Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:021/19.0BALSB
Data do Acordão:10/23/2019
Tribunal:PLENO DA SECÇÃO DO CT
Relator:ARAGÃO SEIA
Descritores:UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA
JUROS INDEMNIZATÓRIOS
PEDIDO DE REVISÃO
Sumário:Pedida pelo sujeito passivo a revisão oficiosa do acto de liquidação (cfr. art. 78.º, n.º 1, da LGT) e vindo o acto a ser anulado, mesmo que em impugnação judicial do indeferimento daquela revisão, os juros indemnizatórios são devidos depois de decorrido um ano após a apresentação daquele pedido, e não desde a data do pagamento da quantia liquidada [cfr. art. 43.º, n.ºs 1 e 3, alínea c), da LGT].
Nº Convencional:JSTA000P25059
Nº do Documento:SAP20191023021/19
Data de Entrada:02/19/2019
Recorrente:AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Recorrido 1:A........., SA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam no Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:



A……., S.A., na qualidade de sociedade gestora e em representação do ……..-………., e do - ……….., apresentou pedido de constituição do tribunal arbitral no âmbito do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD), com vista à:
- Apreciação da legalidade dos pedidos de revisão oficiosa apresentados com vista à anulação dos atos tributários de liquidação de Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis (IMT) bem como, dos atos tributários de liquidação de IMT;
- Restituição do IMT pago em excesso, no montante de €1.309.577,99, acrescido de juros indemnizatórios à taxa legal, desde a data do pagamento do imposto até à data do seu integral reembolso.
A Requerente juntou 54 (cinquenta e quatro) documentos, não tendo requerido a produção de quaisquer outros meios de prova.
Foi requerida a AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA.
Na decisão arbitral, proferida no processo n.º 276/2018, decidiu-se:
a) Julgar procedente o pedido arbitral formulado e, em consequência, declarar a ilegalidade dos indeferimentos tácitos dos pedidos de revisão apresentados pela Requerente, anulando-se os atos de liquidação de IMT, identificados no pedido arbitral.
b) Condenar a AT a restituir à Requerente o montante de imposto pago, acrescido dos respetivos juros indemnizatórios.
c) Condenar a Requerida nas custas do processo.

Inconformada, a AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA apresentou recurso para Uniformização de Jurisprudência do acórdão proferido, ao abrigo do disposto no n.º 2 do artigo 25.º do RJAT, artigo 152.º n.º 1 do CPTA por o mesmo se encontrar em oposição, quanto à mesma questão fundamental de direito, com o acórdão datado de 28 de Janeiro de 2015, proferido no processo n.º 722/14 pelo STA.

Alegou, tendo concluído como se segue:
A. Autoridade Tributária e Aduaneira vem, nos termos do artigo 152.° do Código de Processo nos Tribunais Administrativos aplicável por força do artigo 25.°, n.° 2, do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (RJAT), interpor recurso para esse Supremo Tribunal do Acórdão Arbitral proferido em 08.01.2019, no processo n.° 276/2018-T, por estar em contradição com o Acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Administrativo em 28/01/2015, processo n.° 0722/14, que se indica como fundamento, designadamente, no segmento decisório respeitante à condenação da AT no pagamento de juros indemnizatórios desde a data do pagamento indevido do imposto até à data do processamento da respectiva nota de crédito, mais precisamente, o dies a quo a partir do qual devem ser contabilizados os juros indemnizatórios.
B. O Acórdão Arbitral recorrido colide frontalmente com a jurisprudência firmada pelo Supremo Tribunal Administrativo no Acórdão proferido em 28/01/2015, processo n.° 0722/14, que se indica como fundamento, relativamente ao termo inicial de contagem dos juros indemnizatórios, no caso de revisão oficiosa do acto tributário por iniciativa do contribuinte.
C. O Acórdão Arbitral recorrido incorreu em erro de julgamento ao enquadrar o pedido de pagamento de juros indemnizatórios no n.° 1, do art. 43.° da LGT, contrariando a Jurisprudência reiterada do STA, de que se cita, por todos, o Acórdão proferido em de 23.05.2018, pelo Pleno STA no Processo n.° 01201/17 quanto ao termo inicial dos juros indemnizatórios de revisão oficiosa do acto tributário por iniciativa do contribuinte, com o entendimento vertido no respectivo Sumário : “O artigo 43.°, n.°3, c) da LGT consagra um regime especial, quanto aos juros indemnizatórios, aplicável apenas em situações de revisão do ato tributário em que os mesmos são devidos decorrido um ano após o pedido de revisão.”
D. Laborando neste erro, decidiu o Tribunal Arbitral, em contradição total com o Acórdão fundamento, condenar a AT a pagar à Requerente arbitral juros indemnizatórios nos termos do n.°1, do art. 43.° da LGT, ou seja, contados desde a data do pagamento até à emissão da nota de crédito, quando o n.° 3, alínea c), do ad. 43.° da LGT determina que nas situações, como a dos autos, de revisão do acto tributário por iniciativa do contribuinte são devidos juros indemnizatórios apenas a partir de um ano após a apresentação do pedido de revisão.
E. No Acórdão fundamento estava em causa “a extensão temporal dos juros indemnizatórios devidos em caso de revisão do acto tributário por iniciativa do contribuinte (art. 43.° n.° 3 al. c) LGT)”, tendo esse douto STA decidido que “A decisão recorrida atribuiu a indemnização a partir da ocorrência do evento danoso, sendo que face às normas de direito tributário vigente tal indemnização não tem assento legal, pelo menos sob a égide do processo de impugnação da decisão de indeferimento do pedido de revisão oficiosa do acto de liquidação” e, “Pelo exposto, se declara que os juros indemnizatórios a que as impugnantes têm direito neste processo são apenas devidos a partir de um ano após o pedido de revisão por elas formulado ou seja, a partir de 24/11/2008”.
F. O Acórdão Arbitral recorrido, ao enquadrar o pagamento de juros indemnizatórios no n.° 1, do art. 43.° da LGT, colide com a Jurisprudência que maioritariamente reiterada pelo STA, de que se cita, por todos, o Acórdão proferido em de 23.05.2018, pelo Pleno STA no Processo n.° 01201/17 quanto ao termo inicial dos juros indemnizatórios de revisão oficiosa do acto tributário por iniciativa do contribuinte, cujo entendimento está assim sintetizado no respectivo Sumário “O artigo 43.°, n.°3, c) da LGT consagra um regime especial, quanto aos juros indemnizatórios, aplicável apenas em situações de revisão do ato tributário em que os mesmos são devidos decorrido um ano após o pedido de revisão.”
G. Demonstrada está, assim, uma evidente contradição entre o Acórdão recorrido e o Acórdão fundamento sobre a mesma questão fundamental de direito que se prende com o pagamento de juros indemnizatórios nas situações de revisão do acto tributário por iniciativa do contribuinte, que importa dirimir, mediante a admissão do presente recurso e consequente anulação do segmento decisório contestado, com substituição do mesmo por novo Acórdão que determine a improcedência do pedido de condenação da AT no pagamento de juros indemnizatórios, nos termos do n.°6, do art. 152.° do CPTA.
H. A infracção a que se refere o n.° 2, do artigo 152.° do CPTA, traduz-se num manifesto erro de julgamento expresso na decisão recorrida, na medida em que o Acórdão Arbitral viola o disposto no n.° 3, al c), do art. 43.° da LGT, o qual determina que nas situações de revisão do acto tributário por iniciativa do contribuinte são devidos juros indemnizatórios apenas a partir de um ano após a apresentação do pedido de revisão.
I. Ora, o pedido de revisão oficiosa cujo indeferimento tácito constitui o objecto da acção arbitral foi apresentado no dia 09.11.2017, pelo que, só em 09.11.2018, terá decorrido um ano daquela data, para efeitos do disposto no n.° 3, al c) do art.° 43.° da LGT.
J. Como tem sido entendido pela Jurisprudência e Doutrina, o regime estabelecido no art.° 152.° do CPTA para os recursos para uniformização da jurisprudência destinam-se a obter decisão que fixe a orientação jurisprudencial nos casos em que se verifiquem os seguintes pressupostos: i) existência de decisões contraditórias entre acórdãos do STA ou deste e do TCA ou entre acórdãos do TCA; ii) contraditoriedade decisória “sobre a mesma questão fundamental de direito”; iii) verificação do trânsito em julgado, quer do acórdão recorrido, quer do acórdão fundamento, devendo o recurso se mostrar interposto no prazo de 30 dias contado do trânsito do acórdão recorrido; iv) não conformidade da orientação perfilhada no acórdão impugnado com a jurisprudência mais recentemente consolidada do STA; v) a oposição deverá decorrer de decisões expressas, não bastando a pronúncia implícita ou a mera consideração colateral, tecida no âmbito da apreciação de questão distinta.
K. No presente caso, estão preenchidos todos os requisitos de admissibilidade impostos pelo artigo 152.° do CPTA, designadamente os que são enunciados no Acórdão do Pleno do STA de 21.04.2016, proferido no processo n.°0698/15, quanto à contradição da mesma questão fundamental de direito, que pressupõe “identidade essencial quanto à matéria litigiosa”, conforme o Acórdão do S.T.J. de 02.02.2017, proferido no proc. 4902/14.9T2SNT.LI.SI-A.
L. Está em causa a aplicação de forma diversa dos mesmos preceitos legais em situações fácticas substancialmente idênticas, não se entendendo estas como total identidade dos factos mas apenas a sua subsunção às mesmas normas legais, na linha do entendimento de Jorge Lopes de Sousa (CPPT anotado, p.809), e o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, proferido no recurso n.°87156, de 26.04.1995.
M. Decorre, de todo o exposto, que o Acórdão recorrido, ao não ter subsumido o caso sub judice à al c), do n.°3 do ad. 43.° da LGT, evidencia manifesta contradição quanto à mesma questão fundamental de direito com a jurisprudência firmada pelo STA no Acórdão fundamento, devendo ser substituído por novo Acórdão que determine o pagamento dos juros indemnizatórios decorrido um ano após o pedido de revisão, ou seja desde 09.11.2018.
Termos em que deve o presente Recurso para Uniformização de Jurisprudência ser admitido por se mostrar verificada contradição entre o Acórdão Arbitral proferido no proc. N.° 276/2018-T e o Acórdão fundamento, proferido pelo STA no proc. N.° 0722/14, de 28.01.2015, devendo, em consequência, o mesmo ser julgado procedente e, nos termos e com os fundamentos acima indicados, ser revogado o Acórdão Arbitral no segmento decisório sob recurso, e substituído por Acórdão consentâneo com o quadro legal vigente.

Não foram produzidas contra-alegações.

O Ministério Público notificado, pronunciou-se no sentido da não admissão do recurso por não ter sido proferida decisão expressa sobre a questão colocada pela recorrente, e caso se entenda dever ser conhecido o recurso, a decisão arbitral deve ser revogada na parte em que decidiu que os juros indemnizatórios são devidos desde a data do pagamento do imposto indevido, pois entende que os juros só são devidos a partir de um ano após a apresentação de revisão oficiosa do acto tributário.

Colhidos os vistos legais cumpre decidir.

Na decisão recorrida deu-se como assente a seguinte factualidade concreta:
a)……….. - ………., NIPC……….., e o ……….. - ………., NIPC………., representados pela Requerente, configuram fundos imobiliários abertos, constituídos ao abrigo do Decreto-Lei n.º 316/93, de 21 de setembro, sendo a respetiva atividade regulada pelo Regime Geral dos Organismos de Investimento Coletivo (RGOIC), aprovado pela Lei n.º 16/2015, de 24 de fevereiro.
b) Os objetivos de investimento destes Fundos, nos termos do respetivo Regulamento de Gestão, assentam essencialmente na aquisição de bens imóveis, tendo em vista a subsequente venda ou arrendamento.
c) A Requerente, na qualidade de sociedade gestora e em representação dos Fundos representados, adquire múltiplos imóveis, os quais se destinam a integrar o património daqueles.
d) Os Fundos representados pela Requerente adquiriram, por escritura pública de compra e venda, os imóveis que melhor se discriminam abaixo:




e) No âmbito da aquisição dos imóveis acima identificados, foram emitidos os correspondentes atos tributários de liquidação de IMT, conforme detalhado abaixo:

f) As liquidações de IMT acima descritas foram pagas.
g) A Requerente apresentou, em 9 de novembro de 2017, pedidos de revisão oficiosa dos atos de liquidação de IMT efetuados com base nas declarações Modelo 1 referentes à aquisição dos prédios urbanos identificados acima.
h) Presumindo o indeferimento tácito dos pedidos de revisão oficiosa apresentados, a Requerente apresentou, em 6 de junho de 2018, o presente pedido arbitral.
i) Até à data da apresentação do presente pedido arbitral, a Requerente não tinha sido notificada de qualquer decisão relativa aos aludidos pedidos de revisão oficiosa.
Nada mais se deu como provado.

Dá-se também aqui por reproduzida a matéria de facto vertida no acórdão fundamento e que pode ser consultado em dgsi.pt.

O presente recurso vem interposto, ao abrigo do art.º 25.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (regime da arbitragem Tributária), da decisão arbitral proferida pelo Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD), no âmbito do processo nº 276/2018-T, a qual, como anteriormente se viu, considerou procedente o pedido formulado pelos aqui recorridos.
Invoca a Administração Tributária que tal decisão arbitral está em alegada oposição com a doutrina do acórdão da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo de 28/01/2015, proferido no âmbito do processo n.º0722/14.
Neste Supremo Tribunal o Ministério Público sustenta que não se verifica a totalidade dos requisitos do recurso para uniformização de jurisprudência previsto no art.º 152.º do CPTA.

Assim, e face ao circunstancialismo fáctico-jurídico supra descrito cumpre apreciar, antes de mais, se se verificam os requisitos do recurso por oposição quanto à mesma questão fundamental de direito previsto pelo art.º 25.º, n.º 2 do RJAT (Regime Jurídico da Arbitragem Tributária, DL n.º 10/2011, de 20/1)
De harmonia com o disposto no n.º 2 do art. 25.º do RJAT (DL n.º 10/2011, de 20/1) a decisão arbitral sobre o mérito da pretensão deduzida que ponha termo ao processo arbitral é susceptível de recurso para o Supremo Tribunal Administrativo quando esteja em oposição, quanto à mesma questão fundamental de direito, com acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo ou pelo Supremo Tribunal Administrativo.
A este recurso é aplicável, com as necessárias adaptações, o regime do recurso para uniformização de jurisprudência regulado no artigo 152.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, contando-se o prazo para o recurso a partir da notificação da decisão arbitral. (cfr. o n.º 3 do mesmo art. 25.º)
O único requisito explicitamente referido para a admissibilidade do recurso para uniformização de jurisprudência (152.º do CPTA) é a existência de contradição entre a decisão arbitral recorrida e o acórdão fundamento sobre a mesma questão fundamental de direito.
Na ausência de qualquer expresso tratamento legislativo neste âmbito serão de assim de manter os critérios jurisprudenciais já firmados no domínio da LPTA e do ETAF quer relativamente à caracterização da questão fundamental sobre a qual deverá existir contradição, quer quanto à verificação das oposições de julgados.
Os acórdãos consideram-se proferidos no domínio da mesma legislação sempre que, durante o intervalo da sua publicação, não tenha sido introduzida qualquer alteração legislativa substancial que interfira, directa ou indirectamente, na resolução da questão de direito controvertida.
No que concerne à existência da oposição, exige-se que a mesma norma jurídica tenha sido interpretada e aplicada diversamente numa idêntica situação de facto, não podendo ser considerada quando relativamente a um dos acórdãos em oposição vier a ser detectada uma divergência sobre a factualidade apurada que puder ser determinante para a aplicação de um diferente regime jurídico.
A oposição deverá decorrer de expressa resolução da questão de direito suscitada, não sendo atendível a oposição implícita dos julgados, o que implica que tenha havido julgamento contraditório sobre questões que tenham sido colocadas à apreciação do tribunal e sobre as quais este carecia de emitir pronúncia – cf., neste sentido, Carlos Alberto Fernandes Cadilha, Dicionário de Contencioso Administrativo, Ed. Almedina, pags. 608/609, e, entre muitos outros, acórdãos do Pleno da Secção de Contencioso Tributário de 05.05.1992, in AP.DR de 29.11.1994, pag. 426, de 18.02.1998, recurso 28637, de 26.09.2007, recurso 452/07, de 21.05.2008, recurso 460/07, de 13.11.2013, recurso 594/12, de 26.03.2014, recurso 865/13, de 07.05.2014, recurso 60/14, de 25.02.2015, recurso 964/14, e de 18.03.2015, recurso 525/14, todos in www.dgsi.pt.
Note-se, em todo o caso, que, conforme determina o n.° 3 do artigo 152.°, “o recurso não é admitido se a orientação perfilhada na decisão impugnada estiver de acordo com a jurisprudência mais recentemente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo”.

Sabemos que em ambas as situações analisadas, quer na decisão recorrida, quer no acórdão fundamento, se tratou da anulação de liquidação de imposto subsequente a pedido expresso de revisão oficiosa, cfr. al. g) do probatório da decisão recorrida e al. e) do probatório do acórdão fundamento, sendo que em ambas as situações os respectivos impostos, oportunamente liquidados, foram pagos pelos contribuintes.
A recorrente entende que foi dada uma resposta antagónica pelo tribunal arbitral e por este Supremo Tribunal relativamente à questão de saber qual o momento a partir do qual são devidos os juros indemnizatórios ao contribuinte nas situações em que a correcção ou anulação da liquidação do imposto surge na sequência do pedido de revisão oficiosa por iniciativa do contribuinte; se será aplicável a norma resultante do artigo 43.º, n.º 1 da LGT ou se será aplicável a norma resultante do artigo 43.º, n.º 3, al c) da mesma LGT.
Por sua vez o Ministério Público considera que na decisão recorrida apenas relevou a questão da condenação no pagamento dos juros indemnizatórios, tal como vinha peticionado, sem atender à subquestão do termo inicial dessa obrigação, e, se chegou a considerar esta última, fê-lo de forma implícita e não expressa, faltando por isso um dos requisitos para a admissão do presente recurso e que é o da existência de pronúncias expressas sobre a mesma questão fundamental de direito.

Vejamos então o que se decidiu na decisão recorrida e com interesse para esta questão.
Nessa decisão identifica-se o pedido formulado pela aqui recorrida nos seguintes termos:
- Apreciação da legalidade dos pedidos de revisão oficiosa apresentados com vista à anulação dos atos tributários de liquidação de Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis (IMT) bem como, dos atos tributários de liquidação de IMT;
- Restituição do IMT pago em excesso, no montante de € 1.309.577,99, acrescido de juros indemnizatórios à taxa legal, desde a data do pagamento do imposto até à data do seu integral reembolso.

Na parte argumentativa e decisória, a propósito dos juros peticionados, escreveu-se:
JUROS INDEMNIZATÓRIOS
Além da restituição do imposto indevidamente pago, pretende a Requerente que seja declarado o direito ao pagamento de juros indemnizatórios.
Tal direito vem consagrado no artigo 43.º da LGT, o qual tem como pressuposto que se apure, em reclamação graciosa ou impugnação judicial – ou em arbitragem tributária – que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida em montante superior ao legalmente devido.
O reconhecimento do direito a juros indemnizatórios no processo arbitral, resulta do disposto no artigo 24.º, n.º 5 do RJAT, quando estipula que “é devido o pagamento de juros, independentemente da sua natureza, nos termos previsto na lei geral tributária e no Código de Procedimento e de Processo Tributário”.
No caso em apreço, ocorreu, de facto, erro imputável à AT na liquidação em crise que, por sua iniciativa, o praticou sem suporte legal.
Pelo que assiste à Requerente o direito ao pretendido pagamento de juros indemnizatórios.
IV. DECISÃO
Termos em que se decide neste Tribunal Arbitral:
a)Julgar procedente o pedido arbitral formulado e, em consequência, declarar a ilegalidade dos indeferimentos tácitos dos pedidos de revisão apresentados pela Requerente, anulando-se os atos de liquidação de IMT, identificados no pedido arbitral.
b)Condenar a AT a restituir à Requerente o montante de imposto pago, acrescido dos respetivos juros indemnizatórios.

Por sua vez, resulta do acórdão fundamento proferido no processo n.º 0722/14, em síntese, tal como se extrai do seu sumário:
I - O art.º 43.º, n.º 1 da Lei Geral Tributária estabelece que são devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido, sem definir o momento a partir do qual são os mesmos devidos.
II - O n.º 3, c) do mesmo preceito consagra que também são devidos juros indemnizatórios, «quando a revisão do acto tributário por iniciativa do contribuinte se efectuar mais de um ano após o pedido deste, salvo se o atraso não for imputável à Administração Tributária».
III - O legislador considera que o prazo de um ano é o prazo razoável para a Administração decidir o pedido de revisão e executar a respectiva decisão, quando favorável ao contribuinte, afastando-se da indemnização total dos danos a partir do momento em que surgiram na esfera patrimonial do contribuinte.

Lida atentamente a decisão recorrida, ressalta à evidência, como bem assinala o Ministério Público, que efectivamente apenas se analisou a questão dos juros devidos ao abrigo do disposto no artigo 43.º da LGT e artigo 24.º, n.º 5 do RJAT, de forma genérica, sem se fazer qualquer referência às várias normas constantes dos diferentes números que compõem o artigo 43.º da LGT.
É certo, porém, que o pedido de juros formulado pela recorrida era o de que os mesmos fossem contados desde a data do pagamento do imposto até à data do seu integral reembolso, sendo certo que a condenação em juros operada pela decisão recorrida, conjugada com a fundamentação de tal condenação, leva a concluir que o tribunal arbitral quis reconhecer à recorrida o direito ao pretendido pagamento de juros indemnizatórios, ou seja, reconheceu-lhe o direito ao recebimento dos juros tal como peticionado, isto é, desde a data do pagamento do imposto até à data do seu integral reembolso.
Nesta medida, e por ter havido decisão condenatória expressa quanto a juros, não se pode excluir existir uma evidente e clara contradição entre a decisão recorrida e o acórdão fundamento.
Verificados, assim, os requisitos necessários para a admissão do recurso, passaremos ao conhecimento da questão que vem colocada.

Efectivamente sobre esta questão a de saber qual o termo inicial do momento determinante para a contagem dos juros indemnizatórios na sequência do pedido de revisão oficiosa já se pronunciou este Supremo Tribunal diversas vezes no sentido pretendido pela recorrente, tanto em acórdãos da secção, como em acórdãos de uniformização do Pleno da secção.
Fê-lo, indicando-se apenas os mais recentes e mais relevantes, no processo n.º 0890/16, em acórdão da secção datado de 18-01-2017, no processo n.º 099/18.3BALSB, em acórdão do Pleno datado de 24-10-2018 e no processo n.º 04/19.0BALSB em acórdão do Pleno datado de 03-07-2019.

No terceiro esclareceu-se de forma exemplar que, pedida pelo sujeito passivo a revisão oficiosa do acto de liquidação (cfr. art. 78.º, n.º 1, da LGT) e vindo o acto a ser anulado, mesmo que em impugnação judicial do indeferimento daquela revisão, os juros indemnizatórios são devidos depois de decorrido um ano após a apresentação daquele pedido, e não desde a data do pagamento da quantia liquidada [cfr. art. 43.º, n.ºs 1 e 3, alínea c), da LGT].

Não tendo decidido nestes termos anteriormente apontados, errou a decisão arbitral recorrida, impondo-se, consequentemente, que não se mantenha na ordem jurídica na parte que vinha impugnada.
Assim, o pedido de juros indemnizatórios apenas deverá abranger os juros que se tenham vencido após 09.11.2018 nos termos do disposto no artigo 43.º, n.º 3, al. c) da LGT, até efectivo e integral pagamento.

Em face do exposto, os juízes do Pleno da Secção do Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo acordam em tomar conhecimento do mérito do recurso e, concedendo-lhe provimento, anular a decisão arbitral no segmento recorrido e declarar que os juros indemnizatórios são devidos apenas a partir de um ano após o pedido de revisão formulado.
Custas pela Recorrida, que não paga taxa de justiça porque não contra-alegou o recurso.
Comunique-se ao CAAD.
D.n.
Lisboa, 23 de Outubro de 2019. – Jorge Miguel Barroso de Aragão Seia (relator) – José Manuel de Carvalho Neves Leitão – José Gomes Correia – Suzana Maria Calvo Loureiro Tavares da Silva – Joaquim Manuel Charneca Condesso – Nuno Filipe Morgado Teixeira Bastos – Aníbal Augusto Ruivo Ferraz – Paulo José Rodrigues Antunes – Isabel Cristina Mota Marques da Silva – Francisco António Pedrosa de Areal Rothes.