Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01447/17
Data do Acordão:01/31/2018
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ANA PAULA LOBO
Descritores:IMPOSTO MUNICIPAL SOBRE IMÓVEIS
PRÉDIO URBANO
PARQUE EÓLICO
Sumário:I - Para efeitos de Imposto Municipal sobre Imóveis, estaremos perante a realidade jurídica “prédio” quando se mostrem simultaneamente existentes os três elementos: físico, jurídico e económico constantes do art. 2º do CIMI.
II - O elemento económico traduz-se na necessidade de a fracção de território em causa possuir, por si só, valor económico, distinto do valor das coisas (dos materiais que o compõem), o que não acontece com cada aerogerador integrante de um parque eólico.
Nº Convencional:JSTA000P22869
Nº do Documento:SA22018013101447
Data de Entrada:12/14/2017
Recorrente:FAZENDA PÚBLICA
Recorrido 1:PE... - PARQUE EÓLICO DE ....., LDA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Recurso Jurisdicional
Decisão recorrida – Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé
. de 7 de Fevereiro de 2017


Julgou procedente a impugnação judicial e anulou o ato de fixação do valor patrimonial tributário do prédio em causa.
Acordam nesta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

A Representante da Fazenda Pública veio interpor o presente recurso da sentença supra mencionada, proferida no processo de impugnação n.º 524/15.5BELLE deduzida por PE….-PARQUE EÓLICO DE…….., S.A., contra o ato de fixação do valor patrimonial do prédio inscrito na matriz sob o artigo P1750, que constitui um aerogerador, praticado pelo Chefe de Finanças de Vila do Bispo, no valor de €459.740, tendo, para esse efeito formulado, a final da sua alegação, as seguintes conclusões:
1. A douta sentença recorrida afastou-se dos critérios de que se serve a disposição do art.º 2.º do CIMI.
2. O aerogerador configura uma construção incorporada ou assente numa fracção de território, preenchendo assim o requisito físico.
3. Faz parte do património da entidade exploradora, ou seja, da impugnante, preenchendo deste modo o requisito jurídico.
4. Tem uma individualidade económica, uma função e valor próprio no comércio jurídico-privado.
5. Ou seja, o aerogerador independentemente de estar integrado num parque eólico com vista à produção de energia eléctrica, tem uma individualidade económica, uma função e valor próprio no comércio jurídico-privado.
6. Quer dizer, ao contrário do decidido, reveste os traços característicos da espécie legal.

Requereu a revogação da sentença recorrida.

A entidade recorrida/impugnante, em suporte da decisão recorrida apresentou contra-alegações que encerram com as seguintes conclusões:

DO OBJECTO DAS PRESENTES ALEGAÇÕES
A. Discorda a Recorrida em absoluto da posição perfilhada pela Recorrente, por entender que (i) a torre eólica em presença não é um prédio na acepção do artigo 2.º do CIMI; ainda que o fosse (no que não se concede), (ii) sempre seria um prédio urbano do tipo «industrial» nos termos do artigo 6.º, n.ºs 1, alínea b), e 2, do CIMI; (iii) avaliável de acordo com o método geral previsto no artigo 38.º do CIMI, e, por último, que (iv) o acto tributário impugnado padece do vício de falta de fundamentação na acepção dos artigos 268.º, n.º 3, da CRP, 77.º e 84.º, n.º 3, da LGT;

B. Perante o exposto, delimita-se o objecto das presentes alegações à análise das seguintes questões: (i) subsunção da torre eólica em presença no conceito de prédio previsto no artigo 2.º do CIMI; (ii) espécie de prédio em questão e método de avaliação aplicável, atento o regime ínsito nos artigos 6.º, 38.º e 46.º do CIMI e (iii) carência de fundamentação do acto tributário impugnado, atento o regime ínsito nos artigos 268.º, n.º 3, da CRP, 77.º e 84.º, n.º 3, da LGT.

DA PRETENSA SUBSUNÇÃO DA TORRE EÓLICA EM REFERÊNCIA NO CONCEITO DE PRÉDIO PREVISTO NO ARTIGO 2.º DO CIMI

C. A Recorrente entende ser a torre eólica sub judice um prédio na acepção do artigo 2.º do CIMI, sem que daí resulte qualquer violação das normas constitucionais oportunamente invocadas pela Recorrida – isto é, os artigos 103.º, n.º 2, 165.º, n.º 1, alínea i), e 112.º da CRP;

D. Discorda a Recorrida da posição adoptada pela Recorrente, na medida em que claudicam os elementos atinentes à natureza física e económica ínsitos no conceito de prédio previsto no artigo 2.º do CIMI, sendo certo que uma interpretação conforme à Lei fundamental – in casu, aos princípios constitucionais plasmados nos artigos 103.º, n.º 2, 165.º, n.º 1, alínea i), e 112.º da CRP – pressupõe necessariamente a não aplicação deste preceito legal à realidade em presença;

E. No que especificamente respeita ao elemento atinente à natureza física, entende a Recorrida que o mesmo não se encontra preenchido uma vez que os aerogeradores de parques eólicos constituem conjuntos integrados de componentes – equipamentos – necessários à produção de energia eléctrica, não possuindo a sapata de betão e a estrutura tubular metálica autonomia funcional intrínseca;

F. No que especificamente respeita ao elemento atinente à natureza económica, não possuindo a sapata de betão e a estrutura tubular metálica autonomia funcional relativamente aos demais componentes integrantes do aerogerador, também não a possui, pelos mesmos motivos e maioria de razão, a nível económico, claudicando, em consequência, o preenchimento do requisito em apreço conforme já foi aliás expressamente decidido pela jurisprudência dos tribunais superiores, inclusivamente por esse Douto Tribunal ad quem;

G. Deste modo, afigura-se notório que os aerogeradores são partes componentes de um parque eólico assim como a estrutura tubular e a sapata de betão – realidades tributadas na acepção do artigo 2.º do CIMI, de acordo com o entendimento da Administração Tributária – são partes componentes de um aerogerador, não estando quaisquer destes componentes por si só – isto é, se individualmente considerados – aptos à produção de energia eólica;

H. Tudo ponderado, conclui-se não serem os aerogeradores de parques eólicos prédios na acepção do artigo 2.º do CIMI;

I. Em consequência, inversamente à posição assumida pela Recorrente em sede de alegações, mantêm plena razão de ser os argumentos esgrimidos nos artigos 26.º a 58.º da petição inicial;

J. Nestes termos, requer-se a esse Douto Tribunal ad quem que pugne pela manutenção do sentido decisório sufragado pelo Douto Tribunal a quo;

K. Subsidiariamente, no cenário desse Douto Tribunal ad quem discordar do entendimento supra, pugnando pela anulação do sentido decisório sufragado pelo Douto Tribunal a quo, requer-se que diligencie pela apreciação das questões cujo conhecimento ficou prejudicado pelo sentido decisório propalado na sentença recorrida, nos termos do artigo 636.º, n.º 1, do CPC, as quais infra se enunciam.

DO ERRÓNEO ENQUADRAMENTO DA TORRE EÓLICA NO CONCEITO DE PRÉDIO URBANO DA ESPÉCIE «OUTROS» PREVISTO NO ARTIGO 6.º, N.ºs 1, ALÍNEA D), E 4, DO CIMI

L. A Administração Tributária entende subsumir-se o aerogerador visado no conceito de prédio urbano da espécie «outros» na acepção do artigo 6.º, n.ºs 1, alínea d), e 4, do CIMI;

M. Discorda a Recorrida da posição adoptada pela Administração Tributária, na medida em que desenvolve a sua actividade no sector da indústria energética, possuindo, nesse contexto e para esse efeito, licença de exploração emitida pela Direcção-Geral de Energia e Geologia, motivo pelo qual a torre eólica em presença não pode deixar de constituir um prédio urbano enquadrável na espécie «industrial» na acepção do artigo 6.º, n.ºs 1, alínea b), e 2, do CIMI;

N. Por outras palavras, tendo a Recorrida licença para desenvolver uma actividade industrial – e, ainda que assim não se considerasse, tendo a exploração de um parque eólico como destino normal tal fim –, a torre eólica em presença sempre teria de ser enquadrada no conceito de prédio urbano da espécie «industrial» na acepção do artigo 6.º, n.ºs 1, alínea b), e 2, do CIMI;

O. Perante o exposto, entende a Recorrida não merecer acolhimento a posição sufragada pela Administração Tributária quanto ao enquadramento do alegado prédio urbano na espécie «outros» na acepção do artigo 6.º, n.ºs 1, alínea d), e 4, do CIMI, enquadrando-se o mesmo indubitavelmente na espécie «industrial» prevista no artigo 6.º, n.ºs 1, alínea b), e 2, do CIMI;

P. Nestes termos, requer-se a esse Douto Tribunal ad quem que negue provimento ao presente recurso, considerando enfermar o acto tributário em crise de ilegalidade – geradora de anulabilidade nos termos do então 135.º do CPA – com fundamento na incorrecta aplicação do regime ínsito no artigo 6.º, n.ºs 1, alínea d), e 4, do CIMI, tudo com as demais consequências legais.

DA ERRÓNEA APLICAÇÃO DO MÉTODO DE AVALIAÇÃO PREVISTO NO ARTIGO 46.º, N.º 2, DO CIMI

Q. A Administração Tributária entende ser aplicável ao aerogerador em referência o método de avaliação previsto no artigo 46.º, n.º 2, do CIMI por tal alegado prédio urbano ser enquadrável na espécie «outros» na acepção do artigo 6.º, n.ºs 1, alínea d), e 4, do CIMI;

R. Discorda a Recorrida da posição adoptada pela Administração Tributária, por considerar que, sendo o alegado prédio urbano enquadrável na espécie «industrial», a sua avaliação deveria ter sido realizada nos termos do artigo 38.º do CIMI, não sendo aplicável o regime do artigo 46.º, n.º 2, do CIMI;

S. Não obstante, mesmo que o alegado prédio fosse enquadrável na espécie «outros», a sua avaliação deveria, de igual modo, ter tido lugar nos termos do artigo 38.º do CIMI;

T. Com efeito, entende a Recorrida retirar-se da letra da lei o carácter supletivo do método de avaliação previsto no artigo 46.º, n.º 2, do CIMI e, por conseguinte, a circunstância do mesmo só ser aplicável «no caso de não ser possível utilizar as regras do artigo 38.º [do CIMI]», o que efectivamente não sucede no caso em análise, conforme indubitavelmente resulta das simulações apresentadas pela Recorrida na petição inicial;

U. Nestes termos, requer-se a esse Douto Tribunal ad quem que negue provimento ao presente recurso, considerando enfermar o acto tributário em crise de ilegalidade – geradora de anulabilidade nos termos do então artigo 135.º do CPA – com fundamento na incorrecta aplicação do regime ínsito no 46.º, n.º 2, do CIMI, tudo com as demais consequências legais;

V. Subsidiariamente, no cenário desse Douto Tribunal ad quem discordar do entendimento supra, a Recorrida pretende ver apreciada por esse Douto Tribunal ad quem a questão relativa à falta de fundamentação de que padece o acto tributário de segunda avaliação.

DA FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO DO ACTO IMPUGNADO

W. A Administração Tributária entende estar o acto de segunda avaliação devidamente fundamentado, revelando o iter cognoscitivo que levou ao apuramento do valor patrimonial tributário do aerogerador em referência;

X. Discorda a Recorrida da posição adoptada pela Administração Tributária, na medida em que a avaliação notificada omite os motivos na origem da aplicação do método de avaliação residual do artigo 46.º, n.º 2, do CIMI, não tendo também sido facultados os documentos que estiveram na base da determinação das diversas parcelas que concorreram para o apuramento do valor patrimonial tributário;

Y. Resulta assim evidente não se encontrar a Recorrida em condições de aferir da fidedignidade dos valores apresentados nem da bondade da sua aplicação, impendendo o respectivo ónus probatório sobre a Administração Tributária nos termos do artigo 74.º, n.º 1, da LGT;

Z. Conclui-se, portanto, padecer o acto tributário de segunda avaliação do vício de falta de fundamentação por omitir o itinerário cognoscitivo e valorativo na origem da sua prática – isto é, as razões conducentes à aplicação do método de avaliação previsto no artigo 46.º, n.º 2, do CIMI e, bem assim, os documentos que concorreram para o apuramento dos valores avançados ao abrigo desse regime;

AA. Nestes termos, requer-se a esse Douto Tribunal ad quem que negue provimento ao presente recurso, considerando enfermar o acto tributário em crise de ilegalidade – geradora de anulabilidade nos termos do então artigo 135.º do CPA – por preterição do regime ínsito nos artigos 268.º, n.º 3, da CRP, 77.º e 84.º, n.º 3, da LGT, tudo com as demais consequências legais.

DA DISPENSA DO PAGAMENTO DO REMANESCENTE DA TAXA DE JUSTIÇA

BB. Sendo o valor da causa superior a EUR 275.000,00, requer-se a esse Douto Tribunal ad quem que sejam as partes dispensadas do pagamento do remanescente da taxa de justiça devida na presente instância, nos termos do artigo 6.º, n.º 7, do RCP, ponderadas que possam ser a natureza e a complexidade da causa e, bem assim, o comportamento processual adoptado pelas partes.

Requereu que seja negado provimento ao recurso, requerendo que sejam apreciadas as questões cujo conhecimento ficou prejudicado, caso dissinta da posição perfilhada pelo Douto Tribunal a quo no âmbito da sentença recorrida, nos termos do artigo 636.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, e a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, nos termos do artigo 6.º, n.º 7, do RCP.


Foi emitido parecer pelo Magistrado do Ministério Público no sentido da improcedência do recurso e confirmação da sentença recorrida.



A sentença considerou provados os seguintes factos:
A) A Impugnante é titular e proprietária de parque eólico sito na freguesia de Vila do Bispo e Raposeira, no concelho de Vila do Bispo, composto por seis aerogeradores da marca Vestas, modelo V90 que compõem o parque eólico de ……. (cfr. fls. 83, 84 e 97 dos autos);

B) Em 21/03/2012 foi enviado à Impugnante, ofício a informar da atribuição de licença de exploração do parque eólico de ……… (cfr. fls. 83 dos autos);

C) A energia produzida é escoada para a rede pública até ao limite de 10 kVA (cfr. fls. 83 dos autos);
D) Cada aerogerador é composto por uma sapata de betão (fundação) com 216m2; uma estrutura metálica tubular (Torre) constituída por seis pisos (com elevador), com 13, 80m2 (junto à base) e 4,20m2 (junto à nacelle), uma nacelle, um rotor e três pás (cfr. fls. 79 e 81 dos autos);

E) O aerogerador em causa, foi inscrito oficiosamente pela Administração Tributária no tipo "outros" com o artigo P 1705 (cfr. fls. 86 e 97 dos autos);

F) Foi feita avaliação ao prédio referido na alínea anterior e fixado valor tributário de €536.910 determinado segundo a aplicação da fórmula: valor patrimonial = (área total do terreno x preço m2) + (área bruta de construção x custo m2) (cfr. fls. 86 e 87 dos autos);

G) Em 07/01/2014 foi a Impugnante notificada do resultado da 1ª avaliação ao prédio descrito na alínea E) (cfr. fls. 86 dos autos);

H) Em 06/02/2014, a Impugnante solicitou 2ª avaliação ao prédio descrito na alínea E) (cfr. fls. 88 a 94 dos autos);

I) Em 27/06/2017 foi feita 2ª avaliação ao prédio descrito na alínea E) e mantido o VPT de €536.910 (cfr. fls. 95 a 98 dos autos);

J) A Impugnante foi notificada do resultado da 2ª avaliação mediante ofício de 30/06/2014 (cfr. fls. 95 dos autos);

K) Em 24/09/2014 a Impugnante apresentou Impugnação Judicial que correu termos na 2ª Unidade Orgânica deste tribunal sob o processo nº 741/14.8BELLE e que findou com sentença proferida em 16/02/2015, que determinou a inutilidade superveniente da lide por revogação do ato, oficiosamente, pela Administração Tributária, por falta de fundamentação (cfr. fls. 100 a 114);

L) Em 10/04/2015 feita nova segunda avaliação ao prédio descrito na alínea E) e fixado o VPT de €459.740 (cfr. fls. 118 a 127 dos autos)

M) Em 13/04/2015 a Impugnante foi notificada da avaliação referida na alínea anterior (cfr. fls. 116 dos autos).


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Questões objecto de recurso:
1- do erro de julgamento por não subsunção do aerogerador em referência no conceito de prédio previsto no artigo 2.º do CIMI;

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1- do erro de julgamento por não subsunção do aerogerador em referência no conceito de prédio previsto no artigo 2.º do CIMI

A principal questão suscitada nestes autos é o erro de julgamento na aplicação do direito por errada subsunção do direito aos factos dirigido a definir se e em que medida o aerogerador/torre eólica modelo E-82 deve ser considerado prédio nos termos do artigo 2.º do Código do IMI.
A mesma questão relativa à susceptibilidade de cada aerogerador, como pretende a recorrente, integrar o conceito de prédio para efeito de tributação em sede de IMI foi já apreciada em 15-03-2017, no acórdão deste Supremo Tribunal Administrativo proferido no processo 0140/15, em que interviemos como adjunta, no sentido que merece o nosso inteiro assentimento, sem que neste processo se vislumbrem argumentos diversos, ali não consideramos, e, que de algum modo nos possam fazer divergir do entendimento ali expresso, que, por isso, aqui reafirmamos inteiramente e, passamos a citar:
«(…) o conceito fiscal de “prédio”, para efeitos de incidência do IMI, afasta-se da noção civilística contida no art.º 204º do Código Civil, corporizando um conceito mais amplo, «porquanto prevê a existência de um elemento de natureza física (o território, o qual deve ser autónomo e ter um carácter de permanência); um elemento de natureza jurídica (resultante da necessidade do prédio fazer parte do património de uma pessoa física ou jurídica) e um elemento de natureza económica (traduzido na exigência de possuir um valor económico em circunstâncias normais), sendo «que só com a confluência dos três elementos podemos qualificar determinada realidade como prédio para efeitos de enquadramento em sede de IMI».
Entendimento que se mostra correto, na medida em que o art.º 2º do CIMI define o conceito de prédio do seguinte modo:
«1 - Para efeitos do presente Código, prédio é toda a fracção de território, abrangendo as águas, plantações, edifícios e construções de qualquer natureza nela incorporados ou assentes, com carácter de permanência, desde que faça parte do património de uma pessoa singular ou colectiva e, em circunstâncias normais, tenha valor económico, bem como as águas, plantações, edifícios ou construções, nas circunstâncias anteriores, dotados de autonomia económica em relação ao terreno onde se encontrem implantados, embora situados numa fracção de território que constitua parte integrante de um património diverso ou não tenha natureza patrimonial.
2 - Os edifícios ou construções, ainda que móveis por natureza, são havidos como tendo carácter de permanência quando afectos a fins não transitórios.
3 - Presume-se o carácter de permanência quando os edifícios ou construções estiverem assentes no mesmo local por um período superior a um ano.».
Temos, assim, que para efeitos deste imposto, “prédio” é toda a fracção de território (elemento físico), abrangendo águas, plantações, edifícios e construções de qualquer natureza nela incorporados ou assentes com carácter de permanência, que faça parte do património de pessoa singular ou coletiva (elemento jurídico) e que em circunstâncias normais tenha valor económico (elemento económico).
Posto isto, e vista a importância vital do elemento de natureza económica, traduzido na necessidade de a fracção de território em causa possuir, por si só, valor económico para poder ser qualificado como “prédio” para efeitos de incidência objectiva de IMI, a problemática reside, desde logo, em saber se, à luz desta norma, um “parque eólico” pode ser classificado como “prédio” nos temos e para os efeitos da inscrição na matriz predial e consequente avaliação e tributação neste imposto municipal sobre o património imobiliário.
O que passa, necessariamente, por saber o que é um parque eólico.
Da leitura de obras técnicas da especialidade (Cfr., entre outras, a dissertação de mestrado de YESMARY CAROLINA DA SILVA GOUVEIA, no Instituto Superior de Engenharia de Lisboa - Área Departamental de Engenharia Civil, intitulado “Construção de um Parque Eólico Industrial” e bibliografia aí citada.) decorre, de forma clara, que o objetivo final de um parque eólico consiste no aproveitamento da velocidade do vento para a produção de energia elétrica, sendo que, para que tal aconteça, é necessário que o parque seja constituído por alguns elementos essenciais, nomeadamente por um conjunto de aerogeradores que são interligados por cabos de média tensão e cabos de comunicação ligados a uma subestação e a um edifício de comando, que se liga a uma (habitualmente aérea) rede elétrica de transporte.
Deste modo, um parque eólico é constituído por um conjunto obrigatório e interligado de bens, equipamentos e infraestruturas – aerogeradores (Cada um composto por uma sapata de betão ou “fundação”, uma estrutura metálica ou “torre”, uma nacelle, um rotor, e três pás.), postos de transformação, edifícios de comando e de subestação, rede elétrica de cabos subterrâneos com ligação entre os aerogeradores e o edifício de comando/subestação e, no caso de existência de várias subestações, linhas elétricas de ligação destas, bem como caminhos de acesso - tudo com vista a converter a energia cinética do vento em energia elétrica e a injectá-la no sistema eléctrico de potência, sendo que os grandes parques eólicos exigem a construção de várias subestações e de linhas de transmissão para a conexão ao sistema elétrico de potência, sendo esta injeção ou conexão ao sistema elétrico um dos principais parâmetros de um parque eólico.
Em suma, um parque eólico é uma fracção de território (terrestre ou marítimo) organizado e estruturado com variados e interligados elementos constituintes e partes componentes – onde se destacam os aerogeradores conectados em paralelo (no mínimo cinco), um ou mais edifícios onde se localizam a(s) subestação(ões) e o centro de operação e manutenção – com ligação ao solo e com carácter de permanência, sendo todo esse conjunto de bens e equipamentos imprescindível à atividade económica em questão: atividade de transformação da energia eólica em energia elétrica, sua injeção no sistema elétrico de potência e consequente venda desta eletricidade à rede elétrica de acordo com a tarifa regulada em Portugal para o sector eólico em geral.
O que significa que cada um desses elementos constituintes e partes componentes de um parque eólico não pode, de per si, ser considerado um prédio urbano (“outros”), na medida em que não constitui uma parte economicamente independente, isto é, não tem aptidão suficiente para, por si só, desenvolver a aludida atividade económica (A mesma razão leva a que não possam ser considerados como “prédios” (nem a AT ousa considerá-los como tal) os diversos elementos e estruturas que integram um estádio de futebol (as balizas, as bancadas, a estrutura coberta, os balneários, etc.) ou que integram um campo de golfe (o green, o tee, o fairway, os obstáculos, o edifício de atendimento, etc.), já que cada um dessas estruturas e elementos, que se encontram interligados e conexionados com vista ao mesmo objetivo e finalidade económica, não possuem autonomia económica em relação à fração de território ocupada, pese embora seja incontroverso que tanto o estádio de futebol como o campo de golfe constituem, à luz do mencionado preceito do CIMI, prédios urbanos para efeitos de incidência objetiva de IMI.)
Por conseguinte, e em suma, caracterizando-se como elementos ad integrandum domum, sem autonomia económica relativamente ao todo de que fazem parte, fica afastada a possibilidade de classificar como “prédios” autónomos cada um dos diversos elementos constituintes e partes componentes de um parque eólico, não só porque o seu destino normal não é diferente de todo o prédio, como, também, porque não é possível avaliá-los separadamente, na medida em que não são partes economicamente independentes.
(…).
Pelo que à míngua do terceiro pressuposto, não se pode concluir que um aerogerador pertencente a um parque eólico destinado à injecção de energia eléctrica na rede pública seja um prédio para efeitos de I.M.I., uma vez que o requisito da existência, em circunstâncias normais, do valor económico, não se verifica em relação a cada um dos aerogeradores ou de qualquer outro elemento que compõe o parque eólico (porque individualmente nenhum deles é, por si só, em circunstâncias normais, idóneo para produzir e injectar a energia na rede pública), mas apenas em relação a este (o parque eólico), na sua unidade, atenta a sua finalidade.».
Assiste, pois, razão à impugnante, ora recorrente, quando advoga que os elementos constitutivos de um parque eólico (os aerogeradores, os elementos de ligação, a estação de comando e a subestação) não se subsumem à figura de “prédio” de acordo com a definição constante no CIMI, atenta a falta de valor económico próprio.»
Contrariamente ao entendimento da Administração Tributária de que cada aerogerador (torre eólica) deve ser considerado como realidade distinta e que, mesmo que assim não se entenda, o desiderato da idoneidade para produção e injecção da energia na rede pública é insuficiente, por si só, para afirmar que um aerogerador não tem qualquer valor económico próprio, a falência do referido valor económico de cada aerogerador para produzir a energia eólica faz com que ele não possa ter mais que o valor dos materiais que o compõem e se reduza a uma mera coisa, insusceptível de tributação em sede de IMI.
Inexistindo a referida falta de autonomia económica, não é aceitável a inscrição desta realidade física na matriz predial como um prédio urbano, o que determina, por ilegal, a anulação da decisão de indeferimento da reclamação da matriz.
Fica, pois, prejudicado o conhecimento das demais questões suscitadas neste recurso.
A sentença recorrida fez uma adequada interpretação dos dispositivos legais aplicáveis à situação sub judice não incorrendo no erro de julgamento que lhe vinha apontado, a determinar a sua confirmação.

Dispensa de remanescente:
Tendo em conta que a principal questão jurídica em apreço nestes autos foi já amplamente debatida noutros processos, o que permite a decisão por mera remissão, ao abrigo do disposto no art.º 26.º e 6.º, n.º 7 do RCP releva a especial e concreta simplicidade da questão, no momento actual, pelo que se dispensam as partes de pagamento do remanescente.




Deliberação
Termos em que acordam os Juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em negar provimento ao recurso, e confirmar a decisão recorrida.
Custas pela recorrente.
(Processado e revisto pela relatora com recurso a meios informáticos (art.º 131º nº 5 do Código de Processo Civil, ex vi artº 2º Código de Procedimento e Processo Tributário).

Lisboa, 31 de Janeiro de 2018. – Ana Paula Lobo (relatora) – António Pimpão – Ascensão Lopes.