Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01055/03
Data do Acordão:01/14/2004
Tribunal:3 SUBSECÇÃO DO CA
Relator:COSTA REIS
Descritores:DIRIGENTE SINDICAL.
DISPENSA DE SERVIÇO.
GREVE.
FUNÇÃO PÚBLICA.
FALTA JUSTIFICADA.
REMUNERAÇÃO.
Sumário:I - De harmonia com o que se estabelece no art.º 12.º do DL 84/99, de 19/3, os dirigentes sindicais da Administração Pública gozam do direito de verem as faltas dadas no exercício da acção sindical ser consideradas justificadas e de parte destas serem remuneradas.
II - Todavia, aqueles dirigentes, durante o exercício da actividade sindical, não rompem os vínculos que os ligam à função pública e, porque assim, continuam obrigados aos seus deveres funcionais, designadamente aos deveres de assiduidade e subordinação.
III - O exercício da actividade sindical dos professores levanta problemas específicos resultantes da natureza particular da função docente, o que justifica que os mesmos, durante aquele exercício, possam ficar dispensados, total ou parcialmente, da docência. Todavia, esta dispensa não significa que os mesmos fiquem dispensados de todo e qualquer serviço e, consequentemente, do dever de assiduidade, pois que nas escolas podem desenvolver-se muitas outras actividades para além da docência.
IV - Nos termos do art.º 19.º do DL 110/99, de 31/3, as faltas ocorridas durante o período de greve consideram-se justificadas e presumem-se motivadas pelo exercício deste direito, presunção que pode ser ilidida por declaração em contrário do trabalhador.
Nº Convencional:JSTA00060179
Nº do Documento:SA12004011401055
Data de Entrada:06/02/2003
Recorrente:SE DA ADMINISTRAÇÃO EDUCATIVA
Recorrido 1:A...
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL.
Objecto:AC TCA.
Decisão:PROVIDO.
Área Temática 1:DIR ADM GER.
Legislação Nacional:DL 84/99 DE 1999/03/19 ART1 ART12 ART33 ART34.
DL 110/99 DE 1999/03/31 ART19.
CPA91 ART100.
Aditamento:
Texto Integral: A... interpôs, no Tribunal Central Administrativo, recurso contencioso de anulação do despacho, de 21/9/01, do Sr. Secretário de Estado da Administração Educativa, que indeferiu o recurso hierárquico interposto do despacho de indeferimento da sua reclamação do acto de processamento do seu vencimento relativo ao mês de Maio de 2001, para o que alegou que o mesmo era nulo – ofendia o direito à retribuição pelo seu trabalho e o direito ao exercício de funções sindicais, constitucionalmente consagrados – ou, no mínimo, anulável – por erro nos pressupostos de facto, por violar o disposto no art.º 7.º, n.º 1, da Lei 65/77, bem como no art.º 19.º, n.º 1, da Lei 100/99, conjugados com os art.s 12.º a 15.º do DL 84/99, preterição de formalidade essencial (audiência prévia).
Pelo douto Acórdão de 20/2/03 (pgs. 193 a 204) foi concedido provimento ao recurso e anulado o acto impugnado .
Inconformada com esse julgamento a Autoridade Recorrida agravou para este Tribunal rematando a sua alegação com a formulação das seguintes conclusões :
1. Como acima se defendeu, o Tribunal a quo não procedeu a uma correcta interpretação do Direito aplicável, enfermando a Sentença ora posta em crise de vício de violação da lei.
2. De facto, o Tribunal a quo pressupôs, erradamente, que o docente e dirigente do SPRC usufruía de uma dispensa total de serviço, para o desempenho das suas funções de dirigente sindical, estando, por esse motivo, desvinculado dos deveres de subordinação e assiduidade e, consequentemente, desobrigado de comparecer no local de trabalho, no dia 30.03.2001, dia em que ocorreu uma greve de professores decretada pelo Sindicato de que é dirigente, não sendo, por isso, abrangido pela presunção legal contida no n.o 2 do art.º 19.° do Decreto-Lei n.º 100/99, de 31.03. Ora,
3. Como já se demonstrou nas Alegações aqui produzidas, apenas lhe fora concedida uma dispensa da componente lectiva, ao abrigo do Despacho 68/M/82, não para exercer funções no Sindicato do qual era dirigente mas, para conciliar os dois interesses públicos em presença, garantir o direito dos alunos à educação e ao ensino e o direito ao livre exercício da actividade sindical por parte do professor. Na verdade,
4. Sendo professor do 1.° CEB a exercer funções em regime de monodocência (único professor da turma) os seus alunos seriam altamente lesados se, enquanto dirigente sindical, fizesse uso dos direitos que a lei lhe confere de faltar ao serviço com ou sem perda da remuneração, nos termos previstos nos art.ºs 12.° e 15.° do DL 84/99, de 19.03.
5. Ora, competindo ao Ministério da Educação zelar pelos direitos e interesses dos alunos, foi-lhe concedida, ao abrigo do Despacho 68/M/82, a dispensa de serviço docente, ou seja, a dispensa da componente lectiva que constitui, de facto, a essência da função docente, para que os alunos da turma que lhe fosse atribuída não ficassem lesados dada a enorme probabilidade de faltar ao serviço por motivo do desempenho das suas funções de dirigente sindical, nos termos do DL acima referido. Todavia,
6. A dispensa da componente lectiva, nos termos em que lhe foi concedida, não têm a abrangência que o Tribunal a quo lhe atribuiu, e que, além do mais, sempre seria ilegal, por violação do disposto no Decreto-Lei n.º 84/99, de 19.03, que não consagra a dispensa de serviço para o desempenho de funções de dirigente sindical, e dos princípios gerais de Direito consagrados nos artigos 3.° a 6.° do CPA. Com efeito,
7. Se aos docentes e dirigentes sindicais fosse concedida uma dispensa de serviço com a amplitude que a Sentença recorrida acolhe, essa dispensa constituiria um claro favorecimento dos sindicatos de professores face a todos os outros sindicatos de trabalhadores da função pública, concedendo aos dirigentes que dela beneficiassem um crédito de faltas remuneradas equivalente aos dias úteis de cada ano lectivo, sem prejuízo dos dirigentes do mesmo Sindicato, que não estivessem dispensados, usufruírem das regalias previstas no Decreto-Lei nº 84/99, de 19.03, o que se nos afigura inconcebível num Estado de Direito. Porém,
8. A dispensa total de serviço docente, entendida em sentido estrito, como a dispensa total da componente lectiva não contraria o disposto naquele Decreto-Lei nem viola os princípios gerais de Direito que incumbem sobre a Administração, já que os professores a quem é concedida não ficam desobrigados do cumprimento do horário de trabalho de 35 horas semanais, previsto no art.° 76.°, n.º 1. do ECD, prestado na totalidade a nível da componente não lectiva, nos termos conjugados dos artigos 76.º, n.º 2 e 82.º, nºo 3 do mesmo Estatuto uma vez que não têm turma atribuída. E, por conseguinte,
9. O docente e dirigente do SPRC estava obrigado ao cumprimento de todos os deveres profissionais, nomeadamente o dever de assiduidade, devendo comparecer no seu local de trabalho, a Escola do 1.° CEB do Ingote onde fora colocado nesse ano lectivo, cumprindo 7 horas diárias de serviço, como outro funcionário público, devendo desempenhar funções previstas no nºo 3 do art.º 82.° do ECD. De facto, sendo os professores dos diferentes níveis do ensino público funcionários da Administração Pública, o direito ao livre exercício da sua actividade sindical, rege-se, necessariamente, pelo Decreto-Lei n.º 84/99, de 19.03. Ora,
10.Para o desempenho de funções como membros dos corpos gerentes dos sindicatos dos trabalhadores do Estado, aquele diploma consagrou, apenas, possibilidade de um funcionário e dirigente sindical usufruir de 4 dias de crédito de faltas remuneradas por mês com a possibilidade de acumular créditos de faltas próprios ou cedidos por outros dirigentes da mesma associação sindical, assumindo, nesta matéria, as disposições do art.º 22.° do Decreto-Lei nº 215-B/75, de 30.04, que já vinham sendo aplicadas na ausência da Lei especial. Além disso,
11.Prevê, ainda, a possibilidade das associações sindicais recorrerem à requisição funcionários para exercerem funções nos sindicatos, bem como o recurso a uma licença especial para esse efeito (cfr. art.ºs 33.° e 34.° do DL n.º 84/99, de 10.03) suportando, nestes casos, os sindicatos os encargos com a sua remuneração. Assim,
12.Tal como todos os outros sindicatos de trabalhadores da função pública, também os sindicatos de professores gozam dessas prerrogativa, prevendo o Estatuto da Carreira Docente, aprovado pelo DL n.º 139-A/90, de 28.04, com as alterações introduzidas pelos Decretos-Lei n.º 105/97, de 29.04, e n.º 1/98, de 02.01, que esse tempo de serviço seja equiparado a serviço docente efectivo para efeitos de progressão na carreira (cfr. art.º 37.°. aI. d). Ora,
13.Se o dirigente sindical estivesse requisitado pelo SPRC ou tivesse requerido uma licença para o exercício da actividade de dirigente sindical não restavam dúvidas que estava, de facto, desvinculado, face ao Ministério da Educação, do cumprimento dos seus deveres profissionais, nomeadamente dos deveres de subordinação e assiduidade. E, por conseguinte,
14. Não era obrigado a comparecer na Escola onde fora colocado em exercício de funções, sendo indiferente ao Ministério da Educação conhecer ou presumir a sua adesão à greve, uma vez que não suportava os encargos com a sua remuneração. Contudo,
15.Esse dirigente do SPRC é um docente do 1.° Ciclo do Ensino Básico (1.° CEB), em exercício efectivo de funções, tendo sido colocado, no ano lectivo 2000/2001, na Escola do 1.° CEB do Ingote, pertencente ao Agrupamento Horizontal de Escolas de Coimbra. E, por conseguinte,
16. Apenas podia beneficiar dos créditos de faltas remunerados, próprios ou cedidos e da sua acumulação, nos termos previstos no art.º 12.°, n.º 2 e 15.° e, para além disso, faltar, justificadamente, de acordo com o nº 1 do art.º 12.°, n.º 1 do DL n.º 84/99, de 19.03, e não de qualquer dispensa de serviço para o exercício da actividade sindical. De facto,
17. Tendo em consideração a especificidade da função docente e atenta a ponderação dos interesses em presença, assegurar o livre exercício da actividade sindical por parte dos docentes e dirigentes sindicais, com as consequentes ausências ao serviço, e garantir a qualidade da educação e do ensino ministrado aos alunos, que seriam altamente lesados com a falta de assiduidade do professor, justifica-se a dispensa de serviço docente em sentido estrito ou seja a dispensa da componente lectiva dos docentes que pertençam aos corpos gerentes das associações sindicais de professores. Contudo,
18.Isso não significa que os docentes e dirigentes a quem seja concedida a dispensa da componente lectiva fiquem numa situação de privilégio face a todos os dirigentes sindicais de outros sindicatos de trabalhadores da Administração Pública que se regem pelo mesmo diploma legal, passando a exercer funções a tempo inteiro no sindicato a que pertençam, sem qualquer sujeição aos deveres gerais e específicos da função docente (cfr. art.º 10.º do ECD que remete para o Estatuto Disciplinar), assumindo o Ministério da Educação o encargo com a sua remuneração, o que seria ilegal por violação do disposto nos artigos 12º e seguintes do Decreto-Lei nº 84/99 e dos princípios gerais do Direito, mormente os princípios da legalidade, da igualdade e imparcialidade e prossecução do interesse público que impendem sobre a Administração, consagrados nos artigos 3.º a 6.º do CPA. De facto,
19.Conceder uma dispensa de serviço aos docentes membros dos corpos gerentes dos sindicatos de professores para exercer, exclusivamente, a sua actividade sindical, suportando o Ministério da Educação os encargos com o seu vencimento, além de ilegal e configurar um tratamento mais favorável desses dirigentes face aos membros de corpos gerentes de outros sindicatos de trabalhadores da Administração Pública, seria altamente lesivo do interesse público, já que o Estado assumia encargos financeiros para além dos previstos na lei. Efectivamente,
20.A dispensa concedida ao abrigo do Despacho 68/ M/82 não pode ser entendida como uma dispensa de serviço para o exercício da actividade sindical, como resulta do Acórdão do TCA, mas, somente, uma dispensa da componente lectiva, o que significa que, nesse ano lectivo (2000/2001), não lhe foi distribuída turma como forma de garantir que, enquanto dirigente sindical, pudesse faltar ao serviço nos termos previstos no art.º 12.º e seguintes do Decreto Lei n.º 84/99, sem que os alunos fossem prejudicados por essa falta de assiduidade. Todavia,
21.A dispensa da componente lectiva concedida não o desobrigava do cumprimento dos seus deveres profissionais, nomeadamente dos deveres de subordinação e assiduidade, cumprindo o horário de trabalho de 35 horas previsto para o pessoal, tal como os outros funcionários da Administração Pública, integrando uma componente lectiva e outra não lectiva conforme o previsto nos n.ºs 1 e 2 do art.º 76.° do ECD. E, por conseguinte,
22. Estando dispensado da componente lectiva, por ser um docente do 1.° CEB que exerce funções em regime de monodocência, nesse ano lectivo, não tinha turma atribuída. E, não tendo componente lectiva distribuída, as 25 horas dessa componente (cfr. art.º 77.°, n.º 1) acresciam às 10 horas de componente não lectiva, passando a cumprir um horário de 35 horas semanais de serviço, exercendo funções referentes à componente não lectiva a prestar a nível do estabelecimento de ensino, nos termos previstos no art.º 82.°, n.º 3, do ECD. Logo,
23.Como as 35 horas semanais seriam distribuídas pelos cinco dias da semana, estava obrigado ao cumprimento de 7 horas diárias de serviço, tal como sucede com os outros funcionários públicos, exercendo funções previstas no nº 3 do art.º 82.° do ECD, gozando do direito a faltar para o desempenho das funções de dirigente sindical, nos termos previstos nos artigos 12.° e seguintes do Decreto-Lei n.º 84/99, de 19.03. Com efeito,
24.Não estava desvinculado dos deveres gerais e especiais da função docente, nomeadamente dos deveres de subordinação e assiduidade, apenas podendo faltar ao serviço, por motivo do exercício da sua actividade sindical, sem perda do direito à remuneração, de acordo com o disposto nos artigos 12.°, n.º 2, e 15.° do Decreto-Lei n.º 84/99, de 19.03, ou seja, na exacta medida dos créditos próprios ou cedidos por outro membro da mesma associação sindical. E, portanto,
25.Não podia, com fundamento na dispensa da componente lectiva, que lhe fora concedida, para que pudesse faltar por motivo da actividade sindical sem prejudicar os alunos da turma, deixar de comparecer ao serviço sem justificar a ausência nos termos da lei. De facto,
26.A dispensa a 100% era da componente lectiva (não ter turma atribuída) foi-lhe concedida não no seu interesse ou da associação sindical que representa mas no interesse dos alunos, tanto mais que sendo docente do 1.º CEB exerce funções em regime de monodocência pelo que seria o único professor da turma. E, assim sendo,
27.Tendo o SPRC convocado uma greve para o dia 30.03.2001 e não tendo o docente comparecido ao serviço na Escola do Ingote pertencente ao AHEC onde fora colocado nesse ano lectivo. nem tendo justificado a ausência por outro motivo. presumia-se a sua adesão à greve nos termos previstos no art.º 19.º, nº 2, do Decreto-lei n.º 100/99. de 31.03, aplicável por força do art.º 86º do ECD. E, por conseguinte
28.A Sentença recorrida enferma de vício de violação da lei pois considerou que o docente não estava obrigado a comparecer ao serviço no dia 30.03.2001, dia de greve, não se lhe aplicando o disposto no nº 2 do art.º 19º do Decreto-Lei n.o 100/99, de 31.03, interpretando a dispensa de serviço docente (componente lectiva) como uma dispensa de todo e qualquer serviço que o desobrigava do cumprimento dos seus deveres profissionais, nomeadamente o dever de assiduidade.Interpretação que não está incursa no espírito do Despacho 68/M/82 e constituiria uma dispensa ilegal por violação do disposto nos artigos 12º e seguintes do Decreto-Lei nº 84/99 e dos princípios gerais de Direito consagrados nos artigos 3º a 6º do CPA. Além disso,
29.Também não procedem os argumentos aduzidos na Sentença recorrida quanto ao vício do acto de SEAE por erro nos pressupostos. De facto,
30.O acto de SEAE, de 21.09.01, impugnado no recurso contencioso, foi fundamentado na informação n.º 1302/01/DSRH/GJ, que remetia para o Parecer n.º 80/2000 da Auditoria Jurídica do Ministério da Educação, homologado por SEAE em 31.10.2000, como se reconhece no Acórdão ora posto em crise. E, por conseguinte
31.Os fundamentos de facto encontravam-se plasmados na informação nº 1302/02/DSRH/GJ,. remetendo a fundamentação de direito para o Parecer 80/2000 que se pronunciara sobre a perda do direito à remuneração dos docentes e dirigentes sindicais que gozavam de créditos de faltas e acumulação de créditos de outros dirigentes nos termos previstos nos artigos 12.°, nº 2, 14.° e 15.° do Decreto-Lei 84/99, de 19.03, por motivo de adesão a greve. Ora,
32.Como se afirma naquela informação, o desconto da remuneração de 11.390$00 no vencimento do mês de Maio de 2001, teve como fundamento o facto do SPRC ter convocado uma greve para o dia 30.03.2001. à qual o Recorrente aderiu. como o reconheceu a associação sindical. via fax. datado de 19.04.2001. Efectivamente,
33.Quando questionado sobre a adesão à greve, do dia 30.03.2001, pelo AHEC a Direcção do SPRC informa, então, o órgão de gestão do Agrupamento de que "É evidente que os dirigentes de uma organização sindical que convoca uma greve dos trabalhadores que representa estão envolvidos nessa greve." (sublinhado nosso). Ora,
34.Sendo certo que a Direcção do SPRC utilizou uma expressão dúbia, não assumindo, expressamente, que os dirigentes aí identificados aderiram à greve, aquela afirmação constitui prova bastante de que o dirigente sindical e Recorrente no processo aderiu à greve do dia 30.03.2001, não se vislumbrando outro alcance para essa afirmação, nem sendo razoável concluir que um professor e dirigente sindical esteve envolvido numa greve dos trabalhadores que representa sem aderir a essa greve. Porém,
35.No Parecer n.º 80/2000 é expendida a situação jurídica dos docentes e dirigentes sindicais que gozam de créditos próprios e acumulados nos termos dos artigos 12.°. n.º 2. e 15.° Decreto-Lei n.º 84/99, de 19.03, único diploma que rege o exercício da actividade sindical na função pública, considerando que havia lugar à perda do direito à remuneração por motivo de adesão à greve. Concluindo que, na situação concreta, existindo até uma declaração formal de adesão, não restavam dúvidas da sua adesão à greve e, consequentemente, da perda do direito à remuneração correspondente a esse dia. Todavia,
36.Não resulta da interpretação da lei acolhida nesse Parecer, a necessidade de proceder a qualquer declaração formal de adesão, atenta a presunção legal prevista no art.º 19.°, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 100/99, para haver lugar à perda do direito à remuneração correspondente ao dia de greve, como parece ter entendido o Tribunal a quo na Sentença ora recorrida. Aliás,
37.O próprio SPRC, do qual o docente é dirigente, foi o primeiro a defender a falta de valor jurídico da declaração formal de adesão à greve, atento o disposto no art.º 7.° da Lei 65/77, de 26.08 e o princípio geral aceite entre nós de que “a falta do trabalhador em dia de greve se presume como sendo dada por motivo de adesão à greve". Ora,
38.Os Pareceres da Auditoria Jurídica do Ministério da Educação nº 80/2000 e nº 31/2001, homologados por SEAE, por despachos de 31.10.2000 e 27.01.2001, respectivamente, ao pronunciarem-se sobre a matéria controvertida, embora partindo de uma situação concreta, pretenderam estabelecer uma interpretação uniforme a ser aplicada em todas as situações idênticas, como bem o demonstra todo o processo que conduziu à sua emissão. E, consequentemente
39.Quando, na informação que fundamentou a decisão do ora Requerente impugnada contenciosamente se remete para aqueles Pareceres, pretende se assumir como fundamento de facto, em abstracto, a. existência de uma greve de professores legalmente convocada por uma associação sindical, independentemente da data em que ocorrer, e a adesão ou presunção de adesão à greve por parte de um docente e dirigente desse Sindicato, com os fundamentos de direito neles expendidos. Com efeito,
40.Na situação sindicada, o fundamento de facto que conduziu à decisão de descontar no vencimento do mês de Maio de 2001 a remuneração correspondente ao dia de greve, de 30.03.2001, teve como pressupostos de facto a realização de uma greve convocada pelo SPRC, no dia 30.03.2001 e o facto do Recorrente, que gozava de créditos próprios e cedidos para o exercício da actividade sindical, não ter comparecido na Escola, nesse dia, nem ter justificado a ausência, por outro motivo, pelo contrário, reafirmando a Direcção do SPRC que o mesmo esteve envolvido na greve. Ora,
41.Apesar de considerarmos que a informação do SPRC constituiu prova bastante de que o então Recorrente aderiu à greve do dia 30.03.2001, o certo é que o dirigente do SPRC não ilidiu a presunção legal de adesão à greve, prevista no n.o 2 do art.º 19.° do Decreto-Lei n.º 100/99, de 31.03, justificando a ausência ao serviço por outro motivo, nos termos previstos na lei. Pelo que,
42.O Tribunal a quo procedeu a uma incorrecta interpretação da lei quanto aos pressupostos que presidiram ao acto do ora Requerente, quando sustenta a sua decisão no facto de no Parecer n.º 80/2000 estar em causa outro dia de greve e existir uma declaração formal de adesão, ignorando o Parecer n.º 31/2001 e a presunção legal que decorre do art.º 7.° n.º 1 da Lei da Greve e do nº 2 do art.º 19.° do Decreto-lei n.º 100/99, de 31.03, relativamente aos funcionários públicos. Ora
43.Apesar de entendermos que existe no processo um documento, emanado da Direcção do SPRC, que constitui prova bastante de adesão à greve por parte do dirigente desse Sindicato, a existência de uma declaração formal de adesão não constitui um pressuposto relevante nem de facto, nem de direito, dada a presunção incursa no art.º 19.°, nº 2 do Decreto-Lei nº 100/99, de 31.03.
O Agravado contra alegou formulando as seguintes conclusões :
1. Verifica-se a preclusão dos factos invocados pela A. R. nos art.ºs 18° e seguintes das suas Alegações no presente Recurso Jurisdicional (de que a dispensa de serviço do R para o desempenho de funções sindicais constituiria apenas uma dispensa da componente lectiva), nos termos do art. 264.°, n° 2, do C.P.C., conjugado com o disposto no art. 1.° da LPTA, uma vez que tais factos não foram jamais alegados pela A. R no Processo do Recurso Contencioso de Anulação, para além de que a sentença que conhecesse de tal questão seria nula, nos termos do art. 668°, n.º 1, aI. d) do CPC.
2. O acto recorrido padece de ilegalidade, por vício de violação de lei, em virtude de ofender os normativos do art. 7°, n° 1 da Lei n° 65/77, de 26/8 (Lei da Greve), bem como o art. 19° do DL n° 100/99, de 31/3, conjugados com os arts. 12°, n° 2,13°, n° 2,14° e 15°, todos do DL n° 84/99, de 19 de Março.
3. Ao contrário do que pretende a Autoridade Recorrida e tal como concluiu a sentença recorrida, a presunção contida no art. 19.°, n° 2, da Lei n° 100/99, de 31/3, não pode ser aposta ao R, uma vez que este se encontrava dispensado na totalidade do exercício das suas funções docentes, enquanto dirigente sindical: tal presunção só funcionará se o funcionário estiver ao serviço, isto é, se estiver obrigado a comparecer no local de serviço, mantendo o dever de assiduidade.
4. A Lei n° 84/99, de 19/3, cujos destinatários são os trabalhadores da Administração Pública, docentes incluídos, não estabelece qualquer distinção entre as componentes lectiva e não lectiva do serviço dos professores.
5. Aquele diploma trata apenas de regular as faltas dadas pelos trabalhadores membros dos corpos gerentes para o exercício das suas funções sindicais, sem direito a remuneração, bem como o crédito de quatro dias remunerados por mês para o exercício das suas funções sindicais e ainda o crédito de faltas de cada membro dos corpos gerentes da associação sindical que pode, por ano civil, ser acumulado ou cedido a outro membro da mesma associação, ainda que pertencente a serviço diferente.
6. Os Despachos 68/M/82 e 15/MEC/96 - que definiram as normas aplicáveis aos professores para a sua dispensa de serviço, enquanto membros dos corpos gerentes das respectivas associações sindicais, até à entrada em vigor do DL n° 884/99, de 19 de Março - jamais regularam a concessão de tal dispensa com referência à duração da componente lectiva dos docentes.
7. O regime relativo à cedência e acumulação de créditos de faltas para o exercício de funções sindicais dos docentes, consagrado nos Despachos n° 68/M/82 e n° 15/MEC/86, inspirou-se directamente na Circular de 07/04/78 do ex-Ministério da Reforma Administrativa, alterada por Despacho de 04/02/1985 do Secretário de Estado da Administração Pública, a qual regulamentou a actividade dos dirigentes de associações sindicais de trabalhadores da Administração Pública até à publicação do DL n° 84/99, de 19 de Março, não existindo qualquer diferença de fundo entre o regime instituído por aquela Circular e o regime decorrente dos Despachos nos 68/M/82 e 15/MEC/86.
8. O regime do DL n° 84/99, de 19/3, inspirou-se, por sua vez, na supra referida Circular do ex-Ministério da Reforma Administrativa e nos supra referidos Despachos do Ministério da Educação, inovando em relação a todos eles apenas no que toca ao alargamento, para o período de um ano, da possibilidade de acumulação e transferência mensal de créditos de uns para outros dirigentes sindicais.
9. É, pois, falso o alegado pela Autoridade Recorrida no artigo 19° das suas Alegações quando diz que da letra e do espírito do ponto 1.º do Despacho 68/M/82 se retiraria que a dispensa de serviço prevista naquele Despacho diria apenas respeito à componente lectiva dos docentes e não a todo o seu serviço docente.
10.Nem o Ministério da Educação poderia jamais ter levado à prática a "interpretação" que a Autoridade Recorrida aqui faz do ponto 1.º do Despacho 68/M/82 , pois, se alguma vez o tivesse feito, teria praticado acto ou actos que padeceriam de grave ilegalidade por ofensa do princípio constitucional da igualdade (art. 13° da C.RP.): ao adoptar esse procedimento, o Ministério da Educação teria discriminado negativamente os dirigentes das associações sindicais de professores em relação aos dirigentes das associações sindicais dos restantes trabalhadores da Administração Pública.
11.Com efeito, os restantes trabalhadores da Administração Pública, não comportando o seu serviço a especificidade da distinção entre uma «componente lectiva» e uma «componente não lectiva», sempre teriam direito a créditos de dias para o desempenho das suas funções sindicais iguais aos múltiplos ou submúltiplos de um horário semanal de 35 horas, enquanto os docentes, na perspectiva da Autoridade Recorrida teriam direito apenas a créditos de dias múltiplos ou submúltiplos da duração da respectiva componente lectiva (no caso do R, 25 horas semanais) e, portanto, de duração proporcionalmente inferior aos dos restantes trabalhadores da Administração Pública.
12.Não pode, por isso, a Autoridade Recorrida invocar, como efectivamente invoca, o disposto no art. 36° do DL n° 84/99, de 19/3, para dizer que o Despacho n° 68/M/82 como que continuaria em vigor, pois este, com o sentido com que é aqui interpretado pela A. R, conforme supra exposto, colidiria inequivocamente com o regime contido naquele diploma, colisão essa que é expressamente proibida no corpo daquele preceito.
13.Para além de gravosamente violadora quer do princípio constitucional da igualdade (art. 13° da C.RP.) quer da garantia constitucional da liberdade sindical e da protecção legal adequada do legítimo exercício de funções de dirigente sindical (art. 55°, nos 1 e 6 da C.RP.), seria absolutamente absurda e despropositada a equiparação que a Autoridade Recorrida pretende estabelecer entre o regime de crédito de faltas ou de dias de falta remunerados para o exercício de funções sindicais (DL n° 84/99, de 19/3) e o regime de dispensa total ou parcial da componente lectiva para os docentes portadores de doenças que afectem directamente o exercício das suas funções (art. 81°, n° 1, do ECD e Portaria n° 296/99, de 28 de Abril).
14.A Autoridade Recorrida só pode defender tão absurda e despropositada equiparação para conseguir, a qualquer preço, concluir que no dia da greve, 30/03/2001, o R tinha o dever de comparecer na escola, para assim, muito convenientemente, poder fazer funcionar a presunção legal do art. 19.°, n° 2 do DL n° 100/99, de 31/3, ficando, porém, perante tal "conclusão", por explicar por que razão, na perspectiva da A. R, o R teria faltado injustificadamente ao serviço todos os restantes dias úteis do ano lectivo de 2000/2001, sem que a Autoridade Recorrida tenha sequer alegado - e muito menos provado - que por causa de tais faltas lhe moveu os competentes processos disciplinares por assiduidade e lhe aplicou as correspondentes sanções.
15.As tarefas da componente não lectiva traduzidas na prestação de trabalho ao nível do estabelecimento de educação ou de ensino, devem integrar-se, conforme prevê o art. 82°, n° 3, do ECD, nas estruturas pedagógicas da escola, com o objectivo de contribuir para a realização do projecto educativo da mesma, pelo que o R, não podendo prestar tal trabalho nem espontânea nem individualmente, teria que ter sido necessariamente convocado para ele, não tendo, entretanto, a Autoridade Recorrida sequer alegado e muito menos provado que tivesse convocado o R. para qualquer prestação de trabalho, pelo menos no referido dia 30/03/2001.
16.O acto recorrido, para além de se basear no pressuposto fáctico de que o R. «aderiu declaradamente» à greve ocorrida no dia 30.03.2001, baseou-se em informação que remeteu para um Parecer - o Parecer 83/2000 - cujos restantes pressupostos de facto são diversos dos subjacentes ao acto recorrido, designadamente quanto a tratar-se de uma greve realizada noutra data (09/05/2000), pelo que o acto recorrido padece de vício de violação de lei, por erro nos seus pressupostos de facto.
17.O acto recorrido viola ainda o disposto nos arts. 100.º e seguintes do C.P.A., com o que padece de ilegalidade, por vício de forma, decorrente da preterição de formalidade essencial, em virtude de o R. não ter sido notificado para a audiência prévia de interessados sobre o projecto de decisão final e antes de a mesma ter sido proferida.
O Ilustre Magistrado do Ministério Público emitiu parecer no sentido do não provimento do recurso.
FUNDAMENTAÇÃO
I. MATÉRIA DE FACTO.
A decisão recorrida julgou provados os seguintes factos :
a) No vencimento do recorrente relativo ao mês de Maio de 2001 foi deduzida ao montante do seu vencimento-base a quantia de 11.390$00, correspondente ao dia de greve de 30.03.2001;
b) Com data de 04.06.2001, o recorrente apresentou uma reclamação dirigida à Presidente do Conselho Executivo do Agrupamento Horizontal de Escolas de Coimbra, onde pediu a revogação do acto de processamento do seu vencimento respeitante ao mês de Maio de 2001, com fundamento em ilegalidade do mesmo;
c) A Presidente do Conselho Executivo do Agrupamento Horizontal de Escolas de Coimbra dirigiu ao recorrente, em 06.06.2001, um oficio, dando resposta à reclamação referida em b), com o seguinte teor:
"Exmo Senhor
Relativamente ao assunto em epígrafe e reportando-me à reclamação apresentada por V. Ex.cia que deu entrada nestes Serviços em 04/06/01, cumpre-me informar :
1. A dedução de Es. 11.390$00 a que se refere, respeita ao desconto do dia de greve - 30 de Março de 2001 - decretada pelo Sindicato de que V. Ex.cia é Coordenador.
2. A dedução da referida importância foi devidamente fundamentada, não em Despacho deste Conselho Executivo mas em Despacho da Secretária de Estado da Administração Educativa, homologado em 31/10/00 e cuja cópia V. Ex.cia, como Coordenador do SPRC, muito bem conhece.
3. Assim, deverá V. Ex.cia reler o Parecer nº 83/2000, da Auditoria Jurídica do Ministro da Educação que nos parece ser bastante esclarecedor quanto ao desconto dos dias de greve dos dirigentes sindicais e que, na sua conclusão, referindo-se a V. Ex.cia como dirigente sindical com ausência total ao serviço docente, determina que perde o direito à remuneração correspondente ao dia de greve decretada pelo Sindicato a que pertence.
4. Deste modo, até que nos chegue outro parecer do ME que venha alterar o atrás referido o procedimento será sempre o mesmo.
5. Quando, no ponto 7.º da sua reclamação, Vexa refere que os descontos relativos a C.G.A., Sindicato, IRS e ADSE estão regularmente efectuados, penso que quer dizer que são os mesmos que no mês anterior. Tal não acontece, pois que em Abril o seu desconto para IRS foi de Esc.: 73.460$00 e em Maio apenas Esc.: 67.710$00.
Os outros descontos foram feitos sobre o vencimento base Esc.: 341.700$00 e não sobre o vencimento do mês de Maio Esc.: 330.310$00. Tal facto, que fica a dever-se a erro do programa informático de vencimentos, foi analisado em Conselho Administrativo, reunido em 05/06/01. Assim, as diferenças nos descontos serão processadas no vencimento do mês de Julho. "
d) Em 19.07.2001, o recorrente interpôs recurso hierárquico dirigido ao Ministro da Educação, da decisão, datada de 06.06.01, que indeferiu a reclamação referida em b), com fundamento em ilegalidade, pedindo a revogação de tal decisão (fls. do pa);
e) Por despacho datado de 21.09.01, do Secretário de Estado da Administração Educativa, foi tal recurso decidido, nos seguintes termos: "Nego provimento ao recurso com base na fundamentação de facto e do direito aduzida na presente informação" (fls. do pa e doc. fls. 42 dos autos);
f) A informação para a qual remete o despacho referido em e), consta de fls. 42 a 46 dos autos e o seu teor é, parcialmente, o seguinte :
"O recurso é interposto, segundo o recorrente, do acto da Sr.ª Presidente do Conselho Executivo do Agrupamento Horizontal de Escolas de Coimbra que indeferiu a reclamação por si apresentada referente ao processamento do seu vencimento, do mês de Maio de 2001 por considerar que foi descontado, ilegalmente, o quantitativo de 11.390$00.
Da Análise do Recurso
O recorrente, como afirma é professor do Q.D.V. do 1° CEB a exercer funções de dirigente sindical do Sindicato de Professores da Região Centro (SPRC), a tempo inteiro, por acumulação de créditos, nos termos previstos no DL nº 84/99, de 19.03 (cfr. art.s 12°. n° 2.14° n° 2 e 15°);
Na qualidade de dirigente sindical aderiu à greve do dia 30/3/01, conforme é comprovado pela comunicação da Direcção do SPRC (anexo 1);
E, tendo aderido à greve, tinha pleno conhecimento de que seria descontado no seu vencimento a remuneração correspondente;
Com efeito, a questão da perda de remuneração por motivo de adesão à greve dos docentes e dirigentes sindicais que beneficiam de acumulação de créditos, nos termos previstos naqueles normativos, já fora colocada, no ano transacto, pela Direcção do Agrupamento de Escolas de Coimbra, entidade processadora do vencimento de professores que desempenhavam funções de dirigentes sindicais que tinham aderido à greve do dia 09.05.00, nomeadamente o ora recorrente.
Tendo o Sr. Director Regional decidido, por despacho de 17.07.00, colocar a situação a Sua Ex.cia o então SEAE que homologou o Parecer n° 83/2000 da Auditoria Jurídica do Ministério da Educação (anexos 2 e 3) por despacho de 31.10.00;
Parecer que se pronunciou sobre a situação concreta nomeadamente do ora recorrente, fundamentando a perda do direito à remuneração, por motivo de adesão à greve, quer dos professores identificados no pedido como de todos os docentes que exercem funções de dirigentes sindicais e que, por conseguinte, se encontram na mesma situação;
Pelo que, a questão da perda do direito à remuneração do recorrente por motivo de adesão à greve foi como se afirmou, objecto de decisão superior fundada nesse parecer, sendo aplicável em todas as situações de adesão a greve legalmente convocada;
De facto, a questão controvertida, ainda que diga respeito ao desconto de 11.390$00 no vencimento do mês de Maio de 2001 da remuneração correspondente a outro dia de greve, efectuada em 30.03.2001, tem o mesmo objecto, ou seja, saber se o recorrente enquanto dirigente sindical que beneficia de acumulação de créditos para esse efeito perde ou não o direito à remuneração correspondente por motivo de adesão à greve;
Ora, sobre a matéria controvertida já se pronunciou SEAE quando homologou o Parecer 83/2000 da Auditoria Jurídica, em que também foi apreciada a situação concreta do ora recorrente, que fundamentou a perda do direito à remuneração por motivo de adesão a greve dos dirigentes sindicais que beneficiam da acumulação de créditos;
Parecer que foi comunicado integralmente quer ao órgão de gestão do Agrupamento de Escolas de Coimbra quer à Direcção do SPRC, do qual o recorrente é dirigente.
Não existindo quaisquer dúvidas de que o recorrente teve conhecimento integral da decisão de SEAE;
Não sendo relevante, o facto da Direcção do SPRC não concordar com os fundamentos invocados, como se depreende pelo teor do parecer do Sindicato remetido a SEAE (anexo 4);
Efectivamente, sobre a questão concreta da perda do direito à remuneração do recorrente por motivo de adesão à greve, já foi proferida uma decisão definitiva por SEAE em 3.10.2000 com fundamento no Parecer 83/2000 da Auditoria Jurídica do Ministério da Educação;
Sendo o acto do SEAE uma decisão definitiva e executória apenas poderia ser impugnada através de recurso contencioso a interpor nos termos previstos nos art.°s 25°, n° 1, e 28°, n.° 2, da Lei de Processo nos Tribunais Administrativos (LPTA);
Ora, o desconto de 11.390$00 no vencimento do mês de Maio corresponde ao desconto da remuneração do dia 30.03.2001 em que o recorrente aderiu à greve, conforme foi comunicado ao Recorrente pelo órgão de gestão do Agrupamento de Escolas (anexo 5);(...)".
(doc. fls. 42 a 45 dos autos)
g) A fIs. 47 a 57 dos autos encontra-se o parecer n° 83/2000, da auditoria Jurídica do Ministério da Educação, homologado por despacho do SEAE, datado 31.10.00, e cuja "solução jurídica" tem o seguinte teor :
"1. Estes os pressupostos de facto e de direito que devem balizar a solução jurídica para o caso em análise.
Da incursão pelos diplomas legislativos e normas de natureza regulamentar, acabados de enunciar, resulta que
a) Desde 1976 até à entrada em vigor do mencionado D.L. n° 84/99, o exercício da liberdade sindical exercício do direito à greve por parte dos trabalhadores da Administração Pública foi sendo regulado pelos dispositivos legais contidos nas chamadas "Lei Sindical" (D.L. n° 215-B/75) e "Lei da Greve" (Lei n° 65/77), por aplicação analógica, de todos aceite e seguida:
- a primeira limita-se a conceder a cada um dos membros da direcção das associações sindicais um crédito de 4 dias por mês para o exercício das correspondentes funções, com direito a remuneração, direito este que lhe é retirado relativamente às faltas que excedam esse limite ( embora justificadas, se dadas para o mesmo fim), exigindo sempre a comunicação prévia a que se refere o n° 3 do artigo 22° transcrito;
- a segunda é peremptória em estatuir, quanto aos efeitos da greve, que esta suspende as relações de trabalho, nomeadamente o direito à retribuição, no que respeita aos trabalhadores que a ela aderirem, consagrando em termos legais o princípio geral de que "não pode haver direito ao percebimento dos vencimentos durante o período de greve", já proclamado antes no primeiro Despacho genérico proferido sobre a matéria e depois transposto para o regime de faltas na função pública onde não é admitida qualquer excepção para a perda da remuneração correspondente (cfr. II 1 e 9. do presente parecer).
b) As normas de natureza regulamentar conhecidas que, entretanto, foram surgindo acolhem e reforçam estes princípios reitores, sem mais, com excepção das emitidas pelo Ministério da Educação para a actividade sindical dos professores, ("constituindo inovação não constitucionalmente consentida"), onde se permite a "gestão" e a "globalização" do crédito, pelas direcções sindicais (cfr. II 10. do presente parecer).
c) Na vigência do DL n° 84/99, mantêm-se, em letra de lei, os mesmos princípios reitores do exercício da liberdade sindical dos trabalhadores da Administração Pública e correlativos direitos, agora acrescidos da legitimação da faculdade conferida às associações sindicais de, por ano civil, promoverem a acumulação ou cedência dos créditos de faltas, a que se refere o art.º 15°, mediante as formalidades exigidas no art.º 16°.
d) A situação de cada um dos docentes que se encontra em exercício das funções sindicais, como membro dos corpos gerentes, resulta da sua ausência - total ou parcial - ao serviço docente, decorrente de um somatório das faltas Justificadas, que dá por direito próprio - 4 dias por mês ou 4 dias X o número de meses que acumula - e das que outro membro da mesma associação lhe ceder.
A medida e "distribuição" das acumulações e cedências no seio dos corpos gerentes da associação sindical é que determinam a ausência/falta (total ou parcial) do dirigente em causa ao desempenho as suas funções docentes - integradas pela componente lectiva e pela componente não lectiva - não podendo, pois, em rigor jurídico, falar-se de "dispensa total" ou "dispensa parcial" neste domínio, em virtude de o conceito técnico- jurídico de “ausência" aplicar-se a outras situações definidas na lei.
e) Outra realidade bem distinta perante a lei é a situação de um trabalhador (da Administração Pública ou do sector privado) que adere, declaradamente, a uma greve: incorrer nos efeitos previstos nos já referidos artigos 7° da Lei n° 65/77 e 19° do Decreto-Lei n° 100/99, nomeadamente no que aqui importa reter sempre a perda do direito à retribuição correspondente ao período de duração da mesma greve.
TaI como a define a jurisprudência firmada," a perda da retribuição é um efeito da greve e é a contrapartida do direito à greve "(v., por todos, o Acórdão do STA de 27-5-1986, proferido in Rec. n.º 17.499).
e) A manutenção da remuneração correspondente ao tempo da greve a um membro dos corpos gerentes de uma associação sindical que a ela aderiu e a percepção por este dessa importância independentemente do destino que o próprio ou alguém por ele lhe der são, clara e inequivocamente, violadores das leis vigentes aplicáveis e dos princípios éticos que as enformam.
IV - CONCLUSÃO.
1.Os dois membros dos corpos gerentes do sindicato dos Professores da Região Centro que beneficiam do crédito de faltas mensal (próprio) e/ou da acumulação de créditos mensais próprios) e/ou da cedência de outros créditos de faltas (de terceiros), ao abrigo do disposto nos artigos 12° e 15° do Decreto-Lei n° 84/99, de 19/3 - em termos que lhes permitem a ausência total ao serviço docente - perdem o direito à remuneração correspondente ao dia de greve decretada pelo referido Sindicato (9/5/00), a que declaradamente aderiram, por força dos comandos contidos no artigo 7° da Lei n° 65/77, de 26/8, e no artigo 19° do Decreto-Lei n° 100/99, de 31/3.
2. A dirigente sindical do mesmo Sindicato e Vice-Presidente do Agrupamento Horizontal de Escolas de Coimbra que beneficia do crédito de faltas mensal (próprio) e/ou da acumulação de créditos mensais (próprios) e/ou da cedência de outros créditos de faltas (de terceiros), ao abrigo do disposto nos artigos 12° e 15° do Decreto-Lei n° 84/99, de 19/3 - em termos que lhe permitem a ausência parcial ao serviço docente - perde o direito à remuneração correspondente ao dia de greve decretada por aquele Sindicato (9/5/00), a que declaradamente aderiu, por força dos comandos contidos no artigo 7° da Lei n° 65/77, de 26/8, e no art.º 19° do Decreto-Lei n° 100/99, de 31/3 (...)"
(doc. fls. 54 a 57 dos autos);
h) Por despacho do Subdirector-Geral da Administração Educativa, datado de 04.08.2000, foi homologada a redução da componente lectiva a 100% ao docente A... para o ano lectivo de 2000/2001, para exercício de actividade sindical (fls. do pa e doc. fls. 60 dos autos);
i) O recorrente no ano lectivo de 2000/2001 era professor do Q.D.V. do 1.º CEB, exercendo funções de dirigente sindical do Sindicato dos Professores da Região Centro, a tempo inteiro (fls. 42 dos autos)
j) No dia 30.03.2001 ocorreu uma greve decretada pelo Sindicato dos Professores da Região Centro;
l) A fls. 107 dos autos encontra-se um doc. (fax do Sindicato dos Prof. da Região Centro para Conselho Executivo do Agrupamento Horizontal de Estudos de Coimbra) com o seguinte teor :
"O SPRC foi questionado, telefonicamente, sobre se os seus dirigentes A... e ..., ambos colocados nesse Agrupamento Horizontal aderiram ou não à Greve do passado dia 30 de Março.
Independentemente da forma como o SPRC foi contactado - telefonicamente –solicitamos que nos sejam esclarecidos os motivos por que tal nos foi questionado.
É evidente que os dirigentes de uma organização sindical que convoca uma Greve dos trabalhadores que representa estão envolvidos nessa greve. É obvio, por ser ilegal, que o ME., ou outros que o representem, não pode descontar o dia de Greve dos dirigentes sindicais que se encontram a tempo inteiro nos seus Sindicatos. Porém, como é do conhecimento geral por não pretenderem usufruir de regalias em relação aos seus colegas que se encontram nas escolas, todos os dirigentes do SPRC descontam voluntariamente o seu dia de Greve para um fundo criado no Sindicato e que é despendido em causas humanitárias.
Daí que, se for esse o objectivo - descontar o dia de Greve dos dirigentes sindicais em permanência total ou parcial no SPRC - e se tal vier a ser concretizado, informamos V. Ex.cia que o Gabinete Jurídico do Sindicato dos Professores da Região Centro apresentará uma queixa em Tribunal contra a entidade responsável pelo desconto, com base no parecer jurídico oportunamente enviado a esse Conselho executivo.
Com os nossos cumprimentos (...)".
II. O DIREITO.
O presente recurso jurisdicional dirige-se contra o douto Acórdão do Tribunal Central Administrativo que muito embora tenha considerado que o acto impugnado não era nulo - pois que não ofendera o conteúdo essencial de nenhum direito fundamental – entendeu, no entanto, que o mesmo se fundara em errados pressupostos de factopor um lado, que o Agravado aderira à greve marcada para o dia 30/03/2001, o que não se encontrava demonstrado, e, por outro, que o Agravado estava obrigado ao dever de assiduidade o que não correspondia à verdade já que ele, na sua qualidade de dirigente sindical, estava dispensado do serviço e, portanto, desobrigado de comparecer na escola naquele dia – e, com esse fundamento, deu provimento ao recurso contencioso de anulação e, consequentemente, o anulou.
Decisão que a Autoridade Recorrida não aceita por considerar que os elementos reunidos no probatório eram suficientemente demonstrativos de que o Agravado tinha aderido à greve marcada para o mencionado dia e, além disso, que não estava dispensado do serviço e, portanto, estava obrigado a comparecer na sua escola no referido dia da greve.
As questões que este recurso jurisdicional nos coloca são, pois, as de saber se o Tribunal Central Administrativo fez correcto julgamento quando (1) entendeu que o Agravado, atenta a sua qualidade de dirigente sindical, estava dispensado do serviço e, consequentemente, do dever de comparência na escola dia 30/3/01 e (2) quando considerou que se não tinha provado que aquele tivesse feito greve no identificado dia.
Antes, porém, e para um melhor entendimento na análise de tais questões, impõe-se apreciar o regime legal em que desenvolve a actividade sindical.
1. O DL 84/99, de 19/3, assegura a liberdade sindical dos trabalhadores da Administração Pública e regula o seu exercício, garantindo, desta forma, o direito constitucionalmente reconhecido a todos os trabalhadores. – Vd. o respectivo preâmbulo e o seu art.º 1.º.
E, de acordo com o que ali se estabelece, são concedidos diversos direitos aos dirigentes sindicais, designadamente o de as faltas por eles dadas no exercício das suas funções sindicais se considerem justificadas e contarem, “para todos os efeitos legais, como serviço efectivo, salvo quanto à remuneração e o de que parte dessas faltas serem remuneradas, uma vez que têm direito “a um crédito de quatro dias remunerados por mês para o exercício das suas funções, que podem utilizar em períodos de meio dia.”Vd. n.ºs 1 e 2 do seu art. 12.º, com sublinhado nosso.
Mas para além disso prevê-se a possibilidade de as associações sindicais requisitarem funcionários dos serviços para nelas trabalharem a tempo inteiro e a concessão de licenças especiais sem vencimento a funcionários com mais de três anos de antiguidade para o mesmo efeito. – Vd. art.s 33.º e 34.º do mesmo diploma.
Todavia, e a não ser que os funcionários requisitados ou em licença especial sejam dirigentes sindicais - que, por isso, vêm temporariamente suspensa a sua relação laboral com a Administração Pública e, dessa forma, vêm-se desligados do cumprimento dos seus deveres funcionais – estes, durante o exercício da actividade sindical, não rompem os seus vínculos com a Administração e, porque assim, continuam obrigados aos deveres funcionais, designadamente os de assiduidade e subordinação.
Ou seja, os dirigentes sindicais continuam a ser funcionários da Administração gozando, unicamente, de certos direitos, como de faltar sempre que o exercício da actividade sindical o exija e o direito de parte das faltas dadas nessas circunstâncias terem um tratamento especial.
A lei não prevê, assim, a possibilidade do desempenho de cargos de direcção nas associações sindicais determinar a redução total das suas funções administrativas e de, apesar disso, continuarem a serem remunerados como se estivessem a trabalhar a tempo inteiro ou, dito de outro modo, a lei não contempla a possibilidade de um dirigente sindical ficar completamente desligado do serviço e de, portanto, ficar desobrigado do comprimento dos seus deveres funcionais e de, apesar disso, continuar a ser remunerado.
2. No caso sub judicio o Recorrente contencioso exercia a função de Coordenador da Direcção do Sindicato dos Professores da Zona Centro e, nessa qualidade, requereu e foi-lhe concedida, por despacho do Sr. Subdirector Geral da Acção Educativa, a dispensa total de serviço no período compreendido entre 1/9/00 e 31/8/01, ao abrigo do que se dispunha no DL 84/99, de 19/3, e de acordo com que tinha sido estabelecido no Despacho 68/M/82.
E é apelando a essa dispensa de serviço que o Recorrente contencioso sustenta que se encontra autorizado a dedicar-se em exclusividade às funções sindicais e, consequentemente, dispensado de participar nos trabalhos diários da escola, quaisquer que eles sejam, e que, assim, está desobrigado do cumprimento do seu horário de trabalho escolar já que, de acordo com o regime de serviço que lhe foi concedido, a sua comparência na escola depende de convocação.
Em suma, o Recorrente defende que, estando dispensado do cumprimento dos serviços escolares e, por isso, liberto do cumprimento do horário de trabalho, não tinha que comparecer na escola no dia em que se realizou a greve e, porque assim, não lhe podia ser descontada a remuneração desse dia.
Todavia, sem razão.
Na verdade, nem o que se prescreve no DL 84/99 nem o que se determinou no invocado Despacho 68/M/82 permitem que se sustente tal tese.
Senão vejamos.
2. 1. O referido Despacho, da autoria do Sr. Ministro da Educação, estatuiu o seguinte :
1. – Os membros dos corpos gerentes das associações sindicais representativas dos professores poderão solicitar ao Director Geral de que dependem a sua dispensa total ou parcial de serviço enquanto membros daqueles corpos gerentes.
2. – As faltas dadas por aqueles membros para desempenho das suas funções sindicais consideram-se faltas justificadas e contam para todos efeitos, menos o da remuneração, como tempo de serviço efectivo.
3. – Para o exercício das suas funções cada membro da direcção beneficia do crédito de 4 dias por mês com direito a remuneração.
4. - .....
5.- ....
(.....) ”
É visível que a única novidade neste Despacho em relação ao que se estabelece no DL 84/99 é a possibilidade do Sr. Director Geral poder dispensar os dirigentes sindicais do serviço, total ou parcialmente, pois que o que se estatui nos pontos 2 e 3 daquele Despacho nada difere do que se prescreve no art.º 12.º do referido DL.
E, se assim é, a tese do Recorrente contencioso só poderia ser sufragada se aquele ponto 1 pudesse ser interpretado de acordo com o que ele defende.
Só que tal não é possível.
Com efeito, a ser verdadeira a tese do Agravado, não fazia sentido prescrever – nos pontos 2 e 3 daquele Despacho e no art.º 12.º DL 84/99 - que as faltas dos dirigentes sindicais se consideravam justificadas e contavam para todos os efeitos como tempo de serviço efectivo, menos o da remuneração, e que aqueles tinham um crédito de faltas de 4 dias remunerados por mês para desenvolverem o seu trabalho sindical, visto que a dispensa de serviço na forma pretendida pelo Agravado lhes garantia muito mais que isso - garantia-lhes um corte com os seus deveres funcionais e permitia-lhes ficar libertos do seu horário de trabalho e de prestar qualquer serviço na escola sem qualquer consequência na sua remuneração.
Ou seja, a tese defendida pelo Recorrente contencioso determinaria uma situação em que a dispensa do serviço correspondia a uma licença especial com vencimento ou, dito de outro modo, configuraria uma situação em que o dirigente sindical ficava dispensado de todos os deveres escolares e só prestaria os serviços para que fosse especialmente convocado e, apesar disso, continuaria a receber a sua remuneração como se estivesse ao activo.
Ora essa situação não encontra previsão nem naquele DL nem no referido Despacho, pois que o que aí se estabelece é apenas o direito de faltar sempre que o exercício da actividade sindical o exija e o direito a que parte dessa faltas sejam remuneradas.
Mas se assim é pode perguntar-se que efeitos tem, então, a concessão da dispensa, total ou parcial, de serviço ?
E a resposta a esta interrogação encontra-se não só no citado Despacho mas também na explicação dada pela Autoridade Recorrida.
Aí se diz que o exercício da actividade sindical dos professores levanta problemas específicos resultantes da natureza particular da função docente e que, por isso, se justifica que os dirigentes sindicais que sejam professores fiquem dispensados da docência, o que se compreende na medida em que a acção sindical implica, ou pode implicar, um número apreciável de faltas e estas, como é sabido, para além de causar perturbação, são altamente prejudiciais para a aprendizagem dos alunos.
Deste modo, e tendo em vista o bom funcionamento da escola e a defesa do direito dos alunos ao ensino, faz todo o sentido que os professores que, pelas mais diversas razões – doença crónica, exercício da acção sindical, etc. – não possam assegurar uma presença constante na escola e, portanto, um ensino regular tenham um regime especial e que este consista na dispensa, total ou parcial, do serviço lectivo.
Todavia esta dispensa de docência não significa uma dispensa de todo e qualquer o serviço, porquanto as escolas compreendem muitas outras actividades para além da leccionação e estas podem ser perfeitamente cumpridas por aqueles professores que, por qualquer das apontadas razões, estão dispensados da docência.
O que significa que, apesar da dispensa que lhe tinha sido concedida, o Agravado continuava vinculado à sua escola e aos deveres funcionais decorrentes dessa vinculação, designadamente ao seu dever de assiduidade.
E, porque assim, não se pode acompanhar o decido no douto Acórdão Recorrido, ou seja, não se pode sufragar o entendimento de que a concessão da dispensa total do serviço queira significar a dispensa de todo e qualquer serviço – docente e não docente - e que, em função disso, os professores a quem essa dispensa foi concedida estejam desobrigados do seu dever de assiduidade, sem que as suas faltas impliquem a perda da respectiva remuneração.
3. Resta analisar se o Acórdão recorrido fez errado julgamento quando considerou que o despacho recorrido era ilegal por erro nos pressupostos de facto, já que se não encontrava demonstrado que o Recorrente contencioso tivesse aderido à greve do dia 30/3/01.
Para assim decidir o Tribunal a quo considerou que o Agravado não estava obrigado ao dever de assiduidade e que a presunção prevista no DL 110/99 só se aplicava aos trabalhadores vinculados àquele dever e que, sendo assim, e “não tendo o funcionário o dever de assiduidade faltará um pressuposto para que a presunção contida no art.º 19.º, n.º 2, do citado diploma possa funcionar”, o que valia por dizer que a mesma não podia ser aplicada ao Agravado.
E, para além disso, considerou que inexistia prova de que o Agravado tivesse aderido à greve do dia 30/3/01.
Não podemos, porém, acompanhar este julgamento.
3. 1. Na verdade, e relativamente ao dever de assiduidade do Agravado já se disse o que haveria para dizer no antecedente ponto 2 e a conclusão a que se chegou contraria o decidido na Instância recorrida, pelo que resta analisar se está por demonstrar que o Agravado tenha faltado no dia da greve.
De harmonia com o que esse estabelece no art.º 19.º do DL 110/99, de 31/3, “a ausência por exercício do direito à greve ... considera-se justificada e implica perda das remunerações correspondentes ao período de ausência, mas não desconta para efeito de antiguidade, nem no cômputo do período de férias” - vd. seu n.º 1 – e “as ausências durante o período de greve presumem-se motivadas pelo exercício do respectivo direito, salvo indicação em contrário dada pelo trabalhador.” – seu n.º 2.
O que significa que as faltas ocorridas durante o período de greve consideram-se justificadas e presumem-se motivadas pelo exercício desse direito, presunção que pode ser ilidida por declaração em contrário do trabalhador.
É incontroverso que o Agravado não compareceu na escola naquele dia 30/3/01 e que sendo notificado para informar se essa falta significava adesão à greve realizada nesse dia limitou-se a responder que os dirigentes sindicais que convocam uma greve “estão envolvidos nessa greve”.
O que significa que não afirmou que tinha comparecido na escola nem negou que tivesse feito greve informando apenas, de forma habilidosa, que era evidente que os dirigentes de uma organização sindical que tinha convocado a greve estavam nela envolvidos.
Ora, esta resposta só pode querer só pode querer significar adesão à greve. Seria, aliás, insultuoso considerar o contrário, pois que uma tal interpretação suporia que o Agravado furou uma greve convocada pelo sindicato de que é dirigente.
Mas mesmo que assim não fosse e que se pudesse dar outra interpretação à resposta do Agravado, o certo era que este não tinha comparecido no seu local de trabalho no dia da greve e que o mesmo estava obrigado ao dever de assiduidade pelo que, por força do apontado dispositivo legal, essa falta se presumia resultante da adesão à greve, presunção que só seria afastada por declaração em contrário.
Ora tal declaração não foi feita, pelo que é forçoso concluir que a referida presunção não foi ilidida.
Ou seja, quer por uma quer por outra das apontadas razões, não se pode pôr em dúvida de que o Agravado aderiu à mencionada greve, o que implica a perda da remuneração correspondente a esse dia.
E, se assim é, também nesta parte, não se pode acompanhar o decidido no douto Acórdão recorrido.
4. O Recorrente contencioso invocou um vício de formafalta de cumprimento do disposto no art.º 100.º do CPA – que, atenta a procedência dos invocados vícios de violação de lei, não chegou a ser conhecido no Tribunal a quo.
Impõe-se, por isso, que aquele Tribunal conheça desse vício.
Termos em que acordam os Juízes que compõem este Tribunal em conceder provimento ao recurso e em revogar a douta decisão recorrida, ordenando-se a baixa dos autos ao Tribunal recorrido para que se conheça do vício que falta conhecer.
Custas pelo Agravado fixando-se a taxa de justiça em 150 euros e a procuradoria em metade.
Lisboa, 14 de Janeiro de 2004.
Alberto Costa Reis - relator - Edmundo Moscoso - Maria Angelina Domingues