Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0915/16.4BEBRG 0183/18
Data do Acordão:01/22/2020
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:SUZANA TAVARES DA SILVA
Descritores:NOTIFICAÇÃO DA LIQUIDAÇÃO
MANDATÁRIO
RELATÓRIO
INSPECÇÃO TRIBUTÁRIA
Sumário:I - Os actos de liquidação praticados no seguimento de um procedimento de inspecção tributária em que tenha sido constituído mandatário tributário são actos intrinsecamente ligados àquele procedimento, mas que gozam de autonomia jurídico-procedimental em relação ao mesmo, uma vez que o procedimento de inspecção tributária termina com a assinatura do relatório final da inspecção, onde são sistematizados os factos detectados e sua qualificação jurídico-tributária, e o sancionamento superior das suas conclusões.
II - A referida autonomia jurídico-procedimental daqueles actos de liquidação adicional determina que a sua eficácia, nos casos em que tenha sido constituído mandatário tributário no âmbito do procedimento de inspecção tributária, dependa apenas de notificação dos mesmos segundo a regra geral da notificação dos actos tributários do artigo 36.º, n.º 1 do CPPT, e não de notificação ao mandatário tributário nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 40.º do CPPT;
III - Admite-se, contudo, que é adequado e desejável, atento o nexo funcional que o acto de liquidação adicional mantém com as conclusões do relatório de inspecção tributária, que os serviços notifiquem também o mandatário tributário daqueles actos, mas a falta dessa notificação não afecta a eficácia do acto de liquidação, nem pode, à luz do actual quadro legal, consubstanciar uma irregularidade.
Nº Convencional:JSTA000P25433
Nº do Documento:SA2202001220915/16
Data de Entrada:02/21/2018
Recorrente:AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Recorrido 1:A...
Votação:UNANIMIDADE COM 1 DEC VOT
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

I – Relatório

1 - A Fazenda Pública, inconformada com a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, que, em 29 de Junho de 2017, julgou procedente a oposição à execução fiscal deduzida por A…………., identificado nos autos, e declarou a extinção do processo de execução fiscal instaurado por dívidas de IVA, relativas aos anos de 2013 e 2014 e respectivos juros, perfazendo o total de € 20.270,32, a que acresce juros de mora e custas, apresentou, para tanto, alegações que concluiu do seguinte modo:
I - O presente recurso tem por objeto a douta sentença proferida no processo supra referenciado que julgou procedente a oposição e, em consequência, determinou a extinção do processo de execução fiscal, por se verificar, salvo o devido e muito respeito que nos merece, que a mesma padece de erro de julgamento, em matéria de direito, no que se refere à interpretação e aplicação do artigo 40°, n.° 1, do CPPT, ao considerar condição de eficácia do ato tributário de liquidação, a notificação das liquidações ao mandatário do sujeito passivo constituído no procedimento de inspeção tributária.
II - Na situação em apreço, o sujeito passivo constituiu mandatário no procedimento de inspeção tributária, tendo o mesmo sido regularmente notificado do início do procedimento inspetivo [cfr. artigo 51.°, n.° 2, do RCPITA], bem como para o exercício do direito de audição prévia [cfr. artigo 60.º do RCPITA], e notificado do relatório final do procedimento de inspeção tributária, pelo que, considerando-se concluído o procedimento nesta data [cfr. artigo 62.°, n.° 2, do RCPITA], não se nos afigura existir obrigação legal de o ser quanto à liquidação do ato tributário.
III - Com o fim do concreto procedimento ao qual foi requerida a junção da procuração, deixa de haver objeto no alcance da dita procuração, a qual visava o procedimento de inspeção tributária e do seu teor resulta que a mesma «não abrange qualquer tipo de representação fiscal, designadamente a prevista no art.° 19.°/n.° 5 da LGT, no art.º 130.° do CIRS, no art.° 126.° do CIRC e no art.° 30.º do CIVA.».
IV - O Supremo Tribunal Administrativo já se pronunciou sobre a questão da necessidade de apresentação de uma procuração em cada procedimento, por douto acórdão proferido em 2017-09-13, no processo n.° 01356/16, entendendo que «contrariamente ao que se verifica no instituto da representação fiscal (artigos 19.º/6 da LGT; 130.º CIRS; 126.º CIRC e 30.º CIVA), no domínio do mandato tributário o domicílio fiscal não passa a ser o do representante, sendo certo que, [a] não se encontra norma legal vigente que imponha à AT qualquer dever de arquivar as procurações passadas pelos contribuintes a conferir mandato tributário no respetivo cadastro. Na verdade, atento o disposto nos artigos 44.º e 45.º do CPC e 67.º 1 do CPA, as procurações passadas a conferir o mandato tributário devem ser juntas a cada um dos processos ou procedimentos em que seja interveniente o mandante, como bem decidiu a sentença recorrida.».
V - Concluindo o citado aresto que «Não recai sobre a Administração Tributária a obrigação de associar uma procuração, que exclui a representação fiscal, passada a mandatário, ao cadastro dos contribuintes com a inerente obrigação de, no futuro, proceder a todas as notificações dos atos procedimentais da sua iniciativa na pessoa do mandatário constituído, permitindo a intervenção deste em todos os atos, sem necessidade de apresentação de uma procuração em cada procedimento.».
VI - No caso dos autos, o mandato tributário conferido pelo sujeito passivo ao advogado, não se confunde com a representação fiscal, pelo que não ficou o respetivo mandatário, por aquele instrumento, habilitado a receber as notificações das liquidações do sujeito passivo.
VII - Em conformidade com o exposto, por incorreta interpretação e aplicação do disposto no artigo 40.°, n.° 1, do CPPT, terá sido feito um errado julgamento.
Termos em que, concedendo-se provimento ao recurso, deverá a douta sentença recorrida ser revogada e a oposição julgada improcedente, com todas as consequências legais».


2 – A Recorrida não apresentou contra-alegações.

3 - O Excelentíssimo Senhor Procurador-Geral Adjunto junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso por considerar que o procedimento de inspecção tributária tem carácter meramente preparatório ou acessório do acto exequendo de liquidação do tributo, consubstanciando o RIT a fundamentação do acto tributário, pelo que o mandato tributário não pode deixar de ser válido para o procedimento de liquidação e, nos termos do disposto no artigo 40.° do CPPT, as notificações aos interessados que tenham constituído mandatário são feitas na pessoa deste, salvo quando a notificação tenha em vista a prática de acto pessoal.

4 - Colhidos os vistos legais, cabe decidir.

II – Fundamentação

1. De facto
Na sentença recorrida deu-se como assente a seguinte factualidade concreta:
A) No SF de Viana do Castelo foi instaurado, o processo de execução fiscal n.° 2348201601005715 e aps., por dívidas de Imposto sobre o Valor Acrescentado [IVA] relativas aos anos de 2013 e 2014 e respectivos juros, perfazendo a quantia exequenda o total de € 20.270,32, a que acresce juros de mora e custas;
B) O PEF identificado na al. anterior teve origem nas liquidações de IVA, juntas com a PI sob os docs. n.°s 15 a 27, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzidos para todos os efeitos legais:

C) As liquidações referidas na al. anterior tiveram origem em procedimentos de Inspecções Externas, sob as ordens de serviço n.° OI201500026, n.° OI201500027, n.° OI201500028, com data de início de 10-03-2015 — cf. docs. n.ºs 1 e 2 juntos com a contestação, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
D) As ordens de serviço mencionadas na al. anterior foram notificadas ao aqui oponente a coberto dos ofícios n°s 00814, 00813 e 00814, todos datados de 12-03-2015 — cf. doc. n..° 1, composto de 3 fls., junto com a contestação, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
E) No dia 16-03-2015 o oponente, constituí seu mandatário, o Dr. ……….., advogado com escritório em Viana do Castelo, outorgando procuração forense, cujo teor se passa a reproduzir:


cfr. fls. 2 do doc. n.º 14 junto com a PI cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
F) No dia 17-03-2015, a procuração referida na al. anterior foi apresentada na Direcção de Finanças de Viana do Castelo, para ser junta aos serviços de inspecção tributária — divisão: DIT, procedimentos inspectivos identificados em C. — cfr. doc. n.° 14 junto com a PI cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
G) Pelo ofício datado de 15-09-2015, sob a ref.ª 03183, dirigido ao Dr. …………., na qualidade de mandatário do sujeito passivo identificado na al. A. dos factos provados, o SF comunicou o teor do relatório final da acção inspectiva mencionada na al. C e do teor do despacho que sobre o mesmo recaiu - cfr. doc. n.° 3 junto com a contestação cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
H) As liquidações referidas em B. foram notificadas ao oponente - cfr. docs. n.° 15 a 27 juntos com a cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
*
Factos não provados
A) notificação das liquidações, mencionadas na al. B. dos factos provados, ao mandatário identificada na al. E. dos factos provados — facto não controvertido

2. Questão a decidir
Saber se quando tenha sido constituído mandatário judicial no âmbito de um procedimento de inspecção tributária e, a final, venha a ser praticado um acto de liquidação adicional esse acto pode ser notificado ao mandatário ou se a sua eficácia depende da respectiva notificação ao sujeito passivo.

3 – Do direito

3.1. A questão aqui subjacente não é nova nem pacífica na jurisprudência deste Supremo Tribunal Administrativo. Sobre ela se pronunciou o acórdão de 3 de Maio de 2018 (proc. 0167/18) no sentido de que “[C]oncluído o procedimento de inspeção, nos termos do artigo 62.º, n.º 1 e 2 do RCPITA, termina o mandato constituído no âmbito deste procedimento”. Assim, apoiando-se no acórdão, também deste Supremo Tribunal Administrativo, de 13 de Setembro de 2017 (proc. 01356/16), onde se havia concluído que “contrariamente ao que se verifica no instituto da representação fiscal (artigos 19.º/6 da LGT; 130.º CIRS; 126.º CIRC e 30.º CIVA), no domínio do mandato tributário o domicílio fiscal não passa a ser o do representante”, o primeiro aresto mencionado conclui que “o mandato tributário conferido pelo sujeito passivo a advogado, não se confunde com a representação fiscal, pelo que não ficou a respectiva mandatária, por aquele instrumento, habilitada a receber as notificações das liquidações do sujeito passivo”.

O referido acórdão de 3 de Maio de 2018 (proc. 0167/18) é acompanhado de um voto de vencido, onde se critica a tese que obteve vencimento na decisão, por se considerar não “ser razoável que a constituição [de mandatário] durante um procedimento de inspecção não releve para o acto de liquidação que é o único acto impugnável e, na tese que logrou vencimento, o único para o qual parece ser impossível constituir mandatário”.

As teses em confronto do aresto de 2018 parecem ambas concordar em que “o acto de notificação de uma liquidação tributária não pode considerar-se como um acto pessoal para efeitos do n.º 2 do artigo 40.º do C.P.P.T., uma vez que não se trata de qualquer notificação do interessado para comparecer ou praticar qualquer acto”, mas divergem quanto à integração ou não do acto de liquidação ainda no âmbito do procedimento de inspecção tributária, bem como no âmbito do mandato tributário para este efeito, ou seja, na aplicação ou não, ao caso, da regra do n.º 1 do artigo 40.º do CPPT.

3.2. No recurso que nos cabe apreciar, o Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga julgou procedente a oposição à execução fiscal deduzida pelo sujeito passivo e declarou a extinção do processo de execução fiscal por considerar, precisamente, que, à luz do n.º 1 do artigo 40.º do CPPT, “a notificação ao mandatário do sujeito passivo constituído no procedimento de inspecção tributária dos actos de liquidação praticados em conclusão daquele procedimento é condição de eficácia daqueles actos”. Uma decisão que, pelas razões que iremos expor, aqui não podemos acompanhar.

Pensamos que é pacífico na jurisprudência pretérita, quer o carácter receptício do acto de liquidação — trata-se de um acto administrativo constitutivo de deveres ou encargos e, como tal, só é eficaz a partir da respectiva notificação ao destinatário ex vi do artigo 36.º, n.º 1 do CPPT e 160.º do CPA —, quer o entendimento, como já dissemos, de que a notificação de um acto de liquidação não integra o conceito de acto de natureza pessoal para efeitos do n.º 2 do artigo 40.º do CPPT – ou seja, em que se exija a notificação do sujeito passivo, mesmo quando este tenha constituído mandatário tributário e para além da notificação do primeiro.

Acompanhamos também o entendimento que pensamos estar subjacente à tese que fez vencimento no acórdão de 3 de Maio de 2018 (proc. 0167/18) de que o acto de liquidação adicional, embora intrinsecamente ligado ao procedimento de inspecção tributária (tanto assim é que a fundamentação deste pode fazer-se por remissão para as conclusões daquele – v. artigo 63.º, n.º 1 do Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária e Aduaneira), goza de uma autonomia jurídico-procedimental em relação àquele, na medida em que, sendo consequente daquele procedimento, o acto de liquidação é praticado após o acto com o qual culmina o procedimento de inspecção tributária (i. e, após o acto de aprovação do relatório) e é também praticado por funcionários de uma área operativa diversa embora dentro da mesma estrutura orgânica [cf. artigo 16.º do Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária e Aduaneira e, a nível dos serviços centrais, também a Direcção de Serviços de Planeamento e Coordenação da Inspecção Tributária se distingue das restantes direcções de serviços (v. al. q do artigo 2.º da Portaria n.º 320-A/2011, de 30 de Dezembro)].

Igualmente estamos de acordo quanto à necessidade de distinguir claramente entre os institutos jurídicos do representante fiscal (artigos 19.º/6 da LGT; 130.º CIRS; 126.º CIRC e 30.º CIVA), cuja constituição é obrigatória nos casos legalmente previstos, e que visa assegurar a representação do contribuinte (permanente ou temporariamente) não residente perante a administração fiscal quanto às suas obrigações; e do mandatário tributário (artigos 5.º do CPPT), cuja constituição é facultativa, e que pode, em nome do contribuinte, praticar actos de natureza procedimental ou processual tributária que não tenham carácter pessoal, estando esse exercício limitado aos profissionais expressamente indicados pelo legislador no caso em que se suscitem ou discutam questões de direito perante a administração tributária em quaisquer petições, reclamações ou recursos.

E sufragamos ainda o entendimento expresso no acórdão de 13 de Setembro de 2017 (proc. 01356/16) de que “atento o disposto nos artigos 44.º e 45.º do CPC e 67.º 1 do CPA, as procurações passadas a conferir o mandato tributário devem ser juntas a cada um dos processos ou procedimentos em que seja interveniente o mandante”.

Por tudo isto, entendemos que o acto de liquidação adicional decorrente de procedimento de inspecção tributária em que tenha sido constituído mandatário tributário tem apenas, legalmente, de ser notificado ao contribuinte / sujeito passivo, por se tratar de um acto que, como vimos [e se deixou expresso no acórdão deste Tribunal Supremo de 3 de Maio de 2018 (proc. 0167/18)]: i) goza de autonomia jurídico-procedimental face ao procedimento tributário; ii) constitui sobre o contribuinte / sujeito passivo deveres e encargos diversos daqueles que resultavam do status instituído pelo procedimento de inspecção tributária; e iii) consubstancia ou pode consubstanciar o início de novos procedimentos administrativos impugnatórios, nos quais ele decidirá se pretende renovar o mandato tributário com o anterior mandatário (tendo, para o efeito, que juntar novamente procuração), constituir novo mandatário tributário ou passar a relacionar-se directamente com a Administração Tributária.

Apesar da solução ditada pelo direito positivo, parece-nos que os princípios legais informadores do procedimento tributário (artigo 55.º da LGT), em especial o princípio da colaboração (artigo 59.º da LGT), recomendam que a notificação daquele acto se faça também ao mandatário tributário – por se considerar que, não obstante a existência da referida autonomia jurídico-procedimental do acto de liquidação, subjaz, neste caso, à intrínseca relação que aquela liquidação mantém com o procedimento de inspecção tributária, um interesse fundado (ainda que não legalmente protegido) do mandatário ao conhecimento do conteúdo daquele acto para a conclusão do seu múnus, que há-de abranger ainda a verificação da conformidade daquele acto com as conclusões fixadas no relatório da inspecção tributária e, sobretudo, do respectivo conteúdo com a fundamentação alcançada no referido relatório. E este interesse do mandatário configura-se, em última instância e de modo consequente, também como uma refracção das garantias do contribuinte / sujeito passivo.

Desta conclusão de adequação ou propriedade de uma dupla notificação do acto de liquidação adicional não resulta, porém – sublinhe-se novamente – face à actual ausência de norma legal que a imponha ou recomende, uma obrigação jurídica de a Administração Tributária promover essa dupla notificação – que poderia até revelar-se demasiado onerosa para os serviços (algo que tenderá a ser facilitado com a informatização das comunicações). Na verdade, não sendo a notificação do mandatário tributário neste caso abrangida pelo disposto no n.º 1 do artigo 40.º do CPPT em razão da autonomia jurídico-procedimental do acto de liquidação adicional não se pode sequer afirmar que a sua falta consubstancie uma irregularidade por preterição de uma formalidade não essencial.

Apenas a falta de notificação daquele acto de liquidação ao contribuinte/sujeito passivo determina, de acordo com a lei, nos termos do já mencionado n.º 1 do artigo 36.º do CPPT, a ineficácia do acto de liquidação.

3.3. Na sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, aqui recorrida, ficou provado que os actos de liquidação a que se reporta o processo de execução fiscal onde foi deduzida oposição foram correctamente notificados ao contribuinte (v. ponto H da matéria de facto dada como provada), não tendo ficado provado que a mesma notificação tenha ocorrido relativamente ao mandatário tributário, tendo por essa razão concluído o Tribunal que aqueles actos de liquidação seriam ineficazes, o que fundamentou a sua decisão de conceder procedência à oposição à execução fiscal. Uma decisão que, pelas razões antes aduzidas, não pode manter-se.

Com efeito, uma vez que os actos de liquidação são eficazes por terem sido correctamente notificados ao contribuinte / sujeito passivo (a quem teriam sempre de ser notificados ex vi do artigo 36.º, n.º 1 do CPPT) e não consubstanciando a falta de notificação do mesmo ao mandatário tributário sequer uma irregularidade (porquanto a mesma, pelas razões que expusemos, embora fosse adequada, não se integra no âmbito de aplicação do n.º 1 do artigo 40.º do CPPT), dúvidas não restam de que a oposição à execução fiscal não pode proceder com fundamento em ineficácia dos actos tributários.

Conclusões
Assim, podemos concluir, relativamente à questão em apreço, que:
- Os actos de liquidação praticados no seguimento de um procedimento de inspecção tributária em que tenha sido constituído mandatário tributário são actos intrinsecamente ligados àquele procedimento, mas que gozam de autonomia jurídico-procedimental em relação ao mesmo, uma vez que o procedimento de inspecção tributária termina com a assinatura do relatório final da inspecção, onde são sistematizados os factos detectados e sua qualificação jurídico-tributária, e o sancionamento superior das suas conclusões.
- A referida autonomia jurídico-procedimental daqueles actos de liquidação adicional determina que a sua eficácia, nos casos em que tenha sido constituído mandatário tributário no âmbito do procedimento de inspecção tributária, dependa apenas de notificação dos mesmos segundo a regra geral da notificação dos actos tributários do artigo 36.º, n.º 1 do CPPT, e não de notificação ao mandatário tributário nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 40.º do CPPT;
- admite-se, contudo, que é adequado e desejável, atento o nexo funcional que o acto de liquidação adicional mantém com as conclusões do relatório de inspecção tributária, que os serviços notifiquem também o mandatário tributário daqueles actos, mas a falta dessa notificação não afecta a eficácia do acto de liquidação, nem pode, à luz do actual quadro legal, consubstanciar uma irregularidade.

Pelo exposto, acordam os juízes que compõem esta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em conceder provimento ao recurso, anular a sentença recorrida e julgar improcedente a oposição à execução fiscal.

Custas pelo recorrido em ambas as instâncias [nos termos dos n.ºs 1 e 2 do artigo 527.º do Código de Processo Civil, aplicável ex vi a alínea e), do artigo 2.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário].

Lisboa, 22 de Janeiro de 2020. – Suzana Tavares da Silva (relatora) – Paulo Antunes (voto a decisão) – Francisco Rothes.