Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0525/12.5BECBR
Data do Acordão:10/28/2020
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ANÍBAL FERRAZ
Descritores:IRS
DONATIVO
Sumário:I - No presente, tal como em 2010, para efeitos de benefícios fiscais relativos ao mecenato, entre os quais, se integram os que envolvam “igrejas, instituições religiosas, pessoas colectivas de fins não lucrativos pertencentes a confissões religiosas ou por elas instituídas”, os donativos efetuados podem consistir em entregas de dinheiro ou em espécie, no caso específico da dedução à coleta, por parte de sujeitos passivos de IRS, o legislador, ciente dessa dicotomia, só tratou, sem dúvida, dos donativos em dinheiro no n.º 1 do art. 63.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais (EBF).
II - Apesar de, no seu n.º 2 não ter sido, apaziguadoramente, expresso e inequívoco, entendemos ter sido seu desiderato, igualmente, aí, apenas, conferir tutela aos donativos realizados mediante a entrega de dinheiro, porque, em tal sentido, apontam a literalidade do artigo, a progressão legislativa.
Nº Convencional:JSTA000P26576
Nº do Documento:SA2202010280525/12
Data de Entrada:03/21/2019
Recorrente:A........... E OUTROS
Recorrido 1:AT – AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acórdão proferido no Supremo Tribunal Administrativo (STA), com sede em Lisboa;
# I.

A………….. e B………….., com os demais sinais dos autos, recorrem da sentença proferida, no Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Coimbra, em 29 de dezembro de 2018, que julgou improcedente impugnação judicial, apresentada contra decisão de indeferimento de reclamação graciosa do ato de liquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS), respeitante ao ano de 2010, no montante de € 17.657,03.

Os recorrentes (rtes) formalizaram alegação, terminada com o seguinte quadro conclusivo: «

1. O presente recurso incide sobre os pressupostos de Direito quanto à dedução à colecta do donativo em espécie, efectuado pelos recorrentes, uma vez que, entendem os mesmos que houve erro na interpretação da lei - Decreto-Lei n° 215/89, de 1 de Julho - Estatuto dos Benefícios Fiscais e respectivas alterações, nos seus artigos 61° e 63°, bem como violação do artigo 9° do Código Civil.

2. O recorrente devidamente autorizado pela recorrente mulher doou à Santa Casa da Misericórdia de ………, através de escritura pública de compra e venda e doação do prédio urbano, metade indivisa do prédio urbano composto por terreno situado dentro do aglomerado urbano onde não é permitido construir e sem afectação agrícola, situado na freguesia e concelho de Arganil, inscrito na respectiva matriz, no seu todo, sob o artigo ………., no valor atribuído de CENTO E DEZ MIL EUROS que a donatária aceitou.

3. Em 14.11.2011 os ora Impugnantes entregaram junto da Administração Tributária Declaração de IRS referente aos rendimentos de 2010, com o Anexos H entre outros, declarando no campo 7, referente às deduções à colecta, um donativo em espécie à Santa Casa da Misericórdia de …………..

4. Todavia, a Administração Fiscal não considerou o donativo em espécie efectuado pelos recorrentes para efeitos de dedução à sua colecta, tendo os mesmos apresentado reclamação graciosa da referida liquidação, que por sua vez foi indeferida.

5. E na mesma senda, a douta sentença recorrida nega o direito aos recorrentes de deduzir à colecta de IRS dos seus rendimentos de 2010 o aludido donativo, constituído por metade de um prédio urbano, no valor declarado de 110.000€ (cento e dez mil euros), que aqueles realizaram a favor da Santa Casa da Misericórdia de …………

6. O mesmo veredicto reconhece que a Santa Casa da Misericórdia de ……., embora sendo uma Instituição Particular de Solidariedade Social “não deixa de ser uma instituição religiosa ou, no limite, uma pessoa colectiva de fins lucrativos pertencente a uma confissão religiosa, mormente católica, possuindo personalidade jurídica canónica e estando sujeita ao Direito canónico, mormente, entre outros, ao regime especial previsto no Decreto Geral para as Misericórdias de 23.04.2009, promulgado pela Conferência Episcopal Portuguesa.”

7. O referido artigo 63° diz respeito e regula o regime de deduções que possam emergir dos donativos.

8. Para se aplicar este dispositivo do artigo 63° do EBF, tem de se analisar previamente todo o conteúdo do artigo 61° do mesmo diploma legal, que contém o conceito legal de donativo a submeter ao regime de benefício fiscal e que claramente esclarece que os donativos constituem entregas em dinheiro ou em espécie

9. A sentença recorrida, entende, que o donativo em causa, que é em espécie, efectuado pelos recorrentes, não pode beneficiá-los em termos de poder ser deduzido à sua colecta, porquanto, segundo defende, este donativo não está abrangido pelo regime dos benefícios previstos no n° 2 do referido artigo 63°.

10. É um princípio basilar do nosso ordenamento jurídico que todos os impostos têm de estar tipificados na lei, bem como os benefícios que, também estão previstos, neste caso, em lei especial - EBF.

11. A lei prevê que a alienação a título gratuito a favor da Santa Casa da Misericórdia de ……….., entidade também prevista no referido n° 2 do artigo 63°, de acordo até com o reconhecimento na douta sentença (cfr. Pág. 16 e 17), possa constituir um benefício e consequentemente ser tal doação dedutível à colecta dos recorrentes.

12. O aludido artigo 63° deste Estatuto dedica dois números aos donativos para prever a dedução dos mesmos, sendo que o n° 1 estabelece em que termos os donativos em dinheiro são dedutíveis e o n° 2 não caracteriza os donativos quanto à sua natureza, isto é, se em espécie ou em dinheiro, para estabelecer a percentagem, considerada dedutível à colecta.

13. Na previsão do n° 2, do artigo 63° do EBF, o benefício é reconhecido em função da entidade a quem o donativo é concedido, não sendo relevante se é feito em espécie ou dinheiro, até porque nos termos do artigo do artigo 61°, a noção de donativo abrange o que é realizado em dinheiro ou espécie.

14. Se o legislador quisesse ter distinguido o benefício referido no n° 2, do artigo 63° do EBF, como sendo apenas de natureza pecuniária, teria de alguma forma feito constar tal distinção.

15. O legislador quis ser muito mais abrangente na natureza dos donativos a favor destas entidades.

16. O artigo 10° do EBF dispõe que “As normas que estabeleçam benefícios fiscais não são susceptíveis de integração analógica, mas admitem interpretação extensiva”.

17. Além de interpretação extensiva, é absolutamente necessário fazer-se uma interpretação sistemática da lei neste caso, do Estatuto dos Benefícios Ficais.

18. Mas o tribunal a quo não fez essa interpretação sistemática, em relação a esse Estatuto na parte aplicável à situação concreta, apesar de invocar na sentença recorrida a regra geral vertida no artigo 9° do Código Civil.

19. O Tribunal a quo ao não observar o artigo 9° do Código Civil, nega o direito que assiste aos recorrentes de ver dedutível à sua colecta o donativo efectuado, em virtude do erro na interpretação da norma jurídica.

20. A noção legal de donativo que constitui entregas em dinheiro ou espécie, apenas se confina ou limita a entrega de uma natureza ou de outra, quando especialmente prevista.

21. Quando é referido “donativo” sem se mencionar qual o tipo, o conceito está a abranger as entregas de ambas as naturezas previstas no artigo 61° do EBF. Se não, o legislador não teria feito uma definição prévia neste artigo que antecede as previsões legais do artigo 63° do mesmo diploma.

22. Se assim não fosse, se o regime estatuído no n° 2 do artigo 63° apenas se limitasse aos donativos de uma natureza, fosse ela qual fosse, o legislador tê-la-ia distinguido como o faz no n° 1.

23. Não vislumbra pela interpretação literal do texto, que o legislador se esteja a referir nesse n° 2 a donativos exclusivamente da mesma natureza dos previstos no n° 1.

24. Uma vez que o n° 2 desse artigo só refere a palavra donativos, não especificando o seu tipo, alarga claramente a possibilidade de dedução a todos os donativos quer em dinheiro, quer em espécie, desde que realizados a favor das entidades ali previstas.

25. O legislador quis valorizar os actos dispositivos a favor de entidades que desenvolvem um fim social absolutamente necessário às pessoas e à comunidade, quer seja em dinheiro, quer seja em património ou qualquer outro bem.

26. Até pela valorização que o legislador dá a estes actos, atribuindo o benefício fiscal ali previsto, não faria qualquer sentido que os recorrentes tivessem de proceder à venda de metade do prédio à Santa Casa da Misericórdia de ………. e depois entregassem à mesma instituição como donativo o preço dessa venda, para poderem beneficiar da dedução, como a douta sentença chega a mencionar (Cfr. Pág. 16 e 17 da sentença recorrida).

27. Essa hipótese seria simular um negócio para na realidade efectuar um outro, e o preço da venda andaria a circular para voltar à sua origem, o que nos parece não fazer qualquer sentido nem ter qualquer tutela legal.

28. As partes outorgaram uma escritura pública na qual foram claras a manifestar a sua vontade, ou seja, no caso dos vendedores/doadores, seria vender metade de um prédio e doar a outra metade, e no caso da compradora/donatária, seria adquirir a metade do prédio e receber em doação a outra metade do prédio objeto do negócio jurídico.

29. Não se compreenderia, nem se pode aceitar, que os recorrentes façam um donativo a uma instituição, com o cariz, atribuições e finalidades que tem uma IPSS como as Santas Casas da Misericórdia do país, e os autores de tais donativos não beneficiassem fiscalmente apenas porque o seu donativo não é feito em dinheiro.

30. Pela natureza destas instituições e pelos fins que cumprem, e muitas vezes com a dificuldade enorme com que se deparam para cumprir esses fins pela falta de apoios e de meios, estamos convictos que o legislador não iria valorizar os donativos em dinheiro em detrimento dos donativos em espécie.

31. Se a intenção do legislador fosse apenas valorizar os donativos em dinheiro na previsão legal do n° 2 do artigo 63°, e em relação a todas as pessoas singulares ou colectivas, cair-se-ia no estatuído no n° 1, criando apenas mais uma alínea para a especificidade prevista no n° 2.

32. Não foi de forma distraída que o legislador criou um n° 2 para esse artigo.

33. O tribunal a quo invoca o facto de não estar estatuído o valor a considerar do donativo em espécie para efeitos de dedução à colecta, para concluir que o legislador não quis contemplar esta situação com o benefício que os recorrentes entendem que lhes deve ser reconhecido.

34. Esta invocação não faz sentido, porquanto, a própria administração fiscal atribuiu um valor para a outra metade do prédio não doada para efeitos de Mais-Valias.

35. A administração Fiscal não deve utilizar o critério do valor declarado pelos vendedores e compradora, para tributar o contribuinte alienante em Mais-Valias em sede de IRS (já que este foi manifestamente superior ao valor patrimonial do prédio em questão, atribuído pela AT), e depois não aceitar utilizar o mesmo critério, para fixação do valor da metade doada, para efeitos de benefício fiscal.

36. A lógica de que não existe um valor pelo qual a Administração Fiscal se oriente para aplicar o benefício fiscal, cai por terra, porquanto esse valor existe (e inclusive é manifestamente superior ao valor patrimonial atribuído em sede de avaliação pela AT) para calcular a Mais-Valia.

37. Não se vislumbra porque é que a doação de metade indivisa de um prédio urbano, efectuada a favor da Santa Casa da Misericórdia de …….. à luz da sentença de que ora se recorre, teria um regime fiscal idêntico a uma doação feita a favor de um terceiro que não goze ou possua as características das entidades ou pessoas referidas no n° 2 do artigo 63º do EBF, ali especificamente mencionadas.

38. O sentido do preceito legal estatuído no n° 2 do artigo 63 do EBF é precisamente distinguir os donativos, - independentemente da sua natureza -, em função dos seus destinatários.

39. Assim, todo e qualquer donativo (seja em espécie, seja em dinheiro) efectuado à Santa Casa da Misericórdia de …….., deve ser dedutível à colecta, no caso concreto, dos recorrentes.

40. Assistindo o direito aos recorrentes de ver corrigida a liquidação objecto da impugnação que deduziram para esse efeito, porquanto deve o donativo em causa ser considerado como dedutível à colecta em questão.

TERMOS EM QUE:

Deve ser dado provimento ao presente recurso e, em consequência, revogada a sentença recorrida e substituída por douto acórdão que conclua pela anulação da liquidação feita aos recorrentes, dessa forma se fazendo INTEIRA JUSTIÇA.»


*

Não houve lugar à apresentação de contra-alegações.

*

O Exmo. magistrado do Ministério Público emitiu parecer, tendo concluído: «

(…).

Afigura-se-nos, assim, que no artigo 63° do EBF, o legislador apenas pretendeu acolher os donativos em dinheiro, como resulta do corpo do seu n° 1; No n° 2 do preceito o legislador, embora prevendo uma dedução à coleta por referência a fins diversos dos previstos nos artigos anteriores e para os quais o n° 1 remete, não pretendeu, contudo, alargar o benefício fiscal a todo o tipo de donativos, e nessa medida o termo “donativos” ali utilizado pelo legislador deve ser entendido com referência aos donativos previstos no seu nº 1, ou seja, a “donativos em dinheiro”.

Entendemos, assim, que a sentença recorrida não padece do vício de erro de julgamento que lhe é assacado pela Recorrente, uma vez que fez uma correta interpretação e aplicação do disposto no n° 2 do artigo 63° do EBF, motivo pelo qual se impõe a sua confirmação, julgando-se o recurso improcedente. »


*

Cumpridas as formalidades legais, compete conhecer e decidir.

*******

# II.


Na sentença, em sede de julgamento factual, ficou assente: «

1. Em 02.04.1984 faleceu a mãe do ora Impugnante marido, C…………, sucedendo-lhe o respectivo cônjuge, D……………., e o ora Impugnante marido; Cfr. certidão da Conservatória do Registo Civil/Predial/Comercial de Arganil de 02.08.2012 referente a Assento de Óbito n.° 74 do ano de 1984, junto pelos ora Impugnantes, a fls. 20 dos autos e termo de declaração que deu início ao processo de liquidação do imposto sobre as sucessões e doações instaurado na então Repartição de Finanças de Arganil, a fls. 50-52 do Processo Administrativo Tributário (PAT) em apenso.

2. Na relação de bens apresentada no processo de liquidação do imposto sobre as sucessões e doações instaurado pelo falecimento da contribuinte aludida no ponto anterior constam, entre o mais, diversos prédios, entre os quais quatro prédios rústicos da freguesia de Arganil, que então relacionados sob as verbas 25, 26, 27 e 28 do seguinte modo:

«N.º 25

………… a confrontar do Norte ………., Nascente ……….., Sul Caminho, Poente ……….., inscrita na matriz como n.° ……….

N.° 26

………… a confrontar do Norte Estrada, Nascente ……….., Sul Caminho, Poente …………., inscrita na matriz com o número ………….

N.° 27

…………, a confrontar do Norte Santa Casa da Misericórdia, Sul ……………. e outros, Poente Viso, Nascente Barroco, inscrita na matriz com o n.° …………

N.° 28

Terra de cultura com 10 fructuosas 8 oliveiras e mato à ………, a confrontar do Norte com …………, Nascente Serventia do Paço, Sul ………… e outros, de Poente Barroco, inscrita na matriz com o número …………….

Cfr. termo de apresentação da relação de bens constante do processo n.° 16406 de liquidação do imposto sobre as sucessões e doações instaurado na então Repartição de Finanças de Arganil, a fls. 3 e ss. do PAT em apenso.

3. O prédio rústico relacionado sob a verba n.° 27 possuía então o rendimento colectável de 1.724$00 e o valor matricial de 34.480$00;

Cfr. certidão da então Repartição de Finanças de Arganil de 29.06.1984, a fls. 59 do PAT em apenso.

4. Em 22.09.2003 faleceu D……………, sucedendo-lhe o seu filho, o ora Impugnante marido;

Cfr. prints de aplicação informática da AT referente ao cadastro fiscal e relações inter-sujeito passivo, a fls. 43 e 44 do PAT em apenso.

5. Em 12.01.2009 o ora Impugnante marido, na qualidade de cabeça de casal da herança de D……………., deu entrada junto do Serviço de Finanças de Arganil de Declaração Modelo 1 de IMI, para inscrição na matriz de prédio rústico omisso na mesma, sito na ………….. da freguesia de Arganil, a confrontar a Norte com a Mata da Santa Casa da Misericórdia, Sul com ……..….., Nascente com o próprio e Poente com caminho e o próprio, com 22.000,00 m2, indicado como terreno situado dentro de aglomerados urbanos onde não é permitido construir e sem afectação agrícola, com o valor de construção mais custo de terreno de € 10.000,00;

Cfr. visada declaração, informatizada depois sob o n.° 2055260, junta pelos ora Impugnantes, a fls. 25-27 dos autos.

6. No mesmo dia o ora Impugnante marido deu entrada junto do Serviço de Finanças de Arganil de requerimento com o seguinte teor:

«A……………., CF N° ……….., residente na R. ……….., n.° ……, 3000-……. Coimbra, cabeça de casal no processo de Imposto Sucessório n.° 21265, instaurado por óbito de D…………, ocorrido em 22/09/2003, vem apresentar relação adicional de bens relativamente à verba que abaixo se descreve e que por lapso não foi relacionada na relação de bens já apresentada:

1) Prédio urbano com a área de 22.000 m2, sito em ……………., freguesia e concelho de Arganil, confrontando de Norte com Mata da Santa Casa da Misericórdia, Sul com …………, Nascente com Próprio e Poente com Caminho e Próprio, prédio esse omisso na matriz.

Mantém-se todas as declarações constantes na relação anteriormente apresentada.»

Cfr. visado requerimento, junto pelos ora Impugnantes, a fls. 24 dos autos.

7. O aludido prédio foi então inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Arganil sob o artigo ………, no nome da aludida herança, tendo sido objecto de avaliação patrimonial tributária de que resultou o VPT de € 26.800,00;

Cfr. ficha de 1.ª avaliação n.° 2600723 e print de aplicação informática da ATA referente ao histórico de prédio urbano, a fls. 46-47 e 42, respectivamente, do PAT em apenso.

8. Em 19.07.2010 o ora Impugnante marido, na qualidade de primeiro outorgante, a ora Impugnante mulher, na qualidade de terceira outorgante (autorizante), e E…………., em nome e representação da Santa Casa da Misericórdia de ……., na qualidade de segundo outorgante, outorgaram no Cartório Notarial de Arganil escritura pública de compra e venda e doação do prédio urbano referido no ponto anterior, a qual possui, entre o mais, o seguinte teor:

«(...) “SANTA CASA DA MISERICÓRDIA DE ………”, com sede nesta vila de ….. N.I.P.C. ………, Instituição Particular de Solidariedade Social (...) e assim, pessoa colectiva de utilidade pública, nos termos do Art° 8° do Decreto-Lei 119/83, de 25 de Fevereiro;

(...)

DISSE O PRIMEIRO OUTORGANTE:

Que pela presente escritura e pelo preço de CENTO E DEZ MIL EUROS que já recebeu, vende à representada do segundo outorgante, “SANTA CASA DA MISERICÓRDIA DE ……..”, metade indivisa do prédio urbano composto por terreno situado dentro do aglomerado urbano onde não é permitido construir e sem afectação agrícola, situado na freguesia e concelho de Arganil, inscrito na respectiva matriz, no seu todo, sob o artigo ………., com o valor patrimonial actual de 13.400,00€ (correspondente à fracção), descrito na Conservatória do Registo Predial de Arganil sob o número seis mil novecentos e noventa e oito - freguesia de Arganil, onde se mostra registada a aquisição da totalidade do imóvel a seu favor pela inscrição feita pela apresentação mil novecentos e sessenta e dois, de dois de Junho de dois mil e nove.

E que por esta mesma escritura, doa à mesma representada do segundo outorgante, “SANTA CASA DA MISERICÓRDIA DE …………” a restante metade do imóvel anteriormente identificado, no valor atribuído de CENTO E DEZ MIL EUROS.

DISSE O SEGUNDO OUTORGANTE:

Que, para a sua representada, aceita estes contratos, os quais se destinam à realização dos respectivos fins estatutários.

DISSE A TERCEIRA OUTORGANTE:

Que presta consentimento para a plena validade das precedentes venda e doação.

ASSIM OUTORGARAM.»;

Cfr. fotocópia não certificada da aludida escritura, junta pelos ora Impugnantes, presente a fls. 16 e ss. dos autos.

9. Em 14.11.2011 os ora Impugnantes entregaram junto da Administração Tributária Declaração de IRS referente aos rendimentos de 2010, com os Anexos A, G, G1 e H, declarando nestes três últimos, entre o mais, o seguinte:

- Anexo G: a aquisição no valor de € 10.050,00, em Setembro de 2003, do prédio urbano inscrito na respectiva matriz da freguesia de Arganil sob o artigo …….., na quota parte de 75%, e a realização do mesmo em Julho de 2010 no valor de € 82.500,00;

- Anexo G1: a aquisição no valor de € 3.350,00, em 14.03.1981, do prédio urbano inscrito na respectiva matriz da freguesia de Arganil sob o artigo ………, e a realização do mesmo pelo valor de € 27.500,00, como imóvel alienado excluído ou isento da tributação;

- Anexo H: no campo 7, referente às deduções à colecta, um donativo de € 13.400,00 à Santa Casa da Misericórdia de ………;

Cfr. visada declaração, presente a fls. 32 e ss. do PAT em apenso. O NIF da donatária foi confrontado com o NIF constante da escritura pública a que se refere o ponto antecedente.

10. Em 07.02.2012 o Chefe do Serviço de Finanças de Coimbra-1 proferiu projecto de decisão de alteração do IRS dos ora Impugnantes, do ano de 2010, pelo montante de € 149.995,41, tendo por base informação elaborada por aquele Serviço, com o seguinte teor:

«1. O contribuinte foi notificado em processo de divergências através do ofício n° GIC 2087097 de 22/11/2011, para verificação dos códigos de análise: D17 (donativos) porque declarou um donativo no valor de € 13.400,00 à Santa Casa de Misericórdia de ……… e o D39 (MAIS VALIAS) porque declarou a venda de parte de um imóvel no anexo G1. Analisada a declaração, nomeadamente os anexos G, G1 e H e os documentos entregues pelo contribuinte verificou-se que o donativo à Santa Casa de Misericórdia de ……… é respeitante a uma doação de 50% de um imóvel, artigo urbano …….., da freguesia de Arganil, por escritura celebrada em 19/07/2010, ao qual foi atribuído o valor de € 110.000,00 e que a venda declarada no anexo G1 (25%) e no anexo G (75%) respeita ao mesmo imóvel, os restantes 50%, por € 110.000,00;

2. O contribuinte compareceu neste Serviço de Finanças em 20/01/2012 e foi informado que o donativo não era dedutível porque os donativos em espécie, concedidos por pessoas singulares, de bens que integrem o património pessoal do doador não têm relevância fiscal por não estarem previstos no art° 63° do EBF, atendendo ao seu articulado que diz especificamente “os donativos em dinheiro atribuídos pelas pessoas singulares residentes em território nacional, nos termos e condições previstos nos artigos anteriores, são dedutíveis à colecta do IRS do ano a que digam respeito...” e ficha doutrinária proc° 499/07, com despacho concordante do Sr. Diretor Geral dos Imposto, de 07/03/08;

3. Em relação à venda, foi informado que não havia lugar à entrega de anexo G1 por não estarem 25% da venda excluídos de tributação de mais valias, porque a aquisição foi a título gratuito por óbito do seu pai, ocorrido em 22/09/2003, tendo o imóvel sido inscrito na matriz em Janeiro de 2009 em nome da herança indivisa “NIF ………• D………….. - CABEÇA DE CASAL DA HERANÇA DE” e o motivo de avaliação como prédio omisso. Assim, devia ser declarada a venda dos 50% no anexo G;

4. Como até à presente data não substituiu a declaração com as correcções atrás descritas, elabora-se a presente informação propondo que seja feita a alteração dos rendimentos, com referência ao ano de 2010 e aos mesmos sujeitos passivos, alterando o rendimento global para o montante de € 148.995,41 que corresponde aos rendimentos declarados de CAT.A, mais os de CAT.H, acrescentando as mais valias apuradas no valor de € 47.563,00 e retirar o donativo indicado no anexo H no valor de € 13.400,00, de acordo com o n.° 4 do art.° 65.° do CIRS.»;

Cfr. visado despacho e informação, a fls. 13-14 do PAT em apenso.

11. Em 19.03.2012, face ao não exercício do direito de audição por parte dos ora Impugnantes, o Chefe do Serviço de Finanças de Coimbra-1 converteu «em definitivo o projecto de decisão relativo às correcções propostas na declaração mod. 3 do ano 2010», determinando a elaboração do correspondente documento de correcção;

Cfr. visado despacho, a fls. 12 do PAT em apenso.

12. Preenchido e submetido o correspondente documento de correcção, tendo por base um rendimento global de € 148.995,41, foi emitida em 02.04.2012 a liquidação de IRS n.° 2012 5000057541, no valor de € 41.976,04, e a correspondente liquidação de juros compensatórios n.° 2012 00000035209, no valor de € 441,99, de que resultou o valor global de € 17.657,03, dada a existência de retenções na fonte no valor de € 24.761,00, e o valor a pagar até 16.05.2012 de € 9.608,13, decorrente de compensação realizada em 09.04.2012 referente ao estorno da anterior liquidação n.° 2011 5005134904;

Cfr. DC, demonstração de liquidação de IRS e print de aplicação informática da ATA referente à nota de cobrança de IRS, a fls. 26 e ss., 10 e 24, respectivamente, do PAT em apenso.

13. Em 09.05.2012 deu entrada no Serviço de Finanças de Coimbra-1 reclamação graciosa da liquidação referida no ponto anterior;

Cfr. fls. 7 e ss. do PAT em apenso.

14. Em 16.07.2012 o Chefe da Divisão de Justiça Tributária da Direcção de Finanças de Coimbra, no uso de poderes delegados pelo Director de Finanças, proferiu projecto de decisão de indeferimento da visada reclamação graciosa, com os fundamentos vertidos em informação daquela Divisão com o seguinte teor:

«Vem A…………., NIF …………. apresentar reclamação graciosa, conforme petição entregue no Serviço de Finanças de Coimbra 1 em 09-05-2012 (entrada n° 9771), contra a liquidação n° 20125000057541 de IRS e juros compensatórios (JC) associados, do ano de 2010 no valor total de € 17.657,03, notificada à ora reclamante em 10-04-2012, através do registo n° RY556833030PT.

Que por não ter sido pago deu origem ao processo de execução fiscal n° 0728201201083139.

(…)

Da Reclamação:

Alega o reclamante;

1 - Que de acordo com o art.° 61 e n° 1 e 2 do art. 63 do Estatuto dos Benefícios Fiscais deverá ser considerado como dedução à coleta de IRS, o donativo por e concedido à Santa Casa da Misericórdia de ……… que em sua opinião “é facto social subsumível ao tipo legal, compreendendo variantes, fixado no n° 2 do art.º 63.”

2 - Que “o direito de propriedade sobre todo o prédio, na titularidade do reclamante, funda-se em sucessão/único filho de C…………. e D…………..): 3/4 na consequência do óbito de seu pai, em 22 set. 2003, tendo-se regularizado a situação de herdeiro único; 3/4 que vêm a integrar-se com 1/4 herdado por anterior falecimento de sua mãe (a paternal titularidade de 3/4 derivou de meação dos bens do casal e estatuto de cônjuge sobrevivo)”.

Termos em que pede a reapreciação dos atos, por forma a que seja admitida a doação à Santa Casa da Misericórdia de ………. como dedução á coleta de IRS do ano de 2010, e seja excluído de tributação a aquisição de 1/4 do já referido prédio.

Dos Factos:

A questão principal no caso presente é saber se estão reunidos todos os pressupostos necessários para o Reclamante beneficiar da exclusão da tributação dos ganhos de mais valias originados pela alienação de 25% do prédio urbano inscrito sob o art.° ………. da Freguesia de Arganil, e do donativo concedido dos 50% doados à Santa Casa da Misericórdia de ……, relativamente ao mesmo prédio.

Em causa está uma liquidação adicional efectuada pela A.T. na sequência de uma gestão de divergências na qual constavam os códigos de análise 017 e 039.

O reclamante submeteu a declaração com identificação nº JO631/88 na qual consta do quadro 7 do anexo H, um donativo no valor de € 13.400.00 correspondente a 50% do imóvel inscrito sob o art.° ………, da freguesia de Arganil, concedida à Santa Casa da Misericórdia de …………

No anexo G e no anexo G1, declarou a alienação de 75% e 25% respetivamente, dos restantes 50% do mesmo imóvel, objecto de doação à Santa Casa da Misericórdia de …………

A respetiva doação foi efetuada por escritura celebrada em 19/07/2010 e ao imóvel foi atribuído o valor de € 110.000,00.

A gestão de divergências foi finda pelo Serviço de Finanças de Coimbra 1 com a informação de que o reclamante notificado através do ofício n° 262 de 08/02/2012, do serviço de Finanças de Coimbra 1, para o exercício de audição prévia, não exerceu esse direito, nem entregou a respetiva declaração de substituição, pelo que foi convertido em definitivo o despacho de indeferimento do chefe do Serviço de Finanças de 29/03/2012, notificado pelo oficio n° 480 de 19/03/2012.

Assim foi recolhido em 23-03-2012, o DUC n° 0001-41, retirando do anexo H o (o) código de benefício 720 (donativo) o valor de € 13.400.00, no anexo G consta o valor correspondente a 50% da alienação do imóvel sujeito a mais valias, e foi retirando a anexo G1, e finda com correções a gestão de divergências.

Relativamente aos donativos, o art.° 61 do Estatuto dos Benefícios Fiscais, define o conceito de donativos para efeitos fiscais como sendo entregas em dinheiro ou em espécie, concedidos, sem contrapartidas que configurem obrigações de carater pecuniário ou comercial, às entidades públicas ou privadas, previstas nos artigos seguintes, cuja atividade consista predominantemente na realização de iniciativas nas áreas social, cultural, ambiental, desportiva ou educacional”.

De acordo com artigo n° 63° do mesmo diploma legal, (EBF), são consideradas deduções à coleta de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS):

“Os donativos em dinheiro atribuídos pelas pessoas singulares residentes em território nacional, nos termos e condições previstos nos artigos anteriores, são dedutíveis à colecta do IRS do ano a que digam respeito, com as seguintes especificidades:

a) Em valor correspondente a 25% das importâncias atribuídas, nos casos em que não estejam sujeitos a qualquer limitação;

b) Em valor correspondente a 25% das importâncias atribuídas, até ao limite de 15% da colecta, nos restantes casos;

c) As deduções só são efectuadas no caso de não terem sido contabilizadas como custos.

2 - São ainda dedutíveis à colecta, nos termos e limites fixados nas alíneas b) e c) do número anterior, os donativos concedidos a igrejas, instituições religiosas, pessoas colectivas de fins não lucrativos pertencentes a confissões religiosas ou por elas instituídas, sendo a sua importância considerada em 130% do seu quantitativo.”

Não são considerados assim, neste normativo legal, os donativos em espécie o que contraria o invocado pelo Reclamante no ponto oito (8) da petição.

Estamos perante um donativo em espécie concedido por uma pessoa singular de um bem que integra o património pessoal do doador, não previsto no já citado art.° 63 do Estatuto dos Benefícios Fiscais, reforçado pela ficha doutrinária n° 449/07 de 07-03-2008, junta aos autos a fls. 11, que define no seu ponto i, que estes donativos não têm relevância fiscal.

No que respeita a alienação do imóvel já referido, foi o reclamante informado pelo Serviço de Finanças, conforme informação junto aos autos a fls. 9 a 10, não haver lugar à entrega do anexo G1 por não estarem 25% da venda excluídos de tributação demais valias, porque a aquisição foi a título gratuito por óbito de seu pai, ocorrido em 2210812003 (... )”.

Alega o Reclamante que a parte do prédio declarada no anexo G1, ou seja 1/4 do mesmo deve ser afastada da incidência do imposto pelo facto de ter sido adquirida por óbito de sua mãe ocorrido antes de seu pai, não informando no entanto a data em concreto. Por consulta ao sistema informático da DGCI, verifica-se que o prédio se encontrava omisso na matriz e que foi solicitada a sua inscrição através da entrega da declaração modelo 1 que ocorreu em 12-01-2009, em nome de D…………….. Cabeça de Casal da Herança de.

Contactado o Serviço de Finanças de Arganil competente para a instauração do respetivo processo de Imposto sucessório, e consultado o mesmo, verifica-se que não se pode provar que este prédio fosse adquirido pelo reclamante, por óbito de sua mãe uma vez que o mesmo não consta da relação de bens, também não foi requerida qualquer retificação à mesma, nem apresentada relação de bens adicional.

Conclusão

Conclui-se, desta forma, não estarem reunidas as condições para o afastamento da tributação dos ganhos de mais valias nem para a o benefício do donativo concedido pelo reclamante à santa Casa da Misericórdia de ………, sendo de manter a liquidação reclamada, Termos em que a reclamação deverá ser INDEFERIDA, sem prejuízo, no entanto, do direito de audição previsto no art.° 60º da LGT.»;

Cfr. visado despacho/informação a fls. 65-69 do PAT em apenso.

15. Em 13.08.2012, após notificação para exercício do direito de audição, e não tendo o mesmo sido exercido, foi a Reclamação Graciosa indeferida por despacho do Chefe da Divisão de Justiça Tributária da Direcção de Finanças de Coimbra, no uso de poderes delegados pelo Director de Finanças, convertendo em definitivo o projecto de decisão aludido no ponto anterior;

Cfr. notificação para audição prévia e visado despacho a fls. 70-73 do PAT em apenso.

16. Em 20.08.2012 foi recebido no domicílio fiscal do ora Impugnante, pelo próprio, ofício tendente à notificação do despacho aludido no ponto anterior;

Cfr. ofício e talão de aceitação de correio postal registado e AR respectivo a fls. 74-76 do PAT em apenso.

17. Em 14.08.2012 foi enviado ao Serviço de Finanças de Coimbra-1, por correio postal registado, a petição inicial que deu origem à presente Impugnação;

Cfr. etiqueta de registo postal aposta no envelope de 31 dos presentes autos.

Mais se provou que:

18. Em 14.08.2012 o prédio rústico aludido sob a verba n.° 27 na relação de bens referida em 2., inscrito na respectiva matriz desde 1975, e com a área total de 4 ha, estava inscrito no nome dos seguintes contribuintes, e de acordo com as seguintes proporções:

Identificação fiscal: ……….. Nome: ………………

Morada: R ……….. ….., ARGANIL, 3300-……. ARGANIL

Tipo de titular: Propriedade plena Parte: 40/372 Documento: OUTRO Entidade: DESCONHECIDO

Identificação fiscal: ………… Nome: ………………..

Morada: ……….. N ……. …… ARGANIL. 3300-…. ARGANIL

Tipo de titular: Propriedade plena Parte: 2/93 Documento: ESCRITURA PÚBLICA Entidade: 191544027

Identificação fiscal: ………… Nome: ………………

Morada: R ………….-……….. ARGANIL. 330-…….. ARGANIL

Tipo de titular: Propriedade plena Parte: 5/372 Documento: OUTRO Entidade: SISA Nº 17/1996

Identificação fiscal: ………. Nome: …………..

Morada: R ………., ….., ………. 3405-…….. SEIXO DA BEIRA

Tipo de titular: Propriedade plena Parte: 4/372 Documento: OUTRO Entidade: DESCONHECIDO

Identificação fiscal: ……….. Nome: …………..

Morada: ………... ARGANIL, 3300-……. ARGANIL

Tipo de titular: Propriedade plena Parte: 5/372 Documento: OUTRO Entidade: DESCONHECIDO

Identificação fiscal: ………… Nome: ………………

Morada: ARGANIL, 3300-……….. ARGANIL

Tipo do titular: Propriedade plena Parte: 6/372 Documento: OUTRO Entidade: DESCONHECIDO

Identificação fiscal: ……….. Nome: ……………..

Morada: ……….. - ……. -……., BARROSA, 3300-……….. ARGANIL

Tipo de titular: Propriedade plena Parte: 9/372 Documento: OUTRO Entidade: DESCONHECIDO

Identificação fiscal: ……….. Nome: ………………….

Morada: R ………... N …. …, ARGANIL 3300-…. ARGANIL

Tipo de titular: Propriedade plena Parte: 4/372 Documento: OUTRO Entidade: DESCONHECIDO

Identificação fiscal: ………… Nome: ……………….

Morada…………. Nº ……. – ………. PONTINHA, 1675-…….. PONTINHA

Tipo de titular. Propriedade plena Parte: 8/372 Documento: OUTRO Entidade. DESCONHECIDO

Identificação fiscal: ……….. Nome: ……………..

Morada: …………… ……. ………… ….., ARGANIL, 3309-……….ARGANIL

Tipo de titular: Propriedade plena Parte: 4/372 Documento: OUTRO Entidade: DESCONHECIDO

Identificação fiscal: ……….. Nome: A………………..

Morada: ……… N ……. ….., ………….., 3040-……… COIMBRA

Tipo de titular: Propriedade plena Parte: 264/372. Documento: OUTRO Entidade: DESCONHECIDO

Identificação fiscal: …………… Nome: ………………

Morada: ………. …….. ……. ARGANIL, 3300-……. ARGANIL

Tipo de titular: Propriedade plena Parte: 6/372 Documento: OUTRO Entidade: SF0701SISA112/99

Identificação fiscal: …………… Nome; …………… - CABEÇA DE CASAL DA HERANÇA DE

Morada: ARGANIL, 3300-………… ARGANIL

Tipo de titular: Propriedade plena Parte: 4/372 Documento: OUTRO Entidade: ISTG 472560

Identificação fiscal: ………… Nome: ……….. - CABEÇA DE CASAL DA HERANÇA DE

Morada: ARGANIL, 3300-………..ARGANIL

Tipo de titular: Propriedade plena Parte: 5/372 Documento: IMPOSTO DE SELO Entidade: ISTG Nº 1046893

Cfr. caderneta predial rústica acedida e imprimida na aludida data, junta pelos ora Impugnantes, presente a fls. 21-22 dos autos.»


***

Este recurso jurisdicional coloca-nos, fundamentalmente, a necessidade da interpretação (e consequente aplicação, casuística) do disposto no artigo (art.) 63.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais (EBF), na redação vigorante no ano de 2010 Artigo 63.º
Deduções à colecta do imposto sobre o rendimento das pessoas singulares
1 - Os donativos em dinheiro atribuídos pelas pessoas singulares residentes em território nacional, nos termos e condições previstos nos artigos anteriores, são dedutíveis à colecta do IRS do ano a que digam respeito, com as seguintes especificidades:
a) Em valor correspondente a 25 % das importâncias atribuídas, nos casos em que não estejam sujeitos a qualquer limitação;
b) Em valor correspondente a 25 % das importâncias atribuídas, até ao limite de 15 % da colecta, nos restantes casos;
c) As deduções só são efectuadas no caso de não terem sido contabilizadas como custos.
2 - São ainda dedutíveis à colecta, nos termos e limites fixados nas alíneas b) e c) do número anterior, os donativos concedidos a igrejas, instituições religiosas, pessoas colectivas de fins não lucrativos pertencentes a confissões religiosas ou por elas instituídas, sendo a sua importância considerada em 130 % do seu quantitativo., em particular, do conteúdo do respetivo n.º 2. Especificamente, cumpre determinar se o termo “donativos”, no mesmo inserido, sem qualquer acrescento, se reporta, apenas, aos donativos em dinheiro (tese sufragada na sentença controvertida) ou, também, aos donativos em espécie, como defendem os rtes.

Sem prejuízo da valia dos argumentos fundantes de cada uma das interpretações em antítese, por ora, estando em causa uma tarefa de hermenêutica jurídica, impõe-se, em primeiro lugar, ter presente estas premissas:
- sendo objeto de análise uma norma que estabelece benefícios fiscais, a mesma não é suscetível de integração analógica, embora, aceite interpretação extensiva - art. 10.º do EBF;
- na determinação do sentido das normas fiscais e na qualificação dos factos a que as mesmas se aplicam, são observadas, na linha da frente, as regras e princípios gerais de interpretação e aplicação das leis - art. 11.º n.º 1 da Lei Geral Tributária (LGT);
- a interpretação não deve cingir-se à letra da lei, mas reconstituir a partir dos textos o pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada, não podendo ser considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso - art. 9.º do Código Civil (CC).

Apresentando-se as demais entendíveis sem dificuldades, quanto à primeira regra elencada, devemos esclarecer o seu sentido, com a precisão de que a impossibilidade de integração analógica corresponde, desde logo, à inviabilidade de aplicação de normas privativas da regulamentação legal de determinada situação de facto a outra realidade factual que parece, na essência, igual, mas é diferente nas suas circunstâncias específicas. Já, a facultada interpretação extensiva indica a permissão, do legislador, para ser estendido o significado dos conceitos utilizados para além da sua literalidade.

Com estes faróis, versando o disputado termo donativos, inscrito no art. 63.º n.º 2 do EBF, começamos por referenciar que a previsão deste normativo nasceu, no nosso ordenamento jurídico-tributário, por ação do art. 83.º n.º 3 da Lei n.º 53-A/2006 de 29 de dezembro (Orçamento de Estado (OE) para o ano de 2007), mediante o aditamento, ao vigente EBF, entre outros, do art. 56.º-E Artigo 56.º-E
Deduções à colecta do IRS

1 - Os donativos em dinheiro atribuídos pelas pessoas singulares residentes em território nacional, nos termos e condições previstos nos artigos anteriores, são dedutíveis à colecta do ano a que dizem respeito, com as seguintes especificidades:

a) Em valor correspondente a 25 % das importâncias atribuídas, nos casos em que não estejam sujeitos a qualquer limitação;

b) Em valor correspondente a 25 % das importâncias atribuídas, até ao limite de 15 % da colecta, nos restantes casos;

c) As deduções só são efectuadas no caso de não terem sido contabilizadas como custos.

2 - São ainda dedutíveis à colecta, nos termos e limites fixados nas alíneas b) e c) do número anterior, os donativos concedidos a igrejas, instituições religiosas, pessoas colectivas de fins não lucrativos pertencentes a confissões religiosas ou por eles instituídas, sendo a sua importância considerada em 130 % do seu quantitativo.. No devir legislativo, este último veio, com o mesmo conteúdo integral (exceto alteração da epígrafe), a, por efeito de renumeração operada pelo Decreto-Lei (DL.) n.º 108/2008 de 26 de junho, ostentar o número 63.º, mantendo-se, desde o início e até ao presente, inalterado nos seus termos/conceitos. Outrossim, porque, também, terá de ser focado, o mesmo percurso (e identidade) seguiu o atual art. 61.º do EBF Artigo 61.º


Noção de donativo
Para efeitos fiscais, os donativos constituem entregas em dinheiro ou em espécie, concedidos, sem contrapartidas que configurem obrigações de carácter pecuniário ou comercial, às entidades públicas ou privadas, previstas nos artigos seguintes, cuja actividade consista predominantemente na realização de iniciativas nas áreas social, cultural, ambiental, desportiva ou educacional.; anteriormente, art. 56.º-C Artigo 56.º-C
Noção de donativo
Para efeitos fiscais, os donativos constituem entregas em dinheiro ou em espécie concedidos sem contrapartidas que configurem obrigações de carácter pecuniário ou comercial às entidades públicas ou privadas previstas nos artigos seguintes, cuja actividade consista predominantemente na realização de iniciativas nas áreas social, cultural, ambiental, desportiva ou educacional..

Nada se podendo, neste cenário, recolher da história pretérita dos normativos referenciados, parece-nos ser, contudo, acertado afirmar que, em particular, com a introdução do art. 56.º-E / 63.º do EBF, o legislador visou, mediante a instituição de contados incentivos fiscais, potenciar, incentivar, o recurso ao mecenato, por particulares (a par das empresas), com o objetivo de canalizar dinheiro e bens para áreas carentes, à época, em evidentes e (mais) significativas dificuldades económico-financeiras, nos setores social, cultural, ambiental, desportivo ou educativo.

Posta esta relação umbilical com o mecenato, importa ter em mente que o Estatuto do Mecenato (EM) foi aprovado, em anexo, ao DL. n.º 74/99 de 16 de março, diploma em cujo preâmbulo encontramos um apontamento dos propósitos e objetivos do legislador, à data; «

…, a definição do Estatuto do Mecenato deve realizar-se com vista à definição dos objectivos, da coerência, da graduação e das condições de atribuição e controlo dos donativos, bem como à criação de um regime claro e incentivador, com unidade e adequada ponderação da sua relevância, e à definição da modalidade do incentivo fiscal, em sede de IRS e de IRC, que melhor sirva os objectivos de eficiência e equidade fiscal.
Foi nesse enquadramento que se procedeu à elaboração do Estatuto do Mecenato. Mantém-se, no essencial, o actual regime dos donativos ao Estado e às outras entidades referidas no Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares e no Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas e autonomiza-se o regime do mecenato desportivo, do mecenato científico e do mecenato educacional, sendo certo que algumas das situações neles agora incluídas se encontravam já previstas no âmbito do mecenato social e cultural. Na hierarquização relativa aos benefícios opta-se por atribuir preponderância ao mecenato social e, finalmente, no âmbito do IRS, admitem-se como beneficiários dos donativos as mesmas entidades consideradas em sede de IRC. »

Esta primeira versão do estatuto, relativamente a benefícios em sede de IRS, somente, incorporava no seu artigo 5.º a dedução à coleta de “donativos atribuídos pelas pessoas singulares residentes em território nacional, … Artigo 5.º
Deduções em IRS por virtude do mecenato
Os donativos atribuídos pelas pessoas singulares residentes em território nacional, nos termos e condições previstos nos artigos anteriores, são dedutíveis à colecta do ano a que dizem respeito, com as seguintes especificidades:
a) Em valor correspondente a 25% das importâncias atribuídas, nos casos em que não estejam sujeitos a qualquer limitação;
b) Em valor correspondente a 25% das importâncias atribuídas, até ao limite de 15% da colecta, nos restantes casos;
c) São dispensados de reconhecimento prévio desde que o seu valor seja inferior ao que anualmente for fixado por despacho conjunto dos Ministros das Finanças e da tutela;
d) As deduções só são efectuadas no caso de não terem sido contabilizadas como custos.. Enquanto se manteve em vigor Até ser, expressamente, revogado, pela Lei n.º 53-A/2006 de 29 de dezembro, com efeitos desde 1 de janeiro de 2007., o EM sofreu diversas alterações, merecendo, aqui, destaque a introdução, pela Lei n.º 30-C/2000 de 29 de dezembro (OE/2001), do art. 5.º-A Artigo 5.º -A
Valor dos bens doados

No caso de doação de bens por sujeitos passivos de IRS que exerçam actividades empresariais, o valor a relevar como custo será o valor fiscal que os bens tiverem no exercício em que forem doados, ou seja, o custo de aquisição ou de produção, deduzido das reintegrações efectivamente praticadas e aceites como custo fiscal ao abrigo da legislação aplicável., normativo este que, por seu turno, veio a ser alterado, na respetiva redação, pela Lei n.º 26/2004 de 8 de julho Artigo 5.º -A

Valor dos bens doados
1 - No caso de donativos em espécie efectuados por sujeitos passivos de IRS que exerçam actividades empresariais e profissionais, considera-se, para efeitos do presente Estatuto, que o valor dos bens é o valor fiscal que os mesmos tiverem no exercício em que forem doados, calculado nos termos do artigo 4.º -A.
2 - Sendo os donativos efectuados por sujeitos passivos que não exerçam actividades empresariais ou profissionais, ou que, exercendo-as, os mesmos bens não lhes estejam afectos, o seu valor corresponde ao respectivo custo de aquisição ou de produção, devidamente comprovado.. Ora, deste encadeamento legislativo, entendemos, por evidentes, serem de destacar três notas:
- o primogénito art. 5.º do EM, só se reportava a donativos, sem qualquer distinção, explícita, entre realizados em dinheiro ou em espécie; aliás, enquanto vigorou, tal estatuto nunca incorporou qualquer normativo relativo à definição/caracterização dos donativos;
- a partir de 1 de janeiro de 2001, o legislador teve necessidade de acrescentar, depois desse inicial art. 5.º, um novo normativo (art. 5.º-A) Também, um novel art. 4.º-A, veio regular do valor de bens doados “em estado de uso”, para os benefícios permitidos, em cédula de IRC., com um âmbito inequívoco: regular e estabelecer o valor, fiscalmente, relevante, nos casos de doações de bens, feitas pelos sujeitos passivos de IRS, que exercessem atividades empresariais;
- mais significativamente, com a redação dada a esse art. 5.º-A pela Lei n.º 26/2004…, é manifesto, embora, mantendo a mesma epígrafe, que o poder legislativo quis, se dúvidas existiam, tratar, em exclusivo e separado, dos donativos “em espécie”, para além, de regular as diferentes situações de serem efetuados por sujeitos passivos de IRS que exercessem (ou não) atividades empresariais e/ou profissionais.

Para além dos ajustamentos que ao regime global do EM foram sendo introduzidos para o conformar com a evolução da terminologia das normas privativas da tributação dos rendimentos, é, completamente, certo e seguro, que a vontade do legislador, entre o início do ano de 2001 e o final do de 2006, se manteve constante, inalterada, quanto às deduções à coleta em IRS, no sentido de diferenciar donativos em dinheiro/monetários A remissão do art. 5.º do EM, “…, nos termos e condições previstos nos artigos anteriores,…”, só pode ser interpretada neste sentido, porquanto, nos arts. 1.º a 4.º (do EM), apenas, são tratados donativos com expressão monetária; melhor, em nenhum deles, são, de qualquer modo, referenciados donativos em espécie. das dádivas em espécie. Por outras palavras, no âmbito do EM, a lei, sempre, tratou dos donativos em espécie (bens doados) com recurso a normativo(s) próprio(s) (introduzido(s) a posteriori) e versando, em exclusivo, a matéria do valor (dos bens envolvidos) a relevar como custo.

Coligido este histórico respeitante à génese e regime de vigência do EM, neste momento, volvemos atenções para os tempos sequentes à revogação do mesmo, operante, a partir de 1 de janeiro de 2007, por determinação da Lei n.º 53-A/2006 de 29 de dezembro (OE/2007).

Desta operação, ressalta, imediatamente, a constatação de que o desaparecimento, da ordem jurídica, do EM, foi compensado pela introdução (e aprofundamento) da matéria em causa no seio do EBF, já, em vigor há alguns anos. Efetivamente, essa mesma Lei n.º 53-A/2006 … acrescentou (art. 83.º n.º 3), a este último, o Capítulo X, da Parte II, com a epígrafe «Benefícios relativos ao mecenato», integrando os, novos, arts. 56.º-C a 56.º-H; respetivamente, dispunham sobre a “Noção de donativo”, a “Dedução para efeitos de determinação do lucro tributável das empresas”, as “Deduções à colecta do IRS”, o “IVA - Transmissões de bens e prestações de serviços a título gratuito”, “Mecenato para a sociedade de informação” e “Obrigações acessórias das entidades beneficiárias”. Perante esta simultânea intervenção legislativa, traduzindo no que, aqui, interessa, uma opção do legislador entre um regime vigente durante quase uma década e que, por isso, conhecia bem, bem como, as questões colocadas pela respetiva operação, o qual poderia, simplesmente, reformar e a previsão, sobre as mesmas realidades, de uma normação nova, com eventual repercussão para a tarefa interpretativa que nos ocupa, importa, portanto, auscultar a (eventual) existência de, significativos, pontos de contacto, e, sobretudo, de inovações tradutoras de possíveis novos desígnios.

Entre as novidades, ressalta a introdução do art. 56.º-C (sem, qualquer, paralelo no EM), positivando a definição de donativos para efeitos fiscais, leia-se, obtenção de benefícios fiscais, o qual, inovadoramente, identifica dois tipos de donativos: entregas em dinheiro ou em espécie.
No que tange, especificamente, ao IRS e às deduções à respetiva coleta, verifica-se que o art. 56.º-E, no respetivo n.º 1 se aproxima, quase ipsis verbis, do pretérito art. 5.º do EM; além de ilidir a alínea (al.) c) deste, exclusivamente, faz a precisão, esclarecimento, de visar tratar e abranger, sem mais, os donativos “em dinheiro”. Outrossim, também, inovadoramente (portanto, sem, nenhum, equivalente no EM), procede à instituição de um (novo) benefício fiscal, correspondente à possibilidade de dedução à coleta de IRS dos “donativos concedidos a igrejas, instituições religiosas, pessoas colectivas de fins não lucrativos pertencentes a confissões religiosas ou por eles instituídas”. Finalmente, porque o art. 56.º-E n.º 1 manda atentar “nos termos e condições previstos nos artigos anteriores”, cumpre realçar que o art. 56.º-D incorpora um n.º 11, respeitante ao valor a considerar para efeitos da dedução ao lucro tributável (IRC), nos casos de realização de “donativos em espécie”. Em comparação, este normativo tem uma redação à imagem e semelhança, dos arts. 1.º, 2.º e 3.º do EM, sendo que, o destacado n.º 11, mais não consubstancia que a transposição, com as adaptações necessárias às alterações havidas em matéria de IRC, do conteúdo do art. 4.º-A (“Valor dos bens doados”) do EM.

Aqui chegados, no pressuposto, ainda, de que estes arts. 56.º-C, 56.º-D e 56.º-E, passaram, sem alteração de conteúdo e termos, a partir de meados de 2008, a ser, respetivamente, os arts. 61.º, 62.º e 63.º do EBF, resta finalizar o desígnio interpretativo do n.º 2 do art. 63.º, resumidamente, não se discutindo a abrangência dos donativos em dinheiro, esclarecer se, na sua previsão, podem ser abrangidos donativos em espécie.

Não havendo qualquer reserva em afirmar que, no presente, tal como em 2010, para efeitos de benefícios fiscais relativos ao mecenato, entre os quais, se integram os que envolvam “igrejas, instituições religiosas, pessoas colectivas de fins não lucrativos pertencentes a confissões religiosas ou por elas instituídas”, os donativos efetuados podem consistir em entregas de dinheiro ou em espécie, no caso específico da dedução à coleta, por parte de sujeitos passivos de IRS, o legislador, ciente dessa dicotomia, só tratou, sem dúvida, dos donativos em dinheiro no n.º 1 do art. 63.º do EBF. Apesar de, no seu n.º 2 não ter sido, apaziguadoramente, expresso e inequívoco, entendemos ter sido seu desiderato, igualmente, aí, apenas, conferir tutela aos donativos realizados mediante a entrega de dinheiro, por este conjunto de razões:
- a literalidade do artigo aponta no sentido de só se cuidar de donativos em dinheiro, ou seja, se o legislador pretende-se abranger os dois tipos de donativos permitidos por lei, não teria no n.º 1 inscrito, expressamente, aqueles;
- não se olvidando que o n.º 2 do art. 63.º do EBF é contemporâneo do n.º 1, a habitual/normal técnica de formulação/redação legislativa quando não faz distinção, neste tipo de situações, entre os números que compõem um artigo, é sinal do tratamento de diversas cambiantes da mesma realidade, do mesmo conceito…;
- a progressão legislativa, desde o inicial enquadramento, no EM, até ao momento presente (e, obviamente, até ao ano de 2010), patenteia uma, objetiva, constância, nos elementos essenciais, do regime global e, particularmente, do das deduções à coleta do IRS, bem como, dos termos e conceitos utilizados;
- desta constância, podemos, legitimamente, concluir que, num primeiro momento, só donativos em dinheiro eram, sem reservas, possíveis de serem efetuados, por empresas e/ou particulares, podendo, posteriormente, relevar para efeitos fiscais;
- com certeza, confrontado com a existência de situações de realização de donativos traduzidos na oferta/doação de bens (e/ou serviços) - que a redação inicial dos normativos integrantes do EM não excluía -, o legislador reagiu e, cirurgicamente, sobre a matéria do valor dos “bens doados” a relevar para operação do respetivo benefício fiscal;
- sobre este último aspeto, com a revogação do EM e a passagem da matéria para o EBF, determinantemente, verifica-se que, em relação às deduções à coleta do IRS e, ao invés, do que ocorre em sede de IRC Cf. art. 62.º n.º 11 do EBF (antes, art. 56.º-D)., o novo conjunto normativo deixou de prever (o que, ainda, acontece, presentemente) qualquer regulamentação dos aspetos respeitantes ao valor de donativos em espécie;
- já depois desse momento de migração, precisamente, em 1 de janeiro de 2012 e no mesmo dia do ano de 2015, o legislador integrou, no EBF, normas, privativas, do mecenato científico (art. 62.º-A) e do mecenato cultural (art. 62.º-B), sendo descortinável, em ambos os casos, a previsão da possibilidade de realização de donativos em espécie, com o acrescento de disciplina sobre o valor dos bens envolvidos, para efeitos de quantificação do benefício fiscal correspondente - ver, respetivamente, n.ºs 5 e 7;
- para nós, o n.º 2 do art. 63.º do EBF não visou afirmar um benefício que “é reconhecido em função da entidade a quem o donativo é concedido…” - conclusão 13., porque:
- o art. 63.º n.º 1 do EBF, ao remeter a atribuição de donativos em dinheiro para “os termos e condições previstos nos artigos anteriores” (de início e no ano de 2010, os arts. 61.º e 62.º), já possibilitava que os destinatários fossem, entre muitas outras, “instituições particulares de solidariedade social, bem como pessoas colectivas legalmente equiparadas, pessoas colectivas de utilidade pública administrativa e de mera utilidade pública que prossigam fins de caridade, assistência, beneficência e solidariedade social e cooperativas de solidariedade social…”, por outras palavras, “pessoas colectivas de fins não lucrativos pertencentes a confissões religiosas ou por elas instituídas”, como é o caso das Misericórdias;
- entendemos que o legislador com a previsão do n.º 2 do art. 63.º, além de clarificar e agregar os donativos, desde sempre possíveis de conceder, em torno de entidades, melhor identificáveis pela generalidade das pessoas (sujeitos passivos de IRS), como são as “igrejas” e “instituições religiosas”, pretendeu, sobretudo, instituir uma específica (por contraposição às que, com dificuldades, poderiam operar, por aplicação do art. 62.º) majoração dos quantitativos, das importâncias, em dinheiro, entregues a estas, para o cálculo do respetivo benefício fiscal;
- a concessão do benefício fiscal (dedução à coleta do IRS) restrito aos donativos em dinheiro, na nossa ótica, tem subjacente a vontade do legislador de proteger, em alguma medida, a utilização, pelas pessoas singulares, de parcelas dos rendimentos auferidos, em número muito significativo de casos, do trabalho, enquanto, os donativos em espécie, por não envolverem, diretamente, rendimentos, sendo (ou devendo ser), por regra, a concretização dum tipo de caridade evangélica, decidiu deixar de fora da proteção/compensação do identificado benefício, isto é, operou a ideia de que a sua atribuição era suscetível de toldar, inquinar, os desígnios altruístas, bondosos, da doação de bens a igrejas e afins, cuja compensação tem de se manter (deve manter-se), apenas, na dimensão espiritual;
- finalmente, o caráter provisório do benefício instituído no art. 63.º do EBF (deveria, em princípio, ter caducado a 1 de janeiro de 2017) pode ser mais um indício da vontade do legislador de, somente, querer beneficiar, com abatimento à coleta de IRS, a realização de donativos em dinheiro e, mesmo estes, dentro de percentagens limite, não encontrando, como no caso do IRC Cujo benefício de dedução para efeitos da determinação do lucro tributável das empresas, que, como vimos, aceita, sem reservas, os donativos em espécie, não foi (nem está) condicionado no seu prazo de vigência., qualquer virtualidade (“tutela de interesses públicos extrafiscais relevantes superiores aos da própria tributação”) para, nos 10 anos seguintes, incentivar a atribuição de donativos em espécie, por parte dos sujeitos passivos de IRS.

Destarte, na situação sob escrutínio, os rtes, relativamente ao prédio urbano (terreno situado em aglomerado urbano sem viabilidade construtiva e afetação agrícola) de que, em julho de 2010, venderam metade indivisa e doaram a outra metade, à santa Casa da Misericórdia de ………., não podem, ao abrigo do disposto no art. 63.º n.º 2 do EBF, deduzir à coleta de IRS, respeitante a esse ano, qualquer valor, atribuído ou calculado, referente a esse donativo em espécie (metade indivisa doada).
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# III.


Pelos fundamentos expostos, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, acordamos negar provimento ao recurso.

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Custas a cargo dos recorrentes, em partes iguais.

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[Texto redigido em meio informático e revisto, com versos em branco]


Lisboa, 28 de outubro de 2020. – Aníbal Augusto Ruivo Ferraz (relator) – Francisco António Pedrosa de Areal Rothes – Jorge Miguel Barroso de Aragão Seia.