Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01635/15
Data do Acordão:04/14/2016
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:COSTA REIS
Descritores:DIREITO A DECISÃO JUDICIAL EM PRAZO RAZOAVEL
HONORÁRIOS DE ADVOGADO
Sumário:
Nº Convencional:JSTA00069656
Nº do Documento:SA12016041401635
Data de Entrada:01/18/2016
Recorrente:A...
Recorrido 1:ESTADO PORTUGUÊS
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC REVISTA EXCEPC
Objecto:AC TCAN
Decisão:PROVIMENTO PARCIAL
Área Temática 1:DIR ADM CONT - ACÇÃO ADM COMUM.
Legislação Nacional:CCIV66 ART483 ART484 ART494 ART496 ART562.
L 67/2007 DE 2007/12/31.
CPC13 ART358 N2.
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC0266/11 DE 2012/06/20.; AC STAPLENO PROC024779A DE 2002/06/06.; AC STA PROC043994 DE 1999/06/09.; AC STA PROC0266/11 DE 2012/06/20.; AC STA PROC0127/03 DE 2005/05/31.; AC STA PROC0395/05 DE 2005/06/29.
Aditamento:
Texto Integral: ACORDAM NA SECÇÃO DE CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO DO STA:

A………………… intentou, no TAF do Porto, contra o ESTADO PORTUGUÊS, acção administrativa comum pedindo a condenação deste no pagamento de uma indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais emergentes da alegada violação do seu direito a uma decisão judicial em prazo razoável.
O TAF julgou a acção parcialmente procedente, condenando o Réu a pagar à Autora a quantia de € 4.000 a título de danos não patrimoniais, acrescida de juros de mora, e absolvendo-o dos demais pedidos.

Inconformados, quer a Autora quer o Réu interpuseram recursos para o TCAN.
E este concedeu provimento, ainda que parcial, apenas ao recurso da Autora e, em consequência, condenou o Réu a pagar-lhe o dano correspondente aos honorários do advogado, “a apurar em execução de sentença.”

A Autora interpôs recurso dessa decisão que concluiu do seguinte modo:
1. O Estado deve ser condenado a pagar pelo menos quinze mil euros por danos morais à autora, acrescidos dos juros legais desde a citação.
2. O TCAN fixou a indemnização em 4.000 euros, não tendo em conta a duração do processo e o dano moral intenso da autora: 11 anos e 4 em maioridade.
3. Mesmo menor, a menor sofreu intensamente, “Intensidade emocional agravada”, p. 29 do acórdão.
4. Danos morais que se presumem.
5. Como tudo o TCAN o reconhece.
6. O TCAN violou o artigo 6°, nº 1, da Convenção ao fixar montante miserabilista.
7. E deve o Estado ser condenado a pagar honorários do advogado da autora a liquidar nos termos fixados pelo Estatuto da Ordem dos Advogados, tendo em conta a qualidade do serviço, tempo gasto, estudo demandado, e não segundo a tabela dos honorários de advogados oficiosos.
8. O TCAN violou, grosseiramente, o ESTATUTO DA ORDEM DOS AVOGADOS, no seu artigo 100°.
9. Nas páginas 29/32 o TCAN diz que há duas teses nos tribunais superiores, mas seguiu uma tese diferente da do STA e uma tese diferente da seguida pelo próprio tribunal de recurso, TCAN, dezenas de vezes seguida.
10. Ou seja lançou a incerteza, violou o princípio da segurança jurídica, o princípio da certeza, da legalidade e igualdade. Violou pois o artigo 6.°, n.º 1, da Convenção.
11. O TCAN seguiu ainda uma terceira tese: Pagamento segundo a tabela dos advogados oficiosos. Mas concluiu isso sem dizer porquê!
12. Pagar segundo a tabela dos oficiosos é ofensivo, insultuoso, degradante, humilhante. Como o próprio TCAN o bem sabe!
13. Um advogado oficioso é aprendiz, basta escrever umas coisas para receber, não é exigente, é inexperiente.
14. A mudança de lei e jurisprudência a meio do caminho viola expectativas legítimas.
15. Ao seguir interpretação da lei de forma diferente da anterior e diferente da do STA, o TCAN violou os princípios de segurança jurídica, da certeza, da legalidade e igualdade previstos no artigo 6°, nº 1, da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, artigo que assim foi violado.
16. Como o tribunal decidiu, há violação da jurisprudência do Tribunal Europeu e do artigo 6°, nº 1, da Convenção e do artigo 1° do Protocolo nº 1 a ela anexo.
17. Assim, deve revogar-se o acórdão para se decidir em conformidade com as conclusões anteriores, e assim se condenar o Estado.

O Estado Português contra alegou para formular as seguintes conclusões:
1. Nos termos e com os fundamentos acima expostos, o presente recurso de revista em apreço deverá improceder in totum;
2. Assim, falece razão à Recorrente A……………., quando qualifica de “miserabilista” a indemnização fixada pelo TAF do Porto, confirmada e mantida pelo TCAN a quo, porquanto, contrariamente ao invocado, a mesma respeita e observa os parâmetros consagrados nos doutos arestos tirados pelo Colendo TEDH;
3. Com efeito, a indemnização no valor de €4.000,00, arbitrada à ora Recorrente, a título de indemnização pelos danos não patrimoniais por si alegados e provados, não se afasta, antes se adequa aos valores atribuídos, quer pelo próprio TEDH, quer por esse Colendo STA, como resulta de um exame atento à jurisprudência emanada destes Altos Tribunais;
4. Ademais, no que tange à ressarcibilidade do dano correspondente aos honorários do advogado, o douto aresto recorrido não incorre em qualquer desrespeito à jurisprudência anterior deste TCA Norte e, outrossim, em afronta aos invocados princípios da segurança jurídica, da certeza, da legalidade e da igualdade, afronta que, de resto, não se mostra minimamente densificada e que nem sequer se descortina;
5. Mas, ainda que, por mera hipótese de raciocínio, se surpreendesse, no douto aresto recorrido, uma inflexão a essa jurisprudência, existem mecanismos legais para colmatar essa eventual divergência, designadamente, o recurso para uniformização da jurisprudência contemplado no artigo 152.º do CPTA;
6. De todo o modo, os tribunais só estão vinculados à Constituição e à lei, nos termos dos artigos 203.º e 204.º ambos da CRP, e mesmo a jurisprudência uniformizadora não é vinculativa para as 1.ª e 2.ª instâncias, pese embora possua inequívoca força persuasiva, devendo a eventual discordância da doutrina aí consagrada ser, devida e exaustivamente, fundamentada e alicerçar-se, v. g., na violação de princípios, que firam a consciência jurídica do julgador ou na sua manifesta desactualização, face à evolução da sociedade, à sua reiterada desaplicação pelos tribunais ou aos novos contributos doutrinais nessa específica matéria;
7. Sucede que in casu não está em questão a ressarcibilidade das despesas decorrentes do pagamento dos honorários devidos ao advogado constituído pela A., mas, tão-somente, a determinação do respectivo valor, ou seja, a sua quantificação;
8. Não se detecta, pois, in casu, qualquer erro de julgamento na interpretação e aplicação do artigo 6º n.º 1, da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, preceito que não se mostra minimamente ofendido e/ou violado;
9. De resto, constitui um facto notório ou, pelo menos, evidente ou irrefutável que o próprio TEDH é especialmente parcimonioso na atribuição de indemnizações por danos patrimoniais, pelo que a exegese efectuada pelo TCAN se mostra em perfeita harmonia e, por isso, absolutamente compatível ou conciliável com a jurisprudência desse Colendo TEDH;
10. Em adição, não se revela afrontado o artigo 100.° do Estatuto da Ordem dos Advogados, porquanto se trata de uma disposição estatutária que estabelece os parâmetros em que se deve mover o profissional forense, na fixação dos seus honorários e daí aplicável no âmbito da relação contratual estabelecida entre si e o respectivo cliente, razão por que o tribunal não está adstrito ou vinculado à sua estrita observância
11. Na verdade, parafraseando o mencionado douto aresto do TCA Sul, de 22/11/2012, no Processo n.º 03399/08, “Os honorários de advogado são dano indemnizável, mas apenas enquanto o sejam no valor adequado, necessário para afastar a lesão. E corresponderão ao valor que o legislador considerou o justo, o adequado ao patrocínio em questão e não a qualquer outro, que possa ser livremente fixado pelos profissionais do foro e apenas deontologicamente parametrizados”;
12. Acresce que, contrariamente ao alegado pela Recorrente A............., é destituída de fundamento a assacada violação de jurisprudência consolidada do STA que, pura e simplesmente, inexiste;
13. Com efeito, está pendente, nesse Colendo STA, o Processo n.º 0314/13, [que corresponde ao Processo n.º 03399/08, do TCA Sul, onde foi prolatado o Acórdão de 22/11/2012, acolhido e seguido no acórdão sob revista], em que foi admitida a revista, por douto Acórdão da Formação de Apreciação Preliminar, de 21/03/2013, de cujo sumário se extrai que “O Acórdão do TCA que decidiu limitar a indemnização devida à parte vencedora como honorários de advogado ao montante que está fixado na respectiva tabela para aquele tipo de acções como honorários devidos ao defensor oficioso, trata de questão de importância geral, não decidida antes pelo Supremo, cujas características denunciam a frequência de situações idênticas, pelo que se justifica admitir sobre ela revista excepcional”;
14. Destarte, o Recorrido Estado Português conclui no sentido de que o douto aresto em crise não enferma dos erros de julgamento que lhe são imputados no recurso de revista sub judice, razão por que será de manter in totum.

FUNDAMENTAÇÃO


I. MATÉRIA DE FACTO
A decisão recorrida julgou provados os seguintes factos:
1. A Autora é filha de B…………….., nascida a 6 de Outubro de 1987, na constância do casamento com C…………….. – cfr. assento de nascimento ínsito a fls. 160 do processo físico.
2. A mãe da A., no dia 7 de Julho de 1999, apresentou no Tribunal de Família do Porto requerimento para regulação do poder paternal, figurando como requerido o pai da menor, aqui A. – cfr. certidão do processo n.º 562/1999, que correu termos no Tribunal de Família do Porto, no 2.º Juízo, 1.ª Secção e fls. 86 a 88 do processo físico.
3. A mãe da A. requereu a fixação de prestação alimentar por parte do requerido a favor da filha menor, no montante de 15.000$00 (€ 75,00).
4. No dia 22 de Setembro de 1999, foi marcada conferência de pais para 9 de Novembro de 1999.
5. Foi enviada ao requerido carta registada com AR, para citação, no dia 23 de Setembro de 1999.
6. Não foi realizada a conferência agendada, não se encontrando presente o requerido, sendo ordenado que se aguardasse por 10 dias a devolução do AR para citação, dado se desconhecer se o requerido fora ou não citado. – cfr. doc. 3 junto com a contestação.
7. A carta de citação veio devolvida no dia 17 de Janeiro de 2000 – cfr. fls. 10 da certidão do processo n.º 562/1999.
8. A carta foi expedida para a morada que a mãe da A. indicara ao Tribunal. – cfr. fls. 2 e 10 da referida certidão.
9. A referida carta foi devolvida pelos serviços postais da África do Sul, não constando da mesma os motivos da devolução. – cfr. fls. 10 da referida certidão.
10. A mãe da A., no dia 27 de Setembro de 2000, solicitou a citação do requerido através do consulado português, não tendo indicado outra morada. – cfr. fls. 12 da referida certidão.
11. Através de of.º datado de 27 de Outubro de 2000, o Tribunal oficiou o Consulado Português na África do Sul solicitando informação no sentido de saber se o requerido reside na morada indicada nos autos. – cfr. fls. 13 da referida certidão.
12. O Consulado Português na África do Sul respondeu, por of.º datado de 23 de Novembro de 2000, que deu entrada no Tribunal no dia 11 de Dezembro de 2000, não tendo o Consulado fornecido indicações sobre a morada do requerido – cfr. fls. 14 da referida certidão.
13. A mãe da A., no dia 16/01/2001, após tomar conhecimento da resposta do consulado, forneceu uma morada do mesmo em Joanesburgo, África do Sul. – cfr. fls. 16 da referida certidão.
14. O processo foi concluso em 23 de Janeiro de 2001, tendo sido despachado em 9 de Março de 2001. – cfr. fls. 18 da referida certidão.
15. No referido despacho foi designada conferência de pais para o dia 14/05/2001, tendo sido ordenado fosse tentada a citação do requerido por carta com AR a enviar para a morada fornecida pela mãe da A. no requerimento de 16/01/2001. – cfr. fls. 18 da referida certidão.
16. No dia 15 de Março de 2001 foi enviada carta com AR para citação do requerido. – cfr. fls. 18 da referida certidão.
17. Na mesma data foi remetido of.º ao Consulado Português para proceder à citação do requerido. – cfr. fls. 18 da referida certidão.
18. Por of.º datado de 9 de Abril de 2001, recebido no Tribunal de Família e Menores do Porto em 4 de Maio de 2001, o Consulado Português na cidade do Cabo respondeu referindo que o of.º para citação tinha sido remetido ao Consulado Geral de Portugal em Joanesburgo. – cfr. fls. 21 da referida certidão.
19. A conferência agendada para o dia 14/05/2001 não foi realizada, não tendo comparecido o requerido, desconhecendo-se se o mesmo tinha sido citado, pelo que foi ordenado aguardar 10 dias pela devolução do AR expedido para citação. – cfr fls. 24 da referida certidão.
20. A carta para citação do requerido foi devolvida em 28 de Junho de 2001. – cfr. fls. 25 da referida certidão.
21. A referida carta foi remetida para a morada indicada pela mãe da A. a fls. 16 da certidão mencionada. – cfr. fls. 16 e 25 da certidão.
22. A referida carta não contém o motivo da devolução – cfr. fls. 25 da referida certidão.
23. O Consulado Geral de Portugal em Joanesburgo, através de of.º entrado em Tribunal no dia 12/09/2001, enviou a certidão de citação do requerido. – cfr. fls. 26 e 27 da referida certidão.
24. A citação foi feita no dia 3 de Setembro de 2001, no próprio Consulado – cfr. fls. 27 da referida certidão.
25. No dia 2 de Outubro de 2001, foi designada conferência de pais para o dia 2 de Dezembro de 2001, tendo sido ordenada a notificação do requerido através de consulado – cfr. fls. 28 verso da referida certidão.
26. O referido despacho foi cumprido através de of.º datado de 4 de Outubro de 2001 – cfr. fls. 29 da referida certidão.
27. Através de despacho datado de 10/10/2001, o Tribunal constata um lapso na indicação da data para realização da conferência de pais, ordenando a notificação das partes para realização da referida diligência no dia 10 de Dezembro de 2001 – cfr. fls. 30 da referida certidão.
28. O dia 2 de Dezembro de 2001 foi um Domingo.
29. Foi solicitado ao Consulado Geral de Portugal em Joanesburgo a notificação do requerido. – cfr. fls. 30 da referida certidão.
30. No dia 10 de Dezembro de 2001 o requerido não compareceu para realização da referida diligência tendo sido proferido despacho no sentido de ser solicitada a devolução do mandado de notificação, o que foi feito por of.º datado de 28 de Dezembro de 2001 – cfr. fls. 36 e 37 da referida certidão.
31. O referido of.º foi devolvido a Tribunal com a indicação de endereço insuficiente – cfr. fls. 38 da referida certidão.
32. O endereço constante do referido of.º é o mesmo que consta de fls. 26.
33. Por despacho datado de 21 de Janeiro de 2002 foi solicitado ao Ministério dos Negócios Estrangeiros o endereço do Consulado Geral de Portugal na África do Sul. – cfr. fls. 39 da referida certidão.
34. Através de of.º recebido no Tribunal de Família e Menores em 23/01/2002 e expediente que o acompanha, consta que o requerido foi citado em 3/09/2001 – cfr. fls. 41, 43 e 44 da referida certidão.
35. O Ministério dos Negócios Estrangeiros, mediante of.º datado de 6/03/2002, que deu entrada no Tribunal de Família e Menores em 18/03/2002, prestou informação sobre o endereço do consulado – cfr. fls. 47 da referida certidão.
36. Foi agendada conferência para o dia 12 de Junho de 2002 – cfr. fls. 49 (verso) da referida certidão.
37. No dia 12 de Abril de 2002 foi solicitado ao Consulado que procedesse à notificação do requerido – cfr. fls. 52 da referida certidão.
38. A carta veio devolvida, não se encontrando o endereço completo, face à informação prestada pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros, dado faltar o código postal (………….) – cfr. fls. 53 da referida certidão.
39. Foi enviada carta para o Consulado, datada de 29 de Abril de 2002, solicitando a notificação – cfr. fls. 54 da referida certidão.
40. A conferência agendada para o dia 12/06/2002 foi adiada por não se encontrar presente nenhuma pessoa que nela deveria intervir, tendo sido agendado o dia 24 de Setembro de 2002 para os mesmos efeitos, tendo sido ordenada a notificação do requerido através do consulado, despacho cumprido através de carta datada de 12/06/2002 – cfr. fls. 56 e 57 da referida certidão.
41. A data de realização da conferência foi alterada, no dia 27 de Junho de 2002, para o dia 26 de Setembro de 2002, tendo sido ordenada a notificação do requerido através do consulado – cfr. fls. 63 da referida certidão.
42. A referida alteração de data foi decidida, na sequência de requerimento formulado pelo Advogado da mãe da A., tendo a titular dos autos considerado não ser essencial a presença de advogado na conferência de progenitores – cfr. fls. 63 da referida certidão.
43. Por carta datada de 15 de Julho de 2002, dirigida ao Consulado de Portugal em Joanesburgo, foi cumprida ordem de notificação do requerido. – cfr. fls. 69 da referida certidão.
44. Após promoção de fls. 75 – que se dá como reproduzida – foi dada sem efeito a diligência agendada, tendo sido designado o dia 26 de Novembro de 2002 para os mesmos efeitos e ordenada a notificação do requerido a efectuar pelo consulado, o que foi solicitado por of.º datado de 24 de Setembro de 2002 – cfr. fls. 76 e 80 da referida certidão.
45. A conferência agendada para o dia 26 de Novembro de 2002 não se realizou, dado que, tendo faltado o requerido, se desconhecia se estava ou não notificado – cfr. fls. 82 da referida certidão.
46. No dia 14 de Janeiro de 2003 foi expedido of.º para o Consulado, dando-se cumprimento ao despacho de fls. 84 dos autos de regulação de poder paternal, solicitando informação sobre a notificação do requerido – cfr. fls. 85 da referida certidão.
47. Por of.º datado de 7 de Março de 2003, recebido no Tribunal de Família e Menores do Porto em 28 de Março de 2003, o consulado remeteu certidão de notificação do requerido, efectuada em 5 de Março de 2003 – cfr. fls. 86/87 da referida certidão.
48. Foi agenda conferência de progenitores para dia 28 de Abril de 2003 – cfr. fls. 90 da referida certidão.
49. A referida conferência teve lugar na data supra referida tendo a mãe da A. feito as declarações constantes de fls. 95 da certidão que se dão por integralmente reproduzidas – cfr. fls. 95 e 96 da certidão.
50. No dia 2 de Maio de 2003, foi remetido of.º ao consulado solicitando fosse avaliada a situação económica e familiar do requerido – cfr. fls. 98 da certidão.
51. Dá-se por integralmente reproduzido o teor de fls. 102 a 106 da certidão – “Relatório social”
52. No dia 27 de Junho de 2003, foi oficiado o consulado para dar resposta à pretensão do consulado para avaliar a situação económica do requerido – cfr. fls. 107 da certidão.
53. Através de of.º datado de 22 de Julho de 2003, o consulado informou o Tribunal ter remetido ao requerido duas convocatórias, que não obtiveram resposta por parte do mesmo – cfr. fls. 109 da referida certidão.
54. Foi emitido parecer pelo Ministério Público no dia 16 de Setembro de 2003 – cfr. fls. 110 a 112 da referida certidão
55. No dia 10 de Outubro de 2003 e foi ordenada a expedição de carta rogatória à Justiça da África do Sul para realização de inquérito às condições sócio-económicas e morais do progenitor. – cfr. fls. 113 da certidão.
56. No dia 23 de Dezembro de 2003, foi recebida na Procuradoria da República, junto do Tribunal de Família e Menores, of.º proveniente da Direcção Geral de Administração de Justiça acompanhado de comunicação escrita oriunda do Ministério dos Negócios Estrangeiros – cfr. fls. 120 e 121 da certidão.
57. Através de of.º datado de 21 de Setembro de 2005, o Tribunal solicitou à Direcção Geral de Administração da Justiça providenciasse no sentido de informar o estado da carta rogatória enviada à justiça da África do Sul – cfr. fls. 124 da referida certidão.
58. A referida Direcção Geral respondeu ao Tribunal, por of.º datado de 30 de Setembro de 2005, que deu entrada em Tribunal no dia 6 de Outubro de 2005, no qual é referido ter sido solicitada infº ao Ministério dos Negócios Estrangeiros – cfr. fls. 125 da certidão.
59. No dia 30 de Maio de 2006, o Tribunal formulou pedido idêntico à Direcção Geral de Administração da Justiça – cfr. fls. 132 da referida certidão.
60. A Direcção Geral de Administração da Justiça respondeu ao referido pedido, através de of.º datado de 2 de Junho de 2006, que deu entrada no Tribunal de Família e Menores do Porto no dia 7 de Junho de 2006, no qual é referido que se solicitou a devolução do processo ao Ministério dos Negócios Estrangeiros – cfr. fls. 133 da certidão.
61. No dia 1 de Setembro de 2006, o Tribunal formulou pedido idêntico à Direcção Geral de Administração da Justiça. – cfr. fls. 139 da certidão.
62. A Direcção Geral de Administração da Justiça respondeu ao referido pedido, através de of.º datado de 27 de Setembro de 2006, que deu entrada no Tribunal de Família e Menores do Porto no dia 4 de Outubro de 2006, no qual é referido que se solicitou a devolução do processo ao Ministério dos Negócios Estrangeiros – cfr. fls. 151 da certidão.
63. Através de requerimento datado de 22 de Setembro de 2006, a requerente, mãe da A., informou o Tribunal que a sua filha tinha atingido a maioridade, tendo o Tribunal ordenado o arquivamento dos autos por despacho datado de 25 de Setembro de 2006, do qual foi interposto recurso, admitido por despacho datado de 6 de Outubro de 2006 – cfr. fls. 141, 142 e 147 da certidão.
64. No dia 4 de Dezembro de 2006, foi proferido despacho a reparar o agravo, tendo sido concedidos 20 dias à filha, ora A., para requerer o prosseguimento dos autos. – cfr. fls. 170 da certidão.
65. A A., em requerimento datado de 12 de Dezembro de 2006, vem requerer o prosseguimento dos autos, para fixação de alimentos entre Julho de 1999 e Setembro de 2005; tendo, em requerimento datado de 18 de Janeiro de 2007, referido desconhecer a existência de bens ou rendimentos do requerido. – cfr. fls. 175 e 183 da certidão.
66. Em 23/01/2007, os autos aguardavam a devolução da carta rogatória.
67. Em 17/08/2007, a Direcção Geral de Administração da Justiça remeteu ofício ao Ministério dos Negócios Estrangeiros solicitando a devolução da carta rogatória.
68. Em 29/11/2010, foi proferida decisão no âmbito deste processo n.º 562/1999, condenando o ali requerido, progenitor da A., a contribuir a título de alimentos para aquela filha com a quantia mensal de €100,00, desde a data da propositura da acção de regulação do poder paternal até à maioridade (Julho de 1999 a Setembro de 2005) – cfr. fls. 85 e 206 a 212 do processo físico, cujo teor aqui se tem por integralmente reproduzido.
69. Esta sentença transitou em julgado em 18/01/2011 – cfr. fls. 223 e 224 do processo físico.
70. A mãe da A. recebeu, no período compreendido entre 2 de Agosto de 2001 e 1 de Agosto de 2003, a título de subsídio de desemprego, a quantia de 8.312,78€, e entre 2 de Agosto de 2003 e 1 de Novembro de 2004, a título de subsídio social de desemprego, a quantia de 4.351,74€ – cfr. doc. 29 junto com a contestação.
71. A A., em 02/02/2007, instaurou a presente acção administrativa comum, sob a forma ordinária, contra o R. – cfr. carimbo e registo constante de fls. 1 e 2 do processo físico.
72. A A., face ao desenrolar do processo de poder paternal, não pôde prever a data em que o mesmo terminaria.
73. A A. sentiu incerteza na planificação das decisões a tomar.
74. A A. não pôde organizar-se.
75. O desenrolar do processo causou à A. ansiedade, angústia, incerteza, preocupações e aborrecimentos.
76. A A., por força do desenrolar do processo, sentiu tensão, infelicidade e sentimentos de frustração.
77. A A. sentiu-se e sente-se triste e deprimida pelo desenrolar do processo e por ter de se sustentar sem a colaboração do progenitor.
78. A mãe da A. vivia numa “ilha”, propriedade de um irmão, cedido gratuitamente.
79. O rendimento do agregado familiar era proveniente do subsídio de desemprego referenciado em Y’’), do contributo do filho mais velho, que não estava integrado no agregado familiar, mas contribuía, sem carácter de mensalidade fixa, sempre que o agregado familiar necessitava, com valores não determinados, mas que se aproximavam ora dos €100,00 ora dos €150,00 e, quando conseguia emprego, do trabalho exercido pela mãe da A.
80. A mãe da A. tinha despesas com água, electricidade e gás, bem como com a A..
81. O pai da A. nunca enviou qualquer montante para o sustento dos filhos, nem mesmo após sentença condenatória referenciada em W’) contribuiu com qualquer quantia para a A. a título de alimentos.
82. A mãe da A., para a criar, teve de pedir dinheiro emprestado.
83. Por despacho de 10.01.2007, o juiz do 2.º Juízo do Tribunal de Família e Menores do Porto ordenou que fosse solicitada nova informação sobre o estado da carta rogatória (doc. fls. 178 dos autos).
84. Por ofício recebido em 29.11.2009, o Departamento de Assuntos Jurídicos do MNE informou a Directora-geral da Administração da Justiça, em resposta ao ofício daquela Direcção-geral de 05.08.2009, que, segundo informação verbal do Ministério dos Negócios Estrangeiros sul-africano, a carta rogatória não foi cumprida “pelo facto de não haver acordo de reciprocidade respeitante à ordem de manutenção entre Portugal e a República da África do Sul”, informando, ainda, que foi feita “nova insistência pela devolução da carta rogatória às autoridades competentes” (doc. fls. 213 dos autos).
85. Na sentença referida em W’’) consta, além do mais, que “desconhece-se a situação económica do progenitor” e que “tal situação não é impeditiva da fixação de alimentos(certidão de fls. 206 e s. dos autos).
86. No P. 305/07.0BEPRT, que correu termos no TAF do Porto em que era autora a mãe da aqui Autora e Réu o Estado, no qual peticionava indemnização por atraso da justiça no processo de regulação de poder paternal de sua filha, foi proferido Acórdão pelo TCAN, de 25.11.2011, P. 00305/07.0BEPRT, no qual foi declarada extinta a instância com fundamento em inutilidade superveniente da lide, por ter considerado que a pretensão indemnizatória vertida na acção se esgotou com a atribuição e pagamento da indemnização acordada com o Estado português no âmbito da queixa n.º 55636/08 junto do TEDH, no âmbito da qual a autora (mãe) renunciou a qualquer outra pretensão contra Portugal relativa aos factos que estão na origem da queixa, tendo-lhe sido atribuída a quantia de 8.400,00 euros a título de dano moral e de 1.500,00 euros a título de despesas; e na sequência desse acordo o TEDH proferiu, em 23.03.2010, decisão de arquivamento da queixa (Acórdão pelo TCAN, de 25.11.2011, P. 00305/07.0BEPRT, disponível em www.dgsi.pt).


II. O DIREITO.
A………………… intentou, contra o Estado Português, acção administrativa comum pedindo a condenação deste no pagamento de uma indemnização que a compensasse dos danos patrimoniais e não patrimoniais que sofreu por o processo de regulação paternal que lhe dizia respeito, intentado por sua mãe contra o seu pai, não ter sido julgado em prazo razoável.
O TAF do Porto julgou essa acção procedente apenas no tocante aos danos não patrimoniais pelo que condenou o Réu a pagar à Autora a quantia de 4.000 euros a esse título, acrescida de juros de mora, absolvendo-o dos demais pedidos.

Autora e Réu não se conformaram com essa decisão e, por isso, recorreram para o TCA Norte.
Este negou provimento ao recurso do Estado e concedeu parcial provimento ao recurso da Autora do que resultou a manutenção da anterior condenação daquele no pagamento à Autora do montante de 4.000 euros por danos não patrimoniais e a sua condenação no pagamento de uma quantia “correspondente aos honorários do advogado …. a apurar em execução de sentença, com o limite decorrente dos valores fixados nas tabelas de honorários para apoio judiciário.”

A Autora não aceita este julgamento e daí a interposição desta revista.
Desde logo, porque considera que o montante fixado relativo ao ressarcimento dos seus danos não patrimoniais (4.000 euros) era miserabilista e isto porque, atentos os seus padecimentos e o período de tempo em que os mesmos ocorreram, a indemnização não deveria ser inferior a 15.000 euros.
Depois, porque a condenação do Réu no pagamento dos honorários do seu Advogado com base na tabela dos honorários dos advogados oficiosos era errada e injusta uma vez que os honorários destes são os que correspondem ao serviço prestado por profissionais que se encontram numa fase de aprendizagem, o que não era o caso do seu Mandatário. Deste modo, a fixação dos honorários do seu Advogado deveria atender à qualidade do serviço por ele prestado, ao tempo por ele gasto e ao estudo que demandou e não uma tabela que regula a forma de pagamento referente ao apoio judiciário.

Analisemos cada uma das críticas dirigidas ao Acórdão recorrido.

1. O Aresto sob censura manteve o montante da indemnização atribuída à Recorrente no Tribunal de 1.ª Instância pelos danos não patrimoniais - 4.000 euros - com base na seguinte argumentação:
“ …. Além disso, provou-se, em concreto, que durante o lapso de tempo de 4 anos que decorreu entre a sua intervenção no processo (após atingir a maioridade) e a prolação da sentença, a Autora sentiu incerteza na planificação das decisões a tomar, não podendo prever a data em que o processo terminaria; que a Autora não pôde organizar-se; e que o desenrolar do processo causou à A. ansiedade, angústia, incerteza, preocupações e aborrecimentos, sentindo tensão, infelicidade e sentimentos de frustração.
…..
Do exposto resulta que está verificado um dano moral in re ipsa correspondente à lesão do direito da autora a uma decisão em prazo razoável, que, contudo, só pode reportar-se ao período de tempo de 4 anos que decorreu entre a sua intervenção no processo (após atingir a maioridade) e a prolação da sentença. …...
Para além do dano moral comum ou notório decorrente da violação do direito à decisão judicial em prazo razoável, provaram-se danos morais concretos que excedem aquele. Na verdade, embora não atinjam gravidade máxima, também não se reconduzem a meros incómodos ou transtornos os sentimentos de angústia, incerteza, tensão, infelicidade e frustração experienciados pela Autora face à demora do processo. Além disso, importa não esquecer a “intensidade emocional agravada” inerente a um processo em que estava em causa a regulação do seu poder paternal e a fixação de alimentos a prestar por seu pai, o que só veio a acontecer 4 anos depois de a Autora ter intervindo no processo, quando já era maior, o que determinou a inutilidade superveniente da regulação do poder paternal e a fixação de alimentos a título meramente retroactivo para o período da menoridade.
Assim, considerando que está em causa um processo cuja média temporal de decisão será de dois anos e sete meses e que se prolongou num total de 11 anos; considerando especificamente o período de 4 anos que decorreu entre a intervenção da autora, após ter atingido a maioridade e a prolação da sentença; considerando a natureza do processo em causa e os interesses em jogo; considerando os danos morais concretamente sofridos pela Autora, não totalmente subsumíveis ao dano comum ou notório decorrente da violação do direito a decisão em prazo razoável; à luz dos critérios jurisprudenciais acima referidos e dos legalmente definidos nos artigos 494.º e 496.º/4 do Código Civil, entende-se adequado o montante de €4.000,00 fixado na sentença recorrida, para a indemnização dos danos não patrimoniais sofridos pela Autora.”




E no tocante à condenação em honorários o Acórdão recorrido ponderou o seguinte:
A orientação seguida na decisão recorrida não é isolada, sendo acompanhada por diversas decisões dos tribunais judiciais, onde se conclui que os honorários do advogado não constituem um prejuízo patrimonial que integre a obrigação de indemnizar do lesante (Acórdão do TRC, 26.10.2004, P. 2073/04); e que só nos casos especiais previstos na lei é que pode atribuir-se indemnização autónoma, à parte vencedora, a título de honorários a pagar ao seu advogado judicial, sendo esses casos os de litigância de má fé e de inexigibilidade da obrigação no momento da propositura da acção (Acórdão do TRLx, de 20.03.2012, P. 43/2001.L1-7 que cita, no mesmo sentido os Acórdãos do STJ de 15.03.2007 e de 15.06.1993). Ainda neste sentido, veja-se o Acórdão do STJ, de 02.07.2009, P. 5262/05.4TVLSB.S1.
Em sentido diverso, contudo, tem-se pronunciado maioritariamente a jurisprudência administrativa, de que são exemplo os Acórdãos do STA de 09.06.1999, P. 043994; de 06.06.2002, P. 24779A (Pleno); de 20.06.2012, P. 0266/11; e de 12.10.2012, P. 00064/10.9BELSB; os Acórdãos do TCAN, de 27.05.2009, P. 01399/06.0BEBEG e de 05.07.2012, P. 02767/06.3BEPRT; e os Acórdãos do TCAS, de 22.11.2012, P. 03399/08; e de 08.05.2014, P. 08642/12. Destes arestos extrai-se o entendimento de que os honorários do advogado constituem dano indemnizável no domínio do contencioso em que o mandato judicial seja obrigatório. E neles se salienta, em sentido divergente ao da decisão recorrida, que a possibilidade de recebimento pelo vencedor de uma quantia a título de procuradoria, em vez de excludente por raciocínio a contrario, deve antes ser considerada como uma indemnização a forfait com a qual o interessado poderá, ou não contentar-se nos casos em que, por comodismo ou por outra razão qualquer, não peticiona o montante das despesas efectivas superiores.
Pelos fundamentos que constam da jurisprudência citada não pode manter-se a decisão recorrida nesta parte, porquanto, contrariamente ao aí decidido, deve entender-se que os honorários do advogado constituem, neste contexto, dano indemnizável.
…. Por outro lado, dos factos provados nada consta a respeito de quaisquer despesas que a Autora possa ter incorrido com honorários de advogado.
Assim, embora se possa considerar provado que a Autora incorreu (ou vai incorrer) em despesas com advogado, uma vez que é obrigatório o patrocínio na presente acção e a autora encontra-se efectivamente patrocinada, nada se sabe sobre as concretas despesas incorridas pela Autora com os ditos honorários.
Por outro lado, como resulta da jurisprudência citada, os honorários de advogado são dano indemnizável em “valor adequado e necessário para afastar a lesão” ou seja “desde que adequadas e necessárias para eliminar da ordem jurídica a actuação ilícita da Administração(cfr. designadamente, o Acórdão do STA de 20.06.2012, P. 0266/11)
Ora, isto coloca outro problema que é o de saber qual o limite de adequação e necessidade dos honorários do advogado, quando é sabido que os mesmos são livremente fixáveis pelo profissional liberal e, em regra, apenas deontologicamente sindicáveis. Em nosso entender, ….. essa adequação e necessidade determina que o valor do dano requerido a título de honorários deve ater-se ao montante que o legislador fixou como o justo e adequado ao pagamento do patrono nomeado ou escolhido, isto é, aos valores que forem os fixados nas tabelas de honorários para apoio judiciário e não a qualquer outro, que possa ser livremente fixado pelos profissionais do foro e apenas deontologicamente parametrizado.
No caso em apreço, não havendo elementos concretos para apurar o quantum despendido em honorários do advogado, deverá essa quantificação ser relegada para execução de sentença, com o limite referido.

Não vem, assim, posta em causa neste recurso a responsabilidade do Estado pelo ressarcimento dos danos morais sofridos pela Autora em resultado do processo de regulação paternal que lhe dizia respeito não ter sido decidido em prazo razoável nem a condenação do Réu no pagamento dos honorários devidos ao Mandatária da Autora, visto as únicas questões suscitadas no recurso serem a de saber se o Acórdão ajuizou correctamente quando manteve em 4.000 euros a indemnização que havia sido fixada no TAF por aqueles danos e se decidiu bem quando condenou o Réu a pagar à Autora os honorários do seu Advogado com base no padrão próprio do apoio judiciário.
Vejamos, pois.

2. A jurisprudência deste Supremo tem dito, repetidamente, que, provada a existência de uma conduta ilícita e culposa traduzida na ofensa ao direito do interessado a uma decisão em prazo razoável, o lesado tem direito a ser indemnizado pelos danos patrimoniais e não patrimoniais que essa conduta lhe provocou à luz do regime da responsabilidade civil estabelecido no DL n.º 48.051 (em vigor à data dos factos, agora da Lei 67/2007, de 31/12) e nos art.ºs 483.º, 484.º, 494.º, 496.º, 562.º e segs. do C. Civil.
De acordo com esse regime, e no que toca aos danos não patrimoniais, o citado art.º 496.º do CC estabelece que na fixação da indemnização devida pelos mesmos só podem ser atendidos os que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito (n.º 1), sendo que o respectivo montante é fixado equitativamente pelo Tribunal tendo em conta as circunstâncias referidas no artigo 494.º, isto é, o grau de culpabilidade do agente, a situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias do caso (n.º 3).
O que significa que uma dor insignificante, uma simples maçada ou incómodo, inerentes às vicissitudes normais da vida em sociedade não constituem danos com gravidade suficiente para merecerem a tutela do direito, em sede de atribuição de indemnização por danos não patrimoniais. Sendo, por isso, insuficiente para qualificar os danos como merecedores de tutela jurídica para efeitos do art. 496.º/1 do C. Civil situações em que se mostre alegado e provado sem mais que determinado sujeito sofreu "desgaste", ou "ansiedade", ou “angústia”, ou “preocupações”, ou “aborrecimentos” em consequência da conduta ilícita e culposa, porquanto para o preenchimento do conceito de gravidade exigido por este normativo, não basta uma mera alegação conclusiva e abstracta de realidades como as referidas. Necessário é que tais realidades se mostrem objectivamente concretizadas, que a sua amplitude, intensidade e duração se revele descrita e demonstrada, por forma a que o julgador possa levar a cabo a tarefa em foi investido pelo legislador face ao disposto no art. 496.º, n.º 1 do C. Civil. Cabendo ao Tribunal, em cada caso, dizer se o dano é ou não merecedor de tutela jurídica. – Vd., entre outros, os Acórdãos deste Supremo de 31/05/2005 (rec. n.º 0127/03) e de 28/11/2007 (rec. 308/07).

Por ser assim só serão danos não patrimoniais merecedores de ressarcimento aqueles que se traduzam em sofrimento psico-somático perturbador do ânimo da vítima por forma a retirar-lhe, ou a diminuir-lhe seriamente, a capacidade de organizar e decidir a sua vida e não as pequenas contrariedades, aborrecimentos ou dores que fazem parte do dia a dia do cidadão comum. Sendo que essa gravidade se deve aferir por um padrão, tanto quanto possível, objectivo que parta da valorização rigorosa das circunstâncias do caso concreto e não de factores subjectivos susceptíveis de introduzir injustiça nessa valorização. – vd. P. de Lima e A. Varela in “Código Civil Anotado”, vol. I, 4.ª edição, nota 1, pág. 499, e, entre outros, Acs. do STA 31/05/2005 (rec. 0127/03) e de 29/06/2005 (rec. 0395/05).

Nesta conformidade, e tendo o Acórdão recorrido já decidido que, muito embora os danos morais sofridos pela Autora não atingiam a gravidade máxima, certo era que eles não se reconduziam a meros incómodos ou transtornos visto lhe terem provocado sentimentos de angústia, incerteza, tensão, infelicidade e frustração por estar em causa um processo onde se regulava o seu poder paternal e que, por isso, os mesmos mereciam a tutela do direito resta, apenas, quantificá-los em termos económicos para saber se o Acórdão ajuizou correctamente quando manteve a decisão do TAF que os valorizou em 4.000 euros.

Nessa ponderação deve começar por referir-se que o período temporal que importa considerar são os 4 anos que medeiam entre a intervenção da Autora, após ter atingido a maioridade, no processo onde se regulava o poder paternal que lhe dizia respeito e a prolação da respectiva sentença e não os 11 anos que esse processo demorou a ser decidido. Depois, deve ser tido em atenção que no referido lapso de tempo a Autora já tinha atingido a maioridade e, portanto, tinha a maturidade suficiente para ter uma perspectiva mais informada e mais compreensiva sobre as vicissitudes que determinaram a demora do seu processo de regulação do poder paternal, maxime o comportamento do seu Pai. Finalmente, haverá que atender que a demora do processo dependeu, e em muito, do aparente desinteresse manifestado pelo seu Pai na resolução do processo e na definição do poder paternal da Autora e que o Tribunal desenvolveu todos os esforços para que aquele pudesse vir ao processo.
Ora, muito embora seja certo que, atenta incerteza e as vicissitudes desse processo, a Autora não pôde prever a data em que o mesmo terminaria e que tal lhe causou incerteza na planificação das decisões a tomar, ansiedade, angústia, preocupações, aborrecimentos, tensão, infelicidade e, além disso, sentimentos de tristeza e frustração por ter de se sustentar sem a colaboração do seu pai (vd. pontos 71 a 77 do probatório), também o é que a mesma pôde conhecer das razões da demora da decisão o que lhe possibilitou uma melhor compreensão dos problemas havidos o que, certamente, contribuiu para que os sentimentos de ansiedade, angústia, incerteza, infelicidade, tristeza e frustração que sentiu não fossem muito mais intensos e dolorosos.
Por todas essas razões entendemos que não merece censura o valor de 4.000 euros que as instâncias lhe atribuíram para ressarcir tais danos.
Daí que, nesta parte, o recurso não mereça provimento.

3. A Recorrente insurge-se, também, contra o Acórdão quando este considerou que a fixação dos honorários ao patrono da Autora deveria ter como padrão os valores fixados nas tabelas de honorários para apoio judiciário, uma vez que tal era ofensivo, insultuoso, degradante e humilhante na medida em que um advogado oficioso é aprendiz, basta escrever umas coisas para receber, não é exigente, é inexperiente, situação bem diferente da do seu Mandatário.
E há que reconhecer que neste ponto a Recorrente tem razão.
Com efeito, e muito embora seja certo que, por um lado, os honorários do advogado são, em boa medida, livremente fixados pelo profissional liberal e, por outro, que não existem nos autos elementos concretos para apurar o quantum que a Autora irá despender com os honorários do seu Mandatário, também o é que essa quantificação não deverá ficar, desde já, cerceada por padrões que, neste momento, não é possível dizer se são os mais justos.
Daí que essa quantificação deva ser relegada para ser liquidada de acordo com previsto no art.º 358.º/2 do CPC. Só que, ao invés do que se decidiu no Acórdão recorrido, não cumpre, agora, fixar um limite ou um padrão para o apuramento do montante devido por o mesmo dever ser livremente apurado naquele incidente, impondo-se, por isso, conceder total liberdade ao Tribunal que irá proceder a essa liquidação.
DECISÃO
Termos em que os Juízes que compõem este Tribunal acordam em conceder parcial provimento ao recurso e, em consequência, revogar o Acórdão recorrido no tocante à limitação nele imposta na fixação dos honorários do Mandatário da Autora por os mesmos deverem ser fixados de acordo com o que livremente se apurar no incidente referido no art.º 358.º/2 do CPC.
Custas por Recorrente e Recorrido de acordo com o seu decaimento.

Lisboa, 14 de Abril de 2016. – Alberto Acácio de Sá Costa Reis (relator) – António Bento São Pedro – José Augusto Araújo Veloso.