Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0608/13.4BEALM 0245/18
Data do Acordão:11/18/2020
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ANÍBAL FERRAZ
Descritores:IMPUGNAÇÃO JUDICIAL
OBJECTO
Sumário:I - Nos processos de impugnação judicial, apresentados na sequência de decisões, dos serviços competentes da autoridade tributária e aduaneira (AT) e equivalentes, como neste caso, dos serviços e responsáveis camarários, de indeferimento (mesmo que, por motivos formais) de reclamações graciosas, recursos hierárquicos e/ou pedidos de revisão oficiosa dos atos tributários, há muito, a jurisprudência, do STA, identificou (e vem afirmando) a existência de um objeto imediato (a decisão da reclamação….) e de um objeto mediato (os vícios, concretamente, imputados ao ato tributário de liquidação).
II - O meio processual tributário de impugnação judicial é de acionar em todas as situações onde se visem atos relativos a questões tributárias que impliquem, contendam com a apreciação (de qualquer ilegalidade) do ato de liquidação, ainda que, no mesmo processo se tenham de versar e dirimir questões relacionadas, em exclusivo, com um procedimento de cariz administrativo, quando este tenha tido, previamente, lugar.
III - Por contraposição, o meio processual da ação administrativa só pode utilizado, quando as questões tributárias levantadas (no procedimento administrativo e no tribunal) não impliquem apreciar-se da legalidade do ato de liquidação.
Nº Convencional:JSTA000P26756
Nº do Documento:SA2202011180608/13
Data de Entrada:03/07/2018
Recorrente:EDP DISTRIBUIÇÃO - ENERGIA, S.A.
Recorrido 1:MUNICÍPIO DE PALMELA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral:
Acórdão proferido no Supremo Tribunal Administrativo (STA), com sede em Lisboa;

# I.


EDP Distribuição - Energia, S.A., com os demais sinais dos autos, recorre da sentença proferida, no Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Almada, em 7 de novembro de 2017, que, nesta impugnação judicial, dirigida contra ato de liquidação de “taxas relativas à ocupação do espaço público municipal de Palmela, com infra-estruturas e outros equipamentos afectos às redes de alta e média tensão de distribuição de energia eléctrica, durante o ano de 2012, no valor global de € 880.412,14”, decidiu: «

Em face do anteriormente exposto, o Tribunal julga:

- Procedente, por provada, a excepção dilatória inominada da impropriedade do presente meio processual relativamente ao pedido de revogação da decisão do Presidente do Município de Palmela sobre o pedido de revisão, e, consequentemente, absolve o Município da instância quanto a este pedido (…);

- Improcedente, por não provada, a excepção dilatória inominada da caducidade do direito de acção;

- Improcedente a presente impugnação, por não provada, no que respeita ao pedido de anulação do acto de liquidação das taxas.»

A recorrente (rte) apresentou alegação, finalizada com as seguintes conclusões: «

1.ª Na presente ação de impugnação judicial discute-se, a título principal, a ilegalidade, por violação abstrata do disposto no artigo 3.º, n.º 4, do Decreto-Lei n.º 230/2008, de 27 de novembro, do ato de liquidação das taxas relativas à ocupação do espaço público municipal de Palmela, com infraestruturas e outros equipamentos afetos às redes de alta e média tensão de distribuição de energia elétrica, durante o ano de 2012, no montante global de € 880.412,14 (oitocentos e oitenta mil, quatrocentos e doze euros e catorze cêntimos) e, paralelamente, a ilegalidade da decisão de indeferimento do pedido de promoção de revisão oficiosa do referido ato de liquidação.

2.ª Chamado a pronunciar-se sobre os pedidos formulados na presente ação de impugnação judicial, o Tribunal a que considerou, por um lado, o presente meio processual inidóneo para sindicar a decisão que recaiu sobre o pedido de promoção de revisão oficiosa e julgou, por outro lado, improcedente o pedido de anulação do identificado ato de liquidação.

3ª Como decorre da Sentença recorrida, o Tribunal a que fundamentou as decisões enunciadas, no seguinte: (i) que o meio processual para sindicar a decisão administrativa de indeferimento do pedido de revisão oficiosa seria a Acção Administrativa Especial; (ii) no que respeita à questão de fundo, embora tenha começado por reconhecer que «aparentemente, a partir da entrada em vigor do [Decreto-lei n.º 230/2008, de 27 de novembro] efectuado que seja a renda anual pelas concessionárias aos municípios, ficariam as mesmas dispensadas do pagamento de taxas pela utilização de bens», o Tribunal a quo acabou por concluir que este (novo) regime não se aplica ao caso sub judice, porquanto «Do regime transitório [vertido no artigo 4.° do Decreto-lei n.º 230/2008, de 27 de novembro] decorre claramente que todos os municípios que se encontrassem nas condições ali dispostas, continuar-se-ia a aplicar o regime da Portaria [nº 437/2001, de 28 de abril]» até ao ano de 2012.

4.ª Sucede, porém, que, ambas as decisões contidas na Sentença recorrida assentam em erro sobre os respetivos pressupostos de direito.

5.ª Com efeito, e começando pela questão referente à idoneidade do processo de impugnação judicial para apreciar a decisão de indeferimento do pedido de promoção de revisão oficiosa, faz-se notar que do n.º 2 do artigo 97.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário «resulta claramente [a contrario] que, nos casos em que o acto a impugnar é um acto de liquidação ou um acto que comporta a apreciação da legalidade de um acto de liquidação (acto de indeferimento de reclamação graciosa ou de recurso hierárquico interposto da decisão que a aprecie ou acto de apreciação de pedido de revisão oficiosa, nos termos do art. 78.° da LGT) o meio adequado é o processo de impugnação» (JORGE LOPES DE SOUSA, Código de Procedimento e de Processo Tributário Anotado e Comentado, 6ª edição, vol. II, página 53) (no mesmo sentido, vide Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 8 de julho de 2009, processo n.º 306/09).

6.ª Significa, isto, por conseguinte, que se a decisão de indeferimento do pedido de revisão oficiosa tem ínsita a apreciação da (i)legalidade do ato de liquidação, pode (rectius, deve) a mesma ser sindicada através do processo de impugnação judicial.

7.ª Ora, como se infere da decisão de indeferimento do pedido de promoção de revisão oficiosa sob apreciação é indubitável que a mesma comporta um juízo de (i)legalidade sobre o ato de liquidação das taxas de ocupação das taxas de ocupação do espaço público municipal de Palmela do ano de 2012.

8.ª Consequentemente, impõe-se concluir que a presente ação de impugnação judicial constitui o meio processual apto e idóneo para sindicar a referida decisão administrativa.

9.ª Já quanto à questão principal, começa-se por sublinhar que o artigo 3.º, n.º 4, do Decreto-Lei n.º 230/2008, de 27 de novembro, dispõe, preclaramente, que a «obrigação de pagamento da renda anual pelas concessionárias da atividade de distribuição de energia elétrica em baixa tensão fica sujeita à atribuição efetiva da utilização dos bens do domínio público municipal, nomeadamente do uso do subsolo e das vias públicas para estabelecimento e conservação de redes aéreas e subterrâneas de distribuição de eletricidade em alta, média e baixa tensão afetas ao Sistema Elétrico Nacional (SEN), com total isenção do pagamento de taxas pela utilização desses bens» (os destacados são da RECORRENTE).

10.ª Dito de outro modo, o legislador determinou de forma inequívoca, através do artigo 3.º, n.º 4, do Decreto-Lei n.º 230/2008, de 27 de novembro, que a utilização dos bens do domínio público municipal por parte das concessionárias da atividade de energia elétrica, com infraestruturas e outro equipamento de alta, média e baixa tensão, é comutada pela renda anual paga nos termos do Contrato de Concessão de Distribuição de Energia Elétrica em Baixa Tensão, «com [a consequente] total isenção do pagamento de taxas pela utilização desses bens”.

11.ª Neste sentido, impondo o artigo 3.º, n.º 4, do Decreto-Lei n.º 230/2008, de 27 de novembro, os municípios sejam financeiramente compensados pela utilização do seu espaço público com as infraestruturas de distribuição de eletricidade em alta, média e baixa tensão através da obtenção da renda anual prevista no mencionado Contrato de Concessão de Distribuição de Energia Elétrica em Baixa Tensão, qualquer taxa municipal dirigida a comutar a mesma utilização é, inexoravelmente, ilegal.

12.ª Por seu turno, contrariamente ao que vem defendido na Sentença recorrida, é indubitável que o artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 230/2008, de 27 de novembro, não fez estender a aplicação da Portaria 437/2001, de 28 de abril, até ao ano de 2012, e que o regime vertido no artigo 3.º, n.º 4, do referido diploma legal se aplica ao caso concreto.

13.ª Assim, recorde-se que artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 230/2008, de 27 de novembro, determina que «Os municípios que, à data da entrada em vigor do presente decreto-lei, se encontrem ao abrigo do regime estabelecido no n.º 5º da Portaria n.º 437/2001, de 28 de Abril, mantêm o referido regime no máximo até 2012» (os destacados são da RECORRENTE).

14.ª Por conseguinte, o sentido extraível do elemento literal contido no artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 230/2008, de 27 de novembro, é, claramente, o de que o legislador se limitou a estabelecer o regime transitório do n.º 5.º da Portaria n.º 437/2001, de 28 de abril (e não, como vem defendido na Sentença recorrida, o regime transitório da referida Portaria).

15.ª De resto, a interpretação que se retira do enunciado linguístico contido no artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 230/2008, de 27 de novembro, é plenamente confirmado por uma segunda fase do processo hermenêutico, em que se apela ao elemento teleológico e que impõe que a norma seja entendida em função da finalidade para que foi criada (a ratio juris).

16.ª Com efeito, o n.º 5 da Portaria n.º 437/2001, de 28 de abril, determina que «Da reclassificação de um município, decorrente do acréscimo da sua densidade, e da consequente redução da percentagem sobre o valor das vendas não pode resultar a imediata redução do valor anual da renda, o qual se manterá fixo enquanto não for ultrapassado pela aplicação normal daqueles fatores».

17.ª Por outras palavras, o legislador atribuiu aos municípios concedentes — através do n.º 5 da Portaria n.º 437/2001, de 28 de abril — o direito a manter inalterado (rectius, a não ver reduzido) o valor da renda anual em resultado das oscilações da respetiva densidade populacional.

18.ª Assim, é manifesto que o objetivo principal — ou melhor dito, exclusivo — do regime transitório vertido no artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 230/2008, de 27 de novembro, foi o de manter a aplicação daquela norma de salvaguarda (o n.º 5 da Portaria n.º 437/2001, de 28 de abril) até 2012 e, assim, garantir a constância do valor anual da renda a favor do município concedente, não obstante a alteração da respetiva densidade populacional.

19.ª A finalizar, e travejando adicionalmente o que se afirma, sublinha-se que a interpretação acima alcançada é plenamente confirmada pelo preâmbulo do Decreto- Lei n.º 230/2008, de 27 de novembro, onde se esclarece, preclaramente, a propósito da ratio juris da disposição legal em análise, que «face à densidade verificada em determinados municípios em 2007 e aos eventuais decréscimos que, com a aplicação da nova fórmula, decorreriam para as rendas a pagar aos municípios que se encontravam sujeitos ao regime estabelecido no n.º 5 da Portaria n.º 437/2001, de 28 de Abril, determina-se um regime transitório de manutenção do valor da renda aplicável a esses municípios entre 2009 e 2012».

20.ª Por último, faz-se notar que Decreto-Lei n.º 230/2008, de 27 de novembro, que entrou em vigor no dia 28 de novembro de 2008, revogou a Portaria 437/2001, de 28 de abril. Ora, caso tivesse pretendido manter, in totum, o regime vertido na referida Portaria, o legislador não teria, certamente, procedido à sua revogação (em rigor, o legislador não teria, sequer, instituído em 2008 o novo regime da renda).

21.ª Em face de todo o exposto, impõe-se concluir que o artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 230/2008, de 27 de novembro, não estendeu, contrariamente ao que vem defendido na Sentença recorrida, a aplicação do regime vertido na Portaria 437/2001, de 28 de abril, até ao ano de 2012, e que o artigo 3.º, n.º 4, daquele diploma legal produziu plenamente os seus efeitos desde o dia 28 de novembro de 2008 (cf. artigo 8.° do Decreto-Lei n.º 230/2008, de 27 de novembro).

22.ª Consequentemente, considerando que o ato de liquidação sub judice diz respeita a taxas de ocupação do ano de 2012, impõe-se concluir que lhe é aplicável o regime constante do artigo 3.º, n.º 4, do Decreto-Lei n.º 230/2008, de 27 de novembro, sendo o mesmo, por conseguinte, ilegal.

Termos em que deve ser dado provimento ao recurso interposto pela recorrente e, em consequência, ser revogada a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada, determinando-se, em consequência, tal como anteriormente peticionado, a anulação dos atos tributários impugnados, em particular o ato de liquidação das taxas relativas à ocupação do espaço publico municipal de Palmela, com infraestruturas e outros equipamentos afetos às redes de alta e média tensão de distribuição de energia elétrica. Durante o ano de 2012. No montante global de € 880.412,14 (oitocentos e oitenta mil, quatrocentos e doze euros e catorze cêntimos), com todas as consequências legais, designadamente com a condenação do recorrido no pagamento dos correspondentes juros indemnizatório.»


*

O Município de Palmela, na condição de recorrido (rdo), apresentou contra-alegação, que termina concluindo: «

1. O processo de impugnação não é o meio processual próprio para reagir contra o despacho de indeferimento de um pedido de revisão oficiosa com o fundamento em extemporaneidade do pedido;

2. A ação administrativa especial é o meio processual adequado para atacar um ato de indeferimento total ou parcial de questões tributárias que não comportem a apreciação da legalidade de um ato de liquidação;

3. Em sede de impugnação judicial não pode um Tribunal anular os atos administrativos dos órgãos de um Município que indeferiram um pedido de revisão oficiosa com o fundamento na extemporaneidade;

4. O indeferimento do pedido de revisão oficiosa é um ato administrativo de eficácia externa, suscetível de lesar direitos ou interesse legalmente protegidos, não comportando qualquer apreciação da legalidade do ato de liquidação, não dizendo respeito à legalidade da liquidação do tributo mas sim à legalidade da relação jurídica administrativa;

5. Do contrato de concessão celebrado entre a recorrente e o recorrido não resulta, ao contrário do alegado, qualquer isenção da taxa devida pela ocupação do domínio público municipal mediante a instalação de infra-estruturas de Média e Alta Tensão;

6. O Decreto-Lei n.º 230/2008, de 27 de Novembro destina-se única e exclusivamente a regular a remuneração dos contratos de concessão da distribuição em Baixa Tensão;

7. O contrato de concessão em Baixa Tensão, celebrado entre o Município de Palmela e a EDP, excluiu expressamente as infraestruturas de Média Tensão e Alta Tensão;

8. A utilização de solo municipal com infraestruturas da distribuição em Alta e Média Tensão, alcança-se por força de outros normativos que não do Decreto-Lei n.º 230/2008, de 27 de Novembro;

9. Do contrato de Concessão, resulta evidente que, quer a renda devida, quer as isenções concedidas, respeitam apenas e só à distribuição de energia elétrica em Baixa Tensão e não à distribuição em Média e Alta Tensão;

10. As linhas de Média e Alta Tensão não estão isentas de pagamento das contrapartidas pelo uso do domínio público municipal, sendo que, as taxas liquidadas correspondem precisamente à utilização do domínio público municipal;

11. As taxas liquidadas e impugnadas configuram-se como verdadeiras taxas pela utilização e aproveitamento de bens do domínio público e privado municipal e dessa utilização e aproveitamento resultam vantagens patrimoniais para a recorrente;

12. Do contrato celebrado não resulta qualquer isenção de taxas pela utilização de linhas de Média e Alta Tensão, não se encontrando o uso destas comutado pela renda paga no âmbito da concessão;

13. Carece de qualquer fundamento a invocação da ilegalidade do ato de liquidação, não merecendo a douta sentença objeto do presente recurso qualquer censura, fazendo uma correta análise e apreciação à questão da situação em concreto.

Nestes termos,

Deve ser julgado improcedente o presente recurso e confirmada a douta sentença recorrida, como é de JUSTIÇA »


*

O Exmo. Procurador-geral-adjunto emitiu parecer.

*

Cumpridas as formalidades legais, compete conhecer e decidir.

*******

# II.


Na sentença, em sede de julgamento factual, encontra-se exarado: «

(…).
Compulsados os autos e analisada a prova documental, encontram-se assentes, por provados, os seguintes factos com interesse para a decisão de mérito:

1. Em 14 de Setembro de 2000, foi atribuída à Impugnante, pelo Director-Geral da Energia (em representação do Estado), a Licença vinculada de distribuição de energia eléctrica em Média Tensão e Alta Tensão no território do Continente, nos termos previstos no Decreto-Lei n.º 182/95, de 27 de Julho (cfr. doc. Junto a fls. 32 e segs. junto aos autos);

2. Em 25-02-2009, foi celebrado Contrato de Concessão da Actividade de Distribuição de Electricidade através da Rede Eléctrica Nacional de Distribuição de Electricidade em Média e Alta Tensão (cfr. doc. junto a fls. 43 e segs. junto aos autos, cujo teor aqui se dá por reproduzido);

3. Em 03/07/2002, foi celebrado entre a Impugnante e o Município de Palmela um Contrato de Concessão de Distribuição de Energia Eléctrica em Baixa Tensão no Município de Palmela (cfr. doc. junto a fls. 75 a 96 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido);

4. Por oficio de 14/12/2012 foi a impugnante notificada da liquidação da taxa municipal de ocupação ou utilização do solo e/ou subsolo e/ou espaço aéreo Municipal de Palmela ao qual foi anexo a factura nº 28057 de 13/12/2012 no montante de € 880.412,14, referente a cabos de Alta e média tensão (cfr. 101 a 103);

5. Em 18/02/2013 a impugnante deduziu um pedido de revisão oficiosa do acto de liquidação identificado no ponto anterior (cfr. doc. junto a fls. 104 a 106 dos autos);

6. Em 25/03/2013 foi elaborado o Parecer 31/ CF /2013, do qual consta que o pedido de revisão, datado de 18/02/2012, formulado nos termos do artigo 78°, n. ° 1, se mostra, em consequência, extemporâneo (cfr. doc. junto a fls. 108 a 112 dos autos)

7. Por despacho de 06/04/2013, a Presidente da Câmara de Palmela, aprovou o parecer identificado no ponto anterior e indeferiu o pedido da Impugnante melhor identificado no ponto 3 (cfr. doc. junto a fls. não numeradas do processo instrutor junto aos autos);

(…). »

***

São duas as questões suscitadas pela rte, ambas, reconduzíveis à imputação de errado julgamento, por parte da sentença recorrida, quanto “à idoneidade do processo de impugnação judicial para apreciar a decisão de indeferimento do pedido de promoção de revisão oficiosa” e em relação ao mérito da causa, respeitante à invocada ilegalidade e pedido de anulação do ato de liquidação de taxa, por parte do município de Palmela. Além do mais, pela ordem por que foram suscitadas, passamos a debruçar-nos sobre o primeiro erro identificado, nos, precisos, termos utilizados pela impetrante.

Para se julgar procedente a exceção da impropriedade da utilização deste processo de impugnação judicial, relativamente à decisão, do presidente do município de Palmela, que recaiu sobre o pedido (da impugnante) de revisão do ato de liquidação de taxa, do ano de 2012, afirmando a sua extemporaneidade, no tribunal recorrido, foi entendido, em síntese, que, tendo, nesta impugnação judicial, sido pedido, além da revogação dessa decisão do responsável municipal, “também a revogação/anulação dos atos da liquidação da taxa”, o meio processual utilizado era adequado para conhecer e decidir deste segundo pedido, mas, não do primeiro, que deveria ser/ter sido objeto de uma ação administrativa (especial). Consequentemente, a solução consistiu em absolver o município da instância, quanto à pedida revogação do despacho, do seu presidente, no sentido do indeferimento do pedido de revisão do ato de liquidação de taxa municipal de ocupação ou utilização do solo e/ou do subsolo e/ou espaço aéreo, por formulado fora do prazo disponibilizado por lei e prosseguir com a apreciação da ilegalidade atribuída ao mesmo ato, concluindo, a final, pela sua não verificação.

Nos processos de impugnação judicial, apresentados na sequência de decisões, dos serviços competentes da autoridade tributária e aduaneira (AT) e equivalentes, como neste caso, dos serviços e responsáveis camarários, de indeferimento (mesmo que, por motivos formais) de reclamações graciosas, recursos hierárquicos e/ou pedidos de revisão oficiosa dos atos tributários, há muito, a jurisprudência, do STA, identificou (e vem afirmando) a existência de um objeto imediato (a decisão da reclamação….) e de um objeto mediato (os vícios, concretamente, imputados ao ato tributário de liquidação) (Cf., v.g., acórdãos de 16 de novembro de 2011 (0723/11) e de 18 de junho de 2014 (01942/13).).

Como é evidente e objetivo, este entendimento parte do pressuposto, necessário, de que, em situações do género, o meio processual adequado, para os interessados atacarem, contenciosamente, as decisões de indeferimento dos aludidos processos/procedimentos administrativos e, concomitantemente, verem analisados os vícios colados ao ato de liquidação (de impostos, taxas….) em causa, é, unicamente (Em vez da utilização, como se defende na sentença aprecianda, da ação administrativa para uma pretensão e da impugnação judicial, para outra.), o processo de impugnação judicial, com as condições e trâmites, positivados nos artigos (arts.) 99.º a 133.º-A do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT). O exclusivo requisito/condição exigida, para que, sempre, seja esta a forma de processo a utilizar, é a verificação e conclusão de o, prévio, procedimento administrativo, casuisticamente, ativado, envolver, dizer respeito, à liquidação de tributos, estaduais, regionais e/ou locais. Portanto, numa formulação genérica, o meio processual tributário de impugnação judicial é de acionar em todas as situações onde se visem atos relativos a questões tributárias que impliquem, contendam com a apreciação (de qualquer ilegalidade) do ato de liquidação, ainda que, no mesmo processo se tenham de versar e dirimir questões relacionadas, em exclusivo, com um procedimento de cariz administrativo, quando este tenha tido, previamente, lugar; por contraposição, o meio processual da ação administrativa só pode utilizado, quando as questões tributárias levantadas (no procedimento administrativo e no tribunal) não impliquem apreciar-se da legalidade do ato de liquidação.

Posto isto, resulta, imediatamente, evidente o erro de julgamento perpetrado na sentença, ao decidir julgar “Procedente, por provada, a excepção dilatória inominada da impropriedade do presente meio processual relativamente ao pedido de revogação da decisão do Presidente do Município de Palmela sobre o pedido de revisão, e, consequentemente, absolve o Município da instância quanto a este pedido (…)”. Efetivamente, versando, sem dúvidas, o pedido de revisão, apresentado à entidade liquidadora, pela impugnante, em 18 de fevereiro de 2013, “… liquidação da taxa municipal de ocupação ou utilização do solo e/ou subsolo e/ou espaço aéreo Municipal de Palmela ao qual foi anexo a factura nº 28057 de 13/12/2012 no montante de € 880.412,14, referente a cabos de Alta e média tensão” - pontos 6. e 7. dos factos provados, a decisão do mesmo, ainda que, de indeferimento por extemporaneidade, tinha, como foi, de ser, judicialmente, atacada, no mesmo processo impugnatório, em que, a lesada, insistiu na ilegalidade do ato de liquidação da taxa, pelos vícios não avaliados pela entidade administrativa. Recorrendo à distinção inicial, o objeto imediato, desta impugnação judicial, traduz-se em conferir do acerto (ou não) da decisão de indeferir o procedimento de revisão e o objeto mediato (se não for prejudicado pelo sentido do veredicto referente ao objeto imediato) implica a apreciação da, eventual, relevância dos vícios, concretamente, imputados, pela impugnante, ao ato tributário de liquidação, da supra identificada taxa.

Em suma, a sentença sob crítica tem de ser revogada, desde já, por erro de julgamento, quanto à procedência da mencionada “excepção dilatória inominada da impropriedade do presente meio processual…”, o que provoca, impõe, sem mais, a necessidade de o tribunal de 1.ª instância conhecer e decidir, do objeto imediato desta impugnação judicial, isto é, tem de versar, nos quadrantes factuais e jurídicos, em primeiro lugar, a legalidade da decisão, do presidente da câmara de Palmela, de indeferir o pedido de revisão do ato de liquidação da disputada taxa e, em seguida, se possível (não ficar prejudicado), nos mesmos registos, do seu objeto mediato, ou seja, os vícios imputados, pela impugnante, ao ato tributário de liquidação da taxa municipal de ocupação ou utilização do solo e/ou subsolo e/ou espaço aéreo municipal de Palmela, por cabos de alta e média tensão, corporizado na fatura nº 28057, de 13 de dezembro de 2012, no montante de € 880.412,14.

Nos termos e para os efeitos do art. 635.º n.º 2 do Código de Processo Civil (CPC), registamos que a revogação, a decretar de seguida, não abrange, por virtude do trânsito em julgado, o decidido, na 1.ª instância, em matéria de caducidade do direito de impugnar.

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# III.


Ante o exposto, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, acordamos:

- conceder provimento ao recurso e revogar a sentença recorrida, exceto, na parte em que fundamentou e decidiu julgar “- Improcedente, por não provada, a excepção dilatória inominada da caducidade do direito de acção;”;

- remeter os autos, ao TAF de Almada, para os fins acima definidos.


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Custas pelo recorrido.

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[ Texto redigido em meio informático e revisto, com versos em branco ]


Lisboa, 18 de novembro de 2020. – Aníbal Ferraz (relator) – Paula Cadilhe Ribeiro – Francisco Rothes.