Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0719/11
Data do Acordão:11/02/2011
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ANTÓNIO CALHAU
Descritores:IRC
AMORTIZAÇÃO DO ACTIVO IMOBILIZADO
IMÓVEL
BENFEITORIAS
DESVALORIZAÇÃO EXCEPCIONAL
Sumário:O abate em imobilizado, decorrente da dedução como custo de benfeitorias efectuadas em imóvel arrendado, em montante superior ao que resultaria das quotas do artigo 4.º do DR 2/90, de 12 de Janeiro, por não renovação do contrato, deve ser considerado como desvalorização excepcional para efeitos do artigo 10.º deste DR, e, como tal, dependente de prévia aceitação por parte da DGCI, o que não tendo acontecido determina a sua não aceitação como custo.
Nº Convencional:JSTA00067225
Nº do Documento:SA2201111020719
Data de Entrada:07/15/2011
Recorrente:FAZENDA PÚBLICA
Recorrido 1:A..., LDA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TT1INST LISBOA PER SALTUM
Decisão:PROVIDO
Área Temática 1:DIR FISC - IRC
Legislação Nacional:DRGU 2/90 DE 1990/01/12 ART10 ART4
CIRC01 ART23 N1 G ART28 N1 ART29 ART30 ART32 N1 C
Aditamento:
Texto Integral: Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
I – A Representante da Fazenda Pública, não se conformando com a decisão do Mmo. Juiz do Tribunal Tributário de Lisboa que julgou procedente a impugnação judicial deduzida por A…, com sede em Lisboa, contra a liquidação adicional de IRC/95, dela vem interpor recurso para este Tribunal, formulando as seguintes conclusões:
I- Visa o presente recurso reagir contra a douta sentença que julgou procedente a impugnação deduzida pela firma A…, NIF …, que teve por objecto a liquidação adicional n.º 1998 8310016130, atinente ao IRC do exercício de 1995, emitida na sequência de acção inspectiva, sendo o montante impugnado de 13 797 529$00 (€ 68 821,78);
II- No caso “sub judice” está em discussão saber se o abate em imobilizado decorrente da dedução de benfeitorias realizadas em instalações arrendadas pela impugnante (que reverteram para o senhorio), em virtude do terminus do contrato, é considerado uma desvalorização excepcional para efeitos do art.º 10.º do Decreto Regulamentar n.º 2/90, de 12 de Janeiro, o que determina que esteja sujeito a prévia aceitação por parte da DGCI, ou se, pelo contrário, não preenche aquele conceito, sendo, assim, considerado como custo decorrente de uma normal amortização;
III- Ora, de acordo com o art.º 23.º, n.º 1, al. g) e art.º 28.º, n.º 1, ambos do CIRC, com redacção à data dos factos, e art.º 1.º do Decreto Regulamentar n.º 2/90, as reintegrações e amortizações de elementos do activo imobilizado sujeitos a deperecimento são consideradas como custos ou perdas do exercício desde que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou para a manutenção da fonte produtora;
IV- O cálculo das referidas amortizações segue, por via de regra, o método das quotas constantes, podendo seguir outros (quotas degressivas, duodécimos), de harmonia com os art.ºs 29.º e 30.º, ambos do CIRC, com a redacção à data dos factos, e art.ºs 4.º a 9.º do Decreto Regulamentar n.º 2/90, tendo em conta o período de vida útil máximo e mínimo fixado para cada bem, sendo que as reintegrações e amortizações que excedam os limites estabelecidos naqueles artigos não são aceites com custo, tal como decorre do art.º 32.º, n.º 1, al. c) do CIRC, com a redacção à data dos factos;
V- Porém, determina o art.º 10.º, n.º 1 deste Decreto Regulamentar que no caso de se verificar nos elementos do activo imobilizado desvalorizações excepcionais originadas por causas anormais devidamente comprovadas poderá ser aceite como custo ou perda do exercício em que ocorra numa quota de amortização superior à que resulta da aplicação dos métodos referidos no art.º 4.º do mesmo diploma;
VI- De harmonia com o n.º 2 desta norma: “O regime estabelecido no número anterior aplica-se, designadamente, às desvalorizações excepcionais provocadas por desastres, fenómenos naturais e inovações técnicas excepcionalmente rápidas”, o que significa que estamos perante uma enumeração de casos meramente exemplificativa.
VII- Na situação em epígrafe, a impugnante realizou várias benfeitorias no imóvel arrendado, umas destinadas à manutenção deste local, outras destinadas à adaptação do espaço às suas necessidades, sendo que, tal como resulta do Contrato de Arrendamento, findo este contrato não teria direito a qualquer indemnização pela realização das mesmas nem poderia proceder ao seu levantamento, considerando a impugnante que não ocorreu qualquer desvalorização excepcional proveniente de causa anormal, tratando-se de uma perda decorrente da perda das benfeitorias que reverteram para o senhorio sem qualquer compensação, pelo que o valor desta perda corresponde ao valor do custo não amortizado;
VIII- Não estando em causa que as benfeitorias reverteram para o senhorio, em cumprimento do Contrato de Arrendamento, é de notar que esta perda advém da não renovação deste contrato, o que originou a dedução de um custo ou perda por parte da impugnante em montante superior ao que resultaria de uma amortização efectuada segundo os métodos previstos no art.º 4.º do Decreto Regulamentar n.º 290, pois se a duração do contrato de oito anos tivesse sido prevista a amortização do valor das benfeitorias teria sido feita tendo em conta este período de tempo, consoante o método mais adequado, o que não aconteceu;
IX- Desta forma, estamos perante uma causa anormal e imprevista, o que determinou uma amortização em montante superior ao que resultaria da normal e regular amortização decorrente da aplicação dos métodos referidos no art.º 4.º do Decreto Regulamentar;
X- Ao que acresce que algumas das benfeitorias se traduziram na instalação de materiais ou equipamentos susceptíveis de se desvalorizarem em virtude de inovações técnicas ocorridas;
XI- Deste modo, sendo esta situação considerada como desvalorização excepcional, a sua dedução como custo em montante superior ao que resultaria da quota de amortização decorrente da aplicação dos métodos referidos no art.º 4.º do Decreto Regulamentar está sujeita a aceitação prévia por parte da DGCI, pelo que deveria a contribuinte ter elaborado uma exposição devidamente fundamentada, como decorre do n.º 3 do art.º 10.º do referido Decreto Regulamentar;
XII- É de referir que também é esta a posição adoptada pelo Digno Magistrado do Ministério Público junto deste Tribunal, veiculada no Parecer n.º 172/02, de 15/04/2002, de fls. 39-vs a 41 dos autos;
XIII- Pelo que deve a douta sentença ser revogada e substituída por outra que considere que a liquidação adicional de IRC do exercício de 1995 não sofre de vício de violação de lei por erro nos pressupostos, já que o abate em imobilizado, decorrente da dedução das citadas benfeitorias em instalações arrendadas, em virtude do terminus do contrato, implicando uma dedução como custo em montante superior ao que resultaria da quota de amortização decorrente da aplicação dos métodos referidos no art.º 4.º do Decreto Regulamentar, é considerado uma desvalorização excepcional para efeitos do art.º 10.º deste Decreto, o que determina que esteja sujeita a prévia aceitação por parte da DGCI, o que não tendo acontecido determina a soma do respectivo valor ao resultado fiscal declarado;
XIV- A manter-se na ordem jurídica, a douta sentença ora recorrida revela uma inadequada interpretação e aplicação do art.º 10.º, n.ºs 1 e 2 do Decreto Regulamentar n.º 2/90, de 12 de Janeiro, e bem assim dos art.ºs 23.º, n.º 1, al. g), 28.º, n.º 1, e 32.º, n.º 1, al. c) do CIRC, com a redacção à data dos factos.
Não foram apresentadas contra-alegações.
O Exmo. Magistrado do MP junto deste Tribunal, tendo vista, não emitiu qualquer parecer.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
II – Mostra-se fixada a seguinte matéria de facto:
1. Na sequência de um procedimento de análise interna levada a efeito pela Administração Tributária com referência ao exercício de 1995, foram corrigidos custos contabilizados pela impugnante, nomeadamente, com abates em imobilizado;
2. Do Mapa de Apuramento Mod. DC - 22, a fls. 18, consta a seguinte fundamentação:
«Linha 21 – Esc. 26.468.779
O sujeito passivo considerou como custo abates em imobilizado de Esc. 26.468.779.
Informou que se trata de benfeitorias e obras efectuadas em edifícios alheios.
A desvalorização excepcional foi provocada porque a empresa não renovou o contrato de arrendamento.
Nos termos do art.º 10.º do Decreto Regulamentar 2/90 e prazos aí referidos, o sujeito passivo deveria através de exposição devidamente fundamentada ter obtido a aceitação desta perda.
Não tendo procedido de acordo com o art.º 10.º do citado diploma, o valor de Esc. 26.468.779 irá ser acrescido ao resultado fiscal declarado pela empresa»;
3. As correcções levadas a efeito, nomeadamente a indicada, originaram a liquidação adicional de IRC n.º 8310016130, de 15/10/1998, na importância de 14.200.815$00, com data limite de pagamento em 07/12/1998 (documento de cobrança, a fls. 4);
4. A impugnação deu entrada na Repartição de Finanças em 10/12/1998, conforme carimbo por ela aposto na petição inicial, a fls. 2.
III – Vem o presente recurso interposto da decisão do Mmo. Juiz do TT de Lisboa que julgou procedente a impugnação judicial deduzida pela ora recorrida contra a liquidação adicional de IRC, referente ao exercício de 1995, efectuada na sequência de acção inspectiva, em resultado de ter sido acrescido ao resultado fiscal declarado o custo considerado pela impugnante como abates em imobilizado relativo a benfeitorias e obras efectuadas em edifício alheio arrendado e cujo contrato de arrendamento não foi renovado.
Para não considerar tal custo contabilizado como abates em imobilizado entendeu a AT que a impugnante não procedera de acordo com o previsto no artigo 10.º do Decreto Regulamentar n.º 2/90 relativo a desvalorizações excepcionais de elementos do activo imobilizado.
Contrapõe a impugnante que tal perda não resultou de qualquer desvalorização excepcional mas apenas de benfeitorias pertencentes ao senhorio que, por razões contratuais, no termo do contrato de arrendamento se perderam, sem direito a compensação.
Para o Mmo. Juiz “a quo” a correcção da perda contabilizada como abates em imobilizado no pressuposto de que a mesma se reconduz a uma desvalorização excepcional cuja aceitação não foi oportunamente requerida à AT está inquinada de vício de violação de lei, por erro nos pressupostos, uma vez que não se trata aqui de qualquer desvalorização excepcional tal como previsto no artigo 10.º do DR 2/90, de 12 de Janeiro, razão por que a liquidação de IRC resultante de tal correcção deve ser anulada.
Já para a recorrente FP o abate em imobilizado decorrente da dedução das citadas benfeitorias realizadas em instalações arrendadas, em virtude do contrato de arrendamento ter terminado, implicando uma dedução como custo em montante superior ao que resultaria da quota de amortização decorrente da aplicação dos métodos referidos no artigo 4.º do DR 2/90, é uma desvalorização excepcional para efeitos do artigo 10.º deste DR, o que determina que esteja sujeita a prévia aceitação por parte da DGCI, o que não tendo acontecido determina a soma do respectivo valor ao resultado fiscal declarado.
Vejamos. O que está aqui em causa é, pois, como refere a recorrente nas suas alegações, saber se o abate em imobilizado decorrente da dedução de benfeitorias realizadas em instalações arrendadas pela impugnante (que reverteram para o senhorio), em virtude do terminus do contrato, é considerado uma desvalorização excepcional para efeitos do art.º 10.º do Decreto Regulamentar n.º 2/90, de 12 de Janeiro, o que determina que esteja sujeito a prévia aceitação por parte da DGCI, ou se, pelo contrário, não preenche aquele conceito, sendo, assim, considerado como custo decorrente de uma normal amortização.
Ora, de acordo com o artigo 23.º, n.º 1, alínea g), e artigo 28.º, n.º 1, ambos do CIRC, na redacção à data dos factos, as reintegrações e amortizações de elementos do activo imobilizado sujeitos a deperecimento são consideradas como custos ou perdas do exercício desde que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou para a manutenção da fonte produtora.
O cálculo das referidas amortizações segue, por via de regra, o método das quotas constantes, de harmonia com os artigos 29.º e 30.º, ambos do CIRC, na redacção à data dos factos, e artigos 4.º a 9.º do DR 2/90, tendo em conta o período de vida útil máximo e mínimo fixado para cada bem.
Sendo certo que as reintegrações e amortizações que excedam os limites estabelecidos naqueles artigos não são aceites como custos, como decorre do artigo 32.º, n.º 1, alínea c) do CIRC, na redacção à data dos factos.
Porém, como salienta a recorrente FP, no caso de se verificarem nos elementos do activo imobilizado desvalorizações excepcionais originadas por causas anómalas devidamente comprovadas, poderá ser aceite, nos termos do n.º 1 do artigo 10.º do DR 2/90, como custo ou perda do exercício em que ocorra numa quota de amortização superior à que resulta da aplicação dos métodos referidos no artigo 4.º do mesmo diploma, desde que sujeita a aceitação prévia por parte da DGCI.
É certo que o n.º 2 do artigo 10.º do DR 2/90 refere que o regime estabelecido no número anterior se aplica, designadamente, às desvalorizações excepcionais provocadas por desastres, fenómenos naturais e inovações técnicas excepcionalmente rápidas, mas tal enumeração de casos, face à redacção do preceito, é meramente exemplificativa.
No caso em apreço, a impugnante, ora recorrida, realizou várias benfeitorias em imóvel arrendado, as quais reverteram para o senhorio na sequência da não renovação do respectivo contrato de arrendamento, o que originou a dedução de um custo ou perda por parte daquela em montante superior ao que resultaria de uma amortização efectuada segundo os métodos previstos no artigo 4.º do DR 2/90, tanto mais que se a duração do contrato tivesse sido prevista a amortização do valor das benfeitorias teria sido feita tendo em conta esse período de tempo, consoante o método mais adequado, o que não sucedeu.
Daí que, nesta situação, estejamos, por isso, perante uma desvalorização excepcional proveniente de uma causa anormal devidamente comprovada.
E, nessa medida, a sua dedução como custo em montante superior ao que resultaria da quota de amortização decorrente da aplicação dos métodos referidos no artigo 4.º do DR 2/90, estaria sujeita a aceitação prévia por parte da DGCI, como decorre do n.º 3 do artigo 10.º do referido DR, o que, no caso, não ocorreu.
Razão por que, não tendo a impugnante requerido a sua prévia aceitação à DGCI, aquela amortização não podia ser aceite como custo, determinando, em consequência, o seu acréscimo ao resultado fiscal declarado.
A decisão recorrida que, assim, não entendeu, não pode, por isso, manter-se.
IV – Termos em que, face ao exposto, acordam os Juízes da Secção de Contencioso Tributário em conceder provimento ao recurso, revogando-se a decisão recorrida, e julgar improcedente a impugnação judicial deduzida.
Custas pela recorrida, apenas em 1.ª instância, uma vez que não contra-alegou neste STA.
Lisboa, 2 de Novembro de 2011. – António Calhau (relator) – Casimiro Gonçalves – Francisco Rothes.