Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0133/21.0BEPRT
Data do Acordão:05/10/2023
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:PEDRO VERGUEIRO
Descritores:IMPUGNAÇÃO JUDICIAL
TAXA DE OCUPAÇÃO DO SUBSOLO
REPERCUSSÃO FISCAL
CONSUMIDORES
JUROS INDEMNIZATÓRIOS
Sumário:I - A repercussão fiscal consiste na transferência do imposto que legalmente incide sobre um sujeito passivo, para um terceiro, alheio à relação jurídica tributária, com quem aquele tem relações económicas. Nas palavras de alguns autores, o repercutido será um mero "contribuinte de facto" (titular da capacidade contributiva), por contraposição ao "contribuinte de direito", aquele a quem é juridicamente exigível o pagamento do tributo.
II - A norma constante do art. 85º nº 3, da Lei do OE/2017 para 2017 (Lei nº 42/2016, de 28-12), ostenta validade ou conformidade constitucional e plena eficácia, assim produzindo efeitos desde 01-01-2017, passando a ser ilegal a repercussão da TOS nos consumidores.
III - A circunstância da entidade que praticou o acto lesivo (repercussão ilegal) ser uma entidade privada, uma sociedade anónima, não determina a sua exclusão do âmbito de aplicação do art. 43º nº 1 da LGT, interpretado em conformidade com o art. 22º da CRP.
IV - No contexto de facto e de direito que emerge dos autos, é de considerar a sociedade comercializadora de gás ora recorrida integrada no conceito de "serviços" consagrado no citado art. 43º nº 1 da LGT, o que significa que não existe qualquer obstáculo em reconhecer à sociedade recorrente o direito de reaver o que ilegalmente lhe foi exigido e pagou e, bem assim, o direito a receber o valor correspondente aos juros indemnizatórios.
Nº Convencional:JSTA000P30973
Nº do Documento:SA2202305100133/21
Data de Entrada:04/13/2022
Recorrente:A..., S.A. - SUCURSAL EM PORTUGAL
Recorrido 1:B..., S.A.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral:

Processo n.º 133/21.0BEPRT (Recurso Jurisdicional)



Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

1. RELATÓRIO

“A..., S.A. - SUCURSAL EM PORTUGAL”, devidamente identificada nos autos, inconformada, veio interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, datada de 31-12-2021, que julgou procedente a pretensão deduzida por “B..., S.A.” no presente processo de IMPUGNAÇÃO relacionado com a Taxa Municipal de Ocupação de Subsolo (TOS), do período de Março de 2018, no montante de € 9.904,09, incluída na factura n.º ...75, emitida em 04-04-2018 pela ora Recorrente.


Formulou nas respectivas alegações, as seguintes conclusões que se reproduzem:

“ (…)

A. A douta veio erradamente, do ponto de vista da apreciação do direito, sustentar que assiste razão à Recorrida na sua alegação de ilegalidade da repercussão da taxa municipal de ocupação do subsolo, por essa repercussão ter sido proibida, em face da tese defendida, pelo artigo 85.º, n.º 3, da Lei n.º 42/2016, de 28 de Dezembro.

B. A sentença recorrida sustenta que assiste razão à Recorrida na sua alegação de ilegalidade da repercussão da taxa municipal de ocupação do subsolo, por essa repercussão ter sido proibida, em face da tese defendida, pelo artigo 85.º, n.º 3, da Lei n.º 42/2016, de 28 de dezembro, ao referir que “(…) a partir de 01/01/2017, com a entrada em vigor do art.º 85.º, n.º 3, da Lei n.º 42/2016, de 28/12 (Lei do Orçamento do Estado para 2017), passou a prever-se que a TOS era paga pelas empresas operadoras de infraestruturas, não podendo ser refetida (entenda-se repercutida) na fatura dos consumidores".

C. A douta sentença, de que se recorre, entende que “(...) o art. º 70.º do D.L. n. º 25/2017, de 3/3 (que estabeleceu as normas de execução do Orçamento do Estado paro 2017), não afastou tal proibição de repercussão da TOS aos consumidores finais, ao prever, nos seus n.ºs 4 e 5, que as entidades reguladoras sectoriais avaliavam a informação recolhida (pelos municípios) e as consequências no equilíbrio económico-financeiro das empresas operadoras de infraestruturas e que, tendo em conta essa avaliação, o Governo procedia à alteração do quadro legal em vigor, nomeadamente em matéria de repercussão das taxas na fatura dos consumidores”.

D. Nesta linha de raciocínio, da qual a Recorrente discorda, foi entendimento do tribunal “a quo”, que “um Decreto-Lei de execução orçamental não tem a virtualidade de afastar a aplicação de uma Lei do Orçamento do Estado, sendo que o referido art.º 85º, n.º 3, não estabelece qualquer requisito ou limitação à sua aplicação imediata (leia-se, a partir de 01/01/2017), sendo claro ao afirmar que a TOS é paga pelas empresas operadoras de infraestruturas e que não pode ser refletida na fatura dos consumidores”.

E. Para a douta sentença “(…) o art.º 70º, n.º 5, do D.L. n.º 25/2017, de 3/3, limita-se a deixar aberta a possibilidade de o legislador, em face da avaliação das consequências no equilíbrio económico-financeiro das empresas operadoras de infraestruturas, alterar a proibição de repercussão constante do art.º 85º, n.º 3, da Lei n.º 42/2016, de 28/12”, para a qual não se afigura plausível que estabeleça regras incompatíveis ou impeditivas da aplicação das normas imperativas previstas nesse Orçamento.

F. Não tem em absoluto razão o tribunal “a quo”, pelo que senão não fazia absoluto sentido o que resulta do n.º 5 do artigo 70.º, que é claro e evidente ao estabelecer que o fim da repercussão está dependente do Governo alterar o quadro legal em vigor, o que até à presente data não verificou.

G. Ainda que se pudesse legitimamente questionar, se tal referência ao quadro legal, incluía a questão da repercussão, a identificada disposição legal refere expressamente a questão da repercussão nos consumidores finais, ao dizer taxativamente “… nomeadamente, em matéria de repercussão das taxas dos consumidores”.

H. Conclusão distinta deveria ter sido retirada da interpretação de direito da norma do artigo 85.º, da Lei do Orçamento de Estado, conjugada com aquela que resulta do artigo 70.º do Decreto-Lei de Execução Orçamental, bem como, das normas das leis orçamentais que se seguiram.

I. Não houve por parte da Recorrente qualquer desrespeito da Lei 42/2016, de 28 de dezembro, nem qualquer ilegalidade ao ter procedido à repercussão da taxa municipal de ocupação do subsolo, pelo que outra solução de direito se impunha que tivesse sido adotada pelo tribunal “a quo”, pois, na presente data não se pode considerar como proibida a repercussão da taxa de ocupação do subsolo, visto que a norma do artigo 85.º, n.º 3, da LOE de 2017, não tinha o efeito de automaticamente impor que a recorrente deixasse de repercutir a referida taxa nos consumidores finais.

J. Não resulta de tal disposição legal uma imperatividade quanto ao termo da repercussão taxa de ocupação do subsolo nos consumidores finais, mas somente um objetivo que no futuro quadro legal tal viesse a ser consagrado.

K. Só desta forma se poderá articular a redação do artigo 85.º, n.º 3, com o artigo 70.º, n.º 5, do Decreto-Lei de Execução Orçamental (sobre a Lei de Orçamento de Estado para 2017), visto que é, por mais evidente, que a referida aplicação condicionada pelo referido Decreto-Lei de Execução Orçamental, porque a não ser assim, será pouco compreensível a necessidade de as leis orçamentais posteriores voltarem a fazer referência à extinção da TOS.

L. Nos termos do 6.º, n.º 1, al. c), do RGTAL, podem ser cobras taxas pela “utilização e aproveitamento de bens do domínio público e privado municipal'', visto que a Lei n° 53-E/2006, de 29 de dezembro, veio permitir a criação de taxas por regulamento aprovado pelo respetivo órgão deliberativo autárquico, em que ficou expressamente fixado, como uma das bases de incidência objetiva das mesmas, a utilização e aproveitamento de bens do domínio público e privado municipal.

M. Nos termos do referenciado artigo 6.º, n.º 1, al. c), da Lei n.º 53-E/2006, de 29 de Dezembro, “As taxas municipais incidem sobre utilidades prestadas aos particulares ou geradas pela atividade dos municípios, designadamente: (...) c) Pela utilização e aproveitamento de bens do domínio público e privado municipal".

N. Nos termos do artigo 7.º, n.ºs 1 e 2, do mencionado diploma legal, o sujeito ativo da relação jurídico-tributária geradora da obrigação de pagamento das taxas é a autarquia local titular do direito de exigir a prestação, sendo sujeito passivo a pessoa singular ou coletiva e outras entidades legalmente equiparadas que estejam vinculados ao cumprimento da prestação tributária.

O. Estas taxas são criadas por regulamento, dos quais deve constar a incidência objetiva e subjetiva; o valor ou a fórmula de cálculo do valor das taxas a cobrar; a fundamentação económico financeira relativa ao valor das taxas; as isenções; o modo de pagamento e a admissibilidade de pagamento em prestações, bem como as regras relativas à liquidação e cobrança destes tributos.

P. Através da Resolução do Conselho de Ministros n.º 98/2008, de 8 de abril, foram aprovadas as minutas dos novos contratos de concessão de serviço público de distribuição regional de gás natural, onde se preveem que os custos com as taxas de ocupação do subsolo (TOS) são suportados pelos consumidores de gás natural de cada Município, por via das respetivas faturas do fornecimento do gás natural, emitidas pelas empresas concessionárias de distribuição de gás natural que operam na área de cada Município.

Q. De acordo com as sentenças proferidas em outros processos do TAF do Porto, nomeadamente, as ocorridas no processos n.ºs 847/21.4BEPRT e 75/21.9BEPRT, da Resolução do Conselho de Ministros n.º 98/2008, de 23 de junho, resulta de modo claro e evidente que "... é necessária a realização de uma avaliação pela Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos (ERSE) das consequências no equilíbrio económico-financeiro das empresas operadoras de infraestruturas e só perante essa avaliação é que o Governo procederá à alteração do quadro legal em vigor, designadamente, do regime jurídico da distribuição de gás natural ou do regime geral das taxas das autarquias locais, cuja revisão estava, de resto, prevista e autorizada pelo artigo 85° da Lei nº 42/2016, nomeadamente em matéria de repercussão da TOS na fatura dos consumidores, o que até à presente data, ainda não sucedeu".

R. Nos termos legais, o valor de tais taxas de ocupação do subsolo resulta de decisão aprovada em cada Assembleia Municipal, diferindo assim de Município para Município, pelo que, em cumprimento legal, em cada Município são repercutidos nos consumidores os valores efetivamente cobrados pela respetiva autarquia ao operador de rede.

S. Compete à ERSE definir a metodologia de repercussão nos consumidores das TOS aprovadas por cada Município, pelo que a metodologia aprovada assegura que a imputação das TOS é efetuada em função dos custos das redes de distribuição, dando a recorrente cumprimento ao que resulta da lei em vigor, bem como às orientações de ERSE, nomeadamente, identificando de forma clara, visível e destacada o valor correspondente à taxa de ocupação do subsolo, o município a que se destina e o ano a que respeita.

T. Neste sentido, não existe ilegalidade, e tanto assim é, que, em 11.01.2021, por via do despacho n.º 315/2021, foi constituído um grupo de trabalho com o objetivo de alterar o quadro legal enquadrador da TOS atualmente em vigor, nos termos estabelecidos pelo artigo 85.º da Lei n.º 42/2016, de 28 de dezembro, artigo 70.º do Decreto-Lei n.º 25/2017, de 3 de março, e artigo 246.º da Lei n.º 71/2018, de 31 de dezembro.

U. Ora, diferentemente do entendimento do tribunal “a quo”, tal significa que o quadro-legal ainda não foi modificado, apesar do constante no artigo 85.º, n.º 3, da Lei n.º 42/2016, de 28 de dezembro (Lei do Orçamento de Estado para 2017), visto que apesar do n.º 3 do artigo 85.º da Lei n.º 42/2016, de 28 de dezembro, ter determinado, de forma programática, que a taxa municipal de direitos de passagem e a taxa municipal de ocupação do subsolo são pagas pelas empresas operadoras de infraestruturas, não podendo ser refletidas na fatura dos consumidores, a mesma acabou até à presente data por ser concretizada.

V. Essa norma não era autoexecutável, pelo que teve ser concretizada pelo artigo 70.º do Decreto- Lei n.º 25/2017, de 3 de março (Normas de Execução do Orçamento de Estado para 2017), onde ficou definido que o Governo procederia à alteração do quadro legal em vigor, nomeadamente em matéria de repercussão das taxas na fatura dos consumidores, o que só pode ser interpretado no sentido que o artigo 85.º da Lei n.º 42/2016, de 28 de dezembro, não determinou automaticamente o fim da repercussão das taxas na fatura dos consumidores.

W. Pelo que existiu erro de julgamento pelo douto tribunal “a quo”.

X. O artigo 246.º da Lei n.º 71/2018, de 31 de dezembro (Lei do Orçamento de Estado para 2019), veio estabelecer que o Governo procederá à revisão do quadro legal enquadrador da taxa de ocupação do subsolo em vigor, nomeadamente em matéria de repercussão das taxas na fatura dos consumidores, pelo que, diferentemente do entendimento expresso na sentença de que se recorre, a pretérita Lei do orçamento de Estado para 2017 não eliminou a repercussão da taxa municipal de ocupação do subsolo.

Y. A não ser assim, o que mera tese académica se equaciona, não faria sentido os atos legislativos que se lhe seguiram, uma vez que, posteriormente, a lei do orçamento de Estado de 2019, fala-se no objetivo de colocar termo à repercussão da TOS na fatura dos consumidores, pelo que a mesma ainda não estava concretizada.

Z. A identificada lei do orçamento de Estado de 2019 refere, complementarmente, que a alteração legislativa a efetuar e, portanto, ainda não concretizada, deve ter incidência na efetiva ocupação do subsolo e assegurar a fixação de um limite mínimo e máximo indicativo do valor das taxas de ocupação do subsolo para os fornecimentos em BP < e para os fornecimentos em BP > e MP por parte dos municípios, atendendo aos princípios da objetividade, proporcionalidade e não discriminação.

AA. Por este motivo, o despacho n.º 315/2021, criou um grupo de trabalho, com o escopo de regulamentar o mecanismo da repercussão aos consumidores.

BB. Logo, a sua cobrança é legal! E a decisão do tribunal "a quo" padece de erro de julgamento.

CC. Esta situação não se alterou com a entrada em vigor da Lei n.º 75-B/2020, de 31 de dezembro, uma vez que o legislador voltou a consagrar no seu artigo 133.º uma alteração no sentido de as empresas não poderem cobrar TOS aos consumidores - "A taxa municipal de direitos de passagem e a taxa municipal de ocupação de subsolo são pagas pelas empresas operadoras de infraestruturas, não podendo ser cobradas aos consumidores." mas, uma vez mais, tal norma programática carece de regulamentação, uma vez que dispõe o n.º 3, da referida disposição legal, que "No primeiro semestre de 2021, o Governo procede às alterações legislativas necessárias à concretização do disposto no n.º 1".

DD. Essa falta de regulamentação autoriza que a Recorrida continue legitimamente a refletir na fatura do consumidor final os valores relativos às taxas de ocupação de subsolo (TOS), pelo que desde a inclusão pela primeira vez de disposição conducente ao términus da repercussão da TOS nos consumidores, que foi objeto de inclusão em todas as leis orçamentais posteriores, a verdade é que a mesma consubstanciou apenas um objetivo programático.

EE. A sua definitiva implementação no ordenamento jurídico ficou dependentes dos termos previstos no Decreto-Lei n.º 25/2017, de 3 de março - lei de execução orçamental, o que implicava um conjunto de procedimentos que deviam ocorrer até que efetivamente a taxa deixasse de ser cobrada ao consumidor final.

FF. Apenas nesse sentido se compreendem as afirmações dos responsáveis políticos, como seja o Secretário de Estado da Energia, quando referiu que, “Da parte do Governo, estando reunidas as condições que são necessárias, quer das autarquias, quer do regulador, será o mais rápido possível, no sentido de que é a obrigação do Governo de cumprir o que está estabelecido no Orçamento do Estado".

GG. A única leitura que se pode retirar, é que a medida feita constar na lei de orçamento de Estado ainda se encontra por cumprir, pelo que o fim da repercussão da TOS nos consumidores não decorria de modo automático do artigo 85.º da Lei de Orçamento de Estado para 2017, nem das normas das leis orçamentais que se lhe seguiram, pois em tudo aquilo que se seguiu, sempre se fez referência a que o Governo procederia à revisão do quadro legal enquadrador da taxa de ocupação do subsolo em vigor, nomeadamente em matéria de repercussão das taxas na fatura dos consumidores.

HH. Ora, diferentemente do entendimento da Recorrente, se tal proibição de repercussão foi imediata, como sustenta, por que razão teve o legislador a necessidade de continuar a fazer constar a referência a esta matéria nas leis orçamentais subsequentes e, bem assim, a criar um grupo de trabalho sobre a matéria.

II. A conclusão apenas pode ser uma, e é que a repercussão que se pretende deixar de efetuar ainda não se pode considerar aplicada e que, portanto, não foi o quadro legal alterado, apesar do que foi estabelecido na Lei de Orçamento de Estado para 2017.

JJ. Aliás, posteriormente vem referir que a alteração legislativa a efetuar, tal como estabelecido pelo n.º 2 do artigo 246.º, deve assentar a incidência na efetiva ocupação do subsolo e assegure a fixação de um limite mínimo e máximo indicativo do valor das taxas de ocupação do subsolo, atendendo aos princípios da objetividade, proporcionalidade e não discriminação, pelo que a repercussão da taxa não era automática pela disposição orçamental, como o próprio Governo reconhece, uma vez que existiam condições que se tinham de verificar para que tal ocorresse.

KK. Só após este processo, o Governo procederia à alteração do quadro legal em vigor, nomeadamente em matéria de repercussão das taxas na fatura dos consumidores, pelo que até lá a repercussão é legal continuar a recair sobre os estes, visto que essa operacionalização estava dependente de normas de execução, que o legislador na sua concretização adiou com o estabelecimento da necessidade de uma iniciativa legislativa do Governo para "alteração do quadro legal em vigor”.

LL. Aliás ao invés da norma orçamental, com que o tribunal “a quo” funda a sua decisão que, salvo o devido respeito padece de erro de apreciação da matéria de direito, as propostas do quadro legal vão num sentido totalmente diverso - a possibilidade de repercussão das taxas no consumidor final tem como contraponto um desenvolvimento das regras de transparência e a impossibilidade de repercussão nos consumidores finais de valores superiores aos cobrados pelos respetivos municípios junto dos operadores de rede de distribuição a título de taxa de ocupação do subsolo. Permite também a manutenção do equilíbrio económico-financeiro das empresas operadoras de infraestruturas que, a não se verificar, onerará em igual proporção o contribuinte", bem como avança como solução para o quadro legal que "As empresas operadoras de redes de distribuição de gás podem repercutir os valores efetivamente pagos aos respetivos municípios a título de TOS e apenas esses valores podem ser repercutidos pelos comercializadores no consumidor final.

MM. Esta posição, aqui defendida encontra respaldo nas sentenças proferidas pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, nos processos n.ºs 847/21.4BEPRT e 75/21.9BEPRT, onde se veio a considerar, conforme o que aqui se sustenta, que ao não existir um novo quadro legal, persiste a possibilidade legal de repercussão da taxa de ocupação do subsolo nos consumidores, pelo que a mesma não padece de ilegalidade.

NN. As referidas decisões são claras e perentórias quando afirmam que "do n.º 3 do artigo 85.º da Lei n.º 42/2016 não resulta uma imperatividade de não repercussão da TOS nos consumidores finais, mas somente um objetivo que no futuro quadro legal tal viesse a ser consagrado. Por outras palavras, decorre que "(...) na TOS - o legislador não deixou expressa, de forma imediata, a inoperatividade da norma, tendo vindo a fazê-lo mais tarde, com a aprovação do disposto no já mencionado n.º 5 do artigo 70.º do Decreto-Lei n.º 25/2017, ao aí afirmar que "tendo em conta a avaliação referida no número anterior [o estudo encomendado ao regulador sobre o impacto económico da modificação legislativa pretendida pelo artigo 85.º da Lei n.º 42/2016], o Governo procede à alteração do quadro legal em vigor, nomeadamente em matéria de repercussão das taxas na factura dos consumidores".

OO. Logo, ter-se-á de "concluir que - contrariamente até ao que desejariam algumas forças políticas parlamentares, como é o caso do PCP que apresentou uma proposta de lei no sentido de imprimir retroactivamente eficácia operativa directa à norma do artigo 85.º da Lei n.º 42/2016, por via de uma alegada interpretação autêntica da mesma [Em rodapé: Cf. Projecto de Lei n.º 583/XIII/2.º.] - o Governo e os municípios sempre interpretaram e assumiram que o disposto no n.º 3 do artigo 85.º da Lei n.º 42/2016 era um preceito normativo que carecia de alterações legislativas posteriores em outros diplomas legais - designadamente na lei das comunicações e no regime jurídico da distribuição de gás natural ou na lei do regime geral das taxas das autarquias locais, cuja revisão estava, de resto prevista e autorizada pelo artigo 86.º da Lei n.º 42/2016 - para poder produzir os seus efeitos jurídicos em concreto, o que, até ao momento, não sucedeu".

PP. A proibição de repercussão prevista no n.º 3 do artigo 85.º da Lei OE 2017 não operou de forma imediata, não produziu efeitos jurídicos imediatos, pois encontra-se dependente do cumprimento das condições vertidas nos n.ºs 4 e 5 do artigo 70° do Decreto-Lei n.º 25/2017, que são necessárias à execução do referido normativo.

QQ. Como referem as mencionadas decisões “a eficácia, que é condição de vigência de uma norma, é independente da sua validade", pelo que uma norma pode ser válida, e ainda assim não ser eficaz por não conseguir projetar, total ou parcialmente, os seus efeitos no plano fáctico, que é o caso do n.º 3 do artigo 85.º da Lei OE 2017.

RR. Logo, não tendo ainda o Governo voltado a legislar sobre essa matéria, será de concluir que se mantém o mesmo quadro legal, permite de forma expressa a repercussão da TOS sobre os consumidores. E, tanto assim é, que como afirmam as doutas sentenças, veio o legislador no artigo 246.º da Lei n.º 71/2018, de 31/12 (LOE 2019), sob a epígrafe "Quadro legal enquadrador das taxas de ocupação do subsolo", prever que: "1 - O Governo procede, até final do 1.º semestre de 2019, à revisão do quadro legal enquadrador da taxa de ocupação do subsolo em vigor, nomeadamente em matéria de repercussão das taxas na fatura dos consumidores; 2 - A alteração legislativa prevista no número anterior deve assentar a incidência na efetiva ocupação do subsolo e assegurar a fixação de um limite mínimo e máximo indicativo do valor das taxas de ocupação do subsolo para os fornecimentos em BP (menor que) e para os fornecimentos em BP (maior que) e MP por parte dos municípios, atendendo aos princípios da objetividade, proporcionalidade e não discriminação".

SS. E, conforme acima se referiu, e que mereceu acolhimento nas citadas sentenças, mais recentemente, o artigo 133.º da Lei n.º 75-B/2020, de 31/12 (Lei do Orçamento de Estado 2021), sob a epígrafe "Taxa municipal de direitos de passagem e taxa municipal de ocupação do subsolo", voltou a prever que "A taxa municipal de direitos de passagem e a taxa municipal de ocupação de subsolo são pagas pelas empresas operadoras de infraestruturas, não podendo ser cobradas aos consumidores." (n.º 1), agora acrescentando, no seu n.º 2, que "O presente artigo tem caráter imperativo sobrepondo-se a qualquer legislação, resolução ou regulamento em vigor que o contrarie", mais dispondo no seu n.º 3 que "No primeiro semestre de 2021, o Governo procede às alterações legislativas necessárias à concretização do disposto no n.º 1".

TT. Tendo, nesse seguimento, sido constituído um grupo de trabalho com o objetivo de alterar o quadro legal da TOS - cfr. Despacho n.º 315/2021, de 11 de janeiro, dos Ministro de Estado e das Finanças, Ministra da Modernização do Estado e da Administração Pública e Ministro do Ambiente e da Ação Climática, fixando o prazo de quatro meses para apresentação da proposta de alteração legislativa [e o despacho n.º 5983/2021, de 18/06, que prorroga, por três meses, o mandato do grupo de trabalho],

UU. Tal como é referido neste Despacho n.º 315/2021, de 11 de janeiro, publicado no Diário da República n.º 6, II série, "Considerando que, através do n.º 3 do artigo 85.º da Lei n.º 42/2016, de 28 de dezembro (Lei do Orçamento de Estado para 2017), ficou determinado que a taxa municipal de direitos de passagem e a taxa municipal de ocupação do subsolo são pagas pelas empresas operadoras de infraestruturas, não podendo ser refletidas na fatura dos consumidores, concretizando o artigo 70.º do Decreto-Lei n.º 25/2017, de 3 de março (Normas de Execução do Orçamento de Estado para 2017), que o Governo procederá à alteração do quadro legal em vigor, nomeadamente em matéria de repercussão das taxas na fatura dos consumidores".

VV. Assim, haverá de concluir, como fazem as aludidas sentenças que “... se a proibição de repercussão da TOS tivesse, de facto, produzido efeitos imediatos com o n.º 3 do artigo 85.º da Lei n.º 42/2016, de 28 de dezembro, que aprovou o Orçamento do Estado (OE) para 2017, não seria necessário voltar a aludir, nas Leis do Orçamento posteriores, à intenção de pôr fim à repercussão da taxa nas faturas dos consumidores, nem seria necessário criar o referido grupo de trabalho em 2021, visando, e como ali expressamente se refere, almejar "o fim da repercussão da TOS na fatura dos consumidores".

Pelo exposto,

Deve ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se a decisão do Tribunal “a quo”, fazendo-se


INTEIRA JUSTIÇA”

A Recorrida “B..., S.A.” apresentou contra-alegações, nas quais enuncia as seguintes conclusões:

“…

A. A TOS é liquidada pelo Município da Maia ao distribuidor de gás natural (a C..., S.A.), tendo vindo a ser, a final, suportada através do mecanismo da repercussão legal pela Impugnante, ora Recorrida, através da fatura n.º...75, da A... S.A. - Sucursal em Portugal, emitida a 4 de abril de 2018.

B. No entanto, o artigo 85.º, n.º 3, da Lei do Orçamento do Estado para 2017 determina que a "taxa municipal de direitos de passagem e a taxa municipal de ocupação do subsolo são pagas pelas empresas operadoras de infraestruturas, não podendo ser refletidas na fatura dos consumidores(negritos nossos).

C. Assim, sem prejuízo de - mesmo após a entrada em vigor da Lei do Orçamento do Estado para 2017 - a TOS ter continuado a ser repercutida à ora Recorrida, sendo esta consumidora de gás natural, a repercussão da TOS, nomeadamente a efetuada através da fatura acima identificada é ilegal, por violação do artigo 85.º, n.º 3, da LOE 2017.

D. O quadro normativo em que se baseava a possibilidade de repercussão legal foi profundamente alterado com o artigo 85.º, n.º 3, da LOE 2017.

E. Assim, desde o dia 1 de janeiro de 2017 que as taxas municipais de ocupação do subsolo não podem ser suportadas pelos consumidores.

F. Por outras palavras, sendo a ora Recorrida consumidora final de Gás, esta não poderá suportar a TOS por repercussão legal.

G. A TOS é uma taxa municipal criada e liquidada pelos respetivos municípios pela “utilização e aproveitamento de bens do domínio público e privado municipal”.

H. Conforme previsto na Resolução do Conselho de Ministros n.º 98/2008 que aprovou as minutas dos contratos de concessão de serviço público de distribuição regional de gás natural a celebrar entre o Estado Português e as distribuidoras, existe a possibilidade de repercussão das TOS nos consumidores de gás natural de cada Município.

I. Perante este contexto, a relação jurídico-tributária aqui em discussão processa-se nos seguintes moldes: a Câmara Municipal da Maia liquida uma taxa ao distribuidor de gás natural (a D..., S.A.), que é repercutida ao comercializador (a A... S.A. – Sucursal em Portugal) que, por sua vez, a repercute no consumidor final de gás natural, a ora Recorrida.

J. Do quadro descrito tal como estava estabelecido resultava a existência de um mecanismo de repercussão legal da TOS nos consumidores finais pelas concessionárias.

K. Todavia, desde 1 de janeiro de 2017 que foi expressamente consagrada a proibição de fazer repercutir no consumidor final as taxas municipais de ocupação do subsolo (cfr. artigos 85.º, n.º 3, e 276.º, da LOE 2017).

L. Não obstante a sua ilegalidade, a repercussão que tem vindo a ser efetuada à ora Recorrida encontra a sua razão de ser no facto de o Repercutente fazer uma interpretação errada do quadro jurídico em vigor, nomeadamente do artigo 85.º, n.º 3, da Lei do Orçamento do Estado para 2017.

M. Ou seja, reitera-se, o que se discute na impugnação judicial é a lesão sofrida por força da repercussão de uma taxa municipal, que a Impugnante considera ser ilegal – e cuja ilegalidade foi confirmada pelo Tribunal a quo, mas que lhe continua a ser efetuada por força de um entendimento da lei que ignora os efeitos do disposto no artigo 85.º, n.º 3, da Lei do Orçamento do Estado para 2017.
N. Saliente-se, aliás, que a matéria ora em discussão já foi objeto de apreciação por parte deste douto Tribunal em várias ações intentadas contra os respetivos Municípios, tendo o Tribunal decidido pela ilegitimidade passiva dos mesmos. Assim, é na sequência destas decisões que a Impugnante, ora Recorrida, intentou novas ações, desta feita, contra a comercializadora, vindo, deste modo, acompanhar o entendimento do STA a propósito desta questão.

O. Entendimento este que tem suporte na norma do artigo 85.º, n.º 3, da LOE 2017 o qual impede que a TOS seja repercutida na Recorrida. Ora, não sendo o Município parte legítima na ação, sempre teria a Recorrente que intentar a mesma contra a entidade que lhe repercutiu indevidamente o tributo, sob pena de se considerar que a norma acima referida não produz qualquer efeito prático.

P. Do artigo 85.º, n.º 3, da LOE 2017 resultam dois imperativos claros, precisos e incondicionais: (i) a TOS tem que ser paga pelas empresas operadoras de infraestruturas; e (ii) não pode ser refletida na fatura dos consumidores.

Q. O artigo 85.º, n.º 3, não impõe qualquer requisito nem limitação à sua interpretação ou aplicação. Não se lê “sem prejuízo do disposto no número x”, “assim que y”, “verificado que esteja z”, nem tão pouco se prevê um diferimento temporal para aplicação do referido regime.

R. Mais, a norma não refere que “serão pagas” ou “poderão vir a ser pagas”, antes referindo “são pagas pelas empresas operadoras de infraestruturas, não podendo ser refletidas na fatura dos consumidores”.

S. Salienta-se que a lei é especialmente cuidadosa na terminologia utilizada ao referir que não podem ser “refletidas na fatura dos consumidores”, afastando qualquer possibilidade de repercussão legal e económica. Nada se diz sobre como operará a repercussão, para além da obrigação de a fazer cessar quanto aos consumidores.

T. Relativamente ao artigo 70.º do Decreto-Lei de Execução Orçamental – invocado pela Recorrente -, esta norma que não é exequível por si mesma, e nem sequer programática. Através dela, o legislador do Decreto-Lei de Execução Orçamental limitou-se a abrir a porta para, em função da avaliação das consequências no equilíbrio económico-financeira das empresas operadoras de infraestruturas, vir a ser alterada, por via legislativa, a proibição de repercussão que consta do artigo 85.º, n.º 3, da LOE 2017.

U. Mas, através da referida norma, o legislador não revogou a norma do artigo 85.º, n.º 3, da LOE 2017, nem sequer estabeleceu que ela terá inexoravelmente de ser revogada.

V. Repare-se que o Decreto-Lei de Execução Orçamental “contém as regras que desenvolvem os princípios estabelecidos no Orçamento do Estado para 2017, assegurando, em paralelo, uma rigorosa execução orçamental” (negritos e sublinhados nossos). De referir que o resultado interpretativo deverá ser aquele que não seja incompatível com a Lei do Orçamento do Estado para 2017.

W. Com efeito, o Decreto-Lei de Execução Orçamental existe porque existe um Orçamento do Estado e destina-se a desenvolver os imperativos deste último.

X. Relativamente ao facto de ter sido novamente inscrito no artigo 133.º da Lei do Orçamento do Estado para 2021 a proibição da repercussão da TOS nos consumidores finais, entende a Recorrida que a norma referida veio apenas reiterar novamente a proibição de repercussão, muito possivelmente, perante o incumprimento continuado das operadoras de infraestruturas. Significa igualmente que o legislador quis manter, inequivocamente, a proibição de repercussão da TOS nos consumidores finais (nomeadamente, em 2021).

Y. A Recorrida desenvolve a atividade siderúrgica e de fabricação de ferro-ligas, não se dedica à produção, distribuição, comercialização ou revenda de gás natural. Assim, tratando-se a Recorrida de uma consumidora de gás, a cobrança da TOS contraria lei expressa (cfr. artigo 3.º, al. g), do Decreto-Lei n.º 62/2020, de 28 de agosto).

Z. Assim, tendo sido repercutida na Recorrida a TOS, torna-se claro que esta repercussão é ilegal, não podendo ser limitada pelo Decreto-Lei de Execução Orçamental.
AA. Por todo o exposto, a decisão recorrida deverá ser mantida nos seus precisos termos, por ser conforme ao Direito.

BB. Por último, salienta-se ainda que para além da sentença do douto Tribunal “a quo”, o Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto tem vindo a decidir, na sua esmagadora maioria, a favor do contribuinte quanto á mesma questão facto-jurídica, nomeadamente nos processos: 841/21.5BEPRT, 2311/20.0BEPRT, 936/21.5BEPRT, 148/21.8BEPRT, 772/21.9BEPRT, 797/21.4BEPRT, 118/21.6BEPRT, 1141/21.6BEPRT, 184/21.4BEPRT, 185/21.2BEPRT, 73/21.2BEPRT, 35/21.0BEPRT, 39/21.2BEPRT, 777/21.0BEPRT, 786/21.9BEPRT, 947/21.0BEPRT, 955/21.1BEPRT.
Nestes termos e nos melhores de Direito que V. Exas. Mui doutamente suprirão, em face da fundamentação exposta e porque a sentença recorrida bem decidiu, deve esta ser mantida na ordem jurídica e, consequentemente, ser negado provimento ao recurso apresentado pela A... S.A. – Sucursal em Portugal.

O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso.

Cumpre decidir.




2. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que a matéria apontada nos autos resume-se, em suma, em apreciar a bondade da decisão recorrida quando respondeu pela positiva à matéria da invocada ilegalidade da repercussão da TOS, por violação do disposto no art. 85º nº 3 da Lei nº 42/2016, de 28-12, assumindo a validade e eficácia desta norma e bem assim o entendimento sufragado no sentido de que a repercussão da TOS em apreço nos autos resulta de um erro imputável à Impugnada, que originou o pagamento pela Impugnante de um tributo que não lhe era devido, o que lhe confere o direito a ser compensada mediante o recebimento de juros indemnizatórios, contados desde a data do pagamento indevido da taxa até à data do processamento da respectiva nota de crédito.




3. FUNDAMENTOS

3.1. DE FACTO

Neste domínio, consta da decisão recorrida o seguinte:

“…

A) Em 04/04/2018, a “A..., S.A. - Sucursal em Portugal” emitiu em nome da Impugnante, com referência ao mês de março de 2018, a fatura n.º ...75, no valor de € 551 770,31, que incluía a quantia de € 9 904,09 a título de TOS - cfr. fls. 61 a 64 do SITAF, cujo teor se dá por reproduzido.

B) Em 03/05/2018, a Impugnante procedeu ao pagamento da fatura mencionada na alínea antecedente - cfr. fls. 65 do SITAF, cujo teor se dá por reproduzido.

C) A Impugnante deduziu a presente impugnação em 14/01/2021, após a decisão de absolvição da instância do Município da Maia, por ilegitimidade passiva, proferida no processo n.º 2240/18.7BEPRT - cfr. fls. 4 a 55 e 155 a 175 do SITAF.

2. FACTOS NÃO PROVADOS

Inexistem, com relevância para a decisão da causa.

Motivação:

A convicção do Tribunal quanto aos factos dados como provados resultou da análise dos documentos, não impugnados, juntos aos autos.”


«»

3.2. DE DIREITO

Assente a factualidade apurada cumpre, então, entrar na análise da realidade em equação nos autos, sendo que a este Tribunal está cometida a tarefa de apreciar a bondade da decisão recorrida quando respondeu pela positiva à matéria da invocada ilegalidade da repercussão da TOS, por violação do disposto no art. 85º nº 3 da Lei nº 42/2016, de 28-12, assumindo a validade e eficácia desta norma e bem assim o entendimento sufragado no sentido de que a repercussão da TOS em apreço nos autos resulta de um erro imputável à Impugnada, que originou o pagamento pela Impugnante de um tributo que não lhe era devido, o que lhe confere o direito a ser compensada mediante o recebimento de juros indemnizatórios, contados desde a data do pagamento indevido da taxa até à data do processamento da respectiva nota de crédito.

Para conceder abrigo à pretensão da ora Recorrente, o Tribunal “a quo” ponderou que:

“…

a partir de 01/01/2017, com a entrada em vigor do art.º 85º, n.º 3, da Lei n.º 42/2016, de 28/12 (Lei do Orçamento do Estado para 2017), passou a prever-se que a TOS era paga pelas empresas operadoras de infraestruturas, não podendo ser refletida (entenda-se repercutida) na fatura dos consumidores.

Sendo certo que o art.º 70º do D.L. n.º 25/2017, de 3/3 (que estabeleceu as normas de execução do Orçamento do Estado para 2017), não afastou tal proibição de repercussão da TOS aos consumidores finais, ao prever, nos seus n.os 4 e 5, que as entidades reguladoras setoriais avaliavam a informação recolhida (pelos municípios) e as consequências no equilíbrio económico-financeiro das empresas operadoras de infraestruturas e que, tendo em conta essa avaliação, o Governo procedia à alteração do quadro legal em vigor, nomeadamente em matéria de repercussão das taxas na fatura dos consumidores.

Com efeito, um Decreto-Lei de execução orçamental não tem a virtualidade de afastar a aplicação de uma Lei do Orçamento do Estado, sendo que o referido art.º 85º, n.º 3, não estabelece qualquer requisito ou limitação à sua aplicação imediata (leia-se, a partir de 01/01/2017), sendo claro ao afirmar que a TOS é paga pelas empresas operadoras de infraestruturas e que não pode ser refletida na fatura dos consumidores.

De facto, o art.º 70º, n.º 5, do D.L. n.º 25/2017, de 3/3, limita-se a deixar aberta a possibilidade de o legislador, em face da avaliação das consequências no equilíbrio económico-financeiro das empresas operadoras de infraestruturas, alterar a proibição de repercussão constante do art.º 85º, n.º 3, da Lei n.º 42/2016, de 28/12.

Na verdade, se o referido Decreto-Lei de execução orçamental contém as regras que desenvolvem os princípios estabelecidos no Orçamento do Estado para 2017, não se afigura plausível que estabeleça regras incompatíveis ou impeditivas da aplicação das normas imperativas previstas nesse Orçamento.

Por conseguinte, a partir da entrada em vigor da Lei do Orçamento do Estado para 2017 e sem necessidade de qualquer ato legislativo ou regulamentar adicional, a repercussão da TOS aos consumidores finais passou a ser ilegal. …”

Nas suas alegações, a Recorrente sustenta que não pode, na presente data, considerar-se como proibida a repercussão da taxa de ocupação do subsolo, visto que a norma do art. 85º, nº 3 da LOE de 2017 não tinha o efeito de, automaticamente, impor que a Recorrente deixasse de repercutir a referida taxa nos consumidores finais, pois que, o que resulta da citada disposição legal é que, no futuro, o quadro legal venha a consagrar tal proibição, ou seja, que só após a implementação do pertinente quadro-legal será de considerar tal proibição, sendo que a mencionada norma não é autoexecutável, pelo que teve de ser concretizada pelo art. 70º do DL nº 25/2017, de 03.03 (Normas de Execução do Orçamento de Estado para 2017) onde ficou definido que o Governo procederia à alteração do quadro-legal em vigor, nomeadamente em matéria de repercussão das taxas na fatura dos consumidores, o que, para a Recorrente, só pode ser interpretado no sentido de que o art. 85º da Lei nº 42/2016, de 28.12, não determinou automaticamente o fim da repercussão das taxas na factura dos consumidores, verificando-se que é essa falta de regulamentação que a autoriza a que continue, legitimamente, a reflectir na factura do consumidor final os valores relativos às TOS, tendo a inclusão da citada norma no OE de 2017consubstabciado apenas um objectivo programático, de modo que, até o Governo proceder à alteração do quadro legal em vigor, nomeadamente em matéria de repercussão das taxas nas facturas dos consumidores, a referida repercussão é legal.

Que dizer?

A realidade em equação nos autos tem como referência o facto de a partir de 01-01-2017, data da entrada em vigor da lei nº 42/2016, de 28-12, a TOS deixou de poder ser repercutida no consumidor final, sendo encargo das empresas operadoras de infra-estruturas.

E, na verdade, o artigo 85º da Lei nº 42/2016, de 28-12, que aprovou o orçamento de estado (OE) para 2017, prevê no seu nº 3 que «A taxa municipal de direitos de passagem e a taxa municipal de ocupação do subsolo são pagas pelas empresas operadoras de infraestruturas, não podendo ser refletidas na factura dos consumidores».

E no nº 4 do mesmo preceito legal consignou o legislador que «No primeiro semestre de 2017, é revista a Lei das Comunicações Eletrónicas, aprovada pela Lei n.º 5/2004, de 10 de Fevereiro».

Por sua vez, no artigo 70º do D.L. nº 25/2017, de 03-03, diploma de execução da lei do orçamento, estabeleceram-se regras relativas à informação sobre o cadastro das redes de infraestruturas, estabelecendo-se no nº 4 que em função dessa informação iriam ser avaliadas “as consequências no equilíbrio económico-financeiro das empresas operadoras de infraestruturas”. E no seu nº 5 que “o Governo procede à alteração do quadro legal em vigor, nomeadamente em matéria de repercussão das taxas na fatura dos consumidores”

Além disso, a Lei nº 71/2018, de 31-12, que aprovou o OE para 2019, o legislador voltou a prever no artigo 246º uma autorização ao Governo para revisão do quadro legal de enquadramento da taxa de ocupação do subsolo, nomeadamente em matéria de repercussão das taxas na factura dos consumidores.

Todavia, em nenhum desses períodos nada foi aprovado que em execução do desiderato do legislador, alegadamente por falta de consenso (uma proposta do Governo terá tido a oposição da associação de municípios), e só em Janeiro de 2021, por despacho conjunto dos Ministros de Estado e das Finanças, da Modernização do Estado e da Administração Pública e do Ambiente e da Acção Climática, (despacho nº 315/2021, publicado no Diário da República n.º 6/2021, Série II de 2021-01-11, páginas 222 - 223) é que foi determinada a constituição de um grupo de trabalho «com o objetivo de alterar o quadro legal enquadrador da TOS atualmente em vigor, nos termos estabelecidos pelo artigo 85.º da Lei n.º 42/2016, de 28 de dezembro, artigo 70.º do Decreto -Lei n.º 25/2017, de 3 de março, e artigo 246.º da Lei n.º 71/2018, de 31 de dezembro», sendo que até agora nada foi aprovado em resultado dos labores desse grupo de trabalho.

Nesta medida, atentos os contornos legais da norma plasmada no artigo 85º da Lei nº 42/2016, de 28-12, e o facto de não ter sido até agora implementada pelo Governo qualquer alteração ao enquadramento legal da taxa municipal de ocupação do subsolo que os municípios fazem recair sobre os operadores de distribuição do gás, importa perceber que efeitos foram produzidos com a entrada em vigor daquela norma no ordenamento jurídico, o que implica caracterizar os termos em que vem sendo repercutida no consumidor final a referida taxa de ocupação do subsolo, sabendo que em resultado de a sua aplicação (lançamento) por parte dos (alguns) municípios não ter sido prevista aquando dos procedimentos de concessão da distribuição do gás natural, o que tem gerado uma litigância que levou o Governo a acordar com as concessionárias, no âmbito do clausulado contratual, na admissibilidade de a referida taxa municipal poder ser repercutida no consumidor final.

É o que resulta da Resolução do Conselho de Ministros n.º 98/2008, de 23 de junho, na qual este órgão do Governo fez as seguintes considerações:

(…)

8 - É reconhecido à concessionária o direito de repercutir, para as entidades comercializadoras de gás ou para os consumidores finais, o valor integral das taxas de ocupação do subsolo liquidado pelas autarquias locais que integram a área da concessão na vigência do anterior contrato de concessão mas ainda não pago ou impugnado judicialmente pela concessionária, caso tal pagamento venha a ser considerado obrigatório pelo órgão judicial competente, após trânsito em julgado da respectiva sentença, ou após consentimento prévio e expresso do concedente.

9 - Para efeitos do estabelecido no número anterior, os valores que vierem a ser pagos pela concessionária em cada ano civil serão repercutidos sobre as entidades comercializadoras utilizadoras das infra -estruturas ou sobre os consumidores finais servidos pelas mesmas, durante os «anos gás» seguintes, nos termos a definir pela ERSE. No caso específico das taxas de ocupação do subsolo, a repercussão será ainda realizada por município, tendo por base o valor efectivamente cobrado pelo mesmo”.

E na mesma resolução do CM foi aprovado o clausulado do contrato a celebrar com as concessionárias de distribuição do gás natural, em cuja cláusula 7ª ficou consignado que:

“(…) Cláusula 7.ª

Direitos e obrigações da concessionária

(…) 2 - Assiste à concessionária o direito de repercutir sobre os utilizadores das suas infra-estruturas, quer se trate de entidades comercializadoras de gás ou de consumidores finais, o valor integral de quaisquer taxas, independentemente da sua designação, desde que não constituam impostos directos, que lhe venham a ser cobrados por quaisquer entidades públicas, directa ou indirectamente atinentes à distribuição de gás, incluindo as taxas de ocupação do subsolo cobradas pelas autarquias locais.”.

E é com base em tal clausulado do contrato celebrado entre o Estado e as empresas concessionárias que estas têm vindo a repercutir o valor da taxa que lhes é cobrada pelos municípios.

A partir daqui, e sobre a matéria essencial em equação nos autos, cabe ter presente o exposto no recente Ac. deste Tribunal de 29-03-2023, Proc. nº 817/20.0BEALM, www.dgsi.pt, e onde se ponderou, além do mais, que:

“…

Como se constata da leitura da sentença recorrida, e deixámos já consignado, o julgamento de improcedência da acção acompanhou a tese defendida pela sociedade recorrida, louvando-se, nuclearmente, no entendimento de que a norma prevista no artº.85, nº.3, da Lei do OE para 2017 (Lei 42/2016, de 28/12) não é automaticamente operacional, estando a sua eficácia dependente da criação de um quadro jurídico tendo em vista a alteração do regime legal de repercussão da TOS.
Haverá que examinar da validade e da eficácia da mesma norma, já supra identificada.
Podia defender-se que a própria norma cuja eficácia se discute é inconstitucional (assim se pondo em causa a sua validade) por constituir um "verdadeiro cavaleiro orçamental" (cavaliers budgétaires), uma vez que não é possível descortinar qualquer relação entre o seu conteúdo e uma questão de natureza financeira ou orçamental - nem com o Orçamento de Estado, nem com os orçamentos municipais - a não ser o facto de este tributo passar a constituir um encargo para as empresas privadas que explorem redes de distribuição de gás natural em regime de concessão. Por outro lado, a sua vigência não se esgota com o termo do ano fiscal em causa, não sendo tal matéria objecto de discussão nos presentes autos.
A questão da validade dos "cavaleiros orçamentais", nome sob o qual a doutrina e a jurisprudência designam as normas incluídas no Orçamento do Estado sem relação directa com matéria financeira ou orçamental, constitui, como é sabido, questão há muito debatida no ordenamento jurídico nacional, onde assume contornos mais problemáticos atenta a inexistência, ainda hoje, e contrariamente ao que ocorre em outros ordenamentos jurídicos, de resposta expressa na nossa Lei Fundamental.
Sem prejuízo de se ter presente que não existe ainda consenso na doutrina sobre a melhor solução oferecida pelo ordenamento jurídico, e que em abono de uma e outra das teses em confronto são aduzidos argumentos ponderosos, certo é que, ao nível da jurisprudência constitucional, que aqui releva sobremaneira, o entendimento tradicional e maioritário vai no sentido da sua validade, por, não existindo no ordenamento jurídico-constitucional qualquer proibição expressa de inclusão deste tipo de normas ( [Vide, acórdãos do Tribunal Constitucional 461/87 (processo nº.176/87), de 16/12/1987; 358/92 (processo nº.120/92); de 11/11/1992; 141/2002 (processos nº.198/92 e 62/93), de 9/04/2002; e 360/2003 (processo nº.13/2003), de 8/07/2003].) , e pese embora constituir prática "discutível, e até censurável, seja do ponto de vista doutrinário, seja do da técnica da legislação" se dever concluir que essa censura não encontra fundamento "do ponto de vista jurídico-constitucional".
A explicação para esta utilização censurável mas historicamente sistemática é-nos explicada de forma clara pela doutrina: "[a] natureza calendarizada da lei do Orçamento explica, em grande parte, a sua utilização para fazer aprovar normas sem direta, nem por vezes indireta, incidência materialmente orçamental. Ao fazer-se incluir uma determinada matéria na lei do Orçamento pretende-se, normalmente, beneficiar da certeza de que essa lei será aprovada num prazo reduzido, que entrará em vigor numa data certa e que, no momento da sua discussão e aprovação, as atenções andarão, previsivelmente, arredadas das normas que aí, mais ou menos, subtilmente, se infiltraram" (cfr.Tiago Duarte, A Lei Por Detrás do Orçamento - A Questão Constitucional da Lei do Orçamento, Almedina, 2007, pág.441 e seg.).
É verdade, não se olvida, que a posição a que fizemos referência, que se mantém até hoje, tem vindo, ao longo do tempo, a ser acompanhada de um discurso fundamentador em que se realça a existência de uma tese defensora de exigências acrescidas assente na verificação de uma "conexão mínima entre o cavalier e a lei do orçamento (por se considerar inadmissível que se aproveite a lei do orçamento para regular matérias em tudo a ele absolutamente estranhas, como o seriam, por exemplo a regulamentação do regime de bens do casamento, ou do sistema de recursos em processo civil)" (Ponto 42. do citado Acórdão do Tribunal Constitucional nº.141/2002, integralmente disponível em http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/20020141.html). . Porém, mesmo nos casos contados em que tal aconteceu, a mais das vezes em termos abstractos, e, em caso algum, de forma determinante para o juízo de validade da norma, também aí se conclui, depois de se sublinhar que essa conexão mínima até existe, que "o facto de a inclusão deste tipo de normas nos diversos orçamentos do Estado ser uma prática habitual ou reiterada, como aliás disso dão conta os vários acórdãos deste Tribunal que sobre tais matérias têm sido proferidos, com uma ampla tradição remontando ao constitucionalismo monárquico e que não se encontra excluída pelo actual texto constitucional, pelo que deve ser aceite tal inclusão orçamental, nos termos supra expostos. Assim, e independentemente de outas considerações, não se tem por ilegítima a inclusão das normas em causa na lei do orçamento" (Ponto 42. do citado Acórdão do Tribunal Constitucional nº.141/2002). .
Acresce que, como se diz no Parecer nº.6/2018, do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República, publicado na II série do D.R., 11/06/2018, a propósito de um outro preceito (inserida na LOE 2018 e relativa à aplicação da Tarifa Social aos Clientes de Gás Natural) em que a questão da validade da norma também se colocou, "o teor do atual n.º 5 do artigo 165.º da Constituição, introduzido pela revisão constitucional de 1989, ao aceitar a existência de autorizações legislativas na Lei do Orçamento em matérias não fiscais apresenta-se como um forte apoio para se admitir os cavaleiros orçamentais no ordenamento jurídico-constitucional português", e embora o n.º 2 do artigo 31.º prescreva que «[a]s disposições constantes do articulado da lei do Orçamento do Estado devem limitar-se ao estritamente necessário para a execução da política orçamental e financeira" (…) "parece dever concluir-se do seu teor, particularmente do seu último segmento - "para a execução da política orçamental e financeira" - como ressalta Nazaré da Costa Cabral ("A Nova Lei de Enquadramento Orçamental: Reflexões Breves sobre a sua Forma, Conteúdo e Efeitos", in Estudos de Homenagem Ao Prof. Doutor JORGE MIRANDA, volume V, Coimbra Editora, 2012, pág.787). , que "abre uma infinitude de possibilidades […], qualquer medida que tenha incidência no plano da política orçamental ou da política financeira (e serão a maior parte) parece, portanto, poder ser acolhida na lei do OE". No mesmo sentido Gomes Canotilho e Vital Moreira, a propósito dos limites objectivos da lei do orçamento escrevem: "Admitindo-se que a lei do orçamento possa conter matérias não orçamentais (a favor ver o AcTC n.º 461/87, entre outros), então não poderá deixar de se entender que nessas matérias a lei do orçamento tem de ser considerada como uma lei comum, de modo a poder ser alterada nos termos gerais e não ficar sujeita à regra da vigência anual e à exclusividade da iniciativa legislativa governamental, podendo continuar em vigor mesmo depois da substituição do orçamento, salvo indicação em contrário" (cfr.Constituição da República Portuguesa Anotada, volume I, 4.ª Edição Revista, Coimbra Editora, 2007, págs.1112 e 1113; "idem", Jorge Miranda e Rui Medeiros, Constituição Portuguesa Anotada, Vol.II, 2ª. Edição revista, Universidade Católica Editora, 2018, pág.262 e seg.).
Atento tudo o acabado de mencionar, concretamente a norma cuja validade se aprecia, o identificado artº.85, nº.3, da Lei do OE para 2017, está inserida no Capítulo V "Finanças Locais", do mesmo diploma, tendo como epígrafe "Taxas de direitos de passagem e de ocupação do subsolo", mais alterando a conformação legal do âmbito de incidência da Taxa Municipal de Direitos de Passagem e da TOS e atendendo às repercussões económicas que dessa alteração podem resultar. Com este enquadramento e teor não pode dizer-se que seja indiscutível que deva ser excluída do conceito de normas financeiras e, assim sendo, que não tenha, no caso, o mínimo de conexão com o orçamento que a jurisprudência constitucional vem recentemente exigindo.
Concluímos, pois, tendo especialmente por referência a jurisprudência constitucional citada, que o ordenamento jurídico-constitucional português admite as normas designadas por cavaleiros orçamentais e que, mesmo para quem entenda que essa admissão está dependente da existência da citada conexão mínima, há que dizer que, no caso concreto, ela se verifica.
Firmada a validade ou conformidade constitucional do artº.85, nº.3, da Lei do OE/2017 para 2017, passamos a adiantar as razões porque julgamos que esta norma é também plenamente eficaz.
Desde logo, a norma é, "per se", sem a intermediação ou complementação de quaisquer outras, apta a regular de forma directa e imediata a realidade nela contemplada. O legislador assim o diz, de forma clara, directa e incondicional: "A taxa municipal de direitos de passagem e a taxa municipal de ocupação do subsolo são pagas pelas empresas operadoras de infraestruturas, não podendo ser refletidas na fatura dos consumidores."
Por outro lado, nem nesta norma, nem em qualquer outra da mesma Lei, se faz depender a proibição consagrada no transcrito normativo de quaisquer regulamentações, estudos ou alterações legais, nem existe norma a impor expressamente o deferimento no tempo da sua aplicação, assim devendo o aplicador da lei concluir que a disposição em apreço tem que ser interpretada como uma proibição expressa e incondicional de repercussão da TOS nos consumidores a partir da entrada em vigor da Lei que a aprovou, tudo contrariamente ao decidido pelo Tribunal "a quo".
E não se diga que a ser assim carece de sentido quer o preceituado no artº.70, nº.5, do Decreto-Lei de Execução Orçamental do OE de 2017 (25/2017, de 3/03) quer a necessidade de em posteriores Orçamentos se voltar a consagrar a mesma proibição, quer, por fim, o Despacho 315/21, de 11/01/2021, e o grupo de trabalho que neste último está previsto, entretanto constituído.
Relativamente ao Decreto-Lei de Execução Orçamental, sublinhamos, antes de mais, que, por natureza e imposição legal, constitui o instrumento onde ficam estabelecidas as disposições necessárias à execução do Orçamento do Estado a que respeita.

Sendo esse o seu objecto, como decorre, no caso, do artº.1, do citado Decreto-Lei 25/2017, de 3/03, parece poder concluir-se que a LOE, no caso para o ano de 2017, constitui o quadro legal que, simultaneamente, legitima as normas que integram o Decreto de Execução Orçamental e limita o âmbito da sua aplicação, devendo as normas que integram este último ser interpretadas, primacialmente, em conformidade com os princípios e normas integradas naquela primeira, desta forma se assegurando que um diploma cuja exclusiva elaboração e execução está cometida ao Governo, não altere, em matéria orçamental, o que ficou decidido pela Assembleia da República, a quem, sob proposta do Governo, compete aprovar o Orçamento de Estado (cfr.artº.161, al.g), da C.R.Portuguesa; artº.53, da Lei de Enquadramento Orçamental actualmente em vigor - Lei 151/2015, de 11/09).
Ora, o citado artº.70, do Decreto-Lei 25/2017, de 3/03, não disciplina a repercussão da taxa de ocupação do subsolo, o que bem se compreende porque, como já deixámos explicitado, o artº.85, nº.3, da Lei do OE para 2017, constitui uma norma auto-exequível, ou seja, apta, sem qualquer regulamentação complementar a produzir todos os seus efeitos (também designada pela doutrina como "norma autónoma") (cfr. José Oliveira Ascensão, O Direito, Introdução e Teoria Geral, 4ª. Edição, Editorial Verbo, 1987, pág.474 e seg.). .
Nesta sede, a sentença recorrida confunde duas questões distintas, que são, por um lado, a de saber se a proibição do artº.85, nº.3, da LOE 2017, nos termos em que ficou consagrada, era susceptível de produzir efeitos imediatos à data da sua entrada em vigor e, por outro, a questão de saber quais as repercussões que dessa disposição, produzindo efeitos imediatos, resultam para as empresas operadoras de infraestruturas do ponto de vista financeiro.
Para que estas duas questões pudessem estar correlacionadas e dependentes uma da outra, necessário seria que o legislador tivesse feito depender a examinada proibição do apuramento dessas consequências. O que não fez, limitando-se ou comprometendo-se, como resulta da conjugação do artº.85, nºs.1 e 2, da LOE 2017, e do artº.70, nºs.1 a 5, do Decreto de Execução Orçamental, a definir os novos pressupostos de determinação da TOS e a desenvolver os procedimentos necessários à avaliação ou determinação do impacto da proibição no referido equilíbrio económico-financeiro das empresas operadoras de infraestruturas e, em função do que viesse a ser apurado, alterar o quadro legal em vigor.
Volta a vincar-se, o que está em causa nos autos é a exegese do artº.85, nº.3, da Lei do OE para 2017, mais concretamente a sua susceptibilidade de produzir efeitos imediatos na esfera jurídica dos consumidores finais, que, em primeira linha, terá sempre que resultar da interpretação desta norma em conformidade com os critérios interpretativos consagrados no artº.9, do C.Civil, e no artº.11, da L.G.Tributária, conforme mencionado supra.
Quanto ao teor das sucessivas normas orçamentais (cfr.artº.246, da Lei do OE de 2019/Lei 71/2018, de 31/12; artº.133, da Lei do OE de 2021/Lei 75-B/2020, de 31/12), tal como do Despacho 315/2021, de 11/01/2021, e da constituição do grupo de trabalho neste previsto, deve concluir-se que toda esta legislação reforça a interpretação por nós perfilhada de que o legislador apenas "cuidou da futura regulação da TOS" mas não revogou a proibição de repercussão do seu valor aos consumidores (cfr.ac.S.T.A.-2ª.Secção, 23/02/2023, rec.2/21.3BEALM; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 8/03/2023, rec. 267/21.0BEALM).
Ainda, do citado Decreto-Lei 140/2006, de 26/07, e das bases das concessões nele consagradas (anexo IV), convocadas na Resolução 98/2008, de 3 de Abril de 2008, resulta que a própria Lei, não só previu que o concedente podia, por via legislativa, alterar unilateralmente o contrato de concessão, como previu ainda os meios ou modalidades através dos quais a reposição do equilíbrio económico e financeiro da concessão se devia efectuar, se a ela devesse haver lugar. O que significa, salvo melhor entendimento, que tendo o Governo (Estado) por via da LOE 2017, alterado unilateralmente o contrato de concessão, proibindo a repercussão no cliente final da TOS, haveria que apurar se da modificação unilateralmente imposta tinha efectivamente resultado um desequilíbrio financeiro no contrato e, em caso afirmativo, qual a sua amplitude para que fossem adoptadas uma das modalidades de reposição legalmente previstas, sendo neste contexto, a nosso ver, que deve ser interpretado o preceituado no artº.85, nº.1, da LOE 2017, tal como os consequentes desenvolvimentos consagrados no artº.70, do Decreto-Lei de Execução Orçamental do OE de 2017 (25/2017, de 3/03).
Com estes pressupostos, deve este Tribunal concluir que não existe fundamento para que, ao artº.85, nº.3, da Lei do OE para 2017, não deva ser reconhecida eficácia plena a partir de 2017, isto é, que a norma cuja eficácia avalizamos produziu efeitos desde 1/01/2017.

Por último, aduz a sociedade recorrente, em síntese, que verificando-se a repercussão da TOS pela sociedade recorrida, em violação do artº.85, nº.3, da Lei do OE para 2017, existe fundamento legal para o reembolso da quantia paga, acrescida da entrega de juros indemnizatórios à apelante, ao abrigo do artº.43, da L.G.T. (cfr. conclusões ZZZ) a FFFF) do recurso).
Com base em tal alegação pretendendo concretizar mais um erro de julgamento de direito da decisão recorrida.
Examinemos se a decisão objecto do presente recurso comporta tal pecha.
As obrigações pecuniárias e de quantidade, como é o caso da obrigação de apuramento de juros derivada do indevido pagamento de uma liquidação tributária, devem ser cumpridas de acordo com o princípio nominalista, em moeda que tenha curso legal no País, impondo a lei o pagamento de juros face a tal tipo de obrigações. Os juros consistem no preço do dinheiro em função do tempo, remunerando o seu titular em face da sua disponibilização temporal a terceiro ou, por outras palavras, são os frutos civis, constituídos por coisas fungíveis e que representam o rendimento de uma obrigação de capital (cfr.artºs.550 e 806, nº.1, ambos do C.Civil; ac.S.T.A.-Pleno da 2ª.Secção, 26/05/2022, rec.1611/11.4BELRS-A; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 8/02/2023, rec. 971/21.3BELRS; João de Matos Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, Vol.I, 7ª. edição, Almedina, 1991, pág.844 e seg., e 867 e seg.; José Maria Fernandes Pires e Outros, Lei Geral Tributária comentada e anotada, Almedina, 2015, pág.357).

Especificamente na área do direito tributário, nos termos do artº.100, da L.G.Tributária, em virtude da procedência total ou parcial de impugnação a favor do sujeito passivo, a A. Fiscal está obrigada à imediata e plena reconstituição da legalidade do acto objecto do litígio, tal dever compreendendo o pagamento de juros indemnizatórios ou moratórios, se for caso disso, computados a partir do termo do prazo da execução espontânea da decisão (cfr.artº.43, da L.G.T.).
Em face de tal postulado, a anulação judicial do acto tributário implica o desaparecimento de todos os seus efeitos "ex tunc", tudo se passando como se o acto anulado não tivesse sido praticado, mais devendo a reintegração completa da ordem jurídica violada ser efectuada de acordo com a teoria da reconstituição da situação actual hipotética (cfr.Diogo Freitas do Amaral, A execução das sentenças dos Tribunais Administrativos, 2ª. Edição, Almedina, 1997, pág.70; Diogo Leite de Campos e Outros, Lei Geral Tributária comentada e anotada, 4ª.Edição, Editora Encontro da Escrita, 2012, pág.868 e seg.; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, II volume, 6ª. Edição, 2011, pág.526 e seg.).
No que, concretamente, diz respeito aos juros indemnizatórios correspondem estes à materialização de um direito de indemnização que tem raiz constitucional. Com efeito, no artº.22, da C.R.Portuguesa, estabelece-se que o Estado e as demais entidades públicas são civilmente responsáveis, em forma solidária com os titulares dos seus órgãos, funcionários ou agentes, por acções ou omissões praticadas no exercício das suas funções e por causa desse exercício, de que resulte a violação dos direitos, liberdades e garantias ou prejuízo para outrem.
A norma constitucional remete para o instituto da responsabilidade civil, pelo que serão aplicáveis as respectivas regras.
A obrigação de pagamento de juros indemnizatórios tem o seu fundamento no instituto da responsabilidade civil extracontratual do Estado (cfr.Lei 67/2007, de 31/12), constituindo a contra face dos juros compensatórios a favor da Administração Fiscal. Com estes pressupostos, pode dizer-se que a natureza dos juros indemnizatórios é substancialmente idêntica à dos juros compensatórios, sendo, como estes, uma indemnização atribuída com base em responsabilidade civil extracontratual (cfr.ac.S.T.A.-Pleno da 2ª.Secção, 26/05/2022, rec.1611/11.4BELRS-A; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 8/03/2023, rec. 267/21.0BEALM; Jorge Lopes de Sousa, Sobre a Responsabilidade Civil da Administração Tributária por Actos llegais, Áreas Editora, 2010, pág.37 e seg.).
O citado artº.22, da C.R.Portuguesa, consagra "o princípio da responsabilidade patrimonial directa das entidades públicas por danos causados aos cidadãos" (cfr.J.J. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da Republica Portuguesa Anotada, 4ª. Edição, Coimbra Editora, I Volume, pág.425 e seg.; Jorge Miranda e Rui Medeiros, Constituição Portuguesa Anotada, Vol.I, 2ª. Edição revista, Universidade Católica Editora, 2017, pág.344 e seg.). , um dos princípios estruturantes do Estado de Direito Democrático.
Atendendo à função primordial de protecção dos cidadãos em caso de lesões provocadas pelas entidades públicas que a citada norma constitucional prossegue, a doutrina vem entendendo que o preceito é apto a responsabilizar quer as entidades públicas quer as entidades privadas que, em substituição do Estado, estão incumbidas do exercício de funções públicas ou desempenham por força de lei poderes públicos, sob pena de subversão do referido princípio constitucional. Ou seja, não há que excluir da responsabilidade consagrada no artº.22, da C.R.P., as entidades privadas nas situações em que os actos por si praticados ainda o são na prossecução do interesse público e no exercício de poderes públicos, isto é, sempre que exista uma conexão entre o acto lesivo e a concreta função ou serviço público legalmente cometido a essa entidade privada.
Aliás, constituindo a actividade tributária um domínio particularmente invasivo dos direitos dos cidadãos, não podem subsistir dúvidas que é também neste domínio que a garantia constitucional de reparação da lesão resultante de acto materialmente tributário assume acentuado relevo.
Em conformidade com o regime estabelecido no citado artº.43, da L.G.T., para o que ora releva, são devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços, de que resultou um pagamento de dívida tributária em montante superior ao legalmente devido (nº.1), sendo aplicável, na sua contagem, a taxa prevista para os juros compensatórios (nº.4).
Por sua vez, por força do preceituado no artº.35, nº.10, da L.G.T., a taxa dos juros compensatórios é equivalente à taxa dos juros legais fixados nos termos do artº.559, nº.1, do C.Civil, resultando deste preceito que os juros legais e os estipulados sem determinação de taxa ou quantitativo são os fixados em portaria conjunta dos Ministros da Justiça, das Finanças e do Plano, os quais devem ser calculados à taxa de 4%, por força do artº.1, da Portaria 291/2003, de 8/04.
"In casu", já ficou decidido que o acto de repercussão é ilegal por violação do artº.85, nº.3, da Lei do OE para 2017, e que desse acto ilegal resultou o pagamento de dívida tributária em montante superior ao legalmente devido, pelo que não temos dúvidas em afirmar que se verificam estes particulares requisitos de atribuição de juros indemnizatórios.
A única questão que se pode colocar será a de saber se a recorrida, enquanto pessoa colectiva de direito privado (no caso constituída sob a forma de sociedade anónima), ainda poderá considerar-se abrangida pelo artº.43, da L.G.T. Ou seja, se a concessionária, ou a comercializadora, de um serviço público, no que respeita a lesões patrimoniais decorrentes de um acto de repercussão de tributo por si praticado ao abrigo do poder que para esse efeito lhe foi legalmente conferido, deve integrar o conceito de "serviços", assim ficando onerada com a obrigação de pagamento dos juros indemnizatórios previstos no citado normativo.
Nesta sede, chamamos à colação a doutrina que considera que ainda é de abranger no conceito de "serviços" as empresas privadas concessionárias de serviço público que, nesta condição, substituem a Administração nas relações com o público e actuam como se fossem entidades públicas. Pode falar-se de relações jurídicas administrativas multipolares com vértice publicizado (entre a esfera do Estado e a esfera própria da sociedade se intercala uma maior ou menor área de carácter híbrido, em que funções públicas são levadas a cabo por entidades mistas ou por entidades particulares, em virtude da delegação do Estado, a que podemos chamar a zona pública não-estadual) (cfr.Francisco Paes Marques, As Relações Jurídicas Administrativas Multipolares - Contributo para a sua Compreensão Substantiva, Almedina, 2011, pág.37 e seg.).
Acresce que o Estado ao conceder legalmente à sociedade comercializadora de gás, ora recorrida, a possibilidade de repercutir um tributo, a investiu de um poder tributário que a mesma exerce perante os seus clientes, o que "configura ainda uma competência tributária derivada ou de segundo grau" proveniente da figura da repercussão fiscal. A TOS continua, assim, a consubstanciar "uma contraprestação à prestação estadual constituída pela utilização privativa do domínio público do Estado, nada se alterando, sob o ponto de vista da substância das coisas, pela circunstância de essa utilização ocorrer no quadro de uma concessão de exploração desse mesmo domínio público".
Assim, a circunstância da entidade que praticou o acto lesivo (repercussão ilegal) ser uma entidade privada, uma sociedade anónima, não determina a sua exclusão do âmbito de aplicação do artº.43, nº.1, da L.G.T., interpretado em conformidade com o artº.22, da C.R.Portuguesa, porque o poder de repercutir a TOS (acto materialmente tributário praticado no exercício de uma actividade de serviço público), que legalmente lhe foi atribuído, corresponde ao exercício de um poder de autoridade típico do Estado. Por outras palavras, a actividade desenvolvida pela concessionária/comercializadora não perde a sua natureza pública administrativa apenas por ser desenvolvida sob a forma de sociedade anónima, nem o acto de repercussão, praticado no contexto legal definido deixa de ser materialmente tributário por ser praticado pela sociedade comercializadora de gás, ora recorrida, devendo entender-se que os valores cobrados ao consumidor na parte que respeitam à contrapartida da utilização pela recorrida do bem de domínio público possuem ainda tendencialmente a natureza de créditos tributários.
Em suma, o pagamento da TOS, por via do acto de repercussão, representa ainda a cobrança de uma receita coactiva e não a mera satisfação, por parte do cliente final, de uma obrigação privada assumida no âmbito de um contrato sinalagmático que tem como contraparte a sociedade recorrida. Interpretação que, se bem vemos, encontra respaldo no artº.18, nº.1, da L.G.T., norma que consagra uma noção ampla de sujeito activo da relação tributária, nela se incluindo a figura do representante, entendendo-se ser nesta última figura que se integra o concessionário/comercializador do serviço público de gás natural, a funcionar na arrecadação da TOS como um substituto "ex lege", assim promovendo a cobrança do tributo por meio da respectiva repercussão. Também chamadas entidades de direito público por atribuição e constituindo sujeitos activos da relação jurídica tributária de natureza complexa (cfr.ac.S.T.A.-2ª.Secção, 23/02/2023, rec.2/21.3BEALM; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 8/03/2023, rec.267/21.0BEALM; Joaquim Freitas da Rocha e Hugo Flores da Silva, Teoria Geral da Relação Jurídica Tributária, Almedina, 2017, pág.74 e seg.). …”.

Perante o carácter assertivo do que ficou exposto e porque concordamos integralmente com o que ali ficou decidido e respectivos fundamentos, sem olvidar o disposto no n.º 3 do art. 8.º do Código Civil, resta apenas reiterar o que ficou ali consignado, até porque as alegações da Recorrente não têm a virtualidade de colocar em crise o que ficou dito no aresto apontado, o que equivale a dizer que o acto de repercussão da TOS impugnado com referência à factura n.º ...75, no valor de € 551 770,31, que incluía a quantia de € 9 904,09 a título de TOS, liquidada à Impugnante e ora Recorrente pela sociedade recorrida “A... S.A. - Sucursal em Portugal (gasNatural E...)”, é ilegal, devido a violação do disposto no examinado art. 85º nº 3 da Lei do OE para 2017, sendo que, no contexto de facto e de direito que emerge dos autos, é de considerar a sociedade comercializadora de gás ora recorrida integrada no conceito de "serviços" consagrado no art. 43º nº 1 da LGT, o que significa que não existe qualquer obstáculo em reconhecer à sociedade recorrente o direito de reaver o que ilegalmente lhe foi exigido e pagou e, bem assim, o direito a receber o valor correspondente aos juros indemnizatórios, calculados à taxa de 4% desde a data em que esse pagamento indevido se verificou (03-05-2018) até efectivo e integral reembolso, de modo que, a decisão recorrida não merece qualquer censura, situação que tem um verdadeiro efeito de implosão no que concerne ao presente recurso.


4. DECISÃO

Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal, de harmonia com os poderes conferidos pelo art. 202.º da Constituição da República Portuguesa, em negar provimento ao recurso jurisdicional interposto pela Recorrente, mantendo-se a decisão judicial recorrida.

Custas pela Recorrente.

Notifique-se. D.N..




Lisboa, 10 de Maio de 2023. - Pedro Nuno Pinto Vergueiro (relator) - Francisco António Pedrosa de Areal Rothes - Nuno Filipe Morgado Teixeira Bastos.