Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01108/13
Data do Acordão:03/12/2014
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:VALENTE TORRÃO
Descritores:REFORMA DE ACÓRDÃO
Sumário:
Nº Convencional:JSTA000P17225
Nº do Documento:SA22014031201108
Data de Entrada:06/20/2013
Recorrente:FAZENDA PÚBLICA
Recorrido 1:A...
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

1. Notificada do teor do acórdão proferido em 22 de Janeiro passado e que constitui fls. 121/128 dos autos, veio a recorrente Fazenda Pública pedir a reforma do mesmo acórdão, ao abrigo do disposto nos nºs 1 e 2 do artº 669º do CPC, com a seguinte fundamentação:

A falta de notificação válida do ato tributário dentro do prazo de caducidade não constitui fundamento de inexigibilidade da dívida face ao artº 204º do CPPT.
Ao ter sido indicado no acórdão o artº 134º, nº 1 do CPA como suporte para a admissão da oposição à execução fiscal não ocorreu um enquadramento correto no artº 204º do CPPT

Assim, não era de admitir aqui a inexigibilidade da dívida, porque não contemplada nos fundamentos de oposição previstos no artº 204º do CPPT, o que só por lapso notório do Tribunal na determinação da norma aplicável ao caso sob apreciação se pode entender.

2. Em resposta ao pedido de reforma, veio o recorrido pedir a improcedência da pretensão por falta de fundamento legal, uma vez que o que a requerente pretende é que o Tribunal volte a reapreciar o caso, decidindo em sentido contrário ao anteriormente decidido (v. fls. 154/155).

3. Cumpre decidir.

De acordo com o disposto no artº 669º, nº 2 do CPC (atual artº 616º. nº 2) “Não cabendo recurso da decisão, é ainda lícito a qualquer das partes requerer a reforma da sentença quando, por manifesto lapso do juiz:
a) Tenha ocorrido erro na determinação da norma aplicável ou na qualificação jurídica dos factos;
b) Constem do processo documentos ou outro meio de prova plena que, só por si, impliquem necessariamente decisão diversa da proferida”.

Interpretando esta norma, vem este STA entendendo que tal possibilidade de reforma, porque constitui uma exceção legal ao princípio do esgotamento do poder jurisdicional do juiz, é circunscrita às situações tipificadas na norma, tendo em vista o suprimento de erro de julgamento mediante a reparação da decisão pelo próprio juiz decisor nos casos em que, por manifesto lapso de determinação da norma aplicável ou na qualificação jurídica, a sentença tenha sido proferida com violação de lei expressa ou quando constem dos autos elementos documentais ou meios de prova plena que, só por si e inequivocamente, impliquem decisão em sentido diverso.
Deste modo, e como vem sendo reiteradamente salientado pela jurisprudência a possibilidade de reforma de uma decisão judicial ao abrigo do nº 2 do artº. 669º do CPC (e do idêntico nº 2 do art. 616º do atual CPC) tem caráter de exceção, destinando-se unicamente a eliminar lapsos manifestos, erros evidentes, ostensivos, palmares, juridicamente insustentáveis e incontroversos - vide, entre outros, os seguintes acórdãos do STA: de 24/03/2010, no proc. nº 0511/06; de 26/09/2012, no proc. nº 211/12; de 21/11/2012, no proc. nº 155/11; de 19/12/2012, no proc. nº 740/12; de 13/03/2013, no proc. nº 822/12; e de 3/07/2012, no proc. nº 629/13 (seguimos aqui “ipsis verbis” o recente acórdão de 05.02.2014 – Processo nº 0212/13)

Ora, no caso dos autos e atento o teor do pedido e sua fundamentação, verifica-se que a recorrente discorda do decidido e por isso pede que seja proferida decisão de acordo com o seu entendimento.

Porém, nada no acórdão indica ter existido lapso manifesto na decisão assumida, antes dele resultando claramente que da interpretação das normas aplicáveis se podia concluir que “in casu” foi invocado fundamento de oposição à execução fiscal.

Com efeito, no referido acórdão ficou escrito, para além do mais, o seguinte:

“… No caso concreto, o recorrido não usou da faculdade prevista no artº. 37.º, n.º 1, do CPPT pelo que nenhum efeito lhe aproveita a citada irregularidade no que se refere à falta de notificação com a decisão dos seus fundamentos e meios de defesa e prazo para reagir contra o ato notificado.

Já no que se refere à falta de indicação da entidade e da data em que o ato foi praticado, estamos perante invocação de uma nulidade do ato de notificação (artº 39º, nº 9 do CPPT (hoje nº 12). Esta nulidade tem como consequência a eliminação jurídica da totalidade dos efeitos do acto que dela enferma (artº. 134.º, n.º 1, do CPA), pelo que dela deriva a inexigibilidade da dívida exequenda, a qual pode ser invocada na oposição à execução fiscal.

Assim sendo, ao contrário do defendido nas alegações da recorrente, o fundamento invocado podia ser apreciado na oposição.

É certo que a sentença recorrida, admitindo embora a inexigibilidade da dívida, acabou por não apreciar a questão da falta de indicação da entidade que praticou o ato e da data em que teve lugar. Porém, não cabe a este STA apreciar oficiosamente a eventual omissão de pronúncia”.
Temos então que o acórdão assumiu claramente que tinha sido invocado fundamento de oposição, tendo mesmo sido indicadas as normas legais pertinentes.

E mais entendeu o acórdão que, não tendo a sentença apreciado a questão da falta de indicação da entidade que praticou o ato e da data em que este teve lugar, não cabia ao STA apreciar essas questões por não serem de conhecimento oficioso.

Portanto, não existe qualquer razão para alteração da decisão, ao abrigo do citado artigo 669º do CPC, uma vez que não ocorre o pressuposto em que a requerente se baseou para o pedido de reforma.

Assim sendo, é de desatender o referido pedido.

4. Nestes termos e pelo exposto indefere-se o pedido de reforma.

Custas pela requerente com uma UC de taxa de justiça.

Lisboa, 12 de março de 2014. – Valente Torrão (relator) – Ascensão Lopes – Dulce Neto.