Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0557/13.6BEVIS 01347/17
Data do Acordão:07/01/2020
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:JOSÉ GOMES CORREIA
Descritores:OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO FISCAL
ILEGITIMIDADE
REVERSÃO
Sumário:I – Ainda que, em regra, a oposição tenha como finalidade a extinção, total ou parcial, da execução fiscal, logra também apontar outros fins que se mostrem apropriados à sua função de contestação à pretensão executiva, designadamente a suspensão da execução fiscal ou a absolvição da instância executiva.
II - Destarte, devem admitir-se como fundamentos de oposição à execução fiscal os que, independentemente do carácter substantivo ou adjectivo, possam determinar alguma daquelas finalidades, designadamente deve admitir-se a invocação de excepções dilatórias como fundamento subsumível à previsão da alínea i) do n.º 1 do art. 204.º do CPPT.
III – Na circunstância de a oposição ser julgada procedente com fundamento na falta de fundamentação do despacho de reversão, a decisão a proferir pelo tribunal deverá ser de anulação daquele acto e consequente absolvição do oponente da instância executiva por falta de legitimidade processual de modo a não obviar à possibilidade do órgão de execução fiscal proferir um novo acto de reversão, expurgado do vício que determinou a anulação do anterior acto, possibilidade que lhe assiste em virtude do motivo determinante da anulação ser de carácter formal.
IV - Mas como in casu, foi declarada a procedência da pretensão dos revertidos por não se verificar a sua ilegitimidade substantiva, a sentença extraiu a consequência juridicamente estabelecida correcta determinando a extinção da execução quanto aos oponentes pois foi feito um juízo quanto ao mérito da matéria controvertida.
V - No nosso ordenamento jurídico é sobre o recorrente que impende o ónus de alegar e concluir (cfr. artº 635º do CPC), não podendo suscitar questões novas, não enunciadas na petição inicial apresentada no TT1ª Instância, sendo que, notoriamente, não foram arguidas nulidades de conhecimento oficioso nem das elencadas no artº 615º do CPC e o recurso jurisdicional visa a apreciação da legalidade da sentença com fundamento na imputação de nulidades ou de erros de julgamento sobre a matéria de facto e /ou de direito e não a apreciação em 1º grau de jurisdição de questão nova que não tenha sido submetida ao veredicto do Tribunal de 1ª Instância.
VI -Como é pacificamente entendido, os recursos jurisdicionais têm por objecto a apreciação de decisões da mesma natureza proferidas por Tribunais de grau hierárquico inferior, visando a respectiva anulação ou revogação, por vícios de forma ou de fundo. Significa isto que nos recursos jurisdicionais não é possível fazer a apreciação de quaisquer questões que sejam novas, isto é, que não tenham sido colocadas à apreciação do Tribunal “a quo”, salvo quando o seu conhecimento seja imposto por lei.
VII - No caso vertente, o recorrente suscita a referida questão (a tentativa de concretização do “vício” do despacho de reversão gerador de absolvição da instância), posta apenas em sede de recurso; ou seja, tal questão foi suscitada apenas perante o Tribunal «ad quem», já que não foi invocada perante o Tribunal «a quo».
VIII - Infere-se das conclusões alegatórias, pois, que a recorrente pretende a emissão de pronúncia sobre questão nova, o que o mesmo é dizer que a questão suscitada excede o objecto do recurso, implicando a sua apreciação a preterição de um grau de jurisdição. E como a recorrente deixou cair a questão da ilegitimidade substantiva dos revertidos por não serem responsáveis pela dívida exequenda, sobre a qual a sentença transitou em julgado (cfrº artºs. 619º e 580º do CPC), na improcedência do recurso, deve manter-se a sentença recorrida.
Nº Convencional:JSTA000P26138
Nº do Documento:SA2202007010557/13
Data de Entrada:11/29/2017
Recorrente:AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Recorrido 1:A............ E OUTROS
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo

1 – Relatório

Vem interposto recurso jurisdicional pela Fazenda Pública, visando a revogação da sentença de 30-07-2017, do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu, que julgou procedente a oposição à execução fiscal intentada por A………… e outros, melhor identificados nos autos, determinando a extinção do processo de execução fiscal relativo à reversão por dívidas de IVA de 2008 e IRC dos anos de 2008 e 2009 e acrescido legal, cujo montante global é de 974.651,30 €.

Inconformada, nas suas alegações, formulou a recorrente Fazenda Pública as seguintes conclusões:

A) Nos presentes autos foi proferida sentença que julgou procedente a presente oposição procedente e, em consequência, determinou a extinção dos processos de execução fiscal relativamente aos oponentes;
B) Está patente na decisão que: “Por conseguinte, não estando provada a culpa dos oponentes na insuficiência de património da sociedade para satisfação das dívidas exequendas, a decisão a proferir nos autos terá de ser desfavorável à Fazenda Pública nos termos dos artigos 342.º do Código Civil e 74.º da LGT”;
C) Contudo, a Fazenda Pública diverge apenas da sentença recorrida no que toca à consequência jurídica nela extraída pois ao invés da extinção da execução fiscal quanto aos Oponentes, a Fazenda Pública defende a anulação do despacho de reversão e consequente absolvição dos oponentes da instância executiva;
D) É pressuposto da responsabilidade tributária subsidiária, efetivada ao abrigo da alínea a) do n.º 1 do artigo 24.º da LGT, a prova de que foi por culpa sua que o património da pessoa colectiva ou ente fiscalmente equiparado se tornou insuficiente para a sua satisfação;
E) Entende a Fazenda Pública e a sentença recorrida que a FP não cumpriu no despacho de reversão com o ónus da prova que lhe era exigido, fundamentando insuficientemente o despacho de reversão em matéria de facto, o que equivale à falta de fundamentação, à luz do artigo 153.º, n.º 2 do CPA;
F) Não resulta da sentença que tenha sido provada a inexistência de culpa por parte dos oponentes na insuficiência do património da devedora originária, mas tão só que não se encontra tal facto provado pela AT no despacho de reversão, pelo que não se nos afigura que tenha havido aqui uma verdadeira decisão de mérito;
G) Inexistindo uma avaliação de mérito da matéria controvertida que possa motivar a extinção da execução contra os Oponentes, a douta sentença sob recurso devia limitar-se a anular o despacho de reversão por vício de forma, consubstanciado em falta de fundamentação;
H) Visto que, nas situações em que a anulação do ato administrativo é motivada por um mero vício de forma, de conformidade com o artigo 163.º, n.º 1 do CPA, nada obsta a que a AT execute a decisão anulatória praticando um ato de sentido idêntico, mas sem o vício que o afetava, faculdade que a decisão sob recurso inviabiliza;
I) Veja-se a posição assumida pela Jurisprudência do STA, Acórdão de 10-10-2012, proc. nº. 0726/12: “I - Pese embora, em regra, a oposição tenha como finalidade a extinção, total ou parcial, da execução fiscal, pode também visar outros fins que se revelem adequados à sua função de contestação à pretensão executiva, quais sejam a suspensão da execução fiscal ou a absolvição da instância executiva. II - Consequentemente, devem admitir-se como fundamentos de oposição à execução fiscal os que, independentemente do carácter substantivo ou adjectivo, possam determinar alguma daquelas finalidades, designadamente deve admitir-se a invocação de excepções dilatórias como fundamento subsumível à previsão da alínea i) do n.º 1 do art. 204.º do CPPT. III - No caso de a oposição ser julgada procedente com fundamento na falta de fundamentação do despacho de reversão, a decisão a proferir pelo tribunal deverá ser de anulação daquele acto e consequente absolvição do oponente da instância executiva por falta de legitimidade processual e não a extinção da execução quanto ao oponente (pois não foi feito qualquer juízo quanto ao mérito da matéria controvertida), de modo a não obviar à possibilidade do órgão de execução fiscal proferir um novo acto de reversão, expurgado do vício que determinou a anulação do anterior acto, possibilidade que lhe assiste em virtude do motivo determinante da anulação ser de carácter formal.”;
J) A oposição, enquanto contestação, poderá também ter por finalidade a mera absolvição da instância executiva, pelo que anulando-se o despacho de reversão, deixa de haver fundamento legal para que o revertido se mantenha na execução fiscal, configurando-se a ilegitimidade passiva enquanto pressuposto processual, ao abrigo do artigo 30.º, n.º 1 do CPC, que constitui uma exceção dilatória que leva a uma decisão de absolvição da instância, de conformidade com os artigos 278.º, n.º 1, alínea d) e 608.º, n.º 1 do CPC;
K) Impõe o artigo 608.º, n.º 1 do CPC que “Sem prejuízo do disposto no n. 3 do artigo 278.º, a sentença conhece, em primeiro lugar, das questões processuais que possam determinar a absolvição da instância, segundo a ordem imposta pela precedência lógica”;
L) Assim, a douta decisão, julgando a oposição procedente deveria determinar a anulação da decisão que operou a reversão contra os Oponentes, pelo que ao não se decidir assim, a douta sentença recorrida fez uma errada interpretação e aplicação do Direito, violando os artigos 124.º do CPPT, 153.º do CPA e 608.º, n.º 1 do CPC;
M) Face ao que antecede, discordamos do entendimento da Mmª. Juiz “a quo” de que a oposição deve proceder, por provada, extinguindo-se os processos de execução fiscal relativamente aos oponentes.
Termos em que, deve ser dado provimento ao presente recurso, ordenando-se, em consequência, a substituição da douta sentença recorrida, por outra em que, se anule o despacho de reversão por vício formal de falta/insuficiência de fundamentação e consequentemente se absolvam os oponentes da instância executiva, com as legais consequências.

Houve contra-alegações em que os recorridos concluíram da seguinte forma:

1ª) O recurso apresentado pela Recorrente não tem qualquer razão de ser, uma vez que a douta sentença recorrida, que está devidamente fundamentada, reflete, corretamente, aquilo que se passou na audiência de julgamento e encontra-se em conformidade com a nossa legislação e jurisprudência.
2ª) A Recorrente, com as suas alegações, tenta confundir a questão da prova que lhe competia fazer com a falta de fundamentação do despacho de reversão, que ela própria proferiu.
3ª) No despacho de reversão, bem como na sua contestação, a Recorrente fundamentou a sua decisão, alegando que os recorridos contribuíram, com culpa, para a falta de bens suficientes para liquidar a dívida.
4ª) Por isso, competia à Recorrente fazer a prova dessa culpa, tal como defende abundantemente a nossa Jurisprudência, pois só assim seria possível responsabilizar os administradores, ora recorridos, pelo pagamento da dívida, através do instrumento da reversão.
5ª) Como bem diz a douta sentença recorrida, a fls. 27, no 6º parágrafo, relativa à motivação da matéria de facto, todas as testemunhas, incluindo o Sr. Administrador da Insolvência, I…………, referem que à data da insolvência o património da insolvente era mais do que suficiente para “resolver a situação”, por isso, logo por aqui, toda a fundamentação do recurso da Recorrente “cai por terra”.
6ª) A questão fundamental a ser discutida nestes autos consiste no facto de saber se os ora recorridos são ou não parte legítima na execução, tendo em conta a sua culpa para a falta de pagamento dos créditos tributários.
7ª) Para isso, é necessário ter em conta o disposto nos artigos 23º e 24º da LGT e o art. 153º do C.P.P.T., que referem que o elemento essencial para haver reversão assenta na culpa dos administradores, ou seja, que estes contribuíram de forma dolosa para a delapidação do património da empresa, impedindo, assim, que a dívida fiscal existente fosse cobrada.
8ª) Os recorridos assentaram a sua defesa na falta da culpa, elemento essencial, alegando e provando que em nada contribuíram para a delapidação do património da empresa, tal como ficou demonstrado na audiência de julgamento, reportado na douta sentença, que à data da insolvência existiam bens suficientes para o pagamento da dívida fiscal.
9ª) Além disso, a dívida fiscal em causa venceu-se em momento muito posterior à cessação de funções dos administradores, ora recorridos, pois as liquidações apresentadas datam de 23/05/2010, 03/02/2011, 22/03/2011 e 27/04/2011, como se vê do ponto 2 da informação constante da citação.
10ª) A declaração de insolvência foi proferida a 10 de Março de 2010, sendo que, com a sentença, os administradores deixam de ter os poderes de administração por força das disposições legais constantes do CIRE.
11ª) Como refere a douta sentença, e bem, competia à Recorrente alegar e provar os factos demonstrativos da existência de culpa por parte dos administradores na administração danosa do património da sociedade devedora.
12ª) A Recorrente reconhece isso mesmo no art. 14º da sua contestação quando diz que “não existe qualquer presunção de culpa, recai sobre a Administração Fiscal a demonstração da culpa pela insuficiência do património social (cfr. Art. 342º, nº 1 do C. C.)
13ª) A Recorrente, no despacho de reversão, invocou a culpa dos ora recorridos e alegou os factos demonstrativos que consistiam em terem alienado algum património, referido na douta sentença, antes da declaração de insolvência
14ª) Mas reconhece, ainda, que a oneração de outro património foi feita pela anterior administração, não podendo, por isso, os recorridos ser responsabilizados.
15ª) Na matéria dada como provada, verifica-se que alienação do património não foi ruinosa para a executada, uma vez que foi vendido pelo preço de mercado e com a intenção de fazer face às despesas correntes da empresa, com a intenção de mantê-la em atividade, até porque se tratava de uma das mais importantes entidades empregadoras da região, atento o número de trabalhadores que possuía.
16ª) Como consta da sentença, quando os administradores, ora recorridos, assumiram a administração da empresa já esta se encontrava numa situação económica e financeira muito debilitada e, mesmo assim, tudo fizeram para a manter em funcionamento, tomando todas as medidas necessárias para o efeito.
17ª) Pelo que, como bem diz a douta sentença recorrida, seria da competência da Recorrente provar que, independentemente dessas medidas, já em 2008, quando assumiram a administração, a insolvência da executada “era inevitável”, mas a verdade é que não fizeram a prova desses factos.
18ª) Não é verdade o que a Recorrente refere no artigo 10º e na conclusão F) das suas alegações, quando diz que “não resulta da sentença a inexistência de culpa por parte dos oponentes na insuficiência do património da devedora originária”, pois basta ver o referido a fls. 27 daquele douto libelo, na motivação da matéria de facto, para constatarmos precisamente o contrário.
19ª) A culpa dos administradores deve ser aferida, tal como defende a nossa jurisprudência abundante e a doutrina, tendo em conta o disposto no art. 186º do CIRE e a verdade é que a insolvência foi declarada fortuita, como se vê do doc. 5 junto com a oposição, pelo que dúvidas não restam de que a oposição teria sempre de proceder, como procedeu.
20ª) A Recorrente pretende com o seu recurso tentar, através da absolvição da instância, corrigir aquilo que não conseguiu na audiência de julgamento que era tentar, novamente, provar a culpa dos ora recorridos na falta de bens para pagamento da sua dívida, sendo que tal se mostra totalmente impossível.
21ª) Ninguém invocou ou referiu a falta de fundamentação do despacho de reversão, o que foi invocado foi a falta de culpa dos administradores, nada mais.
22ª) A Recorrente bem alegou essa culpa na sua contestação, mas a verdade é que não conseguiu provar que esses factos foram praticados com culpa e com o intuito de diminuir o património da devedora principal e nisso consistiu, e muito bem, a procedência da oposição.
23ª) A substituição da decisão proferida pela absolvição da instância é completamente descabido, infundado e ilegal, uma vez que para isso é necessário que se verifique uma das situações previstas no art. 278º, nº 1 do C. P. C., o que aqui, claramente, não é o caso, sendo que se tal fosse possível, veriam os ora recorridos os seus legítimos interesses prejudicados.
24ª) Como bem defende a douta sentença, estamos perante uma situação de total procedência dos fundamentos invocados pelos oponentes na sua defesa, plasmada na oposição e, como tal, a consequência legal só poderia ser aquela que foi, ou seja, a extinção dos processos de execução relativamente a eles.
25ª) Já quanto ao vício formal de falta de fundamentação do despacho de reversão invocado pela Recorrente agora - sendo que até este momento nunca o fez, e deveria tê-lo feito, se se quisesse fazer valer dele - não existe, o que existe, é sem sombra de dúvidas, a falta de prova dos factos por si invocados e, por isso, também a douta sentença não poderia concluir de forma diferente daquela que concluiu, ou seja, a extinção da execução contra os oponentes, aqui recorridos.
26ª) Se outra decisão fosse tomada, mais concretamente a pretendida pela Recorrente, estaríamos a violar claramente os princípios da certeza e segurança jurídicas que são o apanágio fundamental do nosso ordenamento jurídico, já que estaríamos a pôr em causa completamente a confiança dos cidadãos na Justiça.
27ª) Porque, depois de os recorridos estarem tanto tempo a “lutar” por verem reconhecidos os seus direitos, quando tal acontece, surgia uma nova decisão que poria em causa esses mesmos direitos e levaria os cidadãos a reiniciar um outro processo que teria os mesmos fundamentos e analisaria os mesmos factos.
28ª) Além disso, estaríamos a permitir, neste caso, à Autoridade Tributária que, depois de não ter conseguido os seus intentos por uma via, iria corrigir os seus erros e “voltar à carga”, sendo que o desfecho teria de ser o mesmo, atentos os fundamentos vertidos na douta sentença, já que não poderiam ser apresentados novos factos, também porque não existem.
29ª) Ao permitir-se à Recorrente fazer o que pretende, estaríamos, ainda, perante uma clara situação de abuso de direito, uma vez que depois de os recorridos terem feito tudo o que estava ao seu alcance para se defender das imputações falsas e infundadas que lhe foram feitas, poderiam ver-se, depois, novamente, “a braços” com a mesma situação, sendo que à Recorrente era permitido corrigir aquilo que, no tempo e lugar próprios não conseguiu.
30ª) A Recorrente esquece que as exceções perentórias ou dilatórias têm de ser invocadas expressamente nos articulados para que possam ser apreciadas pelo Tribunal, salvo as de conhecimento oficioso, que aqui não é o caso, e produzir os seus efeitos.
31ª) A verdade é que ela nunca o fez, antes pelo contrário, estribando-se sempre no pressuposto de que tudo havia sido feito de acordo com a legalidade, desde o despacho de reversão até ao final.
32ª) A Recorrente, na sua contestação refere expressamente que o despacho de reversão não sofre de qualquer anomalia, veja-se o que disse nos artigos 3º e 4º daquela peça processual e, pretende agora, dar o “dito por não dito” para tentar salvar a sua situação.
33ª) Não enferma, assim, a douta sentença proferida de qualquer vício nem de qualquer nulidade, nem muito menos existe qualquer deficiente interpretação das normas aplicadas.
Nestes termos, e nos mais e melhores de direito que V. Exas. doutamente suprirão, deve ser negado provimento ao recurso da Recorrente, mantendo-se a douta decisão recorrida, nos seus precisos termos, fazendo-se assim a tão costumada e esperada J U S T I Ç A.

Neste Supremo Tribunal Administrativo, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto, notificado nos termos do art. 146.º, n.º 1, do CPTA, concluiu, no seu parecer que “(…) Se, em face de oposição deduzida em que foi invocada falta de fundamentação, nomeadamente, quanto à falta de culpa de administradores, bem como ainda a falta de demonstração da mesma, sendo pedido que a execução prosseguisse contra o primitivo devedor, o que foi contraditado pela representante da Fazenda Pública, vindo a ser feita prova quanto a tal falta de culpa, concluindo-se no sentido da sua inexistência, é de proceder à absolvição do pedido, pois conheceu-se quanto ao mérito do mesmo.”.
*

Os autos vêm à conferência satisfeitos os vistos legais.

*

2. FUNDAMENTAÇÃO:

2.1. - Dos Factos:

Na decisão recorrida foi fixado o seguinte probatório reputado relevante para a decisão:

A) Da certidão permanente, com o código de acesso …………, relativa à sociedade B…………, S.A., NIPC ………, consta, para além do mais, o seguinte:
“[…]
AP. 3/20080521 14:32:42 UTC – CESSAÇÃO DE FUNÇÕES DE MEMBRO(S) DO(S) ORGÃO(S) SOCIAL(AIS)
CONSELHO DE ADMINISTRAÇÃO:
Nome/Firma: C…………
[…]
Causa: Renúncia
Data: 28 de março de 2008.
Nome/Firma: D…………
[…]
Causa: Renúncia
Data: 28 de março de 2008
Nome/Firma: E…………
[…]
Causa: Renúncia
Data: 28 de março de 2008
[…]
AP. 4 20080521 14:32:42 UTC – DESIGNAÇÃO DE MEMBRO(S) DE ORGÃO(S) SOCIAL(AIS)
ORGÃO(S) DESIGNADO(S):
CONSELHO DE ADMINISTRAÇÃO:
Nome/Firma: F…………
[…]
G…………
[…]
A…………
[…]
Prazo de duração do(s) mandato(s): Até ao final do mandato em curso.
Data da deliberação: 05 de Maio de 2008
[…]
Av 1 AP 1/20090608 12:05:27 UTC – RECONDUÇÃO DE MEMBRO(S) DE ÓRGÃO(S) SOCIAL(AIS)
CONSELHO DE ADMINISTRAÇÃO:
Nome/Firma: F…………
[…]
G…………
[…]
A…………
[…]
Prazo de duração do(s) mandato(s): Triénio 2009/2011
Data da deliberação: 08 de Maio de 2009
[…]”.
– cfr. fls. 98/101 do processo de execução fiscal [doravante, PEF] apenso aos autos.
B) Por sentença datada de 10/03/2010 e transitada em julgado em 09/04/2010, a sociedade B…………, S.A., foi declarada insolvente no âmbito do processo n.º 183/10.1TBLMG, que correu termos pelo 2.º Juízo Cível do Tribunal Judicial de Lamego. - cfr. fls. 30/31 e 45 do PEF apenso aos autos.
C) Foi nomeado Administrador de Insolvência H…………, com domicílio na Rua ………, n.º ……, ……, 3510-…… Viseu, posteriormente substituído por I…………, Unipessoal, Lda., NIPC ………, com domicílio na Av.ª ………, n.º ……, ……, 3510-…… Viseu. – cfr. fls. 31 verso e 45 do PEF apenso aos autos.
D) A declaração de insolvência foi publicada na 2.ª Série do Diário da República, n.º 59, de 25/03/2010, através do anúncio n.º 2671/2010 – cfr. fls. 44 do PEF apenso aos autos.
E) Através do ofício com a referência n.º 1298824, datado de 09/04/2010, o Tribunal Judicial de Lamego comunicou ao Serviço de Finanças de Lamego a substituição do Administrador de Insolvência H………… por I…………, Unipessoal, Lda. – cfr. fls. 26 do PEF apenso aos autos.
F) Por sentença de 08/04/2011, proferida no âmbito do 183/10.1TBLMG-C, que correu termos por apenso ao processo de insolvência supra referido, a insolvência da sociedade B…………, S.A. foi qualificada como fortuita – cfr. fls. 32/34 dos autos.
G) Contra a sociedade B…………, S.A. foram instaurados, pelo Serviço de Finanças de Lamego, os processos de execução fiscal n.ºs 2542201001003321, 2542201101001965, 2542201101003526 e 2542201101005162, para cobrança de dívidas de IVA dos anos de 2006 e 2008 e IRC dos anos de 2008 e 2009 e acrescido legal, no montante global de 974.651,30 € - cfr. fls. 1 e ss. do PEF apenso aos autos.
H) Servem de base às execuções referidas na alínea antecedente as certidões de dívida n.ºs 2011/1910/47, 2011/53030, 2011/53031, 2011/53032, 2011/53033, 2011/53034, 2011/53035, 2011/53036, 2011/53037, 2011/53038, 2011/53039, 2011/53040, 2011/53041, 2011/53042, 2011/53043, 2011/53044, 2011/53045, 2011/53046, 2011/53047, 2011/53048, 2011/53049, 2011/53050, 2011/53051, 2011/53052, 2011/53053, 2010/66034, 2010/66035, 2010/66036, 2010/66037, 2010/66038, 2010/66039, 2010/66040, 2010/66041, 2010/66042, 2010/66043, 2010/66044, 2010/66045, 2010/66046, 2010/66047, 2010766048, 2010/66049, 2010/66050, 2010/66051, 2010/66052, 2010/66053, 2010/66054, 2010/66055, 2010/66056, 2010/66057, constantes de fls. 1 e ss. do PEF apenso aos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
I) Em 28/08/2013, foi emitida informação da qual consta:
[…]










- cfr. fls. 173/174 do PEF apenso aos autos.
J) Na mesma data, o Sr. Chefe do Serviço de Finanças proferiu despacho com o seguinte teor:








- cfr. fls. 174/177 do PEF apenso aos autos.
K) O oponente F………… foi citado para o processo de execução fiscal, na qualidade de devedor subsidiário, pelo ofício expedido por carta registada com aviso de receção assinado em 19/09/2013 – cfr. fls. 188/189 do PEF apenso aos autos.
L) O oponente A………… foi citado para o processo de execução fiscal, na qualidade de devedor subsidiário, pelo ofício expedido por carta registada com aviso de receção assinado em 24/09/2013 – cfr. fls. 200/201 do PEF apenso aos autos.
M) O oponente G…………, foi citado para o processo de execução fiscal, na qualidade de devedor subsidiário, pelo ofício expedido por carta registada com aviso de receção assinado em 20/09/2013 – cfr. fls. 202/203 do PEF apenso aos autos.

Mais resultou provado que:
N) A sociedade devedora originária, nos anos de 2006, 2007 e 2008, apresentou resultados líquidos do exercício, respetivamente, de -762.498,22 €, 566.907,66 € e -1.046.960,23 € - cfr. fls. 52 do PEF apenso aos autos; depoimentos das testemunhas J………… e I………….
O) A sociedade devedora originária apresentava, em 31/12/2008, no seu ativo:
- Investimentos financeiros, no valor de 395.035,36 €;
- Existências [mercadorias], no valor de 439.811,46 €;
- Dívidas de terceiros de curto prazo, no valor de 1.520.538,76 €, dos quais 836.487,36 € já provisionados;
- Disponibilidades [Caixa e depósitos bancários], no valor de 20.043,67 € - cfr. fls. 55 do PEF apenso aos autos; depoimento da testemunha I………….
P) A sociedade devedora originária apresentava, em 31/12/2008, um capital próprio negativo de – 61.425,00 € - cfr. 56 do PEF apenso aos autos.
Q) Em 17/11/2008, reuniu a Assembleia Geral da sociedade devedora originária, tendo sido lavrada a ata n.º 71, da qual se extrai o seguinte:
[…]
Ponto Primeiro: Deliberar sobre a adopção das medidas estrategicamente necessárias, adequadas e oportunas ao desenvolvimento da atividade da sociedade.
Ponto segundo: Autorizar a administração a intervir, em representação da sociedade, em todos os actos e contratos necessários à execução das medidas estrategicamente necessárias à prossecução da actividade desenvolvida pela sociedade.
[…]
Ponto Quarto: Deliberar sobre o interesse social na pendência da acção judicial movida pela sociedade contra um dos seus accionistas.
[…]
Posto isto, entrou-se então no ponto primeiro da Ordem de Trabalho, tendo sido dada a palavra à Administração, desde que entrou em funções, preocupou-se em fazer um levantamento das reais condições económicas e financeiras da sociedade, procurando, desta feita, identificar os problemas, partindo de uma análise do histórico
Mais solicitaram, com vista àquele desiderato, ao Dr. J………… a realização de um diagnóstico da sociedade que se anexa à presente acta como documento número dois, o qual é composto por trinta e três folhas, tendo alcançado, conclusões deveras preocupantes e que apontam no sentido de uma actual falta de viabilidade da empresa. Com efeito, e considerando que a actividade da B…………, SA se divide em 3 sectores, um dos quais o da Distribuição, tem penalizado severamente os resultados da empresa, sendo certo que desde 2004 a situação se tem vindo a agravar com prejuízos acumulados. Mais diagnosticaram que as condições de exploração da empresa são incompatíveis com a sua manutenção em actividade, designadamente atenta a carga salarial da mesma face aos proveitos.
Neste momento, o Administrador F………… referiu que a empresa está descapitalizada, sendo que os seus fornecedores estão a bloquear os fornecimentos devido à falta de pagamento atempado das respectivas facturas. Mais referiu que os maiores custos da sociedade são representados pelos custos com pessoal, prevendo-se uma redução dos mesmos em cerca de 50% (cinquenta por cento). Não obstante em Agosto e Setembro de 2008, a empresa apresentou resultados de exploração positivos.
O Administrador Eng.º G…………, por sua vez, esclareceu ainda que se encontra já em curso uma restruturação do pessoal da empresa, sendo certo que já saíram alguns dos seus colaboradores.
[…]
Dada de novo a palavra à Administração, na pessoa do Dr. A…………, para que proposta a colocar a votação, foi pelo mesmo dito […] que a sociedade apresenta necessidades de financiamento na ordem dos € 1.800.000,00 (um milhão e oitocentos mil euros), os quais poderão ser realizados mediante um aumento de capital de cerca de € 460.000,00 (quatrocentos e sessenta mil euros) e de € 250.000,00 (duzentos e cinquenta mil euros) por empréstimos dos sócios; a par da alienação de algum património da sociedade, designadamente de parte da Quinta da …………, assim como da alienação do imóvel arrendado ao Supermercado ………… ao próprio supermercado.
Foi então colocada à votação a seguinte proposta da administração […]: Autorizar a administração a proceder à venda do seguinte património da sociedade: imóvel no qual se encontram os escritórios; artigos da Quinta da …………; e imóvel onde se encontra em funcionamento o supermercado …………, pelo valor mínimo em 10% inferior ao mais baixo de duas avaliações imobiliárias independentes a efectuar; assim como a convocação de Assembleia Geral de accionistas para deliberar aumento de capital social até 600.000,00 € (seiscentos mil euros).
Passou-se de imediato, à votação do ponto primeiro da Ordem de Trabalhos, tendo sido a proposta apresentada, aprovada com 75% dos votos dos accionistas presentes e a abstenção dos accionistas C………… e D………….
Na sequência da análise do ponto segundo da ordem de trabalho, foi o mesmo apresentado a votação, tendo sido deliberado, com os votos de 75% do capital representado e as abstenções dos accionistas C………… e D………… […] autorizar a administração a intervir, em representação da sociedade, em todos os actos e contratos necessários à execução das medidas estrategicamente necessárias à prossecução da actividade desenvolvida pela sociedade, e, em concreto, nos actos deliberados no ponto primeiro da ordem do trabalho.
[…]
Neste momento o representante da acionista D………… referiu que os sócios da L………… são quase todos os accionistas da B…………, SA, sendo que os movimentos financeiros a favor da L………… foram para liquidar dívidas aos bancos.
O Administrador Dr. A………… referiu ainda que, na verdade, a B…………, SA atravessa uma situação financeira difícil e que houve saídas de dinheiro para a L………… que, não existindo, poderiam ter evitado as dificuldades.
[…]
Passou-se de imediato à apresentação do ponto quarto da ordem de trabalho, tendo sido solicitada a palavra pelo acionista M…………, o qual, no uso da mesma, atestou que a atitude da anterior administração com a apresentação da acção judicial a que se refere o presente ponto da ordem de trabalho, configurou, na altura, uma vingança pessoal; já que o prédio em causa que corresponde a uma parcela integrada na Quinta das …………, foi, em Novembro de 2003, integrado nas partilhas, sendo que existe um documento elaborado pelo Sr. C………… a comprovar as limitações em questão.
[…]
Colocada a votação proposta no sentido do prosseguimento da acção judicial pendente, foi deliberado com os votos contra do acionista F………… e seus representados, do acionista N…………, O………… e M………… que representam 30,34% do capital e com as abstenções dos demais presentes, a não aprovação da proposta de prosseguimento da acção judicial movida pela sociedade contra um dos seus accionistas. […]” – cfr. fls. 118/127 dos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
R) Em 28/12/2008, reuniu a Assembleia Geral da sociedade devedora originária, tendo sido lavrada a ata n.º 72, da qual se destaca o seguinte:

[…] Ponto Primeiro: Deliberar sobre uma proposta de aumento do capital social da sociedade até € 600.000,00 (seiscentos mil euros), por entradas em dinheiro, e mediante a emissão de novas acções no valor nominal de cinco euros cada.
[…]
Ponto Terceiro: Autorizar a administração a intervir, em representação da sociedade, em todos os actos e contratos necessários à execução do deliberado no âmbito do ponto primeiro da Ordem de Trabalho.
[…] Entrando no ponto primeiro da Ordem de Trabalho, foi dada a palavra à Administração, na pessoa do Dr. A…………, o qual, no uso da mesma, informou os accionistas que a situação da empresa é deveras preocupante; referiu ainda que a administração identifica duas possíveis vias para a sociedade: a viabilização da sociedade ou a sua insolvência. A primeira via pressupõe que os accionistas adoptem uma postura tendente a esse fim, permitindo e garantindo a estabilidade societária; por sua vez, a segunda via que importa a liquidação do património social e consequente extinção da sociedade, determinará necessariamente o despedimento de todos os funcionários, a alienação do património e que a Administração da sociedade venha a ser entregue a um administrador judicial que não terá certamente como preocupação o bom nome da família ………… e nem assim a relação desta com os membros da comunidade em que se insere.
[…] O Administrador Dr. ………… esclareceu os presentes que a proposta de aumento de capital tem subjacente um maior empenho e confiança dos accionistas na viabilização da sociedade.
[…]
O Administrador Dr. A………… reforçou que a sociedade necessita de um investimento na ordem dos € 600.000,00, defendendo que a posição da administração é a de recuperar a sociedade e não assim “adiar o inevitável”.
[…]
Por sua vez, o Administrador F………… referiu que a empresa está a atravessar graves dificuldades, sendo que qualquer dinheiro, por pouco que seja é útil à sua recuperação. Mais referiu que os valores que foram realizados serão preferencialmente aplicados na compra de mercadorias. Referiu ainda que o aumento de capital aumentará a credibilidade da empresa junto a fornecedores, banca e clientes.
[…]
Não havendo mais questões a discutir pelos senhores accionistas, foi então colocado a votação o ponto primeiro da ordem de trabalho, tendo os accionistas C…………, P………… e D………… […], votado contra e todos os demais accionistas presentes a favor;
[…]
Neste momento, o representante da acionista Q…………, propôs que a Assembleia Geral deliberasse um prazo de deferimento da realização das entradas em dinheiro para subscrição do aumento de capital de três meses, tendo esta proposta sido acompanhada pelos membros da Administração. Aceite a colocação de proposta a deliberação dos senhores accionistas, foi a mesma aprovada por unanimidade dos votos emitidos.
Foi assim deliberada por unanimidade dos votos emitidos uma alteração ao artigo terceiro do contrato de sociedade, que passa a ter a seguinte redacção: “O capital social é de duzentos e trinta e oito mil quatrocentos e cinquenta euros, dividido em quarenta e sete mil seiscentas e noventa acções com o valor nominal de cinco euros cada.”
[…]
Foi nestes termos deliberado autorizar a administração a intervir, em representação da sociedade, em todos os actos e contratos necessários à execução do aumento de capital anteriormente deliberado.
[…]
O representante da acionista Q………… solicitou então o seguinte esclarecimento: Se a administração reconhecia ou não que os trezentos e cinco mil euros eram um crédito?; em resposta, o Administrador Dr. A………… referiu que a administração está a trabalhar no sentido de actualizar e cobrar todas as dívidas à empresa, sendo óbvio que nestas se incluem as dívidas da L………… como as de qualquer cliente.
[…]
O administrador Dr. A…………, em representação do Conselho de Administração, formulou então a seguinte proposta a ser colocada a votação no âmbito do ponto quarto da Ordem de Trabalho: Prorrogação do prazo de conciliação, para o qual a administração foi mandatada no âmbito da deliberação do ponto terceiro da Assembleia Geral anterior, até ao dia 26 de Dezembro de 2008, findo o qual, e na impossibilidade de conciliação, a administração tomará as devidas diligências para a sua resolução.
Colocada a votação, foi a acima consignada proposta apresentada pela administração votada favoravelmente por todos os accionistas presentes […]
No âmbito do ponto quinto da Ordem de Trabalho, o administrador F…………, no uso da palavra referiu que relativamente às alienações de património, e, consequentemente ao imóvel que é sede da sociedade, existe um comprador interessado na compra do mesmo pelo valor de cento e noventa mil euros.
[…]
O representante da acionista D………… questionou a administração se tal proposta se compreendia nos valores balizados na anterior assembleia, tendo o Administrador Dr. A………… referido que foram realizadas avaliações por duas entidades independentes, tendo ambas alcançado um valor mínimo próximo dos duzentos mil euros para o indicado imóvel.
[…]”. – cfr. fls. 128/143 dos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
S) Em 08/05/2009, reuniu a Assembleia Geral da sociedade devedora originária, tendo sido lavrada a ata n.º 73, da qual consta, entre o mais:

“[…]
Ponto Primeiro: Discussão e Votação do Relatório de Gestão e Contas do exercício de 2008.
Ponto Segundo: Discussão e Votação sobre a Proposta de Aplicação de resultados do exercício de 2008.
[…]
Mais esclareceu que foi apenas em momento imediatamente anterior à presente assembleia que teve conhecimento que um dos accionistas havia intentado uma acção de anulação de deliberação social.
[…]
No que tange à situação económica e financeira da empresa […] resultando das contas um capital próprio negativo de em € 61.425,00 (sessenta e um mil quatrocentos e vinte e cinco euros). Com efeito, e relativamente ao exercício de 2007, houve uma pequena recuperação, no entanto, os resultados são fortemente negativos.
Neste momento o Sr. Fiscal único usou da palavra referir que os resultados foram influenciados por ajustamentos e correcções relativamente a movimentos efectuados no passado, designadamente quanto a valores cuja cobrança se revela como muito duvidosa, como a exemplo os movimentos com a sociedade L………….
A este propósito interveio o Dr. J………… para referir que a sociedade se encontra numa situação de falência técnica, sendo que os capitais próprios são negativos, em resultado de ajustamentos e correções a exercícios anteriores. Encontrando-se a sociedade na situação prevista no artigo 35.º do Código das Sociedades Comerciais, o que importa uma imediata reacção por parte dos senhores accionistas.
[…]
Questionados os senhores accionistas sobre a existência de mais questões a discutir no âmbito do presente ponto da Ordem de Trabalho, e não tendo sido colocada qualquer questão, foi então colocado à votação o ponto primeiro da ordem de trabalho, tendo sido o mesmo aprovado por maioria dos votos emitidos.
[…]
Passou-se de imediato, à apreciação do ponto segundo da Ordem de Trabalho, tendo o acionista Dr. R………… solicitado à administração concreta posição sobre a proposta de aplicação de resultados, assim como esclarecimentos sobre quais as concretas medidas que a administração entende necessárias para a manutenção em actividade da sociedade […]
Em resposta, o Dr. A…………, sublinhou que os membros do Conselho de Administração aceitaram a incumbência de gerir a sociedade, porquanto acreditam na sua viabilidade, nos termos do plano apresentado na anterior assembleia geral. Na verdade, e não obstante a situação de crise por todos vivenciada, a empresa, certamente porque se distingue face aos seus concorrentes pela sua longa implementação no mercado, recuperou ligeiramente face aos exercícios transactos. A administração em exercício diligenciou pela cabal identificação dos valores que se revelam incobráveis, ou de cobrança duvidosa, para desta feita apurar a real situação económico financeira da empresa. Mais diligenciou a administração em funções por uma melhoria das condições de exploração da sociedade, tendo, por exemplo, levado a efeito um processo de despedimento colectivo de cerca de 50% do pessoal. Por sua vez, no que às vendas tange, foi implementada uma política de vendas com segurança de pagamento do respetivo preço. Entende a Administração que a recuperação ainda que com dificuldade, é possível, desde que se verifique a entrada de dinheiro.
Neste momento, o Sr. Fiscal único pediu a palavra para referir que, neste momento, se verifica uma alteração face à situação da empresa apresentada na anterior assembleia geral. De facto, atendendo aos resultados do exercício de 2008, e verificado o circunstancialismo do artigo 35.º do Código das Sociedades Comerciais, impõe-se à assembleia geral tomar uma posição, designadamente no sentido da redução do capital social.
[…]
Em resposta, a Administração referiu que face aos resultados negativos da empresa, e para ultrapassar a situação de capitais próprios negativos, admite como solução a redução do capital social em valor inferior ao mínimo legal, seguido de aumento de capital com a realizar com as entradas de dinheiro efectuadas.
[…] O acionista e administrador F………… enaltece a posição dos senhores accionistas que, sabendo da pendência de acção judicial de anulação de deliberação social, entregaram dinheiro à sociedade.
[…]
Face à ausência de mais questões a debater no âmbito do ponto segundo da Ordem de Trabalho, foi o mesmo colocado a votação, tendo sido aprovado pela totalidade dos votos emitidos […] que o resultado líquido negativo de € 1.046.960,23, seja transferido para Resultados Transitados, a fim de ser coberto em exercícios futuros mais favoráveis.
[…]
De seguida, passou-se ao ponto terceiro da Ordem de Trabalho, tendo sido deliberada, pela totalidade dos votos emitidos, e as abstenções de C………… e D…………, ao abrigo do disposto nos artigos 376.º e 455.º ambos do CSC, a emissão de um voto de confiança ao actual Conselho de Administração e respectivos membros, bem como ao respectivo órgão de fiscalização, na pessoa do Fiscal Único. […]” – cfr. fls. 144/152 dos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
T) Em 06/07/2009, reuniu a Assembleia Geral da sociedade devedora originária, tendo sido lavrada a ata n.º 74, do qual consta, designadamente, o seguinte:

[…]
Ponto Primeiro: Esclarecimento sobre a importância do aumento do capital e a forma como deve ser realizado.
Ponto segundo: Redução do Capital Social da Sociedade a zero, nos termos do disposto no art.º 94.º do Código das Sociedades Comerciais.
Ponto Terceiro: Aumento do Capital Social até ao limite de € 200.000,00 (duzentos mil euros), em dinheiro, a realizar no prazo a definir na Assembleia, conforme o disposto no art. 95º do Código das Sociedades Comerciais.
[…]
Entrando-se na discussão do ponto primeiro da Ordem de Trabalho, a Presidente da Mesa deu a palavra à Administração, na pessoa do Dr. A…………, o qual, no uso da mesma voltou a expor, esclarecendo a razão pela qual se havia convocado a presente Assembleia Extraordinária, a importância do aumento do capital da sociedade e a forma como este deveria ser realizado.
[…] No segundo ponto foi dada a palavra ao Sr. Fiscal Único, que começou por fazer uma pequena introdução, referindo que a presente Assembleia Geral havia sido convocada com o intuito de reduzir o capital, destinando-se essa redução à cobertura de prejuízos apresentados pela sociedade, tal como estabelecia o disposto no artigo 94º do Código das Sociedades Comerciais.
Mais esclareceu que esta deveria ser feita através de um processo de votação, no qual cada um dos accionistas votaria na redução do valor nominal das suas participações, condicionando-se expressamente aquela redução à efectivação de aumento do capital para montante igual ou superior àquele mínimo, de acordo com o previsto no disposto no artigo 95º do Código das Sociedades Comerciais
[…]
Não tendo sido colocada qualquer questão por parte dos senhores accionistas, procedeu-se de imediato à votação do 3.º ponto, 1.ª parte, ou seja, ao aumento de capital, tendo-se obtido o seguinte resultado: os votos contra de três accionistas, os restantes votos favoráveis de todos os demais accionistas presentes sem qualquer abstenção
[…]
Ainda e em relação à 2.ª parte do ponto três da Ordem de Trabalho, ou seja, aumento do capital até ao limite de € 200.000,00 (duzentos mil euros) e respectivo prazo, foi dada a palavra ao Dr. A…………, que no uso dela, sugeriu o prazo legal de 60 dias.
[…] procedeu-se a nova votação, tendo a mesma sido aprovada por maioria dos votos emitidos, traduzidos no seguinte resultado: dois votos contra dos accionistas: C…………, D…………; uma abstenção da acionista P…………, os restantes votos favoráveis dos demais accionistas presentes e representados.
[…]
Neste particular foi pedida a palavra pelo Dr. R…………, representante da acionista Q………… e no uso dela sugeriu que todos os accionistas mantivessem as mesmas proporções nas participações sociais. Que a entrada de dinheiro para a sociedade era saudável. Apelou à boa vontade de todos os sócios para reforçarem o capital, tendo em conta a viabilidade da sociedade.
[…]
Entretanto e por não existir mais questões a discutir no âmbito do presente ponto da Ordem de Trabalho, foi esta proposta submetida a votação, tendo a mesma sido aprovada por unanimidade dos accionistas presentes e representados.
De seguida e porque alguns dos accionistas haviam já reflectido sobre algumas propostas de subscrição e realização de aumento do capital, pese embora terem sido informados que o poderiam fazer até ao limite do prazo supra estipulado, foi esta submetida a auscultação pela Administração, tendo resultado a subscrição e realização de 19.572 acções correspondentes a € 97.860,00
[…]
Pelo accionista M………… foi depois pedido um esclarecimento acerca da posição que a actual Administração tomou relativamente à L………….
Neste particular o Dr. A………… informou que a actual Administração havia solicitado apoio jurídico relativamente à questão da L………….
[…]
Neste momento foi pedida a palavra pelo Administrador e accionista F………… e no uso dela esclareceu que a Administração contratou um Advogado com domicílio em Viseu, que aceitou o processo, tendo já emitido um parecer em papel timbrado que desde já punha à disposição desta Assembleia para consulta.
[…]” - cfr. fls. 153/159 dos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.

U) Correu termos no 2.º Juízo do Tribunal Judicial da Comarca de Lamego, sob o n.º 243/08.9TBLMG, a ação declarativa de reivindicação, sob a forma de processo ordinário, intentada em 27/03/2008, pela sociedade devedora originária contra R………… e esposa Q………… - cfr. fls. 17/21 dos autos e 165/169 do PEF apenso aos autos.
V) A mencionada ação foi intentada pela anterior administração da sociedade devedora originária – cfr. depoimentos das testemunhas R………… e M………….
W) Em 31/12/2008, no âmbito do processo a que se alude na alínea que antecede, deu entrada um requerimento subscrito por ambas as partes, do qual se extrai o seguinte:
“[…]Primeira
A Autora reconhece que a parcela reivindicada nestes autos, com a área de 2.107 M2, é propriedade plena dos demandados, que a adquiriram por usucapião, declarando, assim, que a mesma não faz parte integrante da Quinta da …………, inscrita na matriz sob o art. 221-B, mas sim do prédio rústico inscrito na matriz sob o art. 139-B, descrito na CRP sob o N.º 00318/160793, de que os demandados são titulares, conforme inscrição predial a seu favor na CRP de Lamego sob a cota G-2, Ap. 20/220894.
Segunda
Consequentemente, a demandante obriga-se a proceder, junto dos Serviços de Finanças, à rectificação da inscrição matricial respeitante àquela sua Quinta da …………, bem como à rectificação da sua descrição predial, junto da CRP, com o cancelamento da respectiva inscrição, se tal vier a revelar-se formalmente necessário, na parte em que ali se inclui a área da parcela reivindicada. […]
Termos em que requerem a V. exa se digne proferir douta sentença homologatória, com menção expressa do teor da cláusula primeira, desta transacção, para efeitos de registo da parcela reivindicada na CRP a favor dos demandados e, consequentemente, sejam os autos mandados à conta, com os ulteriores termos.
[…]” – cfr. fls. 17/18 dos autos.
X) Em 07/01/2009, foi proferida sentença homologatória da transação a que se reporta o requerimento mencionado na alínea W) supra, a qual transitou em julgado em 22/01/2009 – cfr. fls. 20/21 dos autos.
Y) A venda do imóvel descrito na Conservatória do Registo Predial de Lamego sob o n.º 558/19930716-F, efetuada pelo valor de 190.000,00 €, teve em vista a realização de capital para a empresa se manter em funcionamento, pagando os salários aos funcionários e saldando dívidas anteriores. – cfr. depoimentos das testemunhas R………… e M………….

Factos não provados
Com relevo para a decisão da causa não se provaram quaisquer outros factos.
Motivação da matéria de facto
A convicção do Tribunal relativamente à matéria de facto teve por base a análise crítica dos documentos e informações constantes dos autos, os quais não foram impugnados, conjugados com os depoimentos das testemunhas, tudo conforme se encontra especificamente indicado em cada um dos pontos do probatório.
As testemunhas depuseram de forma clara e assertiva, revelando conhecimento direto e concreto sobre as questões que lhe foram colocadas, respondendo sem hesitações que fizessem o Tribunal duvidar da consistência das suas declarações.
É de realçar que, não obstante as ligações de algumas testemunhas à sociedade devedora originária, os seus depoimentos revelaram-se espontâneos e descomprometidos e coerentes entre si, denotando ainda um elevado grau de concretização factual, levando o Tribunal a conferir-lhes credibilidade. Todas as testemunhas relataram com rigor e detalhe a situação financeira em que se encontrava a empresa no momento em que os oponentes assumiram a administração da sociedade devedora originária, bem como os esforços por estes desenvolvidos no sentido de inverter essa situação.
Deram ainda conta, em termos seguros, concretos e coincidentes, das desavenças entre os acionistas que determinaram o desfecho da sociedade, com a apresentação da mesma à insolvência, designadamente quanto ao aumento do capital social da sociedade devedora originária, que não se chegou a concretizar.
Mais referiram que a venda do imóvel onde se encontravam instalados os escritórios da sociedade não foi efetuada com o intuito de delapidar o património societário, mas gerar liquidez, suprindo as dificuldades sentidas na tesouraria, e reduzir custos.
Salientaram ainda que o valor de venda correspondia ao valor de mercado, uma vez que foram feitas duas avaliações por entidades independentes, as quais rondavam os 200.000,00 €, e o valor da venda foi de 190.000,00 €.
Relativamente à parcela de terreno, as testemunhas R…………. e M………… afirmaram perentoriamente que a mesma não integrava o património da sociedade devedora originária, uma vez que desde pelo menos 1980, já fazia parte do prédio pertencente a um herdeiro, o referido R…………, limitando-se a sociedade a reconhecer-lhe esse direito. Acrescentaram que a mencionada parcela tinha cerca de 2000 m2, área insignificante face aos cerca de 250.000 m2 da Quinta da ………..
Todas as testemunhas referiram ainda que à data em que os oponentes cessaram funções de administradores, com a declaração da insolvência, o património da sociedade era suficiente para pagar as dívidas. Quanto a este aspeto realça-se o depoimento da testemunha I…………, Administrador da Insolvência, que referiu que o património, cuja composição elencou, era suficiente para resolver a situação.
I………… e J………… explicaram que a saída de capitais da sociedade devedora originária para a L………… [sociedade da qual os anteriores administradores eram sócios], por via de um empréstimo contraído junto do BES, gerou a discórdia entre os acionistas. Mais concretamente, J………… referiu que o desvio de dinheiro para a L………… contribuiu para a situação debilitada em que a empresa se encontrava quando os oponentes tomaram posse. Questionado se pela análise das demonstrações financeiras da sociedade devedora originária constatou que a recuperação da empresa era uma tarefa difícil ou possível, respondeu que tal tarefa era muito difícil, mas não impossível.
Explicou que face à situação em que a empresa se encontrava a administração constituída pelos oponentes tomou várias medidas corretivas, tais como eliminação de setores de menor rentabilidade, alienação de património e o aumento de capital. Salientou, no entanto, que face às divergências existentes entre os acionistas quanto ao aumento de capital, e à pendência de várias ações de impugnação da deliberação social que aprovou essa medida, não restou outra alternativa à administração que não fosse a de requerer a insolvência da sociedade. Estas declarações foram confirmadas pelos depoimentos de ………… e M………….
Os depoimentos das testemunhas são corroborados pelos elementos documentais constantes dos autos, designadamente as atas n.ºs 71 a 74 da Assembleia Geral da sociedade devedora originária, que retratam a situação económica e financeira em que a sociedade devedora originária se encontrava quando os oponentes assumiram a titularidade do Conselho de Administração da empresa, bem como a posição deste e dos vários acionistas relativamente a essa situação, designadamente quanto às medidas de gestão tomadas, nomeadamente quanto ao aumento de capital.
Do depoimento das testemunhas, conjugado com os referidos elementos documentais, resultou a segurança do Tribunal na constatação de que os oponentes desenvolveram os seus melhores esforços no sentido de reverter a situação económica e financeira em que a sociedade devedora originária se encontrava no momento em que assumiram a administração da empresa, não lhes sendo imputável a insuficiência patrimonial da sociedade.
*

2.2.- Motivação de Direito

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, nos termos dos artigos, 608º nº 2, 635º nºs 4 e 5 e 639º do CPC ex vi dos artigos 2º e) do CPPT.
No caso, em face dos termos em que foram enunciadas as conclusões de recurso pela recorrente, a questão que cumpre decidir subsume-se a saber se a decisão vertida na sentença, a qual julgou procedente a oposição, padece de erro de julgamento, porquanto em vez da extinção da execução fiscal decretada, deveria ser anulado o despacho de reversão e a consequente absolvição dos oponentes da instância, atendendo a que, uma vez que se configura o pressuposto processual da ilegitimidade passiva, esta excepção dilatória sempre implicaria a absolvição da instância.
Dissentindo desse ponto de vista, os recorridos sustentam, em substância, que a substituição da decisão proferida pela absolvição da instância é completamente descabida, infundada e ilegal, uma vez que para isso teria de verificar-se uma das situações previstas no art. 278º, nº 1 do C.P.C., o que aqui, claramente, não é o caso, sendo que se tal fosse possível, veriam os ora recorridos os seus legítimos interesses prejudicados.
É que, realçam, fundamentou-se na sentença que estamos perante uma situação de total procedência dos fundamentos invocados pelos oponentes na sua defesa, plasmada na oposição e, como tal, a consequência legal só poderia ser aquela que foi declarada, ou seja, a extinção dos processos de execução relativamente a eles.
Mais aduzem em abono da sua tese, que o vício formal de falta de fundamentação do despacho de reversão invocado pela Recorrente agora - sendo que até este momento nunca o fez, e deveria tê-lo feito, se se quisesse fazer valer dele - não existe, o que existe, é sem sombra de dúvidas, a falta de prova dos factos por si invocados e, por isso, também a douta sentença não poderia concluir de forma diferente daquela que concluiu, ou seja, a extinção da execução contra os oponentes, aqui recorridos.
Esta posição é coadjuvada pelo Magistrado do MP junto deste STA que promove a absolvição do pedido aliás, de acordo com os Acórdãos do STA de 16/12/2015, Processo nº 0361/14 e de 25/01/2011, Recurso nº 20866/11, que decidem que há lugar à absolvição da instância quando não houver decisão de mérito, o que não é o caso dos autos.
Quid juris?
Como se exarou na fundamentação de direito da muito bem elaborada e clarividente sentença recorrida, a única questão nela conhecida foi a “Ilegitimidade dos oponentes”, a qual foi declarada nos seguintes termos:
“Os oponentes alegam que são parte ilegítima na execução, por ausência de culpa pela falta de pagamento dos créditos tributários.
Cumpre, assim, apreciar os pressupostos da reversão, que constituem matéria da legitimidade do oponente, fundamento de oposição previsto no artigo 204.º, n.º 1, alínea b) do CPPT.
De acordo com o disposto nos artigos 23.º e 24.º da LGT e 153.º do CPPT, constituem pressupostos da responsabilidade subsidiária a fundada insuficiência patrimonial da devedora principal e devedores solidários, o exercício de facto das funções de administração/gerência e a culpa na insuficiência do património da executada para satisfação dos créditos fiscais ou na falta de pagamento dos mesmos.
Ora, os oponentes apenas põem em causa o requisito atinente à culpa, pelo que o Tribunal apenas se irá debruçar sobre esta questão.
Dispõe o citado artigo 24.º da LGT o seguinte:
“1 – Os administradores, diretores e gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração ou gestão em pessoas coletivas e entes fiscalmente equiparados são subsidiariamente responsáveis em relação a estas e solidariamente entre si:
a) Pelas dívidas tributárias cujo facto constitutivo se tenha verificado no período de exercício do seu cargo ou cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado depois deste, quando, em qualquer dos casos, tiver sido por culpa sua que o património da pessoa coletiva ou ente fiscalmente equiparado se tornou insuficiente para a sua satisfação;
b) Pelas dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado no período do exercício do seu cargo, quando não provem que não lhes foi imputável a falta de pagamento.”
Assim, considerou o legislador que, relativamente às dívidas da sociedade vencidas no período de exercício do cargo do gerente ou administrador, se justificava a presunção de culpa dos órgãos sociais na falta de pagamento, cabendo a estes demonstrar, para a sua responsabilidade, que o não pagamento não se ficou a dever a culpa sua.
Esta diferença de regime no ónus da prova compreende-se porque o gerente não pode ser responsabilizado pela falta de pagamento, dado que enquanto exerceu o cargo a dívida não fora posta a pagamento; assim, só poderá ser responsabilizado caso a exequente prove que ele teve culpa na insuficiência do património societário [alínea a) do n.º 1 do art.º 24 da LGT]. Já no caso da alínea b) da mesma norma legal, porque o pagamento da prestação tributária constitui uma obrigação do gerente, tem de ser este a provar que não lhe é imputável a falta de pagamento das dívidas vencidas durante o período do exercício do cargo, designadamente pela demonstração de que não tem culpa pela insuficiência do património da originária devedora para pagamento dessas dívidas. [vide, entre outros, o acórdão do STA de 08/04/2015, proferido no processo n.º 345/14].
Deste modo, apenas relativamente às dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado no período do exercício do cargo [cfr. alínea b), n.º 1 do artigo 24.º da LGT] se faz incidir sobre o gerente ou administrador o ónus da prova que a falta de pagamento das dívidas da sociedade não lhe é imputável.
O prazo legal de pagamento ou entrega a que se refere o artigo 24.º, n.º 1, alínea b) é a data a partir da qual são devidos juros de mora a que alude o artigo 163.º do CPPT, mencionada na certidão de dívida.
Revertendo ao caso em apreço, conforme resulta do probatório, as liquidações cuja cobrança coerciva é efetuada nos presentes autos de execução fiscal venceram-se em data posterior à declaração de insolvência da sociedade devedora originária.
Assim, na data em que terminou o prazo legal de pagamento voluntário das dívidas tributárias, os oponentes já não eram gerentes [nominais] da sociedade devedora originária. Com efeito, com a declaração de insolvência o devedor fica privado dos poderes de administração e de disposição [cfr. artigo 81.º, n.º 1 do CIRE]. No sentido de a tornar plenamente eficaz esta limitação respeita tanto ao devedor como aos seus administradores, no sentido do artigo 6.º.
Deste modo, como, aliás, a própria reconhece, cabia à Administração Tributária demonstrar que foi por facto imputável aos oponentes que o património da sociedade se tornou insuficiente para o pagamento das dívidas que se venceram depois de a insolvência ter sido decretada.
Cabia-lhe, designadamente, a alegação e prova de factos-índice demonstrativos de uma gestão danosa do património da sociedade originariamente devedora, nomeadamente a destruição ou danificação do património social, a ocultação e dissimulação do ativo social, a criação ou agravamento artificial de ativos ou passivos e o uso do crédito da sociedade para satisfazer interesses de terceiros. Não é, pois a mera falta de mérito ou habilidade na gestão da sociedade que pode fundamentar a decisão de reversão, mas uma gestão que se traduza em factos ilícitos e violadores de normas concretas de proteção dos credores sociais [cfr. António Lima Guerreiro, Lei Geral Tributária anotada, pág. 141].
Ora, analisado o despacho de reversão, verifica-se que a Administração Tributária alicerçou a culpa dos oponentes, essencialmente, na alienação de património da sociedade devedora originária verificada no período de exercício de funções de administração, antes do decretamento da insolvência, concretamente a alienação ocorrida em 10/02/2010 do prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial de Lamego sob o n.º 940 e inscrito no artigo 221-B (parte) da matriz rústica de ……… e a alienação ocorrida em 08/01/2009 do prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial de Lamego sob o n.º 558 e inscrito no artigo 1384-F da matriz urbana da ……….
Relativamente à oneração do património societário, é a própria Administração Tributária que admite que tal facto terá ocorrido em períodos anteriores ao exercício da administração pelos oponentes, pelo que não lhes poderá ser imputado.
De facto, extrai-se do despacho de reversão que: “Deste modo, verifica-se por consulta aos dados de registo junto da CRP, bem como por consulta à Mod. 11 que houve registo de alienações do património do devedor principal no período de exercício de funções de administração/gerência dos agora interessados, contribuindo por esse procedimento para a insuficiência de bens, e consequentemente tornar escasso o património, não sendo esse suficiente para garante das dívidas.
[…] Para além destas alienações, já em períodos anteriores à gerência, verificava-se o recurso à oneração do património do devedor principal na figura de hipotecas voluntárias, contribuindo para uma situação falimentar […].
Desta forma e tendo presente o pressuposto da reversão, o período das dívidas, constituição e vencimento das mesmas e com o ónus da prova do lado da AT, pela culpa da insuficiência de bens do principal devedor motivada pelos administradores/gerentes, salienta-se o exposto no ponto 10, sem prejuízo óbvio de serem encetadas novas e demais diligências, para lá das já evocadas, para determinação da culpa dos administradores, estabelecendo uma efectivação de responsabilidade em como o património da sociedade se tornou insuficiente para a satisfação das dívidas tributárias em causa nos presentes autos, determinando por essa via o nexo causa efeito da eventual imputação dos responsáveis subsidiários no que respeita à falta ou insuficiência de património do principal devedor”.
Assim sendo, apesar da alusão feita à oneração de património da sociedade devedora originária, não será de atribuir relevância a esse facto para efeitos de preenchimento do requisito da culpa dos oponentes pela insuficiência do património da sociedade devedora originária, por se reportar a períodos anteriores à sua gestão.
No que se refere à “alienação” do prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial de Lamego sob o n.º 940 e inscrito no artigo 221-B (parte) da matriz rústica de ………, conforme resulta do probatório, não se operou qualquer alienação, mas apenas o reconhecimento, no âmbito da ação judicial de reivindicação, intentada pela anterior administração da sociedade, de que essa parcela “não faz parte integrante da Quinta da …………, inscrita na matriz sob o art. 221-B, mas sim do prédio rústico inscrito na matriz sob o art. 139-B, descrito na CRP sob o N.º 00318/160793, de que os demandados são titulares, conforme inscrição predial a seu favor na CRP de Lamego sob a cota G-2, Ap. 20/220894”, não se descortinando qualquer intuito de dissipação do património societário.
Por sua vez, quanto ao prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial de Lamego sob o n.º 558 e inscrito no artigo 1384-F da matriz urbana da ………, não resulta demonstrado que a sua alienação teve o intuito de delapidar o património social. Ao invés, o probatório dá-nos conta de que a venda do imóvel teve em vista a realização de capital para manter a sociedade em funcionamento. Nem sequer resulta provado que essa alienação tenha contribuído para o “estado falimentar” da sociedade devedora originária, até porque tal venda foi efetuada por valor aproximado do valor de mercado, não se tendo demonstrado que o valor resultante da venda tenha sido canalizado para outros fins que não o de financiamento da própria empresa.
Ao que acresce que a alienação ocorreu em 08/01/2009, portanto, em data muito anterior à data de vencimento das dívidas exequendas, não sendo possível concluir-se que a sua atuação foi, numa relação de causa-efeito, a causa da situação de insuficiência de património da devedora originária para o pagamento de tais dívidas.
Por outro lado, da matéria de facto provada resulta que quando os oponentes assumiram a administração da sociedade devedora originária, esta já se encontrava numa situação económica e financeira bastante debilitada, tendo sido tomadas medidas no sentido de inverter essa situação, designadamente a redução de pessoal, eliminação de setores de menor rentabilidade, a alienação de património e o reforço de capitais próprios, através do aumento do capital social [esta última medida apenas não se concretizou devido aos entraves colocados por alguns acionistas, e não por facto imputável aos oponentes].
O facto de a sociedade devedora originária apresentar resultados líquidos negativos nos anos de 2006, 2007 e 2008, e de, no ano de 2008, registar um capital próprio negativo de –61.425,00 €, por si só, não significa que a subsistência da sociedade era de todo inviável, pois que, muitas empresas apesar de apresentarem resultados negativos, logram, através da tomada de medidas de gestão adequadas, alcançar a sua sustentabilidade económica e financeira, sem se submeterem a um processo de insolvência ou de recuperação de empresa. Relevante seria que a Administração Tributária demonstrasse que, no caso concreto, independentemente da tomada de quaisquer medidas por parte dos órgãos de administração, esse desfecho era já, em 2008 e 2009, inevitável. A este propósito veja-se ainda o acórdão do TCAN de 10/10/2013, processo n.º 00257/11.1BEPNF:
“1. No domínio da vigência da LGT, para responsabilizar o gerente pelas dívidas de impostos cujo facto tributário se constituiu durante o período da sua administração, é necessária a demonstração pela administração tributária de que aquele teve culpa na insuficiência do património da devedora originária (artigo 24º, nº 1, alínea a), da LGT).
2. Não pode considerar-se que houve culpa do gerente na origem da insuficiência patrimonial da devedora originária apenas pelo facto de não ter requerido a insolvência da empresa, se não resultou provado nos autos que antes de se ter gerado a insuficiência do património social tivesse ocorrido o incumprimento de qualquer obrigação vencida que, pelo seu montante e pelo seu significado no âmbito do passivo, revelasse a impossibilidade de a devedora originária cumprir pontualmente as suas obrigações”.
Por último, o próprio órgão de execução fiscal ao referir que “sem prejuízo óbvio de serem encetadas novas e demais diligências, para lá das já evocadas, para determinação da culpa dos administradores”, parece estar a admitir a insuficiência da prova produzida quanto à culpa dos oponentes pela insuficiência de património da devedora originária para solver as dívidas exequendas.
Por conseguinte, não estando provada a culpa dos oponentes na insuficiência do património da sociedade para satisfação das dívidas exequendas, a decisão a proferir nos autos terá de ser desfavorável à Fazenda Pública nos termos dos artigos 342.º do Código Civil e 74.º da LGT.”
Tendo presente que a sentença conheceu por mor do princípio do dispositivo e do que estipula o artº 608º, nº2, do CPC, da ilegitimidade [substantiva] dos oponentes, é forçoso assentar que nela não se decidiu pela procedência da oposição à execução fiscal com fundamento na falta de fundamentação do despacho de reversão, porque este fundamento nem sequer foi invocado na p.i., sendo esse também o entendimento dos vários intervenientes processuais, que todos eles aceitam que a decisão de procedência da oposição à execução fiscal não tem como fundamento a ilegalidade do despacho de reversão por falta de fundamentação, julgamento que a Recorrente, aliás, não põe minimamente em causa, ao não exercer qualquer crítica quanto ao fundamentado e decidido na sentença.
O que a Recorrente visivelmente não quer aceitar é que a verificação do fundamento de oposição invocado (ilegitimidade [substantiva] dos revertidos nos termos claros que brotam do discurso jurídico da sentença e que transcrevemos para que não sobrem quaisquer dúvidas quanto à causa de pedir e ao pedido formulados na p.i.) determine a extinção da execução fiscal quanto aos Oponentes, como decidiu a sentença.
E isso notoriamente por se tratar de uma decisão de mérito, pretendendo a Fazenda Pública, em desespero de causa, divisando que essa decisão inviabiliza a repetição do acto de reversão, sustentar que a única consequência do vício de forma do despacho de reversão por falta de fundamentação – vício cuja existência só agora alega, não discutindo o julgamento que a sentença fez do único fundamento invocado, aceitando a sentença nessa parte – será a anulação desse despacho que acarretará, segundo ela, a absolvição da instância e não do mérito.
Sendo certo que a consequência da falta da fundamentação do despacho de reversão, vício que é subsumível ao fundamento de oposição à execução fiscal previsto na alínea i) do n.º 1 do art. 204.º do CPPT, fazendo a recorrente tábua rasa do que efectivamente foi decidido, a divergência com a sentença recorrida é unicamente quanto à consequência jurídica que nesta se extraiu da verificação desse (suposto, porque não invocado) vício de forma do acto de reversão: enquanto a sentença julgou extinta a execução fiscal quanto aos Oponentes conhecendo da sua ilegitimidade, a Fazenda Pública entende que a sentença deveria ter determinado a anulação do despacho de reversão (isso porque, evidentemente, a decisão de extinguir a execução fiscal quanto aos Oponentes inviabiliza a possibilidade de o órgão da execução fiscal proferir novo acto (novo despacho de reversão contra a ora Recorrida) em que sanasse o vício que determinaria a sua anulação.
É que, na verdade, os vícios de forma, particularmente o vício de falta ou insuficiência (sendo que a lei equipara esta, nos seus efeitos, àquela, nos termos do disposto no n.º 2 do art. 125.º do Código do Procedimento Administrativo) de fundamentação da reversão, apenas determinam a anulação do acto (cf. art. 163.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo (CPA), não obstando à sua renovação, desde que observado o formalismo em falta, ou seja, desde que expurgado do vício que o afectava.
Todavia, uma decisão de extinção da execução fiscal (como foi a ditada na sentença em crise) pressupondo a avaliação de mérito da matéria controvertida (da pretensão executiva), obsta a que seja renovada a instância.
Na esteira do Acórdão deste STA-SCT de 16-12-2015, tirado no Processo nº 0361/14, disponível em www.dgsi.pt, não se suscita qualquer dúvida de que o vício de falta de fundamentação do despacho de reversão não terá como consequência a extinção da execução fiscal, ainda que restrita aos Oponentes, porquanto a anulação do acto de reversão com fundamento em vício de forma por falta de fundamentação não impede que este seja renovado, para tal bastando que o órgão de execução fiscal pratique novo acto em que enuncie explícita e suficientemente as razões que levaram o seu autor a praticar o acto, a proferir a decisão de fazer prosseguir a execução fiscal contra a ora Recorrida.
Ainda segundo o douto aresto, a oposição à execução fiscal, em regra, tem como escopo a extinção, total ou parcial da execução fiscal, podendo ter também como finalidade a suspensão da execução (A oposição à execução fiscal terá por finalidade a mera suspensão da execução, «nos casos em que seja afectada por qualquer motivo a exigibilidade da dívida, por motivo não definitivo, mas meramente temporário», como, v.g., «nos casos em que o fundamento seja ter existido concessão de uma moratória», nos casos em que exista «obstáculo meramente temporário ao prosseguimento da execução, como a existência de um processo de falência ou de insolvência ou de recuperação de empresa (actualmente, à face do GIRE, de insolvência)», nos casos de «ter sido decidida, por via administrativa, a suspensão da eficácia de um acto de liquidação e, apesar disso, ser instaurada execução», ou «ter sido decidida a suspensão do processo executivo, por autoridades superiores da administração tributária, e o serviço de finanças onde corre termos o processo de execução fiscal não ter efectivado tal suspensão», tudo fundamentos enquadráveis na alínea i) do n.º 1 do art. 204.º do CPPT, como salienta JORGE LOPES DE SOUSA, ob. cit., volume III, anotação 39 ao art. 204.º, pág. 502.).
Mas, como também se destaca no citado acórdão, “…isso não significa que a oposição à execução fiscal, que constitui a contestação à execução fiscal, não possa ter outras finalidades, para além das já referidas extinção e suspensão da execução. A oposição, enquanto contestação, poderá ter também por finalidade a mera absolvição da instância executiva derivada da falta de pressupostos processuais (cfr. arts. 571.º, n.ºs 1 e 2, 576.º, n.ºs 1 e 2, e 577.º, do CPC), à semelhança do que sucede com processo civil, em que a oposição do executado é o meio processual adequado para a invocação de qualquer falta de pressupostos processuais [art. 729.º, alínea c), do CPC]. Na verdade, a oposição à execução fiscal deve entender-se como o meio processual adequado a contestar a pretensão executiva, quer o fundamento invocado seja substancial quer seja meramente formal.
Dito isto, podemos avançar no sentido de que, anulado o despacho de reversão, deixa de haver fundamento legal para que o revertido se mantenha na execução fiscal, configurando-se uma situação, quanto à pretensão executiva, de ilegitimidade passiva enquanto pressuposto processual (cf. art. 30.º, n.º 1, do CPC) (Não confundir com a ilegitimidade prevista na alínea b) do n.º 1 do art. 204.º do CPPT – ilegitimidade substantiva, que assenta na falta de responsabilidade do citado pela dívida exequenda – e que determina a prolação de uma sentença que, conhecendo do mérito, julgue extinta a execução fiscal quanto ao oponente).
Ilegitimidade que, constituindo uma excepção dilatória, não pode conduzir a uma decisão sobre o mérito da pretensão, mas antes impõe que o juiz se abstenha de apreciar o pedido, proferindo uma decisão de absolvição da instância [arts. 278.º, n.º 1, alínea d) e 608.º, n.º 1, do CPC].
Assim, não restando dúvidas de que os vícios formais do despacho de reversão se podem erigir em fundamento de oposição à execução fiscal, integrando a previsão da alínea i) do n.º 1 do art. 204.º do CPPT, a procedência da oposição com esse fundamento terá como consequência, não só a anulação do acto de reversão (que, caso fosse o único efeito jurídico prosseguido, teria como meio processual eventualmente mais adequado a reclamação do art. 276.º do CPPT), mas também a absolvição do oponente da instância executiva.
Absolvição da instância que (contrariamente à extinção da execução fiscal, que constitui uma verdadeira absolvição da pretensão executiva) não impede o órgão da execução fiscal de proferir novo despacho de reversão em que, desta vez fundamentando suficientemente o acto, sane o vício que determinou a anulação.
É neste sentido que tem vindo a decidir este Supremo Tribunal Administrativo (Vide os seguintes acórdãos da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
- de 10 de Outubro de 2012, proferido no processo n.º 726/12, publicado no Apêndice ao Diário da República de 8 de Novembro de 2013 (http://www.dre.pt/pdfgratisac/2012/32240.pdf), págs. 2900 a 2905, também disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/f6c0157a2aaf60b780257aa0002d55f2;
- de 22 de Abril de 2015, proferido no processo n.º 511/14, ainda não publicado no jornal oficial, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/68288fca610e673180257e31003e9309.).”
Pelo que ficou dito, entendemos que o recurso não merece provimento porquanto o único fundamento invocado pelos oponentes e conhecido pela sentença foi a ilegitimidade prevista na alínea b) do n.º 1 do art. 204.º do CPPT – ilegitimidade substantiva, que radica na falta de responsabilidade dos citados pela dívida exequenda – e que determinou a prolação de uma sentença que, conhecendo do mérito, julgou extinta a execução fiscal quanto aos oponentes.
Doutro modo, a recorrente FP parece inculcar que na sentença se omitiu pronúncia sobre a falta de fundamentação do despacho de reversão defendendo até a sua prioridade de conhecimento. Porém, a sentença não tinha a obrigação de conhecer dessa questão que é absolutamente nova e só pela primeira vez suscitada no presente recurso sem que a recorrente, no entanto, claramente argua que a decisão recorrida é nula, em razão do disposto no artigo 615º, n.º 1, d), do CPC, que estatui ser causa de nulidade da sentença em processo judicial a falta de pronúncia sobre questões que o juiz deva apreciar.
Aquela regra comporta a excepção prevista no nº 2 do artº 608º do CPC que estipula que «O juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras». E as questões suscitadas pelas partes e que justificam a pronúncia do Tribunal terão de ser determinadas pelo binómio causa de pedir-pedido. A ser assim e de acordo com a opinião do Prof. J. A. Reis, Anotado, Coimbra, 1984, Vol. V, pág. 58, haverá tantas questões a resolver quantas as causas de pedir indicadas pelo recorrente no requerimento e que fundamentam o pedido.
Mas, mesmo admitindo que a recorrente, embora de forma pouco sacramental, alega a nulidade da sentença por omissão de pronúncia por considerar que não se pronunciou sobre a questão supra identificada e que que devia fazê-lo de modo a acarretar a já falada consequência, afigura-se-nos que não lhe assiste razão como decorre claramente da fundamentação do censurado aresto em que foi decretada a extinção da execução nos termos que na oposição os revertidos fizeram valer.
Um dos princípios estruturantes do direito processual civil é o princípio do dispositivo, a que alude o artigo 5º, n.º 1, do CPC, segundo o qual “às partes cabe alegar os factos que integram a causa de pedir e aqueles em que se baseiam as excepções”.
E a que também se refere o art. 608º, n.º 2, do mesmo CPC, que diz que “o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outra. Não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras”.
Conforme este princípio, cabe às partes alegar os factos que integram o direito que pretendem ver salvaguardado, impondo-se ao juiz o dever de fundamentar a sua decisão nesses factos e de resolver todas as questões por aquelas suscitadas, estando obrigado, por regra, a ocupar-se apenas dessas questões.
A sentença ficará afectada de nulidade, quer no caso de o juiz deixar de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar, quer quando conheça de questões de que não podia tomar conhecimento (art. 615.º, n.º 1, alínea d), do CPC).
Mas importa precisar o que deve entender-se por «questões» cujo conhecimento ou não conhecimento integra nulidade por excesso ou falta de pronúncia.
Como tem sido entendimento pacífico da doutrina e da jurisprudência, apenas as questões em sentido técnico, ou seja, os assuntos que integram o «thema decidendum», ou que dele se afastam, constituem verdadeiras «questões» de que o tribunal tem o dever de conhecer para decisão da causa ou o dever de não conhecer, sob pena de incorrer na nulidade prevista no art. 615º/1/d) do CPC.
Há, assim, que distinguir as verdadeiras questões dos meros “raciocínios, razões, argumentos ou considerações”, invocados pelas partes e de que o tribunal não tenha conhecido ou que o tribunal tenha aduzido sem invocação das partes [Ver Abílio Neto In “Código do Processo Civil”, Anotado, 14.ª ed., pág. 702 e Acórdão da Relação de Lisboa, de 2.07.1969, publicado JR, 15.].
Num caso como no outro não está em causa omissão ou excesso de pronúncia.
No que concerne à falta de pronúncia dizia Alberto dos Reis, que «são na verdade coisas diferentes: deixar de conhecer de questão de que devia conhecer-se e deixar de apreciar qualquer consideração, argumento ou razão produzida pela parte. Quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão» [In Código de Processo Civil, Anotado, Volume V, pg. 143].
Do que se conclui que apenas as questões essenciais, questões que decidem do mérito do pleito ou, convenhamos, de um problema de natureza processual relativo à validade dos pressupostos da instância, é que constituem os temas de que o julgador tem de conhecer, quando colocados pelas partes, ou não deve conhecer na hipótese inversa, sob pena de a sentença incorrer em nulidade por falta de pronúncia ou excesso de pronúncia.
Obviamente, sempre salvaguardadas as situações onde seja admissível o conhecimento oficioso do tribunal, o que não como acontecia no caso concreto – a falta de fundamentação do despacho de reversão não assume uma tal natureza.
Por último, importa não confundir a nulidade por falta ou excesso de conhecimento com o erro de julgamento, que se verifica quando o juiz não decide acertadamente, por decidir «contra legem» ou contra os factos apurados [vd A. dos Reis, In “Código de Processo Civil”, Anotado, Volume V, pg. 130].
Ora, no caso em apreciação, o tribunal recorrido conheceu de questão de que devia conhecer pelo que, independentemente da maior ou menor validade da argumentação seguida no aresto recorrido, o certo é que não se está, de modo algum, em presença de omissão de pronúncia mas apenas em face do desenvolvimento de um raciocínio no âmbito da ponderação da única questão (causa de pedir) invocada na p.i., no caso a atinente à ilegitimidade substantiva dos oponentes como se vê claramente do discurso jurídico da sentença recorrida e que acima se focou.
Daí, pois, que não seja de admitir minimamente que a sentença enferma de tal vício decisório.
De tudo quanto ficou dito, resulta que a recorrente nada mais intenta do que pretender um julgamento sobre uma questão inteiramente nova, não arguindo qualquer vício que possa inquinar os fundamentos da decisão recorrida.
Os recursos são meio de impugnação das decisões dos tribunais inferiores, o seu objecto tem de cingir-se em regra à parte dispositiva destas, encontrando-se, portanto, objectivamente limitado pelas questões postas ao tribunal recorrido.
Patenteando as conclusões alegatórias que, afinal, a recorrente nelas não imputa à sentença qualquer vício consistente em erro de determinação, aplicação ou interpretação de normas que constituam o seu suporte jurídico, inexiste específica crítica à legalidade da decisão que justifique a sua apreciação pelo Tribunal Superior.
Porque no recurso jurisdicional apenas podem estar em causa os vícios ou erros de julgamento, o recurso jurisdicional deve consistir num pedido de reapreciação do julgamento e não de qualquer outra questão não suscitada.
Decorrendo do corpo alegatório do recurso jurisdicional e das respectivas conclusões que a recorrente não atacou a legalidade da sentença, em tais circunstâncias não é de conhecer o recurso ou é de considerar o mesmo improcedente.
Isso porque, se o recurso jurisdicional tem por objecto as decisões judiciais recorridas, tal obrigava a recorrente a dirigir a sua crítica à sentença, pelos erros que esta cometeu e que devem conduzir à sua revogação, improcedendo o recurso se a recorrente, na sua alegação, não faz qualquer referência crítica às razões e fundamentos da sentença.
Não tendo o recorrente atacado os fundamentos do acórdão recorrido que sustentam a anulação, antes pretendendo que o Tribunal de recurso aprecie uma questão que a sentença recorrida não apreciou por não a poder apreciar, sem que ponha em causa esta pronúncia do tribunal a quo, deixou incólume a sua pronúncia que não pode ser sindicada pelo tribunal de recurso.
Como não foi arguido qualquer vício que possa afectar a decisão recorrida, antes se limita o recorrente a pretender um novo julgamento sobre a nova causa petendi e o pedido executivo, e sendo o objecto do recurso jurisdicional a sentença, deve ser negado provimento ao presente recurso e mantida a decisão recorrida.
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3.- DECISÃO

Nesta conformidade, acordam, em conferência, os Juízes da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em negar provimento ao recurso e manter a decisão recorrida.

Custas pela recorrente.

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Lisboa, 1 de Julho de 2020. - José Gomes Correia (relator) – Aníbal Augusto Ruivo Ferraz – Paula Fernandes Cadilhe Ribeiro.