Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0740/17
Data do Acordão:07/06/2017
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:COSTA REIS
Sumário:
Nº Convencional:JSTA000P22125
Nº do Documento:SA1201707060740
Data de Entrada:06/20/2017
Recorrente:SINDICATO DOS TRABALHADORES EM FUNÇÕES PÚBLICAS E SOCIAIS DO NORTE, EM REPRESENTAÇÃO DE A............ E OUTRO
Recorrido 1:MINISTÉRIO DA AGRICULTURA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Formação de Apreciação Preliminar da Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo:

I. RELATÓRIO

O SINDICATO DOS TRABALHADORES EM FUNÇÕES PÚBLICAS E SOCIAIS DO NORTE, em representação dos seus associados A………… e B………… apresentou, nos termos do art.º 161.º do CPTA, no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, requerimento solicitando a extensão de efeitos do acórdão proferido, em 04/07/2014, por aquele Tribunal no processo que correu termos sob o n.º 2001/07.9BEPRT, por forma a que:
““i) Que os associados do A. sejam colocados no seu posto de trabalho até à data da aposentação;
ii) Que sejam comunicadas à Caixa Geral de Aposentações as correcções remuneratórias para eventual recálculo da pensão dos associados do A.;
iii) Que o R. seja condenado no pagamento das diferenças remuneratórias devidas, no montante de € 90.455,07 (noventa mil, quatrocentos e cinquenta e cinco euros e sete cêntimos);
IV) Que o R. seja condenado no pagamento dos juros vencidos e vincendos até ao total cumprimento da obrigação.”

Aquele Tribunal julgou procedente a excepção dilatória inominada relativa à caducidade do direito de requerer à entidade administrativa a extensão dos efeitos do acórdão proferido no processo n.º 2001/07BEPRT” e, em consequência, absolveu o R. da instância.

O Sindicato Autor recorreu para o TCA Norte e este, por Acórdão de 24/02/2017 (P.º 2001/07.9BEPRT-H), negou provimento ao recurso.

O Sindicato interpôs, então, recurso de revista dessa decisão, ao abrigo do artigo 150.º do CPTA.

II. MATÉRIA DE FACTO
Os factos dados como provados são os constantes do acórdão recorrido para onde se remete.

III. O DIREITO

1. As decisões proferidas pelos TCA em segundo grau de jurisdição não são, por via de regra, susceptíveis de recurso ordinário. Regra que sofre a excepção prevista no art.º 150.º/1 do CPTA onde se lê que daquelas decisões pode haver, «excepcionalmente», recurso de revista para o Supremo Tribunal Administrativo «quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental» ou «quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito». O que significa que este recurso foi previsto como «válvula de segurança do sistema» para funcionar em situações excepcionais em que haja necessidade, pelas apontadas razões, de reponderar as decisões do TCA em segundo grau de jurisdição.
Deste modo, a pretensão manifestada pelo Recorrente só poderá ser acolhida se da análise dos termos em que o recurso vem interposto resultar que a questão nele colocada, pela sua relevância jurídica ou social, se reveste de importância fundamental ou que a sua admissão é claramente necessária para uma melhor aplicação do direito.
Vejamos, pois, se tais requisitos se verificam in casu socorrendo-nos para isso da matéria de facto seleccionada no Acórdão recorrido.

2. O Autor, em representação de dois dos seus associados, requereu, no TAF do Porto, a extensão de efeitos do acórdão proferido naquele Tribunal na acção que correu termos sob o n.º 2001/07.9BEPRT, formulando os pedidos acima enunciados.
O TAF julgou verificada a excepção dilatória, suscitada pelo Réu, relativa à caducidade do direito de requerer a extensão dos efeitos do referido Acórdão e, em consequência, absolveu o R. da instância. Para tanto ponderou o seguinte:
Dispõe o art.° 161.°, n.º 3, do CPTA (na versão anterior ao Decreto-Lei n.º 214-G/2015, de 2/10,) que, “para o efeito do disposto no n.° 1 … o interessado deve apresentar, no prazo de um ano contado da data da última notificação de quem tenha sido parte no processo em que a sentença foi proferida um requerimento dirigido à entidade administrativa que, nesse processo, tenha sido demandada” (sublinhado e negrito nosso).
Trata-se de um requisito de natureza processual do pedido de extensão de efeitos, cuja falta impossibilita a apreciação do respectivo mérito, nomeadamente quanto a saber se estão preenchidos os restantes elementos constitutivos materiais da pretensão, enunciados nos n.º 1 e 2 do art.° 161.° (cfr. o acórdão do TCA Sul de 21/11/2013, proc. n.° 05438/09, publicado em www.dgsi.pt).
No caso concreto, extrai-se da factualidade provada que as partes no processo n.º 2001/07.9BEPRT foram notificadas do acórdão estendendo através de ofícios com data de 22/07/2014, terça-feira (cfr. ponto 2 dos factos provados). Tal significa que as partes se consideraram notificadas no dia 25/07/2014 (sexta-feira, por aplicação adaptada da regra prevista no art.° 248.° do CPC (ex vi art.° 25.° do CPTA, na redacção anterior ao Decreto-Lei n.° 214-G/2015, de 2/10).
Ora, sendo o prazo de um ano para a apresentação do requerimento um prazo de caducidade e peremptório, o mesmo conta-se nos termos do art.° 279.° do Código Civil, sem qualquer interrupção, e o seu decurso opera a extinção do direito de praticar o ato.
Assim, temos que a contagem daquele prazo se iniciou no dia 26/07/2014 (dia seguinte ao da notificação do acórdão estendendo), terminando no dia 26/07/2015. No entanto, por se tratar de um domingo, o seu termo transferiu-se para o primeiro dia útil seguinte, ou seja para o dia 27/07/2015, segunda-feira [cfr. art.° 279.°, alínea e), do Código Civil).
Sucede, porém, que os requerimentos para a extensão extrajudicial dos efeitos do acórdão em causa foram apresentados pelos associados do A. nos dias 25/09/2015 e 29/09/2015 (cfr. pontos 3 e 4 dos factos provados), já depois do termo do prazo legal de um ano concedido para esse efeito.
Por conseguinte, conclui-se que não foi cumprido o requisito de ordem processual legalmente exigido para que os associados do A. possam ver apreciado o mérito da sua pretensão, o que, portanto, obsta ao conhecimento dos pedidos.”

O Autor apelou para o TCA mas este negou provimento ao recurso com a seguinte fundamentação:
“Entre os objectivos deste mecanismo processual que consagra um direito substantivo, o de o interessado ver estendidos os efeitos de uma sentença proferida num processo em que não foi parte, são apontados normalmente os seguintes: 1º - o descongestionamento da litigância nos tribunais administrativos, não os sobrecarregando com processos em massa; 2º - a promoção da igualdade de tratamento entre situações iguais e 3º - a garantia uma resposta célere na resolução de questões entre a Administração e os particulares (cfr. Diogo Freitas do Amaral e Mário Aroso de Almeida, Grandes Linhas da Reforma do Contencioso Administrativo, Coimbra, 2002. Página 106, citados por Ana Celeste Carvalho em http://www.e-publica.pt/v3n1a05.html).
Esta norma não tem subjacente tutelar ou acautelar qualquer expectativa ou legítimo interesse de quem não utilizou a via contenciosa para impedir a lesão dos seus direitos ou legítimos interesses (tanto assim que equipara os que recorreram à via judiciária e os que não recorreram).
Assim como respeita, ao contrário do que sustenta o Recorrente, o princípio da igualdade, da segurança jurídica e da protecção da confiança dos cidadãos.
O n.º 3 não afasta em exigência de que a decisão cujos efeitos se pretendem ver estendidos a quem não foi parte no processo tenha transitado em julgado e que resulta do n.º 1 do mesmo preceito.
Este é um pressuposto essencial para se poder requerer a extensão dos efeitos de uma decisão e que é perfeitamente consentâneo com os princípios da igualdade, da segurança jurídica e da protecção da confiança dos cidadãos.
Não se impede, por esta via, como é evidente, que as partes que decaíram num processo recorram.
O que veda é a possibilidade de extensão do julgado a quem não foi parte no processo antes do trânsito em julgado da decisão.
A este pressuposto acresce a exigência de fazer um requerimento à Administração para estender os efeitos do julgado, no prazo de um ano, contado - como expressa e inequivocamente se dispõe no n.º 3 do artigo 161º do CPTA, na redacção anterior ao Decreto-Lei n.º 214-G/2015, de 02.10 - da data da última notificação de quem tenha sido parte no processo.
Ou seja, este prazo de um ano está limitado, à partida e por vontade expressa do legislador, pelo momento do trânsito em julgado. Podendo até não existir direito a pedir a extensão do julgado se o trânsito se verificar para além do referido prazo de um ano, o que, em caso de haver recurso, provavelmente sucederá.
Precisamente porque estão aqui em causa, pelo menos em primeira linha, interesses gerais de segurança e uniformidade de tratamento de situações iguais, diminuição da litigiosidade e celeridade processuais; e não interesses individuais de ver uma situação jurídica concreta resolvida de determinada maneira.
Daí que se exija, não só o anterior trânsito em julgado de 5 sentenças proferidas no mesmo sentido (3 nos processos em massa) como o trânsito em julgado da decisão cujos efeitos se pretendem ver estendidos. Ou seja, exige-se a pacificação do litígio mesmo neste último processo, prevendo-se o mecanismo, por regra, apenas nas hipóteses em que todas as partes no processo se conformam com o decidido em primeira instância.
Sendo a solução legal perfeitamente compatível com os objectivos, razoáveis, visados.
Termos em que se impõe manter a decisão recorrida e, assim, negar provimento ao recurso.”

3. O Sindicato Autor discorda dessa decisão e, por isso, requer a admissão desta revista para se reaprecie a questão que identifica do seguinte modo:
“A questão relevante para contagem do prazo em causa reside em determinar quando se inicia essa contagem, se no momento da notificação ou no do trânsito em julgado da sentença estendenda.
O Acórdão recorrido envereda por uma interpretação puramente literal da norma prevista no n.º 3 do art. 161.º do CPTA, que estipula o prazo de um ano contado da data da última notificação de quem tenha sido parte no processo.
Porém, há que interpretar esta norma à luz do estatuído nos n.ºs 1 e 2, do mesmo artigo, que indicam que a sentença estendenda esteja transitada (art. 161, n.º 1, do CPTA), e que se verifique no momento em que a extensão de efeitos é requerida, cinco decisões transitadas no mesmo sentido (Art.º 161.º, n.º 2 do CPTA).”

4. A questão que se suscita nesta revista é a de identificar a data em que se começa a contar o prazo para os interessados requererem a extensão de efeitos da sentença.
As instâncias, atendo-se ao que decorre da letra da lei - n.º 3 do art.º 161.º do CPTA - sinalizaram o início daquele prazo na data da última notificação de quem tinha sido parte no processo onde foi proferida a sentença estendenda, decisão com o que Recorrente não concorda por entender que esse prazo se começa a contar a partir do seu trânsito em julgado por ser esse o entendimento que resulta dos n.ºs 1 e 2 do citado normativo.
Todavia, redacção daquele n.º 2 foi alterada pelo DL 214-G/2015, de 2/10, o que, desde logo, desaconselha a admissão da revista uma vez que a questão que o Recorrente suscita muito dificilmente será replicada.
Deste modo, é seguro que a problemática trazida neste recurso perdeu relevo, não podendo ser já considerada de importância fundamental para o efeito da sua admissão.
E, por outro lado, não se mostra que a revista seja necessária para melhor aplicação do direito, tanto mais quanto é certo que o Acórdão recorrido seguiu uma linha de orientação plausível e fundamentou com razoabilidade a sua decisão na lei directamente aplicável ao caso.
Daí que se não verifiquem os requisitos estabelecidos no art.º 150.º do CPTA para a admissão deste recurso.

DECISÃO

Termos em que os Juízes que compõem este Tribunal acordam em não admitir a revista.
Custas pelo Recorrente.
Lisboa, 6 de Julho de 2017. – Costa Reis (relator) – Madeira dos Santos – São Pedro.