Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:02571/08.4BEPRT
Data do Acordão:11/18/2020
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ANABELA RUSSO
Descritores:IVA
EXPORTAÇÃO
ISENÇÃO
ÓNUS DE PROVA
Sumário:I - É sobre o sujeito passivo que pretende beneficiar da isenção prevista no artigo 14.º, n.º 1, al. s) do Código de Imposto Sobre o Valor Acrescentado (CIVA) que recai o ónus de alegar e provar que os bens exportados saíram efectivamente do território nacional, uma vez que a operação em causa está, em regra, sujeita a tributação (artigo 6.º, n.º 17 do CIVA, na redacção anterior à entrada em vigor do DL n.º 186/2009, de 12-8).
II – Se o sujeito passivo invoca a isenção prevista na norma identificada em I-, mas não faz prova dos pressupostos legais de que está dependente o seu reconhecimento, não há, com este fundamento, que afastar da ordem jurídica a liquidação correctiva que desconsiderou a invocada isenção.
Nº Convencional:JSTA000P26785
Nº do Documento:SA22020111802571/08
Data de Entrada:03/12/2020
Recorrente:A......, LDA
Recorrido 1:AT – AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral:
ACÓRDÃO

1. RELATÓRIO

1.1. A Autoridade Tributária e Aduaneira, inconformada com a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto que julgou parcialmente procedente a impugnação deduzida por A……………………………………, Lda, interpôs para este Supremo Tribunal Administrativo recurso jurisdicional.

1.2. Admitido o recurso e apresentadas as alegações pela Recorrente, aí se consignaram as seguintes conclusões:

«A. Vem o presente recurso interposto da sentença que julgou parcialmente procedente a impugnação judicial intentada por A…………………………, LDA., NIPC ………………, no segmento relativo à anulação, por erro nos pressupostos, da liquidação adicional de IVA e correspondentes juros compensatórios, relativa ao 1.º trimestre de 2003, na parte atinente às correções efetuadas no montante de € 24 384,47.

B. Conforme decorre da petição inicial, no que a esta parte se refere, a impugnante apenas alega que as situações de isenção do artigo 14.º n.º 1, al. s) e de não sujeição contemplada no artigo 6.º n.º 18, ambos do CIVA, não pressupõem a comprovação referida no artigo 28.º, n.º 8, do CIVA, não fazendo qualquer menção relativamente à isenção prevista na alínea q) do n.º 1 do artigo 14.º do CIVA.

C. Neste sentido, a impugnante apenas se insurge contra as correções que resultaram da desconsideração da isenção prevista no art. 14.º n.º 1, al. s) e da não-sujeição contemplada no artigo 6.º n.º 18, não fazendo qualquer reparo às correções resultantes da desconsideração da isenção prevista na alínea q) do n.º 1 do art. 14.º do CIVA.

D. No entanto, na sentença recorrida, o Tribunal a quo pronunciou-se relativamente à isenção prevista na alínea q) do n.º 1 do art. 14.º do CIVA, determinando a anulação da correção resultante da sua desconsideração pelos serviços de Inspeção Tributária.

E. Nestes termos, pronunciou-se o Tribunal a quo sobre uma questão que, não sendo de conhecimento oficioso, não podia tomar conhecimento, considerando uma causa de pedir que não foi invocada.

F. Motivo pelo qual, com o devido respeito, entende a Fazenda Pública que a sentença recorrida enferma de nulidade por excesso de pronúncia, nos termos do art. 125.º n.º 1 do CPPT e art. 615.º n.º 1 d) do CPC, aplicável por força do art. 2.º, al. e) do CPPT.

Sem prescindir,

G. A sentença recorrida anulou a liquidação impugnada na parte atinente a correções efetuadas no montante de € 14 574,85, por erro nos pressupostos, por considerar: que o n.º 8 do artigo 28.º do CIVA não é aplicável à isenção prevista na alínea s) do n.º 1 do artigo 14.º do CIVA, pelo que, em relação às exportações, mostra-se incorreto o afastamento da isenção com tal fundamento; que a não aceitação da isenção prevista na alínea q) do n.º 1 do art. 14.º do CIVA com fundamento no disposto no n.º 8 do artigo 28.º não se mostra correta, porquanto esta norma legal estabelece uma imposição de comprovação através de “documentos alfandegários apropriados” e a Administração Tributária não invocou a falta de apresentação desses documentos, tendo efetuado a correção aos valores das transmissões intracomunitárias invocando tal norma e enquadrando na mesma a falta de registo dos adquirentes e de comprovação da saída dos bens do território nacional.

H. Com a ressalva do sempre devido respeito, não pode a Fazenda Pública conformar-se com o assim decidido, porquanto entende que a sentença recorrida padece de erro de julgamento de direito, por errada interpretação das alíneas q) e s) do n.º 1 do art. 14.º do CIVA, bem como do art. 28.º n.º 8 do CIVA.

I. Relativamente às prestações de serviços de intermediação relacionadas com transmissões intracomunitárias, concretamente, as comissões cobradas ao cliente “vendedor”, decorre inequivocamente do Relatório de Inspeção Tributária que o que obstou à isenção prevista na alínea q) do n.º 1 do art. 14.º do CIVA foi a falta de comprovação dos pressupostos desta isenção.

J. Em relação às comissões cobradas ao cliente” adquirente”, considerou-se que seriam operações não tributáveis nos termos do n.º 18 do art. 6.º do CIVA “quando o adquirente da prestação de serviços de intermediação seja um sujeito passivo registado, para efeitos de imposto sobre o valor acrescentado, em outro Estado Membro e que tenha utilizado o respetivo número de identificação para efetuar a aquisição”.

K. Verificaram os serviços de Inspeção Tributária que o sujeito passivo, aqui impugnante/recorrida, debitou comissões ao “vendedor” e ao “adquirente” relativas a transmissões cujos adquirentes não se encontravam registados ou sem número de identificação fiscal (conforme decorre do anexo 1 e 2 do RIT).

L. Por outro lado, constataram que não existiam elementos comprovativos de que os bens saíram de Portugal para outro Estado Membro, pressuposto fundamental para que os serviços de intermediação relacionados com transmissões intracomunitárias pudessem beneficiar da isenção de IVA.

M. Ora, atenta a redação do art. 28.º n.º 8 do CIVA e o invocado no RIT sobre a falta de elementos comprovativos de que os bens saíram de Portugal para outro Estado Membro, entende a Fazenda Pública que não se afigurava necessária a menção específica à falta de “documentos alfandegários”, como parece decorrer da sentença.

N. É a própria al. q) do n.º 1 do art. 14.º do CIVA (e não o art. 28.º n.º 8 do CIVA) que prevê que só há isenção destas prestações de serviços se estiverem relacionadas com a expedição ou transporte de bens destinados a outros Estados membros, quando o adquirente dos serviços seja um sujeito passivo do imposto registado e que tenha utilizado o respetivo número de identificação para efetuar a aquisição.

O. Tendo as correções efetuadas sido sustentadas na falta de comprovação de todos os pressupostos da isenção previstos na alínea q) do n.º 1 do art. 14.º do CIVA, não podiam ser anuladas tais correções com o fundamento de que não foi feita menção, no RIT, à falta de apresentação de documentos alfandegários.

P. No que concerne às prestações de serviços de intermediação relacionadas com exportações, ao contrário do que refere a sentença recorrida, o afastamento da isenção não se fundamentou no n.º 8 do artigo 28.º do CIVA, mas sim na falta de comprovativos do pressuposto da isenção prevista na alínea s) do n.º 1 do artigo 14.º do CIVA, nomeadamente de que aquelas prestações de serviços estão relacionadas com transmissões de bens expedidos ou transportados para fora da Comunidade.

Q. Dispõe a alínea s) do n.º 1 do art. 14.º do CIVA que são isentas do imposto “As prestações de serviços realizadas por intermediários que atuam em nome e por conta de outrem, quando intervenham em operações descritas no presente artigo ou em operações realizadas fora da Comunidade”.

R. Conforme se refere no RIT: “para que os serviços de intermediação possam beneficiar da isenção é necessário que estejam relacionados com exportações, ou seja, com transmissões de bens expedidos ou transportados para fora da comunidade pelo vendedor ou por um terceiro por conta deste” conforme o disposto no art. 14.º do Código do CIVA (…) Para que estas operações possam beneficiar da isenção do disposto na alínea s) do n.º 1 do art. 14.º do CIVA, tem que haver comprovativo dos pressupostos da isenção (…)”

S. Ora, independentemente da menção ao n.º 8 do art. 28.º do CIVA, da leitura do RIT é patente que as correções decorrem da falta de comprovação de que aquelas prestações de serviço estão relacionadas com transmissões de bens expedidos ou transportados para fora da Comunidade, pelo que, não existindo qualquer elemento de prova nesse sentido, não podiam ser anuladas apenas por se considerar que as correções foram efetuadas com base na falta dos documentos a que se refere o art. 28.º n.º 8 do CIVA.

T. Posto isto, com ressalva do devido respeito, entende a Fazenda Pública que a sentença recorrida padece, além de nulidade por excesso de pronúncia, nos termos do art. 125.º n.º 1 do CPPT e art. 615.º n.º 1 d) do CPC, aplicável por força do art. 2.º, al. e) do CPPT, de erro de julgamento de direito, pois não faz uma adequada interpretação das alíneas q) e s) do n.º 1 do art. 14.º do CIVA, bem como do art. 28.º n.º 8 do CIVA».

1.3. A Impugnante (doravante Recorrida), notificada do despacho de admissão do recurso, contra-alegou, pugnando pelo não provimento do recurso nos seguintes termos:

«1.ª – Vem o presente recurso interposto da douta sentença de fls._, dada em 2 de Novembro de 2019, que julgou a presente impugnação parcialmente procedente e, em consequência, anulou parcialmente a liquidação em IVA, e correspondentes juros compensatórios, relativamente ao 1.º T de 2003.

2.ª – A impugnação judicial sobre que incidiu a sentença recorrida, teve na sua origem uma acção inspectiva realizada pela AT, cujo objectivo foi analisar e concluir sobre a actuação da Impugnante/Recorrida enquanto sujeito passivo de IRC e de IVA, anos de 2003 e 2004.

3.ª – Dessa acção inspectiva resultaram correcções meramente aritméticas introduzidas à matéria tributável da ora Recorrida, quer em IRC, quer em IVA, anos de 2003 e 2004.

4.ª – A ora Recorrida, inconformada com a forma como decorreu a sobredita acção inspectiva e com os resultados nela apurados, apresentou a defesa dos seus direitos, legitimamente protegidos, entre os anos de 2007 e 2008.

5.ª – Por sua vez, a Recorrente, indiferente ao sentido das decisões entretanto já proferidas, prossegue na senda dos recursos.

6.ª – No presente recurso a Recorrente invoca dois argumentos para sustentar o consequente pedido de provimento: (i) a sentença é nula; (ii) o julgamento enferma de erro.

- Quanto à nulidade da sentença

7.ª – Essa (pretensa) nulidade decorreria, segundo a Recorrente, do facto de a sentença se ter pronunciado sobre uma questão de que não podia tomar conhecimento.

Teria havido excesso de pronúncia por parte da sentença.

8.ª – O excesso de pronúncia residiria, então, na circunstância de a Impugnante/Recorrida não ter feito alusão, a propósito da isenção, à norma do art. 14.º/1-q) do CIVA.

9.ª – Só que a Impugnante/Recorrida tratou a matéria da isenção em causa, e não apenas incidentalmente ou de passagem: fê-lo nos arts. 47.º e 48.º da petição inicial e fê-lo também no exercício do direito de audição, no âmbito da reclamação graciosa, descrevendo os factos que enquadram a previsão do referido art. 14.º/1-q) do CIVA.

10.ª – E é aqui, na descrição da realidade e na menção dos factos, que reside o ónus de quem litiga no processo tributário, como expressivamente se diz no célebre brocardo “dabo mihi factus, dabo tibi jus”.

11.ª – Não pode nunca esquecer-se que, para além doutros princípios fundamentais caracterizadores do contencioso tributário, como o princípio da legalidade e o princípio da verdade material, o princípio aqui dominante é o princípio do inquisitório, correctamente interpretado e aplicado na sentença sob recurso, à luz de um contencioso tributário de plena jurisdição.

- Quanto ao erro de julgamento

12.ª – Contrariamente ao alegado pela Recorrente, o julgamento feito na sentença recorrida, quer quanto à identificação fiscal dos adquirentes, quer quanto à saída dos bens do território nacional não padece de qualquer insuficiência ou inexactidão.

13.ª – E nem a identificação feita mediante a indicação do número do grupo que integra empresas clientes da Recorrida deveria ser susceptível de provocar qualquer reparo, sabido como é que constitui um procedimento aceite nos vários Estados-Membros.

14.ª – Sem esquecer, porque estamos no domínio do IVA, o princípio da neutralidade fiscal.

15.ª – A comprovação da saída das mercadorias está feita em muitos dos documentos incorporados nos volumes que constituem a perícia colegial realizada.

16.ª – É o próprio RIT que declara existir prova de que parte dos bens saíram do país e que quanto a outra parte não há prova inequívoca, não explicando nem a AT (no RIT), nem a Recorrente o que seja uma prova não inequívoca, pelo que não pode, obviamente, desconsiderar a isenção em causa.

17.ª – Inequívoca é a declaração produzida no Relatório Pericial, pronunciando-se sobre o montante por que a correcção fixada pela AT deverá ser corrigida.

18.ªEm suma, a sentença sob recurso não enferma de excesso de pronúncia, pelo que lhe não é aplicável a norma do art. 125.º/1 – parte final do CPPT, nem, obviamente, a norma do art. 615.º/1-d), parte final do CPC; e também não enferma de erro de julgamento na interpretação que fez das normas do art. 14.º/1-q) e s) e 28.º/8, todas do CIVA, aplicando-as com justa observância dos princípios da legalidade tributária, do inquisitório e da verdade material.

19.ª – Julgando como julgou, a sentença sob recurso fez correcta interpretação da LEI e do DIREITO, não merecendo qualquer censura.

1.4. Recebidos os autos neste Tribunal, foram os mesmos presentes à Exma. Senhora Procuradora-Geral-Adjunta, que emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.

1.5. Colhidos os vistos dos Exmos. Senhores Juízes Conselheiros Adjuntos, cumpre, agora, em conferência, decidir.

2. OBJECTO DO RECURSO

2.1. Como é sabido, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso, a intervenção do Tribunal ad quem é especialmente delimitada pelo teor das conclusões que finalizam as alegações do recurso jurisdicional apresentado [artigo 635.º do Código de Processo Civil (CPC)].

Essa delimitação do objecto, na sua vertente negativa, permite concluir se o recurso abrange tudo o que na sentença foi desfavorável ao Recorrente ou se este, expressa ou tacitamente, se conformou com parte das decisões de mérito proferidas sobre questões por si suscitadas (artigos 635.º, n.º 3 e 4 do CPC), situação em que fica vedado ao Tribunal ad quem sobre elas se pronunciar. Na sua vertente positiva, a delimitação do objecto do recurso, especialmente nas situações de recurso para o Supremo Tribunal Administrativo, como é o caso, constitui ainda o suporte necessário à fixação da sua própria competência, nos termos em que esta surge definida pelos artigos 26.º do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais (ETAF) e 280.º e seguintes do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT).

2.2. No caso, são duas as questões colocadas nas conclusões pela Recorrente a que neste julgamento devemos responder.

A primeira prende-se com o vício de excesso de pronúncia de que alegadamente padece a sentença recorrida por o Tribunal a quo ter apreciado a questão da validade da liquidação impugnada face à disciplina contida no n.º 1, al. q) do artigo 14.º do CIVA, sem que, alegadamente, a Impugnante o tivesse requerido.

A segunda está conexionada com o alegado erro de julgamento de direito, que, segundo a Recorrente, foi cometido na sentença recorrida na parte em que julgou as liquidações ilegais com fundamento no disposto nos artigos 14.º, n.º 1, als. q) e s) e 28.º, n.º 8, ambos do CIVA, uma vez que, fundando-se essas liquidações na inexistência de prova dos pressupostos da isenção, é irrelevante que não tenha sido feita uma “menção específica à falta de “documentos alfandegários”.

3. FUNDAMENTAÇÃO

3.1. Fundamentação de facto

3.1.1.A sentença efectuou o julgamento da matéria de facto nos seguintes termos:

1. A impugnante tem como actividade “Agente de comércio por grosso de têxteis e calçado” — CAE 51160 — fls. 81;

2. A Impugnante foi alvo de inspecção tributária ao abrigo da Ordem de Serviço n.º 200504081, que se iniciou em 22/03/2006 e terminou em 11/10/2006 — fls. 81;

3. Em 06/11/2006, foi elaborado “Relatório de inspecção tributária”, a fls. 78 e ss., dos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido, com o teor seguinte:

(…)

1) CONCLUSÕES DA ACÇÃO INSPECTIVA

Após acção de inspecção aos exercícios de 2003 e 2004, propuseram-se as seguintes correcções:

A margem bruta de comercialização obtida após correcção de vendas (resultante de divergências entre as facturas emitidas e os valores contabilizados das mesmas, pontos 3.1.1.l.l) a 3.1.l.l.4)) e do custo das mercadorias vendidas (ponto 3.1.1.2.1)) é de:

No exercício de 2003, o sujeito passivo vendeu 411 pares de calças com margem de comercialização negativa, cerca de (76%), tendo no exercício de 2004 sido devolvidos 349 pares de calças das mesmas vendidas no ano anterior.

No exercício de 2003, os 411 pares de calças foram vendidos por 2.503,49 € e o custo das mesmas foi de 10.625,89 €, conforme:

Tecido (fornecido por B……………….., Lda) de 6.333,99 €

Outros materiais e transportes (fornecidos pela sócia gerente) de 4.291,90 €

Deste modo, o preço de venda unitário foi de 6,09 € e o preço de custo foi de 25,85 €.

A sócia gerente referiu que o motivo do preço de venda ter sido inferior ao preço de custo deveu-se, ao facto, do tecido fornecido por B……………….., Lda ter defeito e que as calças se rasgavam. Daí parte delas terem sido devolvidas. No exercício de 2004, B………………, Lda emitiu uma nota de crédito, no mesmo valor que a factura, a anulá-la.

A margem bruta de comercialização expurgada da venda e da devolução dos pares calças é de:

NOTA: 3.644,46€ = 4.291,90€: 411x 349

Se o sujeito passivo não tivesse tido a devolução de 349 pares de calças com defeito, que originou também uma redução ao custo do tecido através da nota de crédito emitida pelo fornecedor, o sujeito passivo apresentava, relativamente ao exercício de 2004, uma margem de comercialização negativa de 57%.

(…)

Valor das entradas de meios financeiros sem contrapartida económica = 133.402,22 €

Volume de negócios omisso = 133.402,22 € : 1,19 = 112.102,71 €

Vendas omissas = 11.940,28 €

Serviços prestados omissos = 100.162,43 €

(…)

3.2.4) IVA INDEVIDAMENTE DEDUZIDO

Nos exercícios de 2003 e 2004, o sujeito passivo deduziu indevidamente imposto sobre o valor acrescentado, nos montantes de 493,32 € e de 504,02 €, respectivamente, tendo infringido o disposto no artigo 19º do CIVA, conforme:

3.2.4.1) EXERCÍCIO DE 2003

No 3º Trimestre, o sujeito passivo deduziu IVA Superior ao valor contabilizado, de 493,32 €, conforme:

3.2.3) FALTA DE LIQUIDAÇÃO DE IVA ORIGINADA PELA ENTRADA DE MEIOS FINANCEIROS SEM A CORRESPONDENTE CONTRAPARTIDA ECONÓMICA

Tendo como base a data da entrada de meios financeiros sem a correspondente contrapartida económica, conforme ponto 3.1.1.1.5.3) e sabendo que a actividade exercida pelo contribuinte é tributada à taxa normal do IVA, o imposto sobre o valor acrescentado em falta é de 21.299,51 e de 24.174,43 €, nos exercícios de 2003 e 2004, respctivamente conforme:

3.2.1.2) EXPORTAÇÕES

Para que os serviços de intermediação possam beneficiar da isenção é necessário que estejam relacionados com exportações, ou seja, com “transmissões de bens expedidos ou transportados para fora da Comunidade pelo vendedor ou por um terceiro por conta deste”, conforme o disposto no artigo 14º do Código do IVA.

À semelhança do que já foi referido quanto às transmissões intracomunitárias o sujeito passivo debita comissões tanto ao cliente “vendedor” como ao cliente “adquirente”. Ambas as operações estão sujeitas a IVA, conforme o disposto nas alíneas b) e a) do n° 17º do artigo 6º do CIVA respectivamente. Para que estas operações possam beneficiar da isenção do disposto na alínea s) do nº 1 do artigo 14º do CIVA, tem que haver comprovativo dos pressupostos da isenção, conforme o disposto no nº 8 do artigo 28º do CIVA.

Além do débito dos serviços de intermediação “relacionados” com exportações, o sujeito passivo também declara “exportações” de bens, mas no entanto não tem comprovativo de que os bens foram expedidos ou transportados para fora da Comunidade pelo vendedor ou por um terceiro por conta deste, nomeadamente documentos alfandegários. Deste modo, existe falta de liquidação de imposto sobre o valor acrescentado, conforme está explicitado nos ANEXOS l e 2, relativos aos exercícios de 2003 e 2004, respectivamente.

3.2.1.3) REPARTIÇÃO DO IVA POR TRIMESTRES

3.2.2) FALTA DE ENTREGA DE IVA ORIGINADO PELA DIFERENÇA ENTRE O VALOR DO IVA LIQUIDADO NAS FACTURAS/NOTAS DE DÉBITO E O VALOR DO IVA LIQUIDADO DECLARADO NAS DECLARAÇÕES PERIÓDICAS DO IVA

Nos exercícios de 2003 e 2004, o sujeito passivo liquidou imposto sobre o valor acrescentado nas facturas e nas notas de débito por si emitidas superior ao valor declarado nas declarações periódicas do IVA, nos montamos de 776,59 € e 338,99 €, respectivamente, tendo infringido o disposto nos artigos 26º e 28º ambos do CIVA, conforme documentos referidos nos ANEXOS 1 e 2, a seguir repartido:

No caso de uma transmissão intracomunitária, a comissão cobrada ao cliente “vendedor” seria uma operação sujeita nos termos da alínea b) do n° 17 do artigo 6º do CIVA, que por sua vez, podia ser isenta de imposto, nos termos da alínea q) do nº1 do artigo 14º do CIVA através da comprovação da verificação dos pressupostos da isenção, conforme o disposto no nº 8 do artigo 28º do CIVA.

Por outro lado, a comissão cobrada ao cliente “adquirente” seria uma operação não sujeita nos termos do nº 18 do artigo 6° do CIVA, “quando o adquirente da prestação de serviços de intermediação seja um sujeito passivo registado, para efeitos de imposto sobre o valor acrescentado, em outro Estado Membro e que tenha utilizado o respectivo número de identificação para efectuar a aquisição”

Conforme ANEXOS 1 e 2, relativos aos exercícios de 2003 e 2004, verificou-se que o sujeito passivo debitou comissões no “vendedor” e ao “adquirente” relativas a transmissões cujos “adquirentes” não se encontram registados, bem como não têm número de identificação fiscal, como;

* .. …………. – I………….. - NIF não registado no cadastro

* … …………. – J……………. - O nome correspondente ao NIF é de outro sujeito passivo.

* ------- - K…………. Limited - A factura emitida pela firma L…………….., Lda (vendedor) para este “adquirente” faz referência ao NIF ……………, mas este NIF é de outro sujeito passivo.

* -------- - M……………. – Verificou-se que o sujeito passivo liquidou imposto na factura nº 300146, de 07/10/03, emitida para este cliente “adquirente”, mas não liquidou imposto nas facturas nº 300192 e 300198, ambas de 31/12/03, emitidas para os clientes “vendedores” os quais venderam para o “adquirente” M…………… Ou seja, se o cliente não tem NIF válido, também teria que liquidar IVA aos “vendedores” desse mesmo cliente.

* .. ……….. – N……………. Ltd - O nome correspondente ao NIF é de outro Sujeito passivo.

* .. ………… – O……………. Ltd - NIF não registado no cadastro

Verificou-se, também, que o sujeito passivo não tem elementos comprovativos de que os bens sairam de Portugal para outro Estado Membro, para que os serviços de intermediação relacionados com transmissões intracomunitárias pudessem beneficiar da isenção de IVA. Em algumas situações possui fotocópias do CMR ou do FCR, noutras não tem documentos comprovativos inequívocos de que a mercadoria foi expedida. Deste modo, existe falta de liquidação de imposto sobre o valor acrescentado, conforme está explicitado nos ANEXOS 1 e 2 relativos aos exercícios de 2003 e 2004, respectivamente

3.2) IVA

Nos exercícios de 2003 e 2004, o montante de imposto sobre o valor acrescentado em falta ascende a 70.005,69 € e a 69.220.49 €, respectivamente, conforme se discrimina:

3.2.1) FALTA DE LIQUIDAÇÃO DE IVA EM VIRTUDE DO SUJEITO PASSIVO TER CONSIDERADO TRANSMISSÕES DE BENS E PRESTAÇÕES DE SERVIÇOS ISENTAS DE IMPOSTO

Nos exercícios de 2003 e 2004, o sujeito passivo considerou prestações de serviços como isentas ao abrigo das alíneas q) e s) do nº 1 do artigo 14°do CIVA, bem como, considerou transmissões de bens como exportações, quando não reunia os pressupostos para poder beneficiar de isenção. Deste modo, o sujeito passivo não liquidou imposto e originou falta de entrega do mesmo, nos montantes de 47.228,66 € e 42.821,22 €, relativos aos exercícios de 2003 e 2004, respectivamente, bem como, infringiu o disposto nos artigos 7º, 14º, 26º e 28º, todos do Código do IVA, conforme se expõe a seguir:

3.2.1.1) TRANSMISSÕES INTRACOMUNITÁRIAS

No entanto, conforme o disposto nos artigos 14º do CIVA e 14° do RITI, para que as prestações de serviços relacionadas com transmissões intracomunitárias estejam isentas é necessário que haja efectivamente uma transmissão intracomunitária isenta.

Para que se verifique a isenção de uma transmissão intracomunitária é necessário que se verifiquem comulativamente duas condições:

- Os bens sejam expedidos ou transportados pelo vendedor, pelo adquirente ou por conta destes, a partir do território nacional para outro Estado Membro com destino ao adquirente

- O adquirente se encontre registado para efeitos de imposto sobre o valor acrescentado noutro Estado Membro, tenha indicado o respectivo número de identificação fiscal e aí se encontre abrangido por um regime de tributação das aquisições intracomunitárias de bens.

Da análise efectuada aos exercícios de 2003 e 2004, verificou-se que o sujeito passivo debitava comissões isentas de imposto, tanto ao “vendedor” como ao “adquirente” dos bens. O “vendedor” situa-se no mercado nacional e o “adquirente” situa-se noutro Estado Membro.

3.2.3) FALTA DE LIQUIDAÇÃO DE IVA ORIGINADA PELA ENTRADA DE MEIOS FINANCEIROS SEM A CORRESPONDENTE CONTRAPARTIDA ECONÓMICA

Tendo como base a data da entrada de meios financeiros sem a correspondente contrapartida económica, conforme ponto 3.1.1.15.3) e sabendo que a actividade exercida pelo contribuinte é tributada taxa normal do IVA, o imposto sobre o valor acrescentado em falta é de 21.299,51 € e de 24.174,37 €, nos exercícios de 2003 e 2004, respectivamente conforme:

3.2.5) FALTA DE REGULARIZAÇÃO DE IVA A FAVOR DO ESTADO

Nos exercícios de 2003 e 2004, o sujeito passivo não regularizou imposto sobre o valor acrescentado a favor do Estado, no montante de 207,61 € e de 1.346,69 €, respectivamente, tendo infringido o disposto no artigo 71° do CIVA, conforme:

3.2.5.1) EXERCÍCIO DE 2003

*Compras 0900035 - Nota de Crédito nº9 de 17/09/03, de P…………., Lda, IVA de 78,40€, não tendo regularizado este valor a favor do Estado.

* Compras 1000031 – Nota de Crédito n°30065 de 09/10/03, de Q…………., Lda, de 31,65€ + IVA 6,01 €, não tendo regularizado este valor a favor do Estado

* Compras 1100018 - Nota de Crédito C n° 217, de 13/11/03, de R……………, Lda, de valor líquido de 648,40 € + IVA 123,20 €, tendo considerado indevidamente como abatimento às compras de 771,60 €, tendo originado falta de regularização de IVA a favor do Estado de 123,20€

3.2.6) TOTAL DE IVA EM FALTA

Nos exercícios de 2003 e 2004, apurou-se imposto sobre o valor acrescentado em falta, de 70.005,69€ e de 69.220,49€, respectivamente, repartido por períodos

4) MOTIVOS E EXPOSIÇÃO DOS FACTOS QUE IMPLIQUEM O RECURSO A MÉTODOS INDIRECTOS

Não aplicável ao caso em concreto.

(…)

4. O montante de €24.384,47 foi calculado pela soma dos valores considerados pela impugnante isentos e constantes das facturas relativas ao 1.º trimestre de 2003— cfr. anexos RIT;

5. Em nome da impugnante e com base do teor do relatório de inspecção que antecede, foi emitida a liquidação adicional de IVA e correspondentes juros compensatórios respeitante ao 1.º trimestre de 2003, no valor de €24.384,47 — cfr. doc. 2 junto com a petição inicial;

6. A actividade da impugnante consiste, fundamentalmente, na intermediação entre empresas confeccionadoras de têxteis e calçado e potenciais clientes - cfr. fls 2 do relatório de inspecção;

7. Em 28/06/2007, a impugnante deduziu reclamação graciosa contra a liquidação impugnada — RG em anexo;

8. Foi elaborado projeto de indeferimento da RG, o qual foi notificado à impugnante, que se pronunciou nos termos de fls. 27 e ss, da RG, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido — cfr. fls. 15 a 39, da RG;

9. Em 17/10/2008, pelos serviços de inspecção tributária foi elaborada a informação de fls.32 a 36 dos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido;

10. Em 05/11/2008, a reclamação apresentada foi indeferida com base no “Parecer” de fls. 26 a 31, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.

3.1.2. Ficou ainda consignado na sentença recorrida que «Não se provaram quaisquer outros factos para além dos referidos com relevância para a decisão da causa». E que «A decisão da matéria de facto assentou na análise dos documentos constantes dos autos, conforme referido a propósito de cada uma das alíneas do probatório, salientando-se a factualidade constante do relatório de inspecção e que o impugnante não pôs em causa, e no acordo das partes.

O relatório pericial constante dos autos não foi considerado por o mesmo incidir sobre factualidade que não se mostrou relevante para a decisão da causa considerando que, no que toca às correcções que foram objecto da perícia, está em causa saber se as mesmas resultaram de avaliação directa ou indirecta da matéria tributável, afigurando-se o mesmo inútil para o efeito.

A prova testemunhal produzida, de igual modo, também não foi considerada por ter tido por objecto factualidade que encontra sustentação na prova documental constante dos autos e que não se mostra controvertida, versando ainda sobre juízos conclusivos, por natureza irrelevantes, para a decisão da causa.»

3.2. Fundamentação de direito
3.2.1. Como resulta do que deixámos exposto nos pontos antecedentes deste acórdão, o presente recurso traduz o inconformismo da Fazenda Pública com a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto que julgou procedente a Impugnação Judicial deduzida na sequência do indeferimento da reclamação graciosa por si apresentada relativamente à liquidação adicional de IVA e correspondentes juros compensatórios respeitante ao 1.º trimestre de 2003, no valor de €24.384,47, na parte relativa à não verificação dos pressupostos da isenção.
3.2.2. Na sentença recorrida, a Meritíssima Juíza, partindo do pressuposto de queresulta do relatório de inspecção, que a Administração Tributária defende que obsta às isenções previstas nas alíneas q) e s) do n.º 1 do artigo 14, do Código do IVA o incumprimento do n.º 8 do artigo 28, concretamente: c) relativamente às transmissões intracomunitárias, as circunstâncias de os adquirentes não estarem registados nem terem os mesmos números de identificação fiscal e de não ter sido comprovada a saída dos bens de Portugal para outro Estado membro; d) relativamente às exportações, a circunstância de a impugnante não ter comprovado a expedição ou o transporte dos bens para fora da comunidade pelo vendedor ou por um terceiro por conta deste, nomeadamente através de documentos alfandegários”, reconheceu razão à Impugnante por duas razões ou com dois fundamentos.

Por um lado, porque “a isenção prevista na alínea q) do n.º 1 do artigo 14, está abrangida pela obrigação de comprovação a que se reporta o n.º 8 do artigo 28, norma esta que não se reporta à isenção prevista na alínea s) do n.º 1 do artigo 14 e, nessa medida, não lhe é aplicável. Assim, quanto às exportações em causa, não há que aplicar a norma do n.º 8 do artigo 28, razão pela qual o afastamento da isenção com tal fundamento se mostra incorrecto, assim determinando a anulação da correcção efectuada.

Por outro, acrescentou, «mesmo quanto à isenção prevista na alínea q), a não aceitação da mesma por parte da Administração Tributária com fundamento no disposto no n.º 8 do artigo 28, não se mostra correcta”, uma vez que, “estabelecendo esta norma uma imposição de comprovação através de “documentos alfandegários apropriados”, a Administração Tributária, que convocara o referido preceito como fundamento da correcção, nunca invocou expressamente como fundamento da correcção “a falta de apresentação de qualquer documento alfandegário».

3.2.3. É contra este julgamento que a Fazenda Pública veio reagir imputando à sentença recorrida o vício de excesso de pronúncia e de erro de julgamento de direito.

3.2.4. Considerando que este Supremo Tribunal Administrativo, através dos acórdãos proferidos a 28-10-2020, nos processos n.ºs 2560/08.3BEPRT e 2567/08.9BEPRT, se pronunciou sobre questões idênticas (excepto no que respeita ao período de tributação que, no caso, é o 1.º trimestre do ano de 2003), suscitadas em processos com as mesmas partes, tendo por base o mesmo relatório de inspecção, será por transcrição da fundamentação de direito que nesses arestos foi exarada, que subscrevemos integralmente, que decidimos este recurso:

Em relação ao alegado excesso de pronúncia, considera a Recorrente que a sentença se pronunciou sobre os pressupostos da isenção prevista na alínea q) do n.º 1 do artigo 14.º do CIVA e que a Impugnante, na p. i., apenas havia questionado a liquidação na parte referente à aplicação da alínea s) do n.º 1 do artigo 14.º do CIVA.
Assim, considera a Recorrente que o Tribunal a quo se pronunciou sobre uma questão que não foi suscitada pela Impugnante (uma causa de pedir não invocada) e que não era de conhecimento oficioso, pelo que a sentença enferma de nulidade nos termos do artigo 125.º, n.º 1 do CPPT e 615.º, n.º d) do CPC, aplicável ex vi do artigo 2.º, al. e) do CPPT. Mas sem razão.
É que a sentença não se pronuncia sobre o IVA liquidado respeitante às isenções da alínea q) do n.º 1 do artigo 14.º do CIVA (transmissões intracomunitárias), pronuncia-se apenas sobre o montante do IVA liquidado pela AT na sequência do procedimento de inspecção tributária relativo às exportações, ou seja, às ilegalidades imputadas à “contabilização dos serviços de intermediação das transmissões de bens expedidos ou transportados para fora da Comunidade pelo vendedor ou por um terceiro por conta deste” e cuja isenção se encontra prevista na alínea s) do n.º 1 do artigo 14.º do CIVA. Um elemento que é facilmente comprovado, desde logo, atentando no valor inscrito no quadro 3.2.1.3. (repartição do IVA por Trimestres) que consta do relatório de inspecção tributária e que está transcrito na matéria de facto da sentença.
A referência que na fundamentação da sentença recorrida se faz à alínea q) do n.º 1 do artigo 14.º do CIVA visa apenas sustentar a decisão tomada no sentido de que a exigibilidade do “documento alfandegário apropriado” se encontrava, no n.º 8 do artigo 28.º do CIVA, expressamente previsto para os casos da mencionada alínea q) (transmissão intracomunitária de bens), mas não para os casos da alínea s) (exportação), tal como vinha alegado na petição; razão pela qual a exigibilidade daquele requisito para o reconhecimento da isenção, tal como contava do RIT, determinava a anulação da liquidação, nesta parte.
A referência à al. q) do n.º 1 do artigo 14.º do CIVA consubstancia um elemento de retórica na fundamentação da decisão (obiter dictum), desnecessário e incorrecto, apto a gerar confusão quando concluiu que também quanto à alínea q) se imporia a anulação da correcção da liquidação do IVA pelo sujeito passivo; mas ainda assim tal afirmação não consubstancia uma pronúncia judicial, na medida em que não é anulada a liquidação relativa a estes valores.
Como este Supremo Tribunal Administrativo tem afirmado, “[A] nulidade do acórdão por excesso de pronúncia só ocorre quando o tribunal decide uma questão que não havia sido chamado a resolver e que não é de conhecimento oficioso” [por todos, acórdão de 11 de Julho de 2012, (proc. 0356/12)] não tendo neste caso sido decidida pelo Tribunal recorrido qualquer questão que não tivesse sido suscitada, designadamente em relação à liquidação de montantes de IVA relativos à transmissão intracomunitária, improcede o alegado fundamento de nulidade da sentença».
(…)
«Do alegado erro de julgamento. Mas tem razão a Recorrente quando alega que existe um erro de julgamento na decisão recorrida. Com efeito, o segmento da sentença que vem recorrido refere-se – já o dissemos – à parte da liquidação adicional do IVA do 3.º trimestre de 2004 na parte respeitante à isenção das exportações ao abrigo do disposto na alínea s) do n.º do artigo 14.º do CIVA, por, como sustenta a sentença recorrida “apenas a isenção prevista na alínea q) do n.º 1 do artigo 14.º está abrangida pela obrigação de comprovação a que se reporta o n.º 8 do artigo 28.º, norma esta que não se reporta à isenção prevista na alínea s) do n.º 1 do artigo 14.º e, nessa medida, não lhe é aplicável. Assim, quanto às exportações em causa, não há que aplicar a norma do n.º 8 do artigo 28.º, razão pela qual o afastamento da isenção com tal fundamento se mostra incorrecto, assim determinando a anulação da correcção efectuada”.
Ora, não é verdade que o fundamento da correcção tributária impugnada, vertido no Relatório de Inspecção Tributária, assente na falta de documento alfandegário apropriado (embora também alegue a sua inexistência) ou na violação do n.º 8 do artigo 28.º do CIVA (embora também alegue que a mesma se verifica), o fundamento da correcção é mais vasto e radica, como resulta do excerto que transcrevemos, da falta de prova de que os bens tenham efectivamente saído do território nacional, o que, na falta do referido documento, seria um ónus que o sujeito passivo que pretendia beneficiar daquela isenção teria de cumprir, uma vez que se trata de uma operação, em princípio, sujeita a tributação ex vi do artigo 6.º n,º 17 do CIVA.
Em outras palavras, o que resulta do RIT é que o sujeito passivo não fez prova dos pressupostos da isenção e, independentemente do modo como essa prova teria de produzir-se, cujos requisitos legais podem não ser os do n.º 8 do artigo 28.º do CIVA, o que se alega no RIT e não vem contestado em nenhum outro sítio pelo Impugnante, é que ela (a prova da saída dos bens) não foi efectuada por nenhum meio.
Assim, ainda que a invocação do n.º 8 do artigo 28.º do CIVA pudesse ser incorrecta, não poderia a sentença ter concluído pela verificação da ilegalidade do acto de liquidação adicional, uma vez que o Impugnante não realizou prova, por nenhuma via, da verificação dos pressupostos da isenção de que pretendia beneficiar».
3.2.5. São, pois, pelos fundamentos expostos, que, repetimos, acolhendo passam a constituir o fundamento deste julgamento, de julgar procedentes as conclusões vertidas nas alíneas G) a T), das alegações de recurso, o que determina o provimento do recurso jurisdicional interposto pela Fazenda Pública.

4. DECISÃO

Pelo exposto, acordam os Juízes que compõem esta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, concedendo provimento ao recurso, anular a liquidação adicional de IVA respeitantes ao 1.º trimestre de 2003 na parte atinente às correcções efetuadas no montante de € 24 384,47.

Custas nesta instância pelo Recorrido e, em 1ª instância, por ambas as partes, fixando-se as mesmas, na proporção de respectivo decaimento, em 80% e 20%, respectivamente a cargo da Impugnante e da Administração Tributária (artigos 527.º, n.º 1 e 2 do CPC).

Registe e notifique.

Lisboa, 18 de Novembro de 2020. - Anabela Ferreira Alves e Russo (relatora) – José Gomes Correia - Aníbal Augusto Ruivo Ferraz.