Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:02358/04.3BELSB
Data do Acordão:05/06/2020
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:PAULO ANTUNES
Descritores:REEMBOLSO
IVA
DOCUMENTOS
PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE
Sumário:I - Pelo Dec.-Lei n.º 408/87, de 31/12 – diploma entretanto já revogado - foi admitido que os sujeitos passivos residentes noutro país da União Europeia (e mesmo de países terceiros) pudessem pedir reembolsos de IVA em Portugal, na transposição da Oitava Diretiva de IVA, identificada no seu preâmbulo, e que se encontra publicada no Jornal Oficial n.º L 331 de 27/12/1979, pág.11-19.
II - No art. 5.º n.º 1 do referido Dec.-Lei previu-se que o pedido de reembolso fosse “acompanhado dos seguintes documentos:
a) Originais dos documentos de importação e das facturas ou documentos equivalentes, passados nos termos dos artigos 35.º ou 38.º do CIVA, comprovativos de que o IVA foi suportado;
b) Certificado, emitido pelo Estado membro onde se encontra estabelecido, comprovativo da sua sujeição a imposto sobre o valor acrescentado, o qual será válido pelo período de um ano a contar da data de emissão”.
III - Os documentos acima referidos estão de acordo com o previsto no art. 2.º dessa Diretiva, em que constam ainda outros, mas sem que se colha qualquer referência aos previstos no art. 7.º do Dec.-Lei n.º 45/89, de 11/2, nomeadamente, quanto às menções da tipografia em que foi impressa a fatura e “processado por computador”, cuja falta foi o fundamento utlizado para a recusa de reembolso solicitado ao abrigo do referido Dec.-lei n.º 408/87.
IV - O Tribunal de Justiça (T.J.) tem declarado em vários acórdãos que as condições de reembolso em excesso, implementadas pelos Estados-membros, não podem ofender o princípio da neutralidade do sistema do imposto, bem como que os meios implementados pelos Estados, com vista a obviar à fraude e evasão fiscais, são de restringir ao estritamente necessário, tendo chegado já decidir que, no caso de serem aplicados a determinado grupo de contribuintes, presumivelmente de maior risco, não podem deixar de ser considerados desproporcionais e que ofendem os objectivos do dito sistema.
V - Ora, a similitude com o presente caso é manifesta, pois o requerente insere-se no grupo de não residentes, havendo presumido maior risco de ocorrer a violação do princípio da neutralidade que o S.T.A. tem também já reconhecido ser peça chave do funcionamento do IVA.
VI - Não tendo sido dada oportunidade ao requerente de prestar quaisquer outras informações, conforme previsto no n.º 2 do referido art. 5.º do Dec.-Lei n.º 408/87, resulta manifesta desproporcionalidade e ofensa dos objectivos do sistema.
Nº Convencional:JSTA000P25868
Nº do Documento:SA22020050602358/04
Recorrente:A......., SA
Recorrido 1:AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: ACORDAM NA SECÇÃO DO CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO


I. Relatório.
I.1. A representante da Fazenda Pública e a impugnante A…………, S.A., inconformadas com a sentença proferida nos autos a 8-8-2018 no Tribunal Tributário de Lisboa, vieram interpor recursos para o Supremo Tribunal Administrativo (S.T.A.)., o primeiro dos quais condicionado a se entender não existir lapso.
I.2. O primeiro, restrito à condenação em custas, foi interposto condicionalmente à não correcção de lapso imputado à sentença recorrida, tendo merecido ainda alegações que foram rematadas com as seguintes conclusões:
I- Declarou a douta sentença a improcedência da acção.

II- Como consta do aí elencado, entendeu ainda o Tribunal ad quo nos presentes autos a Fazenda seria condenada em custas.

III- E decidiu ainda o areópago fixar o valor da causa em € 590 395,55.

IV- Concluindo o contrário e à luz do art.º 536.º n.º 3 do CPC deveria ter-se entendido que as custas são responsabilidade da Impugnante porquanto na situação em apreço, a improcedência da acção é um acto que não deve ser imputável ao réu.

V- Assim, nesse contexto e, atentos ao princípio da causalidade, não nos conformamos com tal decisão, douta no restante, pois quem deu causa à acção foi a impugnante, devendo ser a mesma responsável por custas.

VI- Não obstante, subindo agora os autos ao muito Venerando e Supremo Tribunal Administrativo e Fiscal, verificar-se-á, como se encontra devidamente comprovado nos autos que a impugnante, na sequência da decisão proferida e a que se reporta o ponto G) dos factos assentes, veio a ser notificada em 04-02-2010 pela AT para, em 15 dias exercer o direito de audição prévia, nos termos do art.º 60.º da LGT, do projecto de indeferimento, relativo ao pedido de restituição (ponto H) dos factos assentes) não se verificando a preterição desta formalidade.

VII- Contudo, no que respeita à AT, a mesma é parte vencedora na acção de impugnação, pelo que não deve ser condenada no pagamento de custas, quanto a esta acção, sendo que, além do mais, o Tribunal pode, oficiosamente, deferir o pedido de dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça, nos termos do artigo 6.º/7, do Regulamento de Custas Processuais, em relação a ambas as partes.

VIII- Sem prejuízo do que a RFP entende que adoptou neste processo um comportamento processual irrepreensível de colaboração com os Tribunais, não promovendo quaisquer expedientes de natureza dilatória, tendo inclusive, acatado de imediato as matérias decididas pelo Tribunal que, entende, não merecerem qualquer juízo de censura;
IX - Por essa razão, não deve ser penalizada, em sede de custas judiciais, mas antes deve ver o seu comportamento positivamente valorado;
X - Assim, solicita a recorrente que o Tribunal faça uso da faculdade prevista na segunda parte do n.º 7 do art.º 6.º do Regulamento de Custas Processuais, por forma a dispensar a mesma do pagamento do remanescente das taxas de justiça, reformando-se, nesta parte, o acórdão quanto a custas, ao abrigo do artigo 616.º/1, do CPC.
XI - Por fim, como supra melhor exposto deverá a impugnante, parte vencida, ser condenada em custas por se considerar ter dado azo à causa.
XII - Como se conclui com o devido respeito, se interpretadas as normas legais em apreço de acordo com a melhor jurisprudência e direito, o segmento decisório recorrido não se poderia manter na ordem jurídica.
1.3. O recurso interposto pela impugnante foi admitido, tendo sido apresentadas alegações com as conclusões que a seguir se reproduzem:

A) O presente recurso vem interposto da sentença proferida pelo Tribunal a quo que decidiu julgar totalmente improcedente a impugnação judicial apresentada pela ora Recorrente com vista à apreciação jurisdicional da legalidade do ato de indeferimento do pedido de reembolso de IVA do ano de 1999, no valor de EUR 590.395,55, por violação da Oitava Diretiva do IVA (na redação à data dos factos) e do princípio da proporcionalidade, a título de pedido principal, e como pedido subsidiário, por preterição do direito de audição prévia previsto no artigo 60.º da LGT.

B) A Recorrente não pode concordar com o teor da decisão proferida, pelo que pretende ver analisadas por este Venerando Tribunal as seguintes questões materiais controvertidas:

(i) A legalidade do ato de indeferimento do pedido de reembolso de IVA do ano de 2003, no valor de EUR 590.395,55, por violação da Oitava Diretiva do IVA (na redação à data dos factos) e do princípio da proporcionalidade; e

(ii) Subsidiariamente, a legalidade do procedimento tributário de indeferimento do pedido de reembolso objeto dos presentes autos, por violação expressa do princípio da participação dos contribuintes.

C) No que respeita à primeira questão material controvertida, a Oitava Diretiva veio regulamentar as regras sobre o reembolso do IVA suportado por sujeitos passivos não estabelecidos no território onde o imposto foi suportado e o objetivo do legislador consistiu em "evitar que o sujeito passivo estabelecido num determinado Estado Membro fique sujeito a dupla tributação", bem como "pôr termo às disposições atualmente em vigor nos Estados Membros e que estão por vezes na origem de desvios de tráfego e de distorções de concorrência".

D) O artigo 5.º da Oitava Diretiva estabelecia que o direito ao reembolso seria determinado nos mesmos termos em que o direito à dedução (previsto na Sexta Diretiva) era aplicado no Estado que efetuava o reembolso, contanto que não fossem impostas aos sujeitos passivos outras obrigações que não a de prestar informações sobre o fundamento do pedido de reembolso.

E) A transposição da referida diretiva foi efetuada através do Decreto-Lei n.e 408/87 e o legislador foi claro, fazendo depender o reembolso apenas das condições e termos previstos nos vários artigos do DL 408/87.

F) Conforme resulta inequivocamente da prova junta aos autos, a Recorrente satisfez todos os requisitos materiais e formais para a concessão do reembolso, previstos no diploma acima referido - facto não contestado pela AT - ora Recorrida - em nenhuma fase do procedimento.

G) Como bem notou o TCA Sul no acórdão proferido no processo n.º 07137/13, de 16.01.2014, "O artº 5.º n.º 1 do dec.lei 408/87, de 31/12, faz depender o reembolso da apresentação dos seguintes documentos:

a)Originais dos documentos de importação e das facturas ou documentos equivalentes, passados nos termos dos artºs.35 ou 38, do C/. V.A., comprovativos de que o I. V.A. foi suportado;

b)Certificado, emitido pelo Estado membro onde se encontra estabelecido, comprovativo da sua sujeição a imposto sobre o valor acrescentado, o qual será válido pelo período de um ano a contar da data de emissão."

H) São estes os requisitos expressamente previstos pelo legislador para efeitos de pedido de reembolso ao abrigo da Oitava Diretiva, o que se invoca para os devidos efeitos legais.

I) A Recorrente não cumpriu um dos requisitos da legislação interna para efeitos de impressão das faturas, uma vez que as faturas que titulam o pedido, tendo sido processadas através de mecanismos de saída de computador, não continham a menção "processado por computador", prevista no artigo 7.e do Decreto-Lei n.e 45/89, o qual estabelecia à data dos factos no regime interno nacional as normas sobre os documentos que devem acompanhar as mercadorias em circulação.

J) Os artigos 22.º, n.º 3 e 28-H do regime transitório da Diretiva 77 /388/CEE (normativos que estabelecem quais os requisitos a que um documento deve obedecer para ser considerado como uma fatura) não estabeleciam como requisito obrigatório a referência prevista no artigo 7.º do DL n.º 45/89, nem o próprio diploma que transpôs a Oitava Diretiva para o ordenamento jurídico nacional fazia qualquer referência a tal requisito, mas apenas e tão só ao cumprimento do disposto nos artigos 35.º ou 38.º do CIVA.

K) O incumprimento do requisito previsto no DL 45/89 (redação à data dos factos) não constitui motivo bastante para a Administração Tributária recusar a concessão do reembolso a um sujeito passivo não residente que cumpriu com todos os requisitos formais e materiais previstos na Oitava Diretiva e no DL 408/87, só se admitindo tal cenário se este requisito fosse expressamente introduzido no diploma de transposição da Diretiva ou se houvesse expressa remissão legal para o mesmo, o que, como vimos, não sucedeu.

L) O artigo 7.º do DL 45/89 foi construído para ser aplicado a sujeitos passivos residentes em Portugal, conduzindo a sua aplicação estrita e literal a resultados contrários aos princípios da proporcionalidade e da neutralidade do IVA consagrados no Direito Comunitário.

M) O TJUE vem defendendo de forma reiterada que a falta de cumprimento de requisitos formais das faturas, não deverá comprometer o direito à dedução, princípio fundamental do regime do IVA, na esfera do adquirente dos serviços e bens, tendo-se inclusivamente pronunciado, a propósito da Oitava Diretiva no sentido de admitir o direito ao reembolso, ainda que não se mostre preenchido algum requisito de natureza formal (in casu a apresentação dos originais das faturas e sua substituição por um duplicado), contanto que a transação que está na origem do pedido de reembolso se tenha realizado e não haja riscos de pedido de reembolsos posteriores (dr. Acórdão de 11 de junho de 1998, processo n.º C-361/96, "Société Générale des grandes sources d'eaux minérales françaises").

N) A título de nota final, cumpre salientar que o acórdão mencionado na decisão ora recorrida - Acórdão do TCA Sul n.º 01761/07, de 12.06.2007 - e que fundamentou em exclusivo a posição defendida pelo Tribunal a gUD, mostra-se inaplicável à situacão sub judice, pois no referido aresto não estava em causa a apreciação de uma situação de pedido de reembolso ao abrigo da Oitava Diretiva, mas sim uma situação de direito à dedução que envolvia duas entidades residentes em Portugal e, como tal, ambas sujeitas aos requisitos de emissão de faturas previstos na legislação interna.

O) Tudo considerado, é assim evidente que a AT ao negar o direito ao reembolso de IVA com fundamento na inobservância do requisito previsto no artigo 7.º do DL 45/89 (na redação à data dos factos) viola frontalmente a Oitava Diretiva, sendo precisamente neste ponto que assenta o vício de violação de lei da decisão ora recorrida, o que motivará a sua anulação, bem como a consequente revogação do ato de indeferimento ora sindicado, tudo com as devidas consequências legais, mormente a concessão à Recorrente do reembolso no valor de EUR 590.395,55, acrescido dos juros indemnizatórios legalmente devidos.

P) Estipula o artigo 267.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, que o TJUE é competente para decidir, a título prejudicial, sobre a interpretação dos atos adotados pelas Instituições da União Europeia.

Q) O caso aqui em apreço visa a análise do quadro legislativo nacional face ao disposto na Oitava Diretiva (à data dos factos tributários) e face aos princípios da neutralidade do IVA e do direito fundamental à dedução do imposto e à jurisprudência do TJUE.

R) Considerando as questões levantadas pela Recorrente quanto à incompatibilidade dos atos tributários ora sindicados com a Oitava Diretiva e com os referidos princípios de Direito Comunitário, requer-se - caso este Venerando Tribunal entenda que a questão controvertida carece de interpretação pelo órgão jurisdicional comunitário - ao abrigo do artigo 267.º do Tratado, o reenvio prejudicial das seguintes questões para apreciação junto do TJUE:

a. Avaliar a desconformidade e desproporcionalidade da interpretação administrativa baseada no DL 45/89 face ao princípio da neutralidade do IVA e ao objetivo da Oitava Diretiva;

b. Avaliar se a circunstância de a Recorrente não poder deduzir o IVA suportado na operação sub judice não a coloca numa posição menos favorável que os sujeitos passivos residentes que numa situação idêntica podem exercer o direito à dedução do imposto suportado no prazo de quatro anos, nos termos do artigo 71.º, n.º 7 do CIVA (na redação à data dos factos).

S) Subsidiariamente - pois que apenas com a resposta à primeira questão e causa de pedir a Recorrente verá assegurada uma tutela jurisdicional efetiva da sua pretensão - a Recorrente pretende ver analisada a legalidade do procedimento tributário de indeferimento do pedido de reembolso objeto dos presentes autos, o qual, na ótica da Recorrente padece de um vício formal, consubstanciado na prolação de decisão sem notificação para exercício do direito de participação na modalidade de audição prévia previsto no artigo 60.º da LGT.

T) No caso em apreço, foi negada à Recorrente a possibilidade de se pronunciar previamente à decisão de indeferimento do pedido de reembolso de IVA, sendo assim evidente o vício de que padece o ato tributário ora sindicado, pois que o direito de audição apenas poderá ser suprimido, unilateralmente, pela Administração Tributária, no caso de norma legal expressa nesse sentido, o que não é manifestamente o caso, uma vez que tal dispensa apenas é possível nos casos previstos nos números 2 e 3 do artigo 60.º da LGT.

U) Ao contrário do invocado pela AT e admitido pelo Douto Tribunal a quo na sentença ora recorrida, resulta provado em 1.ª instância, que o TI Lisboa proferiu sentença a 23 de setembro de 2009 e a 6 de outubro de 2009 a ora Recorrente apresentou recurso jurisdicional da decisão, sendo que a notificação para exercício do direito de audição ocorreu apenas a 11 de fevereiro de 2010 (cfr. documento anexo às alegações apresentadas pela Fazenda Públia em 1.ª instância), i.e., a notificação surgiu na pendência do referido processo de recurso e não, como pretende fazer crer a Fazenda Pública, já após o trânsito em julgado do acórdão do STA.

V) Desta forma, não tendo a sentença proferida pelo Douto Tribunal a quo, em 23 de setembro de 2009, à data transitado em julgado, deveria o procedimento administrativo de reembolso que lhe estava subjacente ficar suspenso até decisão transitada em julgada no processo de recurso jurisdicional que correu termos junto deste Venerando TCA, ficando assim irremediavelmente condicionada a validade da referida notificação proferida pela AT.

W) Por outro lado, é inequívoco que in casu, atenta a prova junta em 1.ª instância, a audição da Recorrente se mostrava procedimentalmente relevante e suscetível de alterar o sentido da decisão final do procedimento, pelo que não estamos perante uma situação de degradação da formalidade de direito de audição em formalidade não essencial.

X) Constitui jurisprudência assente nos nossos tribunais que apenas quando se conclua que o ato inquinado do vício formal alberga a única solução juridicamente possível, ou a solução tenha sido atingida por outra via, é que a formalidade essencial se degrada em formalidade não essencial, permitindo, assim o aproveitamento do ato, o que não sucede manifestamente no caso em apreço, considerando que a Recorrente juntou nova documentação suscetível de alterar o sentido da decisão e veio ainda demonstrar que tal decisão assentava num vício de violação de lei, por violação direta da Oitava Diretiva.

Y) Face a tudo o acima exposto, é evidente que a sentença ora recorrida deverá também por este motivo ser revogada, uma vez que (i) carece de qualquer relevância a notificação para audição prévia efetuada no decurso do ano de 2010 por parte da AT, pois a sentença de 1.ª instância não havia transitado em julgado, pelo que não poderia ter sido desencadeado qualquer procedimento de execução voluntária da referida decisão, (ii) assim como improcede o argumento de que tal formalidade se havia degradado em formalidade não essencial, pelos motivos acima melhor expostos.

Z) Em harmonia com a mais recente jurisprudência dos nossos tribunais superiores e dada a simplicidade das questões materiais controvertidas, em função da posição já sustentada pela jurisprudência dos tribunais, a ora Recorrente vem requerer a este Venerando Tribunal, a fixação do valor do presente recurso no montante máximo de EUR 275.000, determinando-se igualmente nos presentes autos a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, nos termos e para os efeitos do n.º 7 do artigo 6.° do RCP.

Nestes termos, e nos melhores de Direito que os mui Ilustres Juízes CONSELHEIROS deste Venerando Tribunal assim o julgarem no seu MUI douto juízo, deve o presente recurso ser julgado totalmente procedente, determinando-se a revogação da sentença ora recorrida com base nos fundamentos acima melhor expostos, tudo com as devidas consequências legais.

Subsidiariamente, requer-se o reenvio prejudicial para o TJUE do presente processo quanto às questões relativas à incompatibilidade dos atos tributários ora sindicados com o Direito Comunitário, ao abrigo do disposto no artigo 267.e do Tratado.

Mais se requer a fixação do valor do presente recurso no montante máximo de EUR '275.000, determinando-se igualmente nos presentes autos a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, nos termos e para os efeitos do n.e 7 do artigo 6.° do RCP.

I.4. A sentença recorrida foi corrigida por despacho quanto à condenação em custas, de acordo com o invocado no recurso interposto pela representante da Fazenda Pública.
I.5. Notificadas as partes desse despacho, nada mais requereram.
I.6. Remetido o processo ao S.T.A., o exm.º magistrado do Ministério Público teve “vista”, emitindo o seguinte parecer:
“1.OBJECTO.
Sentença do TT de Lisboa, de 08/08/2018, que indeferiu impugnação judicial deduzida contra o ato de indeferimento de reembolso de IVA, formulado ao abrigo do disposto no DL 408/87, no entendimento de que das respetivas faturas não consta a menção de «processado por computador», nos termos do DL 45/89 e DL 198/90, não se mostrando violado o princípio da proporcionalidade nem a Oitava Diretiva (79/1072/CE).
Sustenta, também, a decisão recorrida que não ocorre o alegado vício formal de omissão do direito de audição prévia, uma vez que na sequência da 1.ª decisão proferia em 1.ª instância, em 16/09/2009, e que anulou o ato sindicado por vicio formal de omissão de audição prévia, a recorrente foi notificada para exercer esse direito sobre projeto de indeferimento de reembolso do IVA.
2.FUNDAMENTAÇÃO.
Comecemos pelo alegado vício de violação de lei.
O DL 408/87, de 31 de Dezembro, faz depender a concessão do reembolso do IVA da verificação dos seguintes pressupostos:
1.Que o sujeito passivo não tenha a sede da sua atividade ou estabelecimento estável em Portugal.
2.Que não tenha efetuado qualquer transmissão de bens ou prestação de serviços localizada em território nacional.
3.Que o imposto suportado diga respeito ao período do ano civil imediatamente anterior, com o limite do último dia do mês de Junho do ano seguinte ao que o imposto se tornou exigível.
4.Que o pedido seja apresentado em formulário próprio acompanhado dos originais das faturas emitidas nos termos do artigo 35.º do CIVA e por certificado comprovativo da sujeição a imposto emitido pelas autoridades fiscais do Estado membro onde o sujeito passivo se encontra estabelecido.
O referido diploma está em consonância com a Oitava Diretiva (79/1072/CE).
A questão controvertida traduz-se em saber se não contendo as faturas a expressão “processado por computador” mesmo assim podem servir de suporte ao reembolso do IVA pretendido pela recorrente.
Nos termos do artigo 22.º/3/ b) da SEXTA DIRETIVA (77/388/CEE) a fatura deve mencionar o preço líquido do imposto e o imposto correspondente a cada a taxa diferente e, se for o caso, a isenção.
De acordo com a alínea c) do mesmo artigo e número “Os Estados-Membros estabelecem os critérios segundo os quais um documento pode servir de fatura.
Ora, à data dos factos, os elementos que deviam constar da fatura constavam do artigo 35.º do CIVA, sendo certo que a partir de 01/01/1992, a numeração e impressão das faturas e documentos equivalentes referidos naquele normativo passou a ter que obedecer aos requisitos exigidos nos artigos 3.º/3, 4.º e 7.º a 11.º do DL 45/89, de 11/02 ex vi do artigo 5.º do DL 198/90, de 19/06.
Assim, no caso em análise, as faturas que foram juntas pela recorrente para fundamentar o pedido de reembolso do IVA deveriam conter a expressão “processado por computador”, mas não contêm, como resulta do probatório.
O artigo 5.º do DL 198/90 submete, assim, as faturas e documentos equivalentes aos acrescidos requisitos formais ali previstos, com vista ao combate e evasão fiscal e a partir de então só podem ser consideradas como faturas passadas na forma legal as que observem os requisitos enunciados tanto no artigo 35.º/5 do CIVA (redação data dos factos) como no diploma referenciado naquele DL (acórdão do STA, de 18/11/2009-recuros n.º 0712/09, disponível em www.dgsi.pt).
Trata-se de formalidades ad substantiam, pelo que o seu incumprimento determina que não estejamos perante faturas ou documentos equivalentes emitidos na forma legal, suscetíveis de fundamentar o direito à dedução ou reembolso do IVA.
De facto, não se vêm razões legais válidas para distinguir entre direito à dedução e ao reembolso no que concerne às faturas ou documentos equivalentes de suporte, que devem ser os originais, emitidos, claro está, nos termos qua a lei impõe.
Assim sendo, salvo melhor juízo não se vê que tenha sido violado o princípio da proporcionalidade e a Oitava diretiva.
Ressalvado melhor juízo, parece inexistir dúvida razoável que determine o requerido reenvio prejudicial para o TJUE.
Vejamos, agora, o apontado vício de forma por omissão do exercício do direito de audição prévia.
Sustenta a decisão recorrida que não ocorre tal vício, porquanto, na sequência da primeira decisão de 1.ª instância, de 16/09/2009, que anulou o ato de indeferimento de reembolso por omissão do exercício do direito de audição prévia, em 04/02/2010, a AT notificou a recorrente para, em 15 dias, exercer o direito de audição prévia, nos termos do artigo 60.º da LGT, do projeto de indeferimento relativo ao pedido de restituição do IVA.
Em concordância com a recorrente, afigura-se que, salvo melhor opinião, neste segmento, a decisão não se pode manter.
De facto, a referida notificação carece de relevância jurídica uma vez que quando foi efetuada, a decisão que havia anulado o ato, não tinha, ainda, transitado em julgado, pois que veio a ser revogada por acórdão do STA, de 07/12/2010, pelo que, em nosso entendimento, não poderia ter sido desencadeado qualquer procedimento de execução voluntária da referida decisão.
Na verdade, como alega a recorrente, o procedimento administrativo de reembolso que lhe estava subjacente deveria ter ficado suspenso até trânsito em julgado da decisão a proferir em sede do recurso jurisdicional, então, interposto.
Portanto, pode afirmar-se que a recorrente não foi, validamente, notificada para o exercício do direito de audição prévia.
O direito consagrado nos artigos 100º do CPA (correspondente ao atual artigo 121.º), 45º/1 do CPPT e 60º da LGT constitui uma concretização do princípio da participação dos particulares na formação das decisões administrativas que lhe digam respeito, dando, assim, satisfação à diretriz consagrada no art. 267º/5 da CRP, revestindo a natureza de um princípio estruturante da lei especial sobre o processamento da actividade administrativa, traduzindo a intenção legislativa de atribuição de um verdadeiro direito subjetivo procedimental.
Nos termos do disposto no artigo 60.º/1/b) da LGT, o contribuinte deve ser ouvido antes de ser proferida decisão desfavorável.

Portanto, no caso em análise, impunha-se a obrigação de audição da recorrente antes da decisão de indeferimento do pedido de reembolso, uma vez que, salvo melhor juízo, a decisão impugnada não se apresenta como uma inelutabilidade legal, como se pode constatar através da argumentação expendida pela impugnante/recorrente.

Ocorre, pois, vício de forma suscetível de determinar, a anulação do ato sindicado, nos termos do disposto no artigo 135.º do CPA (atual artigo 163.º).
O recurso merece parcial provimento.
3.DA DISPENSA DE PAGAMENTO DO REMANESCENTE DA TAXA DE JUSTIÇA.
Nos termos do disposto no artigo 6.º/7 do RCP “nas causas de valor superior a € 275.000,00, o remanescente da taxa de justiça é considerado na conta final, salvo se a especificidade da situação o justificar e o juiz de forma fundamentada, atendendo designadamente à complexidade da causa e à conduta processual das partes, dispensar o pagamento.
São, designadamente, dois os pressupostos de dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça:
-A menor complexidade ou simplicidade da causa;
-A positiva atitude de cooperação das partes.
Nos termos do disposto no artigo 530.º/7 do CPC “para efeitos de condenação no pagamento de taxa de justiça, consideram-se de especial complexidade as ações e os procedimentos cautelares que:
- Contenham articulados ou alegações prolixas;
- Digam respeito a questões de elevada especialização jurídica, especificidade técnica ou importem a análise combinada de questões jurídicas de âmbito muito diverso; e
- Impliquem a audição de um elevado número de testemunhas, a análise de meios de prova extremamente complexos ou a realização de várias diligências de produção de prova morosas.
Ora, no caso dos autos, embora pareça não estarem em causa questões de especial complexidade, nos termos enunciados, as questões em apreciação e que têm a ver com as formalidades das faturas para efeitos de pedido de restituição de IVA e sua conformidade como o Direito da União Europeia e vício de forma do ato de indeferimento de pedido de restituição de IVA não deixam de ser questões complexas.
As partes tiveram uma atitude positiva de cooperação, sendo certo que a FP não contra-alegou.
A recorrente pagou € 816,00 pelo impulso processual com a interposição do recurso, sendo certo que o remanescente da taxa de justiça, ressalvado eventual erro de cálculo, ascenderá a cerca de € 1.930,00.
Ora, ressalvado melhor juízo, pelo circunstancialismo referido, não se afigura que o montante da taxa de justiça seja desproporcional ao serviço judiciário prestado, nem que se mostrem violados os princípios do acesso ao direito e à tutela jurisdicional efetiva (artigos 20.º, 266.º/2 e 264.º/2 da CRP).
Assim sendo, ressalvado melhor juízo, parece não se justificar a dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça.
4.CONCLUSÃO.
Deve dar-se parcial provimento ao recurso e revogar-se a sentença recorrida no segmento em que julgou não verificado o vício de forma, por omissão do exercício de audição prévia, e, em substituição anular-se o ato sindicado com fundamento nesse mesmo vício e indeferir-se o pedido de dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça.

I.6. Após o processo foi a “vistos” dos exm.ºs Conselheiros adjuntos.
I.7. Nada obsta a que se conheça apenas do recurso interposto pela impugnante.
II. Objeto do recurso.
Sendo de definir o recurso de acordo com as conclusões da recorrente A………….., S.A., custas, restringe-se o mesmo à apreciação das seguintes questões:
- Se, ao contrário do decidido, o ato de indeferimento do pedido de reembolso de IVA do ano de 2003 no valor de € 590 395,55 padece de ilegalidade por violação da Oitava Directiva (na redacção à data dos factos), nomeadamente, do seu art. 5.º;
- Subsidiariamente, se, ao contrário do decidido, o procedimento tributário de indeferimento do pedido de reembolso, sofre de ilegalidade por violação expressa do princípio da participação dos contribuintes.
- Se é de fixar o valor para efeitos de recurso em € 275 000 e dispensar o pagamento do remanescente da taxa de justiça, nos termos do art. 6.º n.º 7 do R.C.P..
A propósito da 1.ª questão, atrás enunciada, se apreciará, em conexão, se é de proceder ao reenvio prejudicial das questões colocadas para apreciação, a título prejudicial pelo T.J.U.E., nos termos do art. 267.º do T.F.U.E., as quais foram a de avaliar a desconformidade e desproporcionalidade da interpretação administrativa baseada no DL 45/89 face ao princípio da neutralidade do IVA e ao objetivo da Oitava Diretiva, bem como ainda se ao não poder deduzir o IVA foi numa posição menos favorável que os sujeitos passivos residentes que numa situação idêntica podem exercer o direito à dedução do imposto suportado no prazo de quatro anos, nos termos do artigo 71.º, n.º 7 do CIVA (na redação à data dos factos).
III. Fundamentação.
III. 1. De facto.
Na sentença recorrida deram-se por provados os seguintes factos:
A) No ano de 2003 a A……….., SA (sociedade impugnante) tinha o domicílio fiscal em Bruxelas, Bélgica, sendo sujeito passivo de IVA, nesse País, com o NIF …….. (doc de fls 17, dos autos);
B) Em 13-03-2003 a sociedade impugnante adquiriu equipamento industrial à empresa “B……….” com domicílio fiscal em Portugal, que liquidou IVA a 19%, no montante total de €590.395,55, conforme facturas emitidas pela vendedora, junto como doc de fls 71 a 74, dos autos;

C) Em 09-07-2003 a impugnante apresentou junto da Direcção de Serviços de Reembolso do IVA, pedido de reembolso a que coube o nº 030278730 formulado ao abrigo do DL nº 408/87, de 31-12, no montante global de €590.395,55 (doc de fls 67 a 74, dos autos);

D) Em 23-06-2004 o Director dos Serviços de Reembolso do IVA indeferiu o pedido de reembolso identificado em C), visto não reunir os requisitos previstos no artº 5º nº 1 do DL nº 408/87, de 31-12, dado que as facturas não estavam emitidas na forma legal, nomeadamente não contendo a indicação de terem sido processadas por computador e os dados identificativos da tipografia que as imprimiu (fls 63 a 77 do PAT e informação de fls 54 a 65, do PAT);

E) Através do ofício datado de 06-07-2004 a sociedade impugnante foi notificada pela AT do indeferimento do pedido de reembolso, identificado em C) (doc de fls 28 e 29, dos autos);

F) Em 06-10-2004 deu entrada no extinto TAF de Lisboa a impugnação deduzida pela sociedade impugnante (carimbo de entrada de fls 3, dos autos);

G) Em 16-09-2009 foi proferida sentença que julgou procedente a impugnação com fundamento na preterição de formalidade legal;

H) Por ofício de 04-02-2010 a AF notificou a impugnante para, em 15 dias exercer o direito de audição prévia, nos termos do artº 60º da LGT, do projecto de indeferimento, relativo ao pedido de restituição;

I) Da sentença a impugnante interpôs recurso para o TCA Sul que foi admitido por despacho de 20-10-2009 que, por Acórdão de 18-05-2010 se declarou incompetente e conceder competência ao STA;

J) Por Acórdão de 07-12-2010 o STA deu provimento ao recurso, baixando os autos para nova decisão.

Quanto a factos não provados ficou a constar o seguinte: “Com interesse para a decisão da causa não se provaram outros factos.”
Mais se consignou: “A decisão da matéria de facto efectuou-se com base no exame crítico dos documentos e informações oficiais vinculativas, não impugnados, bem como da posição das partes”.

III.2. De direito.

III.2. a. Se, ao contrário do decidido, o ato de indeferimento do pedido de reembolso de IVA do ano de 2003 no valor de € 590 395,55 padece de ilegalidade por violação da Oitava Directiva (na redacção à data dos factos), nomeadamente do art. 5.º, e do princípio da proporcionalidade, bem como ainda se se impõe proceder ao requerido reenvio prejudicial.
O pedido de reembolso de IVA, apresentado em 9-7-2003, pela impugnante, ora recorrente foi acompanhado de aturas passadas à empresa “B…………” com domicílio fiscal em Portugal, resultando ainda do probatório que a mesma tinha domicílio fiscal na Bélgica, com o NIF que foi ainda indicado.
O pedido veio a ser indeferido com fundamento em “que as facturas não estavam emitidas na forma legal, nomeadamente não contendo a indicação de terem sido processadas por computador e os dados identificativos da tipografia que as imprimiu”.
Na sentença recorrida julgou-se que tal indeferimento não padecia de ilegalidade, no entendimento de, quanto às faturas em causa, de origem de outro Estado membro, ser aplicável o art. 7.º do Dec.-Lei n.º 45/89, de 11/2.
Sustenta-se na referida sentença que o previsto neste art. 7.º é aplicar com efeitos substanciais e em termos impeditivos do deferimento do pedido de reembolso, mesmo considerando o princípio da proporcionalidade que norteia o sistema de IVA.
Em abono reproduz-se fundamentos constantes do acórdão do T.C.A. Sul de 12-6-2007, proferido no processo n.º01761/07, nomeadamente, que mesmo após “o DL 45/89 ter sido revogado pelo DL 147/2003JUL11, tal exigência foi mantido pela remessa efetuada pelo art. 5.º do DL 256/2003”, bem como que o entendimento “se compagina com a Diretiva 77/388/CEE de 1997Mai17 (6.ª Directiva) já que o legislador nacional, no domínio que agora nos ocupamos estava autorizado a adoptá-lo, uma vez que o que dela decorre é que os Estados membros ficaram autorizados a definir os critérios necessários à definição do próprio conceito de fatura, para efeitos de IVA”,
Com o devido respeito, a dita aplicação e entendimento tido não são no presente caso de acolher.
O pedido de reembolso de IVA foi apresentado ao abrigo do Dec.-Lei n.º 408/87, conforme consta do probatório.
Por esse diploma – entretanto já revogado - foi admitido que os sujeitos passivos residentes noutro país da União Europeia (e mesmo de países terceiros) pudessem pedir reembolsos de IVA em Portugal, na transposição da Oitava Diretiva de IVA, identificada no seu preâmbulo, e que se encontra publicada no Jornal Oficial n.º L 331 de 27/12/1979, pág.11-19.
No art. 5.º n.º 1 do referido Dec.-Lei previu-se que o pedido de reembolso fosse “acompanhado dos seguintes documentos:
a) Originais dos documentos de importação e das facturas ou documentos equivalentes, passados nos termos dos artigos 35.º ou 38.º do CIVA, comprovativos de que o IVA foi suportado;
b) Certificado, emitido pelo Estado membro onde se encontra estabelecido, comprovativo da sua sujeição a imposto sobre o valor acrescentado, o qual será válido pelo período de um ano a contar da data de emissão”.
Não havendo dúvidas quanto a ser de proceder a uma aplicação deste norma em conformidade com a Oitava Diretiva de IVA, de acordo com a regra do primado do Direito da União Europeia, que emana do acórdão Costa v. ENEL, do Tribunal de Justiça da então CEE, proferido a 15 de Julho de 1964, no proc. C-6/64, desde logo resulta que os documentos acima referidos estão de acordo com o previsto no art. 2.º dessa Diretiva, em que constam ainda outros, mas sem que se colha qualquer referência aos previstos no art. 7.º do Dec.-Lei n.º 45/89, de 11/2.
Por outro lado, este dispositivo, inicialmente previsto quanto a documentos de transporte, veio a ser estendido quanto às faturas e documentos equivalentes previstos no art. 35.º do CIVA pelo Dec.-Lei n.º 198/90, de 19/6, sem que as referidas normas tenham alguma vez sido inseridas no artigo 35.º do CIVA, em que se prevêem as formalidades aplicáveis quanto a faturas.
Certo é que a jurisprudência do S.T.A. chegou já a admitir a aplicação do dito art. 7.º do acima referido Dec.-Lei para efeitos de exercício do direito à dedução de IVA, conforme dá notícia o exm.º magistrado do Ministério Público, embora por referência a legislação posterior à ora em causa.
Contudo, conforme o S.T.A. também já reconheceu, “[o] direito à dedução do imposto suportado a montante, constitui característica fundamental do sistema comum do IVA, essencial para garantia da neutralidade do imposto e "peça-chave" do seu funcionamento”- assim, no Acórdão do S.T.A. de 8 de Julho de 2009 no processo 0199/99, acessível em www.dgsi.pt, quase contemporâneo do citado.

E o Tribunal de Justiça (T.J.) tem também declarado em vários acórdãos que as condições de reembolso em excesso, implementadas pelos Estados-membros, não podem ofender o princípio da neutralidade do sistema do imposto, bem como que os meios implementados pelos Estados, com vista a obviar à fraude e evasão fiscais, são de restringir ao estritamente necessário, tendo chegado já decidir que, no caso de serem aplicados a determinado grupo de contribuintes, presumivelmente de maior risco, não podem deixar de ser considerados desproporcionais e que ofendem os objectivos do dito sistema - Acórdãos Molenheide e o., de 18-12-97, publicado na Colect. p-I, 7281, n.ºs 46 e 47, de 27-9-2007, Teleos e o., Proc. C-409/04, Colect., p. I-7797, n.os 52 e 53, e de 21-2-2008, Caso Netto Supermarkt, Proc. C-271/06, Colect. p. I00771, n.os 19 e 20, citados por Clotilde Celorico Palma em comunicação inserida em e-book, organizado pelo C.E.J. “Tributação Indireta/IVA e IEC, Maio 2019”.
Ora, a similitude com o presente caso é manifesta, porquanto o previsto no art. 7.º do Dec.-Lei n.º 45/89, de 11/2, visou objectivos de combate à fraude e evasão fiscal, conforme se pode ler no seu preâmbulo.
Por outro lado, resulta que o requerente se insere no grupo de não residentes, havendo presumido maior risco de ocorrer a violação do dito princípio da neutralidade ao se terem aplicado requisitos constantes do mesmo em fundamento da recusa de reembolso.
Aliás, sem que fosse dada oportunidade ao requerente de prestar quaisquer outras informações, conforme previsto no n.º 2 do referido art. 5.º do Dec.-Lei n.º 408/87, resulta manifesta desproporcionalidade e ofensa dos objectivos do sistema.
Impõe-se, pois, conceder provimento ao recurso interposto, revogar o decidido e anular o impugnado indeferimento.
Assim sendo, e por aplicação da teoria do ato claro consagrada ainda no acórdão CILFIT de 6-1-1982, no proc. C-283/81, do T.J. não se justifica colocar à apreciação desse Tribunal as questões suscitadas pela impugnante para apreciação do recurso interposto.
Resulta ainda prejudicado o conhecimento da violação do princípio do princípio da participação.
III. 3. b. Do valor a fixar para efeito de custas e da dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça.
Nos termos previstos no art. 7.º n.º 6 do R.C.P., não há fundamento para alterar o valor fixado para efeitos de custas.
No entanto, com fundamento nesta disposição, dispensamos o pagamento do remanescente da taxa de justiça na proporção de 50%, pois resulta excessivo o pagamento pela totalidade, nas circunstâncias dos autos relatadas, das quais resulta não ser censurável o comportamento das partes, e tendo a questão apreciada significativa complexidade.
IV. Decisão:
Os juízes Conselheiros da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo acordam em conceder provimento ao recurso, revogam o decidido na sentença recorrida e anulam o impugnado indeferimento.

Lisboa, 6 de maio de 2020. – Paulo Antunes (relator) – Aragão Seia – Francisco Rothes.