Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:02213/04.7BELSB
Data do Acordão:10/14/2020
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:PEDRO VERGUEIRO
Descritores:IMPUGNAÇÃO JUDICIAL
IVA
NULIDADE DE SENTENÇA
FALTA
ESPECIFICAÇÃO
FUNDAMENTO DE DIREITO
PRESCRIÇÃO
Sumário:I - Em relação à nulidade da sentença por falta de especificação dos fundamentos de direito, há que ter em atenção que, como é sabido, só se verifica tal nulidade quando ocorre falta absoluta de fundamentação, sendo que há que distinguir cuidadosamente a falta absoluta de motivação da motivação deficiente, medíocre ou errada. O que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação; a insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente, afecta o valor doutrinal da sentença, sujeita-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz nulidade.
II - Apesar de a prescrição não poder constituir fundamento de impugnação judicial da liquidação, a jurisprudência tem vindo a admitir que pode ser apreciada nessa sede, mesmo oficiosamente, como motivo da inutilidade superveniente da lide: verificada a prescrição da obrigação tributária, que determina a inexigibilidade da correspondente dívida, com a consequente impossibilidade de cobrança coerciva, a impugnação judicial em que se visa apenas a apreciação da legalidade da liquidação que lhe deu origem deixa de ter utilidade; nesse circunstancialismo, deve extinguir-se a instância por inutilidade superveniente da lide.
III - Como a Recorrente apenas argui a nulidade da sentença por falta de fundamentação de direito e no segmento em que julgou não prescrita a dívida e já não no segmento em que julgou improcedente a impugnação judicial por falta de causa de pedir, por não ter sido imputado qualquer vício às liquidações sindicadas, resta apenas negar provimento ao recurso perante o que ficou dito relativamente ao primeiro elemento (nulidade da sentença por falta de especificação dos fundamentos de direito), dado que, sem prejuízo do que ficou exposto relativamente à questão da prescrição (de modo a deixar um obiter dictum para o futuro), resulta evidente que a decisão de improcedência da impugnação judicial torna-se inatacável, o que significa que, o conhecimento da prescrição nesta sede, que visa apenas indagar da eventual inutilidade superveniente da lide, pois que, verificada a prescrição da obrigação tributária, que determina a inexigibilidade da correspondente dívida, com a consequente impossibilidade de cobrança coerciva, a impugnação judicial em que se visa apenas a apreciação da legalidade da liquidação que lhe deu origem deixa de ter utilidade, deixa de ter qualquer sentido neste contexto.
Nº Convencional:JSTA000P26506
Nº do Documento:SA22020101402213/04
Data de Entrada:11/12/2019
Recorrente:A......, LIMITADA
Recorrido 1:AT – AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Processo n.º 2213/04.7BELSB (Recurso Jurisdicional)

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

1. RELATÓRIO

“A…………, LDA.”, devidamente identificada nos autos, inconformada, veio interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Tributário de Lisboa, datada de 05-06-2019, que julgou improcedente a pretensão pela mesma deduzida no presente processo de IMPUGNAÇÃO relacionado com as liquidações adicionais n.º 04203791, de IVA no montante de 11.726,33, referente ao ano de 2002 e n.ºs 04203790, 04203789, de juros compensatórios.


Formulou nas respectivas alegações, as seguintes conclusões que se reproduzem:

“ (…)

1. Não pode a recorrente colher o entendimento que se encontra sufragado na sentença ora em crise, porquanto s.m.e. encontra-se a mesma enferma por vício de nulidade por falta de fundamentação e bem assim, por mal ter promovido a aplicação da Lei quanto ao instituto da prescrição diz respeito.

2. A recorrente não é obrigada, nem isso a Lei determina, que a mesma tenha de atingir as conclusões não fundamentadas do douto Tribunal, porquanto devidamente compulsada a sentença proferida, a mesma é completamente omissa quanto à fundamentação.

3. A devida fundamentação de Direito, importa que se indiquem não só os factos dados por provados, bem como e em particular, porquanto é nesse tocante que importa a douta aplicação da JUSTIÇA,

4. O tribunal a quo limita-se a indicar factos - as datas supra indicadas - não promovendo contudo a devida subsunção dos factos ao Direito.

5. Inexiste, como é bom de ver nos presentes autos e no quanto à não aplicabilidade por parte do Tribunal a quo diz respeito da prescrição qualquer exame crítico, o mesmo é claramente OMISSO.

6. É OMISSA a fundamentação de Direito, bastando para tanto indicar que não é sequer indicado um único artigo de direito, a fundamentar a posição adoptada pelo Tribunal a quo.

7. Termos em que atendendo ao supra exposto, desde já respeitosamente se requer que se reconheça o vício imputado à sentença em crise, determinando-se a revogação da mesma, o que desde já se requer para todos os devidos efeitos legais.

8. No ordenamento jurídico tributário a prescrição é de conhecimento oficioso (art.º 175.º do CPPT).

9. As dívidas tributárias prescrevem assim e de acordo com a Lei, salvo o disposto em lei especial, no prazo de oito anos.

10. A interrupção inutiliza para a prescrição todo o tempo decorrido anteriormente, começando a correr novo prazo a partir do ato interruptivo (n.º 1 do art.º 326.º do Código Civil), sendo que é neste tocante que mal andou o douto Tribunal a quo.

11. A vertente que adopta a posição s.m.e. inconstitucional, não começaria a correr de novo o prazo de prescrição, enquanto o processo não tiver termo, labora assim em erro, porquanto ficaria assim o executado refém de uma Justiça que se poderia atrasar no tempo e ser obliterada no espaço, renascendo assim a hipotética divida, anos ou décadas mais tarde,

12. Este entendimento, tal qual o entendimento que não pode ser colhido mas que se encontra a enformar a sentença ora em crise, viola os princípios do Estado de direito e coloca em crise os princípios da boa-fé e da proteção da confiança, mais atendendo a que não existe já uniformidade na jurisprudência, porquanto, no acórdão do STA, tirado no processo n.º 01121/16, de 23.11.2016, foi lavrado por um juiz Conselheiro voto de vencido.

13. Impõe-se assim considerar que o facto que interrompe a prescrição, nos presentes autos, ocorre com a citação no processo judicial aqui em causa, i e, em 20.09.2004 e que, conforme melhor decorre da Lei, inutiliza-se o tempo até ai então decorrido.

14. No entanto e para boa e conforme aplicação da Lei, ao abrigo dos mais basilares ditames e orientações Constitucionais supra melhor indicadas alegadas e legalmente, jurisprudencialmente e doutrinariamente fundamentas, nesse mesmo momento, renasce a contagem do prazo para efeitos de prescrição, e assim, atendendo ao período de prescrição de oito anos, tendo iniciado novo período de contagem em 20.09.2004, sempre a prescrição tem de ser reconhecida, com efeitos à data de 19.09.2012, o que respeitosamente se requer em estrita conformidade com a tão douta e costumada JUSTIÇA!

Termos em que com os mais de Direito doutamente supridos por V.ªs. Ex.ªs. respeitosamente se requer a procedência por provada do presente Recurso e em consequência, se reconheça quer a nulidade da sentença em crise por falta de fundamentação quer ainda a verificação da prescrição invocada, tudo em estrita conformidade com a tão douta e costumada JUSTIÇA!”

A Recorrida Autoridade Tributária e Aduaneira não apresentou contra-alegações.

O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso.

Cumpre decidir.




2. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que a realidade apontada nos autos resume-se, em suma, em analisar a invocada nulidade da sentença por falta de especificação dos fundamentos de direito bem como indagar da bondade da decisão recorrida no que concerne ao tratamento da questão da prescrição.




3. FUNDAMENTOS

3.1. DE FACTO

Neste domínio, consta da decisão recorrida o seguinte:

“…

A) A AT procedeu a inspeção à atividade da Impugnante relativamente ao exercício de 1997 e elaborou o Relatório de Inspeção Tributária (RIT) que constitui fls. 25 e segs. do Processo Administrativo Tributário (PAT), que aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os legais efeitos.
B) Em cumprimento da Ordem de Serviço n.º 9833, de 5/03/2001, a AT procedeu a inspeção à atividade da Impugnante com o objetivo de verificar todas as irregularidades em termos de IRS, IRC e IVA, no ano de 1997 (conforme resulta de fls. 27 do PAT em apenso).
C) Em matéria de “III - DESCRIÇÃO DOS FACTOS E FUNDAMENTOS DAS CORRECÇÕES MERAMENTE ARITMÉTICAS À MATÉRIA TRIBUTÁVEL”, para efeitos de IVA, resulta do RIT:
«Da inspeção efetuada nas instalações da sociedade, ao exercício de 1997, verificou-se que o sujeito passivo não possuía qualquer comprovativo justificativo da entrega das Declarações Periódicas do IVA deste ano de 1997, que confirma-se também com os dados presentes no sistema informático do Serviços de Administração do IVA.
Assim efetuámos o apuramento dos valores faturados efetivamente neste ano, conforme abaixo se descrimina de acordo com listagens conferidas e presentes nas pastas dos documentos.

Em termos de Custos, a sociedade apresenta na sua contabilidade apenas as faturas da empresa “B…………, Lda”, possuidora do N.I.P.C.: ………, conforme abaixo se indica:

As faturas têm uma numeração contínua e sequencial da 21 à 32 (precisamente 12, sendo uma por mês, donde se pode deduzir que aquela sociedade trabalha única e exclusivamente para esta), e referem-se a uma sociedade que nunca cumpriu com as suas obrigações fiscais tanto a nível de IVA como de IRS e IRC.
Aquelas faturas não estão devidamente descriminadas, conforme refere o n.° 5 do art.° 35.° do Código do IVA bem como a informação do SIVA n.° 181044 de 1991/12/06. Por isso o IVA mencionado naquelas faturas não é dedutivel nos termos do art.° 19 ° n.° 2 do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado.»
(conforme resulta de fls. 28 e 29 do PAT em apenso)
D) Para efeitos de IRC, resulta do RIT:
«Tendo em atenção o acima exposto, quanto ao IVA, e considerando apenas os elementos apresentados no ato da inspeção, para o qual foi devidamente notificado para o fazer. A sociedade não apresentou outros documentos justificativos de custos, nestas condições vamos em conformidade acrescer o Lucro Tributável, pelos valores não apresentados.

Assim, o valor a acrescer ao Lucro Tributável, apresentado na Declaração mod. 22 IRC, neste exercício de 1997 é de 10.692.089$00. nos termos do artigo 41 ° n.º 1 alínea h) do Código do IRC.
Importa salientar que o valor corrigido por se referir a documentos não apresentados, logo despesas confidenciais, têm uma tributação autónoma de 30%, nos termos da Lei 52-C/96 de 27 de dezembro, a que corresponde o valor de 3.207.627800.»
(conforme resulta de fls. 29 e 30 do PAT em apenso)
E) Relativamente ao exercício do direito de audição, resulta do RIT:
«Em resposta ao Direito de Audição, exercido pelo contribuinte, em resposta à notificação que lhe foi entregue em 12 de junho de 2001, refere-se:
- A sociedade foi notificada em 28 de maio de 2001, para apresentar todos os elementos da escrita, nomeadamente, declarações periódicas e documentos comprovativos de custos, em 04/06/2001. Até àquele momento a sociedade não apresentou os documentos mencionados no ponto 3 do presente relatório. A não apresentação dos documentos até à conclusão dos atos de inspeção feita com a entrega da nota de diligências, em 07/06/2001, determina, obviamente, as respetivas correções, pela não apresentação dos documentos.
- As correções efetuadas vão incidir no ano de 1997, no entanto, após a receção do aditamento à resposta ao Relatório Projeto, rececionado em 26 de junho de 2001, de que se junta cópia foi novamente analisado o sistema informático do SAIVA, através de dados expurgados, que não estão disponíveis a todo o tempo, e as correções são alteradas em conformidade, no que se refere ao primeiro trimestre. Chama-se a atenção, para a importância do Sujeito Passivo ter sempre na sua posse fotocópias das Declarações Periódicas do IVA entregues e os respetivos comprovativos de registo.
O primeiro trimestre de 1997, passa a ter as seguintes correções;
- O IVA liquidado da Declaração Periódica entregue e constante nos dados expurgados é de 8.253.747$00 (Base de 48.551.450$00), o valor apurado na inspeção foi de 8.430.759$00 (Base de 49.592,700$00), logo temos de corrigir o IVA Liquidado em 177.012S00 (Base 1.041.250$00).

- O IVA deduzido, por não se ter comprovado, de acordo com a documentação apresentada, não é considerado, mantendo-se em conformidade as correções anteriormente feitas.
Relativamente às deduções de IVA das faturas da B…………, apenas tenho a referir que de acordo com inspeções a decorrer e já concluídas esta sociedade não existe, efetivamente.
O gerente ou já morreu ou é de difícil contacto, por outro lado, a sociedade que administra pessoal e que constantemente terá de contactar clientes, distribuir meios e instrumentos de trabalho, e nalguns casos mesmo transportar pessoal, não ter um escritório aberto e em pleno funcionamento, no mínimo é muito estranho.
Ainda acontece uma coisa interessante, é o facto de a A…………, empresa em análise, participar no capital da B………… com 20.000$00, que representa 5% do capital.»
F) Sobre os RIT recaíram o parecer e o despacho de concordância de fls. 25 do PAT, que aqui se dão por integralmente reproduzidos.
G) Em 04/10/2001 a AT emitiu a liquidação adicional de IRC referente ao exercício de 1997 (conforme resulta de fls. 14 do PAT em apenso).
H) O Prazo para pagamento voluntário terminou em 19/11/2001.
I) A Impugnante, em 31/05/2002, apresentou reclamação graciosa contra as liquidações adicionais de IRC do exercício de 1999.
J) Em apreciação da reclamação graciosa a que se refere a alínea anterior, foi elaborada a informação de fls. 54 e segs. do processo de reclamação graciosa em apenso, que aqui se dá por reproduzida.
K) Resulta da informação a que se refere a alínea anterior:
«II - QUESTÃO PRÉVIA
1. A R. alega preterição de formalidades essenciais e inexistência total do facto tributário “uma vez que não se encontra assente (provado) nos autos de inspeção”:
a) a existência de relações especiais entre si e a empresa B…………, LDA, de preços de transferência e o apuramento de lucro diverso do que se resultaria da ausência dessas relações, nos termos e para os efeitos do artigo 57° do Código do IRC;
b) os requisitos expressos no artigo 125° do CPA que exige a fundamentação das correções meramente aritméticas efetuadas, sob pena de vício de forma determinante da anulabilidade do ato tributário.
2. Razões pelas quais considera que a reclamação, apresentada no prazo previsto no n° 2 do artigo 70° do CPPT, é tempestiva.

3. Ora, de acordo com o teor do Relatório, a fls. 28, a R. foi inspecionada no âmbito de uma série de ações externas levadas a cabo junto de “empresas pertencentes aos mesmos sócios e que se participavam mutuamente”.
4. Este foi o motivo ou justificação para a realização da ação inspetiva que, no entanto, não foi relevante para a fundamentação das correções ao lucro tributável declarado dela resultantes.
5. Com efeito, as correções efetuadas são meramente aritméticas, ou seja, os serviços inspetivos não aceitaram, para efeitos fiscais, custos declarados porque os documentos de suporte apresentados não observam os requisitos legais ou porque, pura e simplesmente não foram exibidos, ainda que a R. tenha sido notificada para o efeito. A credibilidade da contabilidade não foi posta em causa, a existência ou não de relações especiais com outra(s) empresa(s), preços de transferência ou outros factos que a R. vem alegar aqui na petição não foram, então, considerados relevantes.
6. No que respeita à alegada falta de fundamentação deve referir-se que é entendimento pacífico, em face da abundância de jurisprudência e de doutrina firmada, que a referenciação inequívoca do ato tributário a um quadro normativo determinado configura fundamentação de direito suficiente.
7. Tal acontece no presente caso. No Relatório estão indicadas as normas dos Códigos do IVA e do IRC e de outra legislação - n° 5 do artigo 35°, n° 2 do artigo 19° do CIVA, alínea h) do n° 1 do artigo 41° do CIRC, artigo 31° da Lei n° 52-C/96, de 27 de dezembro, que alterou a taxa a que estão sujeitas as despesas consideradas confidencias previstas no artigo 4° do Decreto-Lei n° 192/90, de 9 de junho - que foram infringidas.
8. Quanto à invocada inexistência de facto tributário o artigo 70° do CPPT limita-a aos casos de violação das normas de incidência tributária e de benefícios fiscais (n° 3 do citado artigo).
9. A situação controvertida contende com regras de determinação (cálculo) do lucro tributável. A observância das regras de incidência pessoal (qualidade de sujeito passivo ou de responsável tributário) e objetiva (indicação dos rendimentos sujeitos a imposto) foi efetuada pela R: ao apresentar a declaração de IRC mod. 22 Os Serviços Inspetivos limitaram-se, face aos registos e documentos contabilísticos a aceitar ou não os custos imputados ao lucro tributável declarado. Pelo que, não se verifica a inexistência de facto tributário.
10. Finalmente, refere-se que o relatório com as conclusões da ação inspetiva referente ao exercício de 1997, foi notificado à R. em 2001.08.14 (fl. 14) e que a liquidação n° 8310012081, correspondente, data de 2001.09.21 (fl. 39), ou seja, não “foi ultrapassado o prazo perentório de seis (6) meses, cfr. cits. arts. 45° e 460 da LGV e, consequentemente, não caducou o direito de liquidar o imposto.
11. Em suma porque:
• não foram preteridas quaisquer formalidades legais;

• não se verifica a inexistência de facto tributário;
• não se verifica a caducidade do direito a liquidar o imposto (de conhecimento oficioso);
• a data limite de pagamento do imposto ocorreu em 2001.11.19 (fl. 42) e a petição só foi apresentada em 2002.05.31 (fls. 2), contrariando o disposto na alínea a) do n° 1 do artigo 102°, aplicável por remissão do n° 1 do artigo 70°, do CPPT;
• deve considerar-se a presente reclamação intempestiva.
III - INFORMAÇÃO SUCINTA
Realizada a instrução do processo, foi elaborado o projeto de decisão (fls. 53 a 57) e a Reclamante notificada, através de ofício n.º 30438 de 2002.11.08, para, no prazo de 10 dias, exercer o direito de audição nos termos do art.° 60° da Lei Geral Tributária (fls. 58 e 59).
Em 21 de novembro de 2002 a Reclamante exerceu esse direito, reafirmando que o prazo para contestar é de um ano conforme previsto no n° 2 do artigo 70° do CPPT, com fundamento na violação de normas de incidência tributária, conforme argumentos expendidos na reclamação graciosa nos “arts. 81° a 93º - em especial arts. 85 e 91"(fl. 60).
Ora, a reclamação é composta apenas por 81° artigos, correspondendo este último à conclusão ou ao pedido de deferimento (fl. 12).
Não resultando do exercício do direito de audição quaisquer factos novos ou relevantes suscetíveis de alterar o sentido do projeto de decisão proposto, deve ser mantido o indeferimento do pedido com os fundamentos constantes da presente informação.
À consideração superior.»
L) Sobre a informação a que se refere a alínea anterior recaiu o despacho de indeferimento da reclamação graciosa que aqui se dá por integralmente reproduzida (conforme resulta de fls. 61 do PAT).
M) O Despacho a que se refere a alínea anterior foi notificado à Impugnante por carta registada com aviso de receção em 11/03/03, (conforme resulta do processo de reclamação graciosa em apenso).
N) A AT emitiu as liquidações impugnadas:



O) A petição inicial for apresentada em 20/09/2004 (conforme resulta de fls. 2).
P) A AT em apreciação da presente impugnação elaborou a informação de fls. 96 a 100 do PAT em apenso que aqui se dá por integralmente reproduzida.
Q) Resulta da informação a que se refere a alínea anterior:
«(…) 7º O caso que se nos apresenta prende-se com a utilização indevida de créditos de imposto associada à entrega fora de prazo das declarações periódicas de IVA.
8º O campo 81 dos modelos das declarações periódicas de IVA, foi criado para a indicação das regularizações a crédito utilizadas, a fim de possibilitar tanto por parte da administração como do sujeito passivo, um controlo mais eficiente sobre a utilização desses créditos.
9º Só poderão indicar-se neste campo as regularizações a favor do contribuinte que tenham sido objeto de comunicação escrita por parte da Direção de Serviços de Cobrança do IVA,
10° A utilização dos respetivos valores será facultativa e visa corrigir erros materiais ou de cálculo praticados nas declarações referentes a períodos anteriores, comunicadas pela Direção de Serviços de Cobrança do IVA.
11º A inscrição, neste campo 81, de quaisquer importâncias superiores às comunicadas não serão consideradas no controlo do apuramento a efetuar pela Direção de Serviços de Cobrança do IVA.
12° Deverá ainda ter-se em atenção que, se as referidas regularizações já foram efetuadas, não deverão ser objeto de nova inscrição, considerando-se, nesse caso, erro na liquidação.
13° Da análise do anexo 2 à presente informação - resumo de declarações periódicas - verificamos que o sujeito passivo envia a declaração periódica de um determinado período, na maior parte dos casos, fora de prazo, sem ser acompanhada do meio de pagamento.
14° No anexo 1 à presente informação - regularizações a crédito - podemos analisar os créditos existentes e o apuramento feito pelos serviços à medida que vão sendo entregues as declarações periódicas, sem esquecer que o sujeito passivo as entrega sem respeito pelo prazo estabelecido nos arts. 28° e 40° do CIVA.
15° Assim, tomemos como exemplo o período de 0009 (fls. 1/26 do anexo 2):
a) O sujeito passivo enviou a declaração periódica do período referenciado a 30/07/2001, tendo apurado um montante de imposto a entregar de € 1.330,98,
b) Enviou a declaração sem meio de pagamento,

c) Como tinha um crédito de € 1.926,09 (identificado em A, a fls. 6/8 do anexo 1) foi feita a compensação entre os dois valores: regularizações a crédito - débito sem meio de pagamento, ou seja, 1.926,09 - 1.330,98,

d) E foi emitida nova regularização a crédito pela diferença, isto é, no montante de € 595,11 (identificado em B, a fls. 5/8 do anexo 1).
16° Este era o comportamento padrão do sujeito passivo, conforme se pode verificar da análise dos referidos anexos 1 e 2.
17° No período de 0012 (fls. 9/26 do anexo 2):
a) O sujeito passivo enviou a declaração periódica do período referenciado a 30/07/2001, tendo apurado um montante de imposto a entregar de € 2.310,97,
b) Enviou a declaração sem meio de pagamento,
c) Como tinha em saldo um crédito de € 14.037,30 (identificado em K, a fls. 3/8 do anexo 1) foi feita a compensação entre os dois valores: saldo das regularizações a crédito - débito sem meio de pagamento, ou seja, 14,037,30 - 2.310,97,
d) E foi emitida nova regularização a crédito pela diferença, isto é, no montante de € 11.726,33 (identificado em J, a fls. 2/8 do anexo 1).
18° O sujeito passivo enviou a declaração periódica de 9706T, a 11/09/2001, tendo apurado um montante de imposto a entregar de € 49.088,48 (fls. 11/26 do anexo 2).
19° Enviou a declaração sem meio de pagamento.
20° Como tinha em saldo um crédito de € 11.726,33 (identificado em J, a fls. 2/8 do anexo 1) foi feita a compensação entre os dois valores: saldo das regularizações a crédito - débito sem meio de pagamento, ou seja, 11.726,33-49.088,48,
21° Foi ainda emitida uma liquidação adicional de € 37.362,15 (fls. 13/26 do anexo 2).
22° No período de 0107, enviado a 14/11/2001, utilizou no campo 81 da declaração periódica a regularização a crédito de € 11.726,33, mas o sistema de apuramento já havia utilizado este crédito anteriormente e como só tinha em saldo um crédito de € 5.040,13 (fls. 2/8 do anexo 1) retificou-lhe o excesso a reportar em menos € 6.686,20.
23° No período de 0205 (fls. 16/26 do anexo 2):
24° O sujeito passivo enviou a declaração periódica do período referenciado a 22/10/2002, e utilizou no campo 81 da declaração periódica o saldo existente de € 5.040,13,
24° No entanto o sistema já não os tinha porque já tinham sido aplicados no período de 0107,
25° E apurou para este período imposto a pagar no montante de € 950,96.

26° Foram então emitidas as regularizações a débito - anexo 3 à presente informação - nos montantes de € 950,96, € 5.918,94 e € 4.857,13 para os períodos, respetivamente, de 0205, 0206 e 0207, por utilização indevida de créditos que já haviam sido utilizados e
27° No fecho do período (ano) foi emitida a liquidação adicional de € 11.726,33, referente aos montantes acima indicados pelos cheques não enviados uma vez que andava a reportar valores inexistentes (fls. 17/26 a 19/26 do anexo 2 e fls. 1 do anexo 3) e respetivos juros compensatórios.
Face ao exposto, devem os atos impugnados ser mantidos e remeter-se o presente processo ao Representante da Fazenda Pública junto do Tribunal Administrativo e Fiscal de Lisboa.»
R) Sobre a informação a que se refere a alínea anterior recaíram o parecer e o despacho de concordância de fls. 130 do PAT apenso, que aqui se dão, por integralmente reproduzidos.

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2.2. FUNDAMENTAÇÃO DO JULGAMENTO.
A decisão da matéria de facto resultou do exame dos documentos e informações oficiais, não impugnados, que dos autos constam, tudo conforme referido a propósito de cada uma das alíneas do probatório.
*
2.3. FACTOS NÃO PROVADOS
Com interesse para a decisão inexistem factos invocados que devam considerar-se como não provados.”

«»

3.2. DE DIREITO

Assente a factualidade apurada cumpre, então, antes de mais, entrar na análise da realidade em equação nos autos, sendo que a este Tribunal, estaria cometida, desde logo, a tarefa de indagar da nulidade da sentença por falta de fundamentação de direito.

Com efeito, nas suas alegações, a Recorrente refere que não é obrigada, nem isso a Lei determina, que a mesma tenha de atingir as conclusões não fundamentadas do douto Tribunal, porquanto devidamente compulsada a sentença proferida, a mesma é completamente omissa quanto à fundamentação, sendo que a devida fundamentação de Direito, importa que se indiquem não só os factos dados por provados, bem como e em particular, porquanto é nesse tocante que importa a douta aplicação da JUSTIÇA e o tribunal a quo limita-se a indicar factos - as datas supra indicadas - não promovendo contudo a devida subsunção dos factos ao Direito, para além de que inexiste, como é bom de ver nos presentes autos e no quanto à não aplicabilidade por parte do Tribunal a quo diz respeito da prescrição qualquer exame crítico, o mesmo é claramente OMISSO, sendo OMISSA a fundamentação de Direito, bastando para tanto indicar que não é sequer indicado um único artigo de direito, a fundamentar a posição adoptada pelo Tribunal a quo, o que significa que, atendendo ao supra exposto, desde já respeitosamente se requer que se reconheça o vício imputado à sentença em crise, determinando-se a revogação da mesma, o que desde já se requer para todos os devidos efeitos legais.

Relativamente ao núcleo essencial desta arguição, há que ter em atenção que, como é sabido, só se verifica tal nulidade quando ocorre falta absoluta de fundamentação, sendo que tal como refere o Prof. Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, volume V, página 140 “há que distinguir cuidadosamente a falta absoluta de motivação da motivação deficiente, medíocre ou errada. O que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação; a insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente, afecta o valor doutrinal da sentença, sujeita-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz nulidade. Por falta absoluta de motivação deve entender-se a ausência total de fundamentos de direito e de facto.”.

Porém, como refere o Cons. Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e de Processo Tributário, Anotado e Comentado, 5ª ed., Vol. I, pág. 909, “deverão considerar-se como falta absoluta de fundamentação os casos em que ela não tenha relação perceptível com o julgado ou seja ininteligível, situações em que se está perante uma mera aparência de fundamentação.

Com efeito, a fundamentação destina-se a esclarecer as partes, primacialmente a que tiver ficado vencida, sobre os motivos da decisão, não só para ficar convencida de que não tem razão, mas também porque o conhecimento daqueles é necessário ou, pelo menos, conveniente, para poder impugnar eficazmente a decisão em recurso ou arguir nulidades, designadamente a derivada de eventual contradição entre os fundamentos e a decisão.

Por isso, quando a fundamentação não for minimamente elucidativa das razões que levaram a decidir como se decidiu deverá entender-se que se está perante uma nulidade por falta de fundamentação”.

Diga-se ainda que a fundamentação de direito, por norma, é feita por indicação da norma ou normas legais em que se sustenta, mas poderá, também, ser estruturada por mera indicação dos princípios jurídicos ou doutrina jurídica em que se baseia.

Por outro lado, quanto à nulidade decorrente da falta de exame crítico das provas, é sabido que nos termos do disposto nos arts. 123º nº 2 do CPPT e 659º nº 3 do C. Proc. Civil, na elaboração da decisão final o julgador está vinculado a elencar discriminadamente, a factualidade demonstrada da não provada, fundamentando porque veio a tomar o sentido decisório final, seja no que concerne ao julgamento da matéria de direito, seja, como é axiomático e evidente, no que diz respeito ao julgamento da matéria de facto, na medida em que aquele mais não será do que subsunção desta última ao enquadramento jurídico tido por relevante e aplicável.

Nesta sequência, cumpre notar que o vício em apreço, em qualquer das vertentes apontadas, apenas ocorre quando haja ausência total de fundamentos, de modo que, considerando os termos da decisão recorrida, é manifesto que a invocada nulidade não pode ser atendida na medida em que foram fixados os factos descritos no probatório relacionados com a problemática em causa, procedendo-se depois à análise das questões apontadas nos autos, o equivale a dizer que a decisão recorrida, ao contrário do defendido pela Recorrente, exterioriza de forma expressa e clara as razões pelas quais julgou a presente impugnação improcedente e que se traduzem no simples facto de a Recorrente ter impugnando as liquidações adicionais de IVA de 2002 e respectivos juros compensatórios e de não lhes ter imputado qualquer vício especifico, uma vez que toda a causa de pedir se reporta a outros actos tributários que não os sindicados, o que a recorrente não põe, expressamente, em causa, ou seja, qualquer destinatário normal colocado na posição da Recorrente não poderia deixar de entender a motivação de direito que determinou a improcedência da impugnação judicial, pelo que, tem de improceder o presente recurso na parte em que reclama a nulidade da sentença por falta de especificação dos fundamentos de direito.

A Recorrente aponta depois que no ordenamento jurídico tributário a prescrição é de conhecimento oficioso (art.º 175.º do CPPT) e as dívidas tributárias prescrevem assim e de acordo com a Lei, salvo o disposto em lei especial, no prazo de oito anos, sendo que a interrupção inutiliza para a prescrição todo o tempo decorrido anteriormente, começando a correr novo prazo a partir do ato interruptivo (n.º 1 do art.º 326.º do Código Civil), sendo que é neste tocante que mal andou o douto Tribunal a quo, pois que a vertente que adopta a posição s.m.e. inconstitucional, não começaria a correr de novo o prazo de prescrição, enquanto o processo não tiver termo, labora assim em erro, porquanto ficaria assim o executado refém de uma Justiça que se poderia atrasar no tempo e ser obliterada no espaço, renascendo assim a hipotética divida, anos ou décadas mais tarde, sendo que este entendimento, tal qual o entendimento que não pode ser colhido mas que se encontra a enformar a sentença ora em crise, viola os princípios do Estado de direito e coloca em crise os princípios da boa-fé e da protecção da confiança, mais atendendo a que não existe já uniformidade na jurisprudência, porquanto, no acórdão do STA, tirado no processo n.º 01121/16, de 23.11.2016, foi lavrado por um juiz Conselheiro voto de vencido, impondo-se considerar que o facto que interrompe a prescrição, nos presentes autos, ocorre com a citação no processo judicial aqui em causa, i e, em 20.09.2004 e que, conforme melhor decorre da Lei, inutiliza-se o tempo até ai então decorrido, verificando-se, no entanto e para boa e conforme aplicação da Lei, ao abrigo dos mais basilares ditames e orientações Constitucionais supra melhor indicadas alegadas e legalmente, jurisprudencialmente e doutrinariamente fundamentas, nesse mesmo momento, renasce a contagem do prazo para efeitos de prescrição, e assim, atendendo ao período de prescrição de oito anos, tendo iniciado novo período de contagem em 20.09.2004, sempre a prescrição tem de ser reconhecida, com efeitos à data de 19.09.2012, o que respeitosamente se requer em estrita conformidade com a tão douta e costumada JUSTIÇA!.

Que dizer?

Como é sabido, em sede de impugnação judicial, a prescrição da obrigação tributária nunca poderá constituir causa de pedir do pedido de anulação da liquidação, mas apenas poderá ser conhecida, incidentalmente, como motivo de extinção da instância por inutilidade superveniente da lide: no caso de a obrigação tributária não estar ainda solvida e de ser inquestionável o decurso do prazo da respectiva prescrição, a AT, ainda que a impugnação seja julgada improcedente, não poderá instaurar execução com vista à cobrança da dívida correspondente, bem como deverá oficiosamente declarar extinta a execução (cfr. art. 175.º do CPPT), caso esta tenha já sido instaurada. Assim, apesar de a prescrição não poder constituir fundamento de impugnação judicial da liquidação, a jurisprudência tem vindo a admitir que pode ser apreciada nessa sede, mesmo oficiosamente, como motivo da inutilidade superveniente da lide: verificada a prescrição da obrigação tributária, que determina a inexigibilidade da correspondente dívida, com a consequente impossibilidade de cobrança coerciva, a impugnação judicial em que se visa apenas a apreciação da legalidade da liquidação que lhe deu origem deixa de ter utilidade; nesse circunstancialismo, deve extinguir-se a instância por inutilidade superveniente da lide, nos termos do art. 277.º, alínea e), do C. Proc, PC (Neste sentido JORGE LOPES DE SOUSA, Sobre a Prescrição da Obrigação Tributária, Notas Práticas, Áreas Editora, 2.ª edição, págs. 23 a 25.).

Cumpre também ter presente que a prescrição da obrigação tributária em sede de impugnação judicial apenas deve ser conhecida, como causa da eventual inutilidade superveniente da lide, nos casos em que do processo constem (não havendo de diligenciar nesse sentido, pois não se trata de questão a apreciar em impugnação judicial) todos os elementos que permitam uma decisão segura quanto àquela questão, designadamente, quando do processo constem os elementos que permitam atender a possíveis causas de interrupção e suspensão da prescrição, que poderão ter ocorrido noutros processos administrativos ou contenciosos.

No caso presente, o Tribunal a quo ponderou o seguinte:

“…

Nas doutas alegações, a Impugnante, aos vícios indicados na douta petição inicial, veio invocar a prescrição da dívida a que se referem as liquidações de 1997.

Porque, nos termos do artigo 175.º do CPPT a prescrição é de conhecimento oficioso, importa, pois, verificar se a dívida a que se refere as liquidações de IVA de 2002 impugnadas se encontram prescritas.

Nos termos do artigo 48.º, n.º 1, da LGT, as dívidas tributárias, salvo disposição em lei especial, prescrevem no prazo de oito anos.

Atento o disposto no artigo 49.º, n.º 1, do mesmo diploma legal, a impugnação da liquidação do tributo interrompe a prescrição.

Ora, no caso dos autos as liquidações impugnadas reportam-se ao ano de 2002, foram elaboradas em 29/05/2004, o prazo para pagamento voluntário terminou em 31/08/2004 e a presente impugnação foi apresentada em 20/09/2004.

Do exposto resulta claro que o prazo de prescrição das dívidas a que se reportam as liquidações impugnadas ainda não se completou. …”.

Assim, a sentença recorrida, não obstante ter conhecido do mérito da impugnação judicial, na medida em que a julgou improcedente por não ter sido imputado qualquer vício às liquidações sindicadas, conheceu da prescrição da dívida, tendo-a considerado não prescrita, por via do ato interruptivo decorrente da instauração da impugnação judicial em 20/09/2004.

Neste ponto, resulta claro que, nos termos do disposto nos artigos 48º e 49º da LGT (na redacção vigente em 2004) o efeito interruptivo da instauração da impugnação judicial tinha como consequência a eliminação de todo o tempo até aí decorrido, não voltando o prazo a correr enquanto não transitar em julgado a decisão que puser termo à aludida impugnação judicial.

No entanto, se a impugnação judicial esteve parada por mais de um ano por facto não imputável à recorrente, o efeito interruptivo convola-se em suspensivo, nos termos do então nº 2 do artigo 49º da LGT, sendo certo que esta factualidade não foi levada ao probatório, embora seja certo que decorre de fls. 38/39 do processo físico que os autos pararam por mais de um ano a partir de 09/11/2005, realidade que incompreensivelmente foi ignorada pelo Tribunal a quo.

Além disso, não consta do probatório e dos autos se a dívida tributária foi ou não paga espontaneamente e, portanto, se se pode invocar a prescrição, se existe PEF, se a Recorrente foi ou não citada e em que data, se foi ou não prestada garantia e em que data, factos esses susceptíveis de relevar, enquanto factos interruptivos e suspensivos da prescrição e determinantes para se poder apreciar a prescrição da dívida - artigos 48º e 49.º da LGT.

Isto equivale a dizer que do probatório e dos autos não constam todos os elementos necessários para apreciação da eventual prescrição da dívida, sendo certo que, o Tribunal recorrido apenas podia conhecer, oficiosamente, da prescrição, a título incidental, tendo em vista a avaliação da eventual utilidade ou não do prosseguimento da lide e não, como fez, conhecendo, simultaneamente do mérito da causa e da prescrição.

Todavia, a Recorrente apenas argui a nulidade da sentença por falta de fundamentação de direito e no segmento em que julgou não prescrita a dívida e já não no segmento em que julgou improcedente a impugnação judicial por falta de causa de pedir, por não ter sido imputado qualquer vício às liquidações sindicadas.

Nestas condições, resta apenas negar provimento ao recurso perante o que ficou dito relativamente ao primeiro elemento (nulidade da sentença por falta de especificação dos fundamentos de direito), dado que, sem prejuízo do que ficou exposto relativamente à questão da prescrição (de modo a deixar um obiter dictum para o futuro), resulta evidente que a decisão de improcedência da impugnação judicial torna-se inatacável, o que significa que, o conhecimento da prescrição nesta sede, que visa apenas indagar da eventual inutilidade superveniente da lide, pois que, verificada a prescrição da obrigação tributária, que determina a inexigibilidade da correspondente dívida, com a consequente impossibilidade de cobrança coerciva, a impugnação judicial em que se visa apenas a apreciação da legalidade da liquidação que lhe deu origem deixa de ter utilidade, deixa de ter qualquer sentido neste contexto.

Finalmente, cabe notar que esta análise em nada coloca em crise a posição da ora Recorrente, que sempre poderá suscitar esta questão junto do órgão de execução fiscal, no caso de, como é habitual, terem sido instaurados processos de execução fiscal com referência às dívidas relacionadas com as liquidações descritas nos autos, sendo que, ainda que esteja esgotado o prazo para deduzir oposição à execução fiscal, sempre a ora Recorrente poderá requerer ao órgão de execução fiscal que declare a prescrição das obrigações tributárias, com reclamação para o tribunal, nos termos do art. 276.º do CPPT, no caso de eventual decisão de indeferimento.




4. DECISÃO

Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal, de harmonia com os poderes conferidos pelo art. 202.º da Constituição da República Portuguesa, em negar provimento ao recurso jurisdicional interposto pela Recorrente, mantendo-se a decisão judicial recorrida.

Custas pela Recorrente.

Notifique-se. D.N..




Lisboa, 14 de Outubro de 2020. - Pedro Vergueiro (relator) - Aragão Seia - Nuno Bastos.