a transmissão onerosa de imóveis isoladamente da empresa ou do estabelecimento, sendo essencial para que a isenção tenha lugar que a transmissão abranja a universalidade da empresa ou estabelecimento (sublinhado nosso).

J. Neste sentido é importante reproduzir, parte de um esclarecimento da AT à Ordem dos Notários, relativamente aos arts. 269.º e 270.º do CIRE, conforme Parecer da Direcção de Serviços Jurídicos e do Contencioso da AT, junto ao PA de fls. 20 e seguintes, que determina o seguinte:
No que concerne ao IMT, a redacção do art. 270.º, n.º 2, é clara no sentido, ao contrário das isenções previstas no anterior n.º 1, da limitação das isenções de IMT previstas nessa norma legal aos actos de venda, permuta ou cessão da empresa ou estabelecimento desta, integrados no âmbito do plano de insolvência ou de pagamentos ou praticados no âmbito do plano de insolvência ou de pagamentos ou praticados no âmbito da liquidação da massa insolvente.
A transmissão onerosa de bens imóveis isoladamente da empresa ou do estabelecimento não está, assim, abrangida pela isenção, sem prejuízo, mesmo em caso de inexistência de planos de insolvência ou de pagamentos, da aplicação da isenção das aquisições de imóveis por instituições de crédito em processo de insolvência, desde que se destinem, nos termos e condições do art. 8.º do CIMT, à realização de empréstimos feitos ou de garantias prestadas.
É essencial à aplicação da isenção que a transmissão abranja a universalidade da empresa ou estabelecimento.
Inexiste obstáculo legal à transmissão de bens imóveis separada da empresa ou estabelecimento, desde que a universalidade da empresa ou do estabelecimento não seja afectada nos seus elementos essenciais. Essa transmissão está, no entanto, sujeita nos termos gerais a IMT, salvo quando se verifique o condicionalismo específico do art. 8.º do CIMT, posto que paradoxalmente esteja isenta de Imposto de Selo. Essa incongruência parece, no entanto, ter sido pretendida pelo legislador, que, no art. 269.º alínea e), menciona a venda, permuta ou cessão de activos da empresa, ao passo que, no art. 270.º n.º 2, se refere a actos de venda, permuta ou cessão da empresa ou de estabelecimento” (sublinhado nosso).

K. Assim sendo, a Fazenda Pública não concorda com o sentido decisório do tribunal a quo e entende que a sentença evidencia errada interpretação e aplicação da lei tributária.

L. Ao decidir como decidiu, o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento por fazer uma incorrecta interpretação e aplicação do disposto no n.º 2 do art. 270.º do CIRE.

M. Em conclusão, a aquisição do referido imóvel não está isenta de IMT ao abrigo do art. 270.º n.º 2 do CIRE, uma vez que não se trata de uma transmissão onerosa de bens que se integrem na universalidade da empresa ou de estabelecimentos vendidos, permutados ou cedidos no âmbito do plano de insolvência ou de pagamentos ou da liquidação da massa insolvente, mas sim da transmissão onerosa de bens imóveis isoladamente da empresa.

Termos em que, deve ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se a douta sentença recorrida, julgando-se impugnação totalmente improcedente».

1.3 O Recorrido não contra-alegou.

1.4 Remetidos os autos a este Supremo Tribunal Administrativo e dada vista ao Ministério Público, o Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de que seja negado provimento ao recurso. Após tecer diversos considerandos em ordem a delimitar a questão a apreciar e decidir e sobre a interpretação da lei, aí deixou dito:

«[…] parece resultar do texto do artigo 270.º/2 do CIRE que o legislador não pretende relacionar as expressões «venda» e «permuta» com as expressões «empresa» ou «estabelecimento». Apenas teria pretendido relacionar a expressão «cessão» com as expressões «empresa» e «estabelecimento».
De facto, parece que não faria sentido utilizar as expressões «venda» e «cessão», uma vez que ambas têm, em última instância, o mesmo significado, ou seja, a transmissão onerosa de um direito.
Por outro lado a expressão «permuta» é habitualmente utilizada para designar o negócio de «troca» de imóveis entre duas partes e não para designar negócios de trocas de empresas ou estabelecimentos.
Assim, quando o legislador se refere à «venda» e «permuta» parecer ter em vista a venda e permuta de imóveis isoladamente considerados e quando se refere à cessão está a pensar na cessão da empresa ou estabelecimento desta.
O CPEREF, diploma que antecedeu o CIRE, que era norteado pelo primado da recuperação da empresa devedora, no artigo 121.º/2 estatuía que “as transmissões de bens imóveis, integradas em qualquer das providências de recuperação de empresas, que decorram (...) da venda, permuta ou cessão de elementos do activo da empresa (...)”.
Era, pois inequívoco que a isenção de Sisa abrangia a transmissão isolada dos imóveis, na medida em que estivessem previstas num plano que visasse a recuperação da empresa.
A lei 39/2003, de 22/08 autorizou o Governo a legislar sobre a insolvência de pessoas singulares e colectivas, colocando a tónica na satisfação dos credores, pela via da liquidação do património ou pela via da aprovação de um plano de insolvência.
O artigo 9.º/3 autorizava o Governo “a isentar de imposto municipal de sisa as seguintes transmissões de bens imóveis, integrados em qualquer plano de insolvência ou de pagamento ou realizadas no âmbito da liquidação da massa insolvente: (...) as que decorram (...) da venda, permuta ou cessão da empresa, estabelecimento ou elementos do seu activo (...)”.
A lei 39/2003 não restringia a isenção de tributação às transmissões de imóveis que pudessem ter lugar num contexto de recuperação de empresas, pelo contrário, essa isenção era alargada às transmissões que tivessem lugar num contexto de liquidação da empresa insolvente ou de seus estabelecimentos, tudo isto com o intuito de maximizar a satisfação dos direitos dos credores.
E a esta luz que se deve entender a afirmação que consta do ponto 39 do preâmbulo do CIRE, segundo a qual este diploma mantém “no essencial, os regimes existentes no CPEREF quanto à isenção de emolumentos e benefícios fiscais”.
O objectivo do legislador era o de manter qua tale todos os benefícios já concedidos no âmbito da recuperação de empresas e alargá-los à liquidação do seu património.
Por isso, salvo melhor juízo, não faz sentido sustentar que o benefício fiscal previsto no artigo 270.º/2 do CIRE apenas abrange a transmissão de imóveis em conjunto com a empresa ou com o estabelecimento de que fazem parte.
O CIRE deixa ao prudente arbítrio dos credores a decisão sobre a prossecução da recuperação da empresa, o legislador elegeu a liquidação como a via supletiva em detrimento do plano de insolvência, o objectivo de recuperar determinada empresa não é motivo suficiente para que o plano de insolvência prejudique determinado credor, pelo que é de concluir que a finalidade do processo de insolvência é a satisfação dos credores, sendo qualquer outra finalidade secundária em relação a esta.
Assim, seria incoerente e contraditório que tal diploma concedesse um benefício fiscal com a finalidade exclusiva de promover a recuperação da empresa, sobretudo quando esse benefício pode contribuir de forma relevante para a maximização das perspectivas de satisfação dos credores ou para minimizar os prejuízos que a insolvência acarreta para os agentes económicos que com ele se relacionaram.
Sendo de presumir que o legislador é coerente com as soluções que adopta o inciso do artigo 270.º/2 do CIRE não pode excluir os actos que prosseguem a finalidade que preside a todo o Código, ou seja, a maximização da satisfação dos credores.
Assim sendo, uma vez que está, sempre, em causa a maximização da satisfação dos credores o benefício fiscal estatuído no artigo 270.º/2 do CRE deve aplicar-se indiferentemente a todas as transmissões onerosas e imóveis, quer ocorram em separado ou em conjunto da empresas ou do estabelecimento que os imóveis integram.
A isenção de imposto do selo prevista no artigo 269.º/d) e e) tal como a isenção de IMT estatuída no artigo 270.º/1 do CIRE abrangem sem dúvida, a transmissão dos imóveis em conjunto com a empresa ou estabelecimento de que fazem parte bem como a transmissão isolada desses imóveis.
Assim sendo, a interpretação de que o artigo 270.º/2 do CIRE apenas abrange a transmissão dos imóveis quando efectuada em conjunto com a empresa ou estabelecimento de que fazem parte não resiste ao teste da coerência ou harmonia do ordenamento jurídico.
Na verdade, nos termos do estatuído no artigo 9.º/3 do CC é de presumir que a filosofia que subjaz a todas as referidas isenções não pode deixar de ser a mesma.
E, considerando que a filosofia que subjaz a tais isenções não é nem a promoção da transmissão global de empresas ou estabelecimentos, nem a sua recuperação, outra não pode ser que não a que preside a todo o CIRE, ou seja, a maximização da satisfação dos credores, minimizando as suas perdas e o impacto negativo da insolvência do devedor no tecido económico e empresarial.
A solução contrária, sustentada pela recorrente, não deixaria de criar distorções e incentivos incompatíveis com o objectivo de assegurar “a satisfação, pela forma mais eficiente possível, dos direitos dos credores (ponto 3 do preâmbulo do CIRE) (neste sentido o artigo da autoria dos advogados David Sequeira Dinis e Luís Bértolo Rosa “A isenção de Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis nas vendas e permutas em processo de falência”, cujo discurso fundamentador se segue, disponível em
https://www.oa.pt/upl/%7B3c6e43bb-a36c-4a86-981c-4e4016fe5c48%7D.pdf)».

1.5 Colheram-se os vistos dos Juízes Conselheiros adjuntos.

1.6 Cumpre apreciar e decidir.


* * *

2. FUNDAMENTAÇÃO
2.1 DE FACTO

O Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel efectuou o julgamento da matéria de facto nos seguintes termos:

«A) Em 19/12/2014, o impugnante solicitou a liquidação do IMT devido pela aquisição que pretendia fazer da fracção autónoma designada pela letra A, destinada a armazém, do prédio urbano constituído em regime de propriedade horizontal, inscrito sob o artigo n.º 2613-A, na matriz predial urbana da União das Freguesias ……….., concelho de Lousada (documentos juntos à petição inicial, ao procedimento de reclamação graciosa apenso (PRG) e ao PA).

B) A aquisição será realizada no âmbito do Processo de Insolvência n.º 457/14.2TBLSD, que corre termos na Comarca do Porto Este, Amarante, Instância Central, Secção de Comércio - J2, em que é insolvente B………………., Ld.ª, em liquidação, pessoa colectiva n.º …………. (documentos juntos à petição inicial, ao PRG e ao PA).

C) O valor de aquisição da fracção é de € 175.586,85 (documentos juntos à petição inicial, ao PRO e ao PA).

D) O Serviço de Finanças de Lousada procedeu à liquidação do IMT devido, através da declaração modelo 1 de IMT n.º 2014/274704, tendo sido apurado imposto no montante de € 11.413,15 (documentos juntos à petição inicial, ao PRG e ao PA).

E) O Serviço de Finanças de Lousada não reconheceu qualquer isenção a título de IMT (documentos juntos à petição inicial, ao PRO e ao PA).

F) A liquidação impugnada foi paga em 22/12/2014 (fls. 28 a 33 verso).

G) O impugnante adquiriu o imóvel identificado em A), nas condições e pelo preço referidos em B) e C), por contrato de compra e venda outorgado em 22/12/2014 (documentos juntos à petição inicial ao PRG e ao PA).

H) A liquidação impugnada foi objecto de reclamação graciosa com o n.º 1791201404000960, instaurada em 19/12/2014, que não foi objecto de decisão e que nos termos do n.º 3 do art. 111.º do CPPT, foi apensa à impugnação judicial (documentos juntos à petição inicial, ao PRG e ao PA).

I) Em 20/05/2015 a impugnante apresentou impugnação judicial dessa decisão (fls. 2 e seguintes)».


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2.2 DE FACTO E DE DIREITO

2.2.1 A QUESTÃO A APRECIAR E DECIDIR

A ora Recorrida adquiriu um imóvel (fracção autónoma de um prédio em regime da propriedade horizontal) no âmbito de um processo de insolvência de uma pessoa colectiva, prédio que fazia parte do activo da insolvente.
Em ordem à celebração da escritura de compra e venda, pediu a liquidação do IMT no serviço de finanças e pagou o montante liquidado.
Ulteriormente, entendendo que a referida aquisição está isenta daquele imposto ao abrigo do disposto no n.º 2 do art. 270.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (CIRE), a adquirente (ora Recorrida) deduziu reclamação graciosa contra essa liquidação e, na sequência da falta de oportuna decisão, apresentou a presente impugnação judicial, que o Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel, louvando-se na jurisprudência deste Supremo Tribunal Administrativo, designadamente no acórdão de 30 de Maio de 2012, proferido no processo n.º 949/11 (Publicado no Apêndice ao Diário da República de 8 de Outubro de 2013
(http://www.dre.pt/pdfgratisac/2012/32220.pdf), págs. 1703 a 1706, também disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/82c4c317ca96d1c280257a1a0047ce48.), julgou procedente, motivo por que anulou aquelas liquidações.
A Fazenda Pública, discordando desse entendimento, recorreu da sentença para este Supremo Tribunal Administrativo. Argumenta, em síntese, que o reconhecimento do benefício previsto no art. 270.º, n.º 2, do CIRE, deriva de os bens imóveis transmitidos se integrarem na universalidade da empresa ou estabelecimento vendidos, sendo assim, essencial à aplicação da isenção de IMT que a transmissão abranja a totalidade da empresa ou estabelecimento, o que não sucedeu in casu.
Assim, a questão que cumpre apreciar e decidir é a de saber se (a sentença recorrida fez correcto julgamento ao considerar que) a aquisição em causa estava isenta de IMT ao abrigo do disposto no art. 270.º do CIRE, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 53/2004, de 18 de Março, o que, como procuraremos demonstrar, passa por indagar se a referida isenção opera apenas relativamente às vendas, permutas ou cessão de empresas ou estabelecimentos enquanto universalidade de bens, como defende a Recorrente, ou também relativamente a vendas, permutas ou cessão de imóveis (enquanto elementos do seu activo), desde que enquadradas no âmbito de um plano de insolvência ou de pagamento, ou praticados no âmbito da liquidação da massa insolvente, como sustentou a sentença recorrida.

2.2.2 DA ISENÇÃO DE IMT RESPEITANTE ÀS AQUISIÇÕES DE BENS EM PROCESSO DE INSOLVÊNCIA

A questão não é nova e tem vindo a ser tratada reiterada e uniformemente neste Tribunal (Sem a preocupação de sermos exaustivos, vide os seguintes acórdãos:
- de 17 de Dezembro de 2014, proferido no processo n.º 1085/13, publicado no Apêndice ao Diário da República de 15 de Janeiro de 2016 (http://www.dre.pt/pdfgratisac/2014/32240.pdf), págs. 4249 a 4252, também disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/bdbf686acbd6970380257dc6005569fb;
- de 11 de Novembro de 2015, proferido no processo n.º 968/13, publicado no Apêndice ao Diário da República de 19 de Dezembro de 2016 (http://www.dre.pt/pdfgratisac/2015/32240.pdf), págs. 3711 a 3714, também disponível em http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/8641778b75f387b380257efc005b1e99;
- de 18 de Novembro de 2015, proferido no processo n.º 575/15, publicado no Apêndice ao Diário da República de 19 de Dezembro de 2016 (http://www.dre.pt/pdfgratisac/2015/32240.pdf), págs. 3772 a 3777, também disponível em http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/dfc2214b865a8eb680257f07003bc47d;
- de 18 de Novembro de 2015, proferido no processo n.º 1067/15, publicado no Apêndice ao Diário da República de 19 de Dezembro de 2016 (http://www.dre.pt/pdfgratisac/2015/32240.pdf), págs. 3809 a 3812, também disponível em http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/6584532b3466938c80257f07004e7be1;
- de 16 de Dezembro de 2015, proferido no processo n.º 1345/15, publicado no Apêndice ao Diário da República de 19 de Dezembro de 2016 (http://www.dre.pt/pdfgratisac/2015/32240.pdf), págs. 4111 a 4114, também disponível em http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/b0239cdc2b892b7080257f32003fe7ee;
- de 20 de Janeiro de 2016, proferido no processo n.º 1350/15, ainda não publicado no jornal oficial, mas disponível em http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/fb2a61c2ad3301c480257f4500504396.
Para além disso, relativamente a questão diversa, mas dentro do mesmo enquadramento legal, vide também os seguintes acórdãos:
- de 3 de Julho de 2013, proferido no processo n.º 765/13, publicado no Apêndice ao Diário da República de 26 de Maio de 2014 (http://www.dre.pt/pdfgratisac/2013/32230.pdf), págs. 3060 a 3065, também disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/9c68c763d8eb1a1580257ba3004cca44;
- de 25 de Setembro de 2013, proferido no processo n.º 866/13, publicado no Apêndice ao Diário da República de 26 de Maio de 2014 (http://www.dre.pt/pdfgratisac/2013/32230.pdf), págs. 3535 a 3541, também disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/dfcedf1ffe47cf2380257bf80047940a.), pelo que vamos limitar-nos a remeter para a fundamentação expendida num dos mais recentes desses acórdãos, o de 16 de Dezembro de 2015, proferido no processo n.º 1345/15.
Assim, e passamos a citar, «[a] sentença recorrida, a fls. […] dos autos, julgou procedente a impugnação deduzida pelo ora recorrido contra liquidação de IMT incidente sobre aquisição de prédio em fase de liquidação do activo em processo de insolvência, anulando o acto de liquidação impugnado e condenando a Administração à restituição do imposto indevidamente pago acrescido de juros indemnizatórios, no entendimento de que tal aquisição está abrangida pela norma de isenção constante do n.º 2 do artigo 270.º do CIRE.
Fundamentou-se o decidido no acórdão deste STA de 30 de Maio de 2012, processo n.º 0949/11, para ele remetendo e procedendo à respectiva transcrição […].
Discorda do decidido a Fazenda Pública, alegando que os pressupostos para o preenchimento dos requisitos que determinam a obtenção do benefício de isenção, não foram preenchidos pelo adquirente, uma vez que não adquiriu a empresa ou estabelecimento desta e que o disposto no art. 270.º, n.º 2 do CIRE, mesmo por via de uma interpretação extensiva, não contempla a venda pura e simples de elementos do activo da empresa.
Não fornece, porém, a recorrente razão alguma que abale a nossa convicção de que a sentença recorrida bem julgou ao adoptar a interpretação do artigo 270.º, n.º 2 do CIRE que vem sendo de forma pacífica e reiterada adoptada por este STA desde o Acórdão mencionado na sentença recorrida – cfr. para além dos acórdãos já citados no parecer do Excelentíssimo Procurador-Geral Adjunto junto deste STA supra transcrito, os recentes Acórdãos de 11 de Novembro de 2015, rec. n.º 0968/13 e de 18 de Novembro de 2015, recs. n.ºs 0575/15 e 1067/15 –, não sendo o facto de a AT ter do preceito uma interpretação desconforme à jurisprudência do STA – que terá, inclusive, feito constar de recente informação 1/2014 da DSIMT e prestado à Ordem dos Notários (cfr. alegações de recurso a fls. [no caso, a fls. 119 verso e 121]) –, razão para postergar o entendimento que vem sendo adoptado e que aqui se reafirma, porquanto constitui o que melhor adequa o texto legal ao sentido e extensão da autorização legislativa ao abrigo da qual a norma foi emanada pelo Governo em matéria reservada à Assembleia da República e porque essa interpretação é a que melhor serve a teleologia do n.º 2 do artigo 270.º do CIRE – «fomentar e apoiar a venda rápida dos bens que integram a massa insolvente por óbvias razões de interesse dos credores, mas, também do interesse público de retoma do normal funcionamento do mundo empresarial em que cada processo de insolvência se apresenta como elemento perturbador», dando incentivos fiscais a quem adquirir os bens imóveis que integram a massa insolvente e que serão vendidos em fase de liquidação – não havendo, a essa luz, razão para distinguir as situações em que se esteja a vender globalmente a empresa com todo o seu activo e o seu passivo, das situações em que se esteja a vender um ou mais dos estabelecimentos comerciais que a integravam, ou em que se estejam a vender bens imóveis que integravam o seu activo (cfr. o Acórdão do STA de 18 de Novembro último, rec. n.º 01067/15).
Conclui-se, pois, que nada há a censurar à sentença recorrida que bem julgou, estando o recurso da Fazenda Pública votado ao insucesso».
Assim, nos termos do citado acórdão e aderindo também aos fundamentos invocados pelo Procurador-Geral Adjunto no parecer proferido nos presentes autos e que acima (em 1.4) ficou transcrito, entendemos ser de confirmar a sentença recorrida, que decidiu no sentido da anulação das liquidações oficiosas.
Por tudo o que ficou dito, o recurso não pode ser provido.

2.2.3 CONCLUSÕES

Preparando a decisão, formulamos a seguinte conclusão:

A isenção de IMT prevista pelo n.º 2 do art. 270.º do CIRE aplica-se, não apenas às vendas ou permutas de empresas ou estabelecimentos enquanto universalidade de bens, mas também às vendas e permutas de imóveis (enquanto elementos do seu activo), desde que enquadradas no âmbito de um plano de insolvência ou de pagamento, ou praticados no âmbito da liquidação da massa insolvente.


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3. DECISÃO

Face ao exposto, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo acordam, em conferência, em negar provimento ao recurso.

Custas pela Recorrente.

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Lisboa, 15 de Fevereiro de 2017. – Francisco Rothes (relator) – Aragão Seia – Casimiro Gonçalves.