Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:077/08.0BEVIS 01509/17
Data do Acordão:10/24/2018
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ARAGÃO SEIA
Descritores:NULIDADE
MANDADO JUDICIAL PARA ENTRADA NO DOMICILIO
REVENDA
JUSTO IMPEDIMENTO
PROVAS
BUSCA
PROCEDIMENTO DE INSPECÇÃO TRIBUTÁRIA
Sumário:I - Os Tribunais Tributários não são competentes para apreciar da validade da execução dos mandados de busca se os mesmos foram emitidos e cumpridos no âmbito de um processo de inquérito criminal cabendo, por isso, à autoridade judicial que superintende nesse processo a apreciação desta questão.
II - Não se verifica o justo impedimento se a dificuldade da revenda resulta de factos originados na vontade da própria contribuinte que deu um destino ao imóvel diferente da venda;
III - Instaurado inquérito crime para investigação de infracções em que são visadas várias empresas e o comum sócio gerente das mesmas e ordenadas, por despacho do Ministério Público, busca a realizar no local da sede dessas empresas, bem como, por despacho do juiz de instrução criminal, busca a realizar no local da residência do mesmo sócio gerente (local que é também o indicado como sede da impugnante), não sofre de ilegalidade a liquidação adicional decorrente de correcções técnicas operadas com base em elementos documentais obtidos na busca realizada no local da sede daquelas empresas (que não a recorrente).
IV - A alteração do procedimento inspectivo, nos termos e para efeitos do disposto no art. 15º do RCPIT, por parte da entidade que o tenha ordenado, pressupõe que tal procedimento ainda esteja a ser executado.
Nº Convencional:JSTA00070969
Nº do Documento:SA220181024077/08
Data de Entrada:12/29/2017
Recorrente:A... SA
Recorrido 1:AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:RECURSO JURISDICIONAL
Objecto:SENTENÇA DO TAF DE VISEU
Decisão:NEGA PROVIMENTO
Área Temática 1:PROCEDIMENTO TRIBUTÁRIO
Legislação Nacional:Nº2 do Artigo 270º do CIRE, ARTIGOS 174º, nº2, 176º, 177º, 178º, nº1, e 269º, nº 1, alínea a), do CPP, e artigos 2º, 3º, nº2, 9º, 32º, nº8, e 62º, 266º, da CRP, 15º, nº 1 e 36º, nº2 e 4, do RCPIT, 3º, nº1, 4º, nº2, 5º, 6º e 6º-A, do CPA
Aditamento:
Texto Integral: Acordam os juízes da secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

A………….., SA, inconformada, interpôs recurso da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu (TAF de Viseu) datada de 19 de Abril de 2017, que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida contra o acto de liquidação de Imposto Municipal de Sisa no montante de € 104.747,56 e respectivos juros compensatórios no valor de € 22.166,31 por aquisição de prédio urbano sito na freguesia de ……….., Concelho de Oliveira de Frades, inscrito na matriz predial sob o artigo 365.
Alegou, tendo apresentado conclusões, como se segue:
1. A Recorrente não revendeu o imóvel no prazo de três anos em virtude de factos que não lhe são imputáveis.
2. Sendo que tal situação se enquadra na figura do “justo impedimento”
Sem prescindir
3. O imóvel em causa foi adquirido à massa falida da “C…………., S.A.”.
4. Entende a Recorrente que ao caso se deve aplicar a norma constante do n.° 2 do art.° 270.º do CIRE, uma vez que aquando do término do prazo de três anos para a revenda do imóvel, bem como aquando da liquidação impugnada aquela norma já se encontrava em vigor.
5. Assim sendo, e por aplicação daquele preceito legal a Recorrente estava isenta do pagamento do IMT (antes SISA).
Sem prescindir
6. A documentação que foi apreendida, respeitante à impugnante, que serviu para a AT fundamentar a liquidação impugnada, foi obtida na Rua …………, ……….., Porto, para cujo local não havia qualquer autorização judicial e respectivo mandado com referência à impugnante.
7. Tal actuação consubstancia a utilização de um meio de prova ilícito, porque angariado de forma ilícita, uma vez que foram violados os art.°s 174°, n°2, 176°, 177.°, 178.°, n.°1 e 269.°, n.° 1, al. a), do CPP.
8. Tal actuação é, também, violadora dos artigos 2.°, 3.°/2, 9°, 32.°/8 e 62.° da Constituição da República Portuguesa.
9. Qualquer interpretação das normas invocadas e/ou qualquer decisão que venha a sufragar admissibilidade e utilização desses documentos pela AT, como fonte de prova para as aludidas liquidações do IRC, violará aqueles normativos constitucionais, consubstanciando uma inconstitucionalidade que, desde já, se invoca.
10. A busca e apreensão dos aludidos documentos em local para o qual não havia autorização, configura um acto inválido, sancionado pela ordem jurídica como nulo e de nenhum efeito, nulidade essa que inquina todos os actos subsequentes, designadamente as liquidações impugnadas.
11. Acresce que a ilicitude dos meios de prova angariados e a sua nulidade decorre também do facto dos mandados de busca em causa, por força do n.° 4 do art.° 174.° do CPP, já não serem válidos no momento em que as mesmas foram efectuadas, uma vez que os respectivos despachos são de 29.06.2006 e 3.07.2006 e as buscas foram efectuadas em 10.10.2006, sendo o prazo de validade de apenas 30 dias, nulidade essa que se invoca.
12. Sendo esta nulidade insanável, invocável a todo o tempo e de conhecimento oficioso, nos termos do n.° 3 do art.° 126.° do Código de Processo Penal.
13. Os documentos/provas utilizados pela AF são ilícitas e nulas.
14. Sendo que a utilização daqueles elementos inquina, inevitavelmente, as liquidações impugnadas que são também inválidas.
15. Reiterando-se que qualquer interpretação das normas já invocadas e/ou qualquer decisão que venha a sufragar admissibilidade e utilização desses documentos violará os já referidos normativos constitucionais, consubstanciando uma inconstitucionalidade que, mais uma vez, se invoca.
Por outro lado
16. A AT, violando o princípio da continuidade do acto inspectivo, veio, desnecessariamente, abrir dois novos procedimentos inspectivos quando já tinha um a decorrer há muitos meses e tinha em seu poder os elementos apreendidos na busca.
17. O procedimento da inspecção OI200509731 era o próprio para alcançar os fins que se pretendiam alcançar com o OI200605560 e o OI200701879, podendo e devendo ter sido alterado quanto ao fim e ou âmbito e ou extensão, pelo que estes novos procedimentos são uma excrescência procedimental, na medida em que foram criados em contravenção com as referidas disposições legais dos artigos 15.°/1 e 36.°/2/3/4 do RCIPT, dada a existência na ordem jurídica de um procedimento de inspecção, em curso, suficiente e bastante para alcançar os objectivos alcançáveis por estes.
18. A AT usou mal, abusando do meio posto à sua disposição para fiscalizar situações tributárias dos contribuintes, defraudando e violando os princípios constitucionais e administrativos da legalidade, proporcionalidade, da boa-fé e da confiança, que devem enformar todos os actos da administração Pública previstos, aliás, nos artigos 266.º da CRP, 3.°/1, 4.°/2, 5°, 6.º e 6.°-A do CPA, bem como o art.°15.°/1 e o art.° 36.°/2/4 do RCPIT.
19. Sendo que esta actuação, que defrauda o espírito da lei, inquina também as liquidações impugnadas.
20. Deve pois a liquidação reclamada e respectivos juros ser anulada porquanto deriva de actos e procedimentos ilegais.
Termos em que deve ser revogada a sentença recorrida e julgada procedente a impugnação.

Não houve contra-alegações.

O Ministério Público notificado, pronunciou-se pela improcedência do recurso e confirmação do decidido na sentença recorrida.

Colhidos os vistos legais cumpre decidir.
Na sentença recorrida deu-se como assente a seguinte factualidade concreta:
A) Em 12/12/2001, no Segundo Cartório Notarial de Aveiro, a fls. 4/5, do livro de notas para escrituras diversas n.° 194-F, foi lavrada escritura pública, intitulada “compra e venda”, da qual consta, para além do mais, o seguinte:
“[…]
Primeira — Dr.ª D………….. […] que intervém na qualidade de liquidatária judicial da massa falida da sociedade comercial anónima com a denominação, “C………….., SA.” […]
Segunda — E…………. […] que intervém na qualidade de administradora da compradora: sociedade comercial anónima com a denominação “A………….., SA.” […]
Disse a primeira outorgante: que pelo preço, já recebido, de duzentos e dez milhões de escudos, vende, livre de ónus ou encargos, à sociedade que a segunda outorgante representa o seguinte imóvel pertencente à massa falida da indicada sociedade sua representada:
- Edifício industrial de rés do chão, com onze divisões, e rocio, com a área coberta de três mil cento e cinquenta metros quadrados, sito no Monte ………… em …………., da freguesia de ……….., do concelho de Oliveira de Frades, inscrito na matriz urbana sob o artigo 365, com o valor patrimonial de 9.856 080$00, descrito na Conservatória de Oliveira de Frades sob o número cento e catorze, cujo direito de propriedade se encontra ali registado a favor da indicada sociedade “C……………”, pela inscrição G-Um, com duas hipotecas registadas a favor do Banco Espirito Santo e Comercial de Lisboa, pelas inscrições C-Um e C-Dois; com uma penhora inscrita pelo F-Um em que é exequente a Fazenda Nacional, e com duas hipotecas legais, inscritas pelos C-Quatro e C-Cinco, a favor do Serviço Sub Regional de Coimbra, Centro Regional de Segurança Social do Centro e com a apreensão em processo de falência, inscrita pelo F-dois.
Disse a segunda outorgante: que aceita esta venda para a sociedade sua representada e que o imóvel se destina a revenda em conformidade com o objeto da sociedade compradora.
Arquivo: uma certidão passada no segundo Serviço de Finanças de Vila Nova de Gaia, que mostra que a sociedade compradora se encontra ali coletada com a atividade de “Industria de construção Civil, comércio de prédios para revenda e participações sociais” e que no ano findo exerceu essa atividade.
A transmissão está isenta de sisa nos termos do n° 3 do artigo 11º do Código do Imposto Municipal da Sisa.
[…]”.
B) O imóvel mencionado na alínea A) foi vendido no âmbito da liquidação da massa falida da sociedade C…………., S.A., que correu termos pela Secção Única do Tribunal Judicial de Oliveira de Frades, sob o nº 163-C/2000.
C) Em 02/07/2002, a impugnante, intervindo na qualidade de primeira contraente, celebrou com a sociedade denominada “F…………, S.L.”, que interveio como segunda contraente, um acordo escrito intitulado “contrato de arrendamento, aluguer e promessa de venda”, do qual se extrai o seguinte:
“[…]
É ACORDADO O CONSTANTE DAS SEGUINTES CLÁUSULAS:
ARRENDAMENTO E ALUGUER
PRIMEIRA
A primeira outorgante é dona e legitima possuidora do seguinte imóvel: edifício industrial de rés-do-chão, sito no Monte ………… em …………, freguesia de ……………, concelho de Oliveira de Frades, inscrito na matriz urbana sob o art° 365, descrito na competente Conservatória do Registo Predial sob o n° 114, com alvarás de licença de utilização n°s 39 e 40, emitidos em 22-06-1993, e 4 e 5, emitidos em 26-01-1996 pela Câmara Municipal de Oliveira de Frades.
SEGUNDA
A primeira contraente dá de arrendamento e a segunda contraente toma de arrendamento, para o estrito fim definido no ponto um da cláusula sexta, o imóvel descrito na cláusula anterior.
[…]
PROMESSA DE VENDA
DÉCIMA
1. A primeira contraente promete vender à segunda o imóvel descrito na cláusula primeira, bem como os bens móveis que constam do inventário em anexo.
2. O preço da venda será o seguinte: Um Milhão e Seiscentos Mil Euros (1.600.000,00 Euros).
Imóvel: Um Milhão de Euros (1.000.000,00);
Móveis: Seiscentos Mil Euros (600.000,00), ao qual acresce 19% de I.V.A.;
3. O preço, global, terá que ser pago na data da escritura pública de compra e venda, através de cheque visado, sendo que o pagamento é condição essencial para que se efectue os actos de transmissão dos bens que aqui se prometem vender, sob pena da primeira contraente legitimamente se recusar a vender.
4. No caso da segunda contraente decidir efectuar a compra, a primeira contraente fará sua a quantia dada em caução, mencionada na cláusula décima, sendo esse montante deduzido ao montante total do preço referido no ponto dois desta cláusula.
5. A presente promessa de venda é eficaz até ao dia 31 de Agosto de 2003 […]”.
D) Em 30/10/2003, no âmbito do processo ordinário que correu termos pela 3.ª Secção da 9.ª Vara do Tribunal Cível da Comarca do Porto, sob o nº 1840/03.4TVPRT, foi proferida sentença pela qual se declararam resolvidos os contratos de arrendamento e aluguer a que se alude na alínea que antecede e condenou-se a sociedade F………….., S.L. a entregar à impugnante os locados, com todas as máquinas, equipamentos e utensílios constantes da lista anexa ao contrato de arrendamento e a pagar a quantia de 100.000,00 € a título de rendas vencidas e não pagas, bem como das rendas que se vencerem desde a instauração da ação até efetiva entrega dos arrendados e das referidas máquinas e utensílios.
E) A impugnante foi objeto de uma ação de inspeção, levada a efeito a coberto da ordem de serviço n.º DI200509731, de 24/05/2005, para recolha de elementos com vista a informar o processo de inquérito n.° 1172/05.3.
F) A referida ação inspetiva incidiu sobre os exercícios de 2002 e 2003 e teve o seu início em 30/06/2003.
G) No âmbito do processo de inquérito a que se alude em E), em 29/06/2006, o Exmo Sr. Magistrado do Ministério Público proferiu despacho, do qual consta, designadamente, o seguinte:
“O presente inquérito foi instaurado para investigação da prática de crimes de fraude fiscal em que são visados B…………… e as sociedades de que é sócio gerente, face à desconformidade entre os valores por si declarados como rendimentos nos exercícios de 2002 e 2003 e aqueles que parecem resultar da análise das contas bancárias que movimenta e dos avultados gastos em Casinos.
Para concretizar tal desiderato é fundamental desencadear acções inspectivas a esses sujeitos passivos, sem perder de vista a sua ligação na perspectiva da circulação de capitais entre si. Tal procedimento foi já accionado pela Divisão de Processos Criminais Fiscais e encontra-se em curso nos Serviços de Inspecção Tributária.[…]
Acontece que o denunciado B………….. procura dificultar o acesso aos documentos que lhe são pedidos e inclusivamente obstar à presença dos inspectores tributários, atitude que faz antever a intenção de ocultar ou descaminhar provas absolutamente imprescindíveis à instrução do presente inquérito.
Assim sendo;
1. Determino a realização de uma busca às instalações das empresas ………….., Ldª, …………, Ldª, …………, Ldª, ………….., Ldª, …………, Ldª, ………….., Ldª e ……….., Ldª, onde aliás decorria a acção inspectiva na R. …………, ……, ………., Porto, com apreensão de todos os documentos conexionados com a actividade comercial destas empresas e do arguido, incluindo computadores, suportes informáticos, extractos de contas, cheques e outros tidos por relevantes para a acção inspectiva, ao abrigo dos art°s 174º, n.º 2, 176° e 178º, n°1, do CPP.
Passe mandados de busca.
2. Promovo a realização de uma busca à residência do denunciado B………… situada na Alameda …………, ……, ……….., Vila Nova de Gaia, local onde também tem sede a empresa A…………., SA (presentemente alvo de inspecção Tributária), a fim de apreender todos os documentos da contabilidade conexionados com a actividade comercial do arguido e das empresas a que está ligado, incluindo computadores, suportes informáticos, documentação bancária que identifique movimentos de depósito ou levantamento em contas bancárias do arguido e das suas empresas, contratos e todos os demais com interesse para a investigação;
Assim, remeta os autos à consideração do Mm° Juiz de Instrução Criminal junto de quem se promove que ordene diligência de busca e apreensão na citada residência ao abrigo dos art°s 174º, n°2, 176º, 177º, nº, 178º, n°1 e 269, n°1, al. a), todos do CPP”.
H) Em 03/07/2006, o Mm°. Juiz do 3.° Juízo de Instrução Criminal do Porto proferiu despacho com o seguinte teor:
“Deferindo ao requerido pelo Ministério Público, e por se verificarem os necessários pressupostos legais, autorizo que se proceda a uma busca à residência de B…………., sita na Alameda …………., ……., ……….., Vila Nova de Gaia, local onde também tem sede a “A……………., SA.”, se necessário com arrombamento de portas com vista à apreensão de artigos, objectos e documentos relacionados com os crimes de fraude fiscal em investigação — artigos 174º, n°2, 177 n°1, e 269º, n°1, al. a), do Código de Processo Penal […]”.
I) Em 10/10/2006, a Divisão de Processos Criminais Fiscais da Direção de Finanças do Porto, lavrou o “auto de busca e apreensão”, no qual se indica como local de realização da diligência a “Rua …………., ……….. – Porto”.
J) Em 22/05/2007 foi dirigido à impugnante, o oficio n.° 43522/0506, sob o assunto “Notificação de procedimento inspectivo”, subscrito pelo Sr. Chefe de Divisão de Inspeção Tributária III da Direção de Finanças do Porto, do qual consta, designadamente o seguinte:
“[…] Para os efeitos previstos no artigo 51.º do RCPIT e uma vez que o administrador da empresa, Sr. B…………, não se disponibilizou a assinar a ordem de serviço, fica por este meio notificado do início do procedimento inspectivo de âmbito e extensão conforme OI200701879 que se anexa […]”.
K) Em 22/05/2007, foi dirigido à impugnante, o oficio n.º 43523/0506, sob o assunto “Notificação dos actos de inspecção tributária subscrito pelo Sr. Chefe de Divisão de Inspeção Tributária III da Direção de Finanças do Porto, do qual consta:
“[...] Fica por este meio notificado, da conclusão do procedimento realizado a coberto do Despacho n° DI200509731, conforme nota de diligências que se anexa. […]”.
L) Em 11/09/2007, pela Divisão de Inspeção Tributária III da Direção de Finanças do Porto foi emitida informação da qual se extrai o seguinte:
“[…]
No decurso da acção de fiscalização ao sujeito passivo, A………….. SA., com NIPC: ……….. e sede em Alameda …………, n°……, ……… 4405-…… - VILA NOVA DE GAIA desenvolvida ao abrigo da Ordem de Serviço OI200701879 de 2007/05/16 constatou-se o seguinte:
1. - SISA
A sociedade A…………… SA. encontra-se registada para o exercício de “compra e venda de bens imobiliários — CAE 070120”.
No âmbito da sua actividade, a sociedade efectua aquisições de imóveis para revenda, usufruindo por este facto do regime de isenção de SISA.
Tal regime estava previsto no n.° 3 do artigo 11.° do CIMSISSD que, entretanto foi revogado pelo Dec.-lei n°287/2003 de 12 de Novembro que, instituiu o CIMT onde no seu artigo 7.° é dado um tratamento idêntico às aquisições de imóveis que se destinam a revenda.
Da análise efectuada às compras realizadas, foram detectadas irregularidades que consubstanciam a perda do beneficio da isenção de SISA que, a seguir se passam a transcrever:
Para efeitos da determinação da taxa a aplicar nos casos previstos no n.º 3 do artigo 11.º artigo 16.° e artigo 30.° do CIMSISSD, sobressai o entendimento da Administração Fiscal emanado da DSISTP consubstanciado no despacho de 2004.11.22 do subdirector Geral que recaiu sobre a informação n.º 2533, estabelecendo deste modo que, em caso de caducidade da isenção nas aquisições dos prédios destinados a revenda “a legislação e taxas aplicáveis são aquelas que estavam em vigor à data a que se reportar a transmissão onerosa”.
1.1. — ANO DE 2004
Por escritura de compra e venda realizada no Segundo Cartório de Aveiro em 2001.12.12 - Anexo I- págs. 1 a 3 - a A………….. SA. adquiriu o prédio urbano inscrito na matriz predial da freguesia de …………, concelho de Oliveira de Frades, sob o artigo 365, pelo preço total de € 1.047.475,58, com isenção de SISA ao abrigo do disposto no n.° 3 do artigo 11.º do CIMSISSD, conforme consta da referida escritura.
O benefício de isenção de SISA ao abrigo do normativo acima invocado está condicionado no tempo. Nestes termos não tendo a sociedade A…………… S.A. alienado o referido imóvel no período de 3 anos, ficou sujeita às normas de incidência do imposto da SISA a partir de 2004.12.12, “terminus” do prazo para revenda
No ano de 2005 o imóvel ainda constava do mapa de stocks, - Anexo II-págs 4 a 6.
Após consulta ao sistema informático da DGCI verificou-se que na presente data, o imóvel se encontra averbado em nome da A…………, S.A.
• Valor Tributável - € 1.047.475,58
• Taxa a aplicar - 10% […]”
M) Sobre a informação mencionada em L) recaiu despacho de concordância do Sr. Chefe de Divisão, datado de 24/09/2007.
N) Pelo ofício n° 2977, de 10/10/2007, a impugnante foi notificada para “efectuar o pagamento da SISA devida pela aquisição do prédio urbano da freguesia de …………., inscrito na matriz predial sob o art.° 365, titulada pela escritura lavrada a fls. 4 do L. 194-F, lavrada no 2.° C.N. de Aveiro em 2001-12-12, no valor de 104.747,56 € (10% do valor de aquisição), liquidada nos termos do art.º 116 do mesmo preceituado legal, acrescido do montante de 22.166,31 € de juros compensatórios, calculados a contar da data do contrato de aquisição à taxa de 7% até 2002/04/30 e de 4% a partir de 2002/05/01”.
Nada mais se deu como provado.

Há que conhecer do recurso que nos vem dirigido.
Seguindo o esquema de conhecimento das questões colocadas pelas partes, desenhado na sentença recorrida, a Recorrente começa por insurgir-se contra a sentença por entender que se verifica justo impedimento na falta de revenda do prédio no prazo de três anos.
Considera também que aquando do termo do prazo de três anos –após a aquisição do imóvel- já se encontrava em vigor o nº2 do artigo 270º do CIRE, à luz do qual beneficia da isenção do pagamento do imposto devido.
Considera igualmente que a liquidação realizada pela AT foi baseada em documentação obtido de forma ilegal, uma vez que o mandado para o local onde foi realizada a busca não fazia qualquer referência à impugnante, tendo sido violados os artigos 174º, nº2, 176º, 177º, 178º, nº1, e 269º, nº 1, alínea a), do CPP, e artigos 2º, 3º, nº2, 9º, 32º, nº8, e 62º, todos da CRP. E nessa medida considera que a busca e apreensão dos aludidos documentos em local para o qual não havia autorização, configura um acto inválido, sancionado pela ordem jurídica com a nulidade, o que inquina todos os actos subsequentes, designadamente as liquidações impugnadas.
Entende igualmente que a busca padece do vício de nulidade insanável por ter sido realizada após o decurso do prazo de 30 dias a contar da data de emissão dos mandados de busca.
Considera, por último, que a AT realizou indevidamente dois procedimentos de inspeção, com violação dos princípios da legalidade, proporcionalidade e da boa fé e do disposto nos artigos 15º, nº 1 e 36º, nº2 e 4, do RCPIT, 3º, nº1, 4º, nº2, 5º, 6º e 6º-A, todos do CPA, e 266º da CRP.

Resulta do probatório da sentença sindicada que em 12/12/2001 a impugnante e aqui Recorrente adquiriu um imóvel que fazia parte de massa insolvente, pelo preço de 210 milhões de escudos, tendo declarado que o destinava a revenda, beneficiando desse modo de isenção de sisa, ao abrigo do disposto no nº3 do artigo 11 º do CIMSISD.
Mais se deu como assente que em 02/07/2002 o referido imóvel foi dado de arrendamento à sociedade "F…………., S.L.", com promessa de venda com efeitos até 31/08/2003, contrato que foi resolvido por sentença datada de 30/10/2003, por incumprimento da arrendatária. E que decorrido o prazo de 3 anos a contar da data da aquisição, o imóvel ainda constava na sua titularidade.
Mostra-se igualmente assente que a Recorrente foi objeto de três procedimentos de inspeção: o primeiro, com início em 30/06/2003, tendo por objeto os exercícios de 2002 e 2003, e para efeitos de instrução de processo penal, no âmbito do qual foi determinada a realização de busca, para apreensão de diversa documentação relativa a outras sociedades; O segundo, determinado pela ordem de serviço nº 01 2007 01879 e comunicado à impugnante em 22/05/2007, tendo por objeto os exercícios de 2003, 2004 e 2005, no âmbito do qual foi feita proposta de liquidação de imposto de sisa, que conduziu ao ato tributário impugnado.
Para decidir pela improcedência da ação considerou o tribunal" a quo" que se verificava, tal como o entendeu a AT, a caducidade da isenção do imposto de sisa devido pela aquisição do imóvel efetuada em 12/12/2001, por não ter ocorrido a sua revenda no prazo de três anos após a aquisição, não integrando a factualidade alegada pela impugnante/Recorrente o conceito de "justo impedimento", por «não evidenciar uma verdadeira impossibilidade de se proceder à venda do imóvel naquele prazo de três anos a contar da aquisição».
Mais considerou não ser aplicável ao caso concreto o disposto no artigo 270º, nº2, do CIRE, dado que "estando em causa normas de cariz substantivo, à data do facto tributário [2001] ainda se encontrava em vigor o CPEREF, aplicando-se o CIRE apenas aos factos ocorridos após a entrada em vigor do Decreto-Lei nº 55/2004 de 18 de Março, ....», e que «a aquisição do imóvel efetuada pela impugnante no âmbito da liquidação da massa falida não beneficiava da pretendida isenção de sisa à luz do artigo 121º nº 2, alínea c) do CPEREF, por tal isenção se circunscrever a aquisições efectuadas no âmbito de providências de recuperação de empresas, o que não é o caso».
Mais entendeu que os documentos que estiveram na base das correções em sede de sisa foram obtidos em busca determinada pelo Ministério Público, entidade com competência para tal e que são válidas as provas assim obtidas.
Por fim considerou que o procedimento inspetivo a que se refere a ordem de serviço nº 01 2007 01879 não padece de qualquer invalidade, por nada obstar a que o mesmo fosse realizado, por o anterior «ser de mera informação e ter um âmbito e extensão diferentes» e nada obrigar a AT a alterar o primeiro em vez de iniciar um segundo.

Conforme resulta da sentença recorrida, o tribunal "a quo" não conheceu da questão da nulidade dos mandados de busca invocada pela impugnante ao abrigo do disposto no nº4 do artigo 174º do CPP, por a invalidade -cumprimento fora do prazo - não ter sido invocada na petição inicial, mas apenas em sede de alegações.
A Recorrente vem novamente em sede de alegações para o STA invocar o mesmo vício sem fazer qualquer reparo ao entendimento sufragado na sentença. E como é entendimento pacífico, os recursos destinam-se a apreciar a validade das decisões judiciais e não a conhecer de questões novas e não apreciadas pela 1ª instância, pelo que, agora também não se conhecerá desta questão. De todos os modos não seria este o Tribunal competente para apreciar a validade da execução dos mandados de busca uma vez que os mesmos foram emitidos e cumpridos no âmbito de um processo de inquérito criminal cabendo, por isso, à autoridade judicial que superintende nesse processo a apreciação desta questão.
Nesta parte o recurso deve improceder.

Quanto à questão do justo impedimento na falta de revenda do prédio no prazo de três anos, acompanha-se o decidido pelo tribunal" a quo", pois como se concluiu na sentença recorrida, «a factualidade alegada pela impugnante como circunstância suscetível de excecionar o prazo de caducidade da isenção poderá apenas configurar uma situação de dificuldade em efectuar a revenda - risco associado ao negócio -, mas não de impossibilidade em concretizá-la».
De todos os modos sempre se dirá que a isenção de imposto de que a recorrente pretende beneficiar tem ínsita a ideia de que o imóvel é adquirido para revenda, ou seja, a razão que motiva a aquisição do imóvel é necessariamente a posterior revenda no prazo de 3 anos, cfr. artigos 11º, 13º-A e 16º do Código da SISA; como a recorrente o arrendou e se colocou voluntariamente e de motu próprio numa situação que acarretou impossibilidade ou dificuldade na revenda não pode agora invocar justo impedimento quando essas dificuldades resultaram precisamente desse contrato de arrendamento que celebrou com um arrendatário e promitente comprador por si escolhido que veio a incumprir os termos do negócio que haviam celebrado.
Impõe-se, assim, também, a confirmação da sentença nesta parte.

Do mesmo modo se acompanha o decidido na questão da invocada isenção ao abrigo do disposto no artigo 270º, nº 2, do CIRE, atento que o facto tributário ocorreu em data anterior à entrada em vigor deste diploma legal.
Verificando-se a caducidade do direito à isenção, pela verificação da condição resolutiva prevista no artigo 16º do CIMSISD, são desencadeados todos os efeitos do facto tributário até aí suspensos que retroagem à data da aquisição do imóvel - ano de 2001.
Como se deixou exarado no acórdão do STA de 29/06/2011 (proc. 0288/11), «a isenção de sisa dos prédios para revenda tem, por opção expressa do legislador nesse sentido (que aliás se manteve no Código do IMT - cfr. o respectivo artigo 7.°; neste sentido, JOSÉ MARIA FERNANDES PIRES, Lições de Impostos sobre o Património e do Selo, Coimbra, Almedina, 2010, pp. 416/417) natureza de beneficio fiscal, na modalidade de isenção, pois que «( ... ) sendo o imposto municipal de sisa um imposto que incide sobre as transmissões, a título oneroso, do direito de propriedade ou de figuras parcelares desse direito, sobre bens imóveis qualquer que seja o título por que se operem (cfr. arts. 1° e 2° do Código da Sisa), já se vê que a disposição contida no nº 3 do art. 11° do mesmo código não se configura como regra de não incidência estruturante do próprio sistema de tributação regra, de tal modo que possa ter-se como regra de não sujeição ao respectivo imposto». Tem afirmado a jurisprudência deste Supremo Tribunal tratar-se de uma «isenção sob condição resolutiva (embora condição imprópria, pois a condição não resulta de estipulação contratual mas da existência de requisitos essenciais para a produção dos seus efeitos _ cfr. Pires de Lima/Antunes Varela, Código Civil Anotado, Vol. I, Coimbra, 1987, p. 250, nota 2 ao art. 270.° do CC), e como é próprio do regime jurídico destas, a verificação da condição tem em regra eficácia retroactiva (art. 276.° do CC)), tudo se passando, como se afirmou no Acórdão deste STA de 28/1/2009 (rec. n.º 642/08) e jurisprudência aí citada, "como a liquidação tivesse ficado suspensa no momento da transmissão já que a esta data se deve reportar a não consolidação da referida isenção".

Motivo pelo qual se impõe igualmente nesta parte a confirmação da sentença recorrida.

Quanto à questão da nulidade da apreensão de documentos que serviram de suporte às correções que deram lugar à liquidação impugnada.
Considera a Recorrente que a apreensão dos documentos para a qual não havia autorização, configura um acto inválido, sancionado pela ordem jurídica com a nulidade, o que inquina todos os actos subsequentes, designadamente as liquidações impugnadas.
De acordo com a matéria de facto levada ao probatório da sentença - pontos G), H) e I) -, foram realizadas buscas determinadas pelo Ministério Público e juiz de instrução, no âmbito de inquérito criminal, levada a efeito pela Divisão de Processos Criminais Fiscais da Direção de Finanças do Porto, na qual foi apreendida diversa documentação nas instalações sitas na rua …………, no Porto, e na Alameda …………., em ……….., que serviam de sede a várias empresas tendo como sócio o representante legal da impugnante.
E foi na sequência desses elementos que a AT determinou - ordem de serviço nº 01 2007 01879 - a realização de procedimento inspetivo no âmbito do qual foram propostas as correções que deram lugar ao ato tributário impugnado.
Pese embora não decorra dessa factualidade que documentos foram apreendidos na busca realizada na rua …………, no Porto, a Mma. Juiz "a quo" considerou que a ordem de serviço nº 01 2007 01879 terá tido como suporte essa documentação - cfr. fls. 23 da sentença. E a Recorrente pretende extrair do facto de essa busca ter sido determinada pelo MºPº para a recolha de documentação relativa a outras empresas representadas pelo mesmo sócio-gerente para arguir a invalidade da apreensão da documentação relativa à impugnante, que não estaria abrangida nessa ordem.
Mas não lhe assiste razão. Desde logo porque, como resulta da factualidade assente, o MºPº ordenou e promoveu no referido inquérito criminal buscas para apreensão de documentação relativa a todas as sociedades representadas pelo mesmo sócio-gerente que estava a ser investigado, o que abrangia a impugnante (divergindo apenas o lugar da sede de cada uma das empresas). E por outro lado, como resulta da mesma factualidade, as correções que deram lugar à liquidação sindicada foram efetuadas com base nos elementos recolhidos no procedimento inspetivo iniciado ao abrigo da ordem de serviço nº 01 2007 018 e que tinha como sujeito passivo a impugnante - ponto L) do probatório.
Não resulta da factualidade apurada que tenha sido utilizada indevidamente qualquer documentação apreendida noutro procedimento inspetivo, uma vez que os elementos tidos em consideração fazem parte da contabilidade da impugnante, tendo a AT concluído pela verificação da condição resolutiva pela constatação de que o imóvel no ano de 2005 ainda constava do mapa de stocks - cfr. excerto do relatório vertido no ponto K) do probatório.
De resto, esta questão já foi anteriormente apreciada por este Supremo Tribunal, cfr. acórdão proferido no recurso n.º 0827/12 de 29.01.2014 nos seguintes termos:
Com efeito, nos termos do disposto no art. 99º do CIRC, a DGI procede a liquidação adicional quando, depois de liquidado o imposto, seja de exigir, em virtude de correcção efectuada nos termos do nº 10 do artigo 90º, ou de fixação do lucro tributável por métodos indirectos, imposto superior ao liquidado.
Por outro lado, de acordo com o disposto no art. 63º da LGT, os órgãos competentes podem, nos termos da lei, desenvolver todas as diligências necessárias ao apuramento da situação tributária dos contribuintes, nomeadamente, as especificadas nas diversas alíneas do seu nº 1, indicando-se no nº 4 do mesmo artigo os casos em que é legítima a falta de colaboração do visado pela acção de fiscalização, que se reconduzem a situações em que está em causa violação de direitos de carácter pessoal (como o direito à inviolabilidade do domicílio, direito à intimidade da vida privada, direito a sigilo profissional ou outro legalmente regulado, direitos de personalidade). Em tais situações, a possibilidade de realizar as diligências de fiscalização só é admitida (cfr. o nº 6) mediante ordem do tribunal da comarca competente, com base em pedido fundamentado da AT.
Em sede de procedimento de inspecção tributária, os arts. 28º e 29º do RCPIT estabelecem as garantias de eficácia e as prerrogativas da inspecção tributária (no âmbito penal - infracções tributárias - o art. 40º do RGIT atribui aos órgãos da AT, durante o inquérito, os poderes e funções que o CPP atribui aos órgãos de polícia criminal) e também os diversos códigos fiscais contêm normas que permitem à AT o controlo da situação tributária dos contribuintes, realizado através do livre acesso aos locais destinados por estes ao exercício da sua actividade (cfr., no presente caso, em que estão em causa correcções no âmbito de liquidação de IRC, os actuais arts. 133º e 134º do CIRC).
Sabido que o procedimento tributário de inspecção se pode definir como sendo o conjunto de actos, formalidades e diligências, praticados pelos órgãos de inspecção tributária integrados e sequencialmente ordenados, com vista ao controlo, fiscalização e correcção dos comportamentos tributários dos contribuintes, verificamos que, no caso dos autos, as buscas foram promovidas com vista a tal controlo e fiscalização e foram, no âmbito do mencionado processo de inquérito, autorizadas pelo MP quanto ao, local sito na Rua …, Porto e onde tinham sede várias empresas de que o B… é sócio gerente, bem como, autorizadas pelo magistrado judicial competente, as buscas realizadas na Alameda da, …, Vila Nova de Gaia, onde o dito B… tem residência, e onde, igualmente, a impugnante tem a sede social.
Ora, por um lado, e como refere a sentença, ao contrário do que pretende a impugnante, as buscas são autorizadas ou ordenadas por despacho pela autoridade judiciária competente (nº 3 do art. 177º do CPPenal), sendo certo que o Ministério Público é uma autoridade judiciária (cfr. al. b) do nº 1 do art. 1º do mesmo CPP) podendo, por isso, autorizar ou ordenar uma busca desde que a mesma não seja domiciliária (só tratando-se de busca domiciliária é que se impõe a existência de ordem ou autorização do juiz, sob pena de nulidade (cfr. nº 1 do art. 177º do CPP). Daí que, no que respeita à busca levada a efeito nas instalações das sociedades que não a recorrente (na Rua …) não se impusesse despacho judicial a ordená-la ou autorizá-la. Como também diz a sentença, o despacho judicial impunha-se – e teve lugar – apenas para autorizar as buscas domiciliárias na residência de B…….
Neste contexto, tendo as buscas realizadas na Rua ……, nº …, …, Porto, sido determinadas pelo Ministério Público e tendo as buscas levadas a cabo na residência de B…… (local onde também é indicada a sede da impugnante), na Alameda da …, Vila Nova de Gaia, sido autorizadas por despacho judicial proferido no âmbito do processo que correu termos no 3º juízo de instrução criminal do Porto sob o nº 1172/05.3DPRT, não se vê que a DGI estivesse impedida de utilizar, a par de quaisquer elementos recolhidos no local da sede da impugnante, também os elementos documentais obtidos nas buscas realizadas na Rua … (art. 178º do CPPenal) para proceder às correcções aqui questionadas. Apesar de a recorrente não constar entre as empresas referidas como tendo a sede social neste último local, em termos de liquidação adicional decorrente de correcções, a AT pode servir-se de todos os elementos de que disponha, desde que, naturalmente, não tenha ocorrido (e no caso não ocorreu) ilegalidade na obtenção dos mesmos.
Até porque os titulares do direito à inviolabilidade de domicílio são as pessoas físicas que habitam uma residência, não sendo esse direito extensível às pessoas colectivas através da equiparação de domicílio à sede social. Embora no nº 2 do art. 12º da CRP se estabeleça que as pessoas colectivas gozam dos direitos e estão sujeitas aos deveres compatíveis com a sua natureza, desta atribuição não decorre que lhes seja aplicável a garantia da inviolabilidade do domicílio, sendo duvidoso que a protecção da sede das pessoas colectivas ainda seja enquadrável no âmbito normativo constitucional da protecção do domicílio: é que, como salientam Gomes Canotilho e Vital Moreira, «… quanto às pessoas colectivas, a protecção que é devida às respectivas instalações (designadamente quanto à respectiva sede) contra devassas externas não decorre directamente da protecção do domicílio, de cuja justificação não compartilha, como se viu acima, mas sim do âmbito de protecção do direito de propriedade e de outros direitos que possam ser afectados, como a liberdade de empresa, no caso das empresas …». (Constituição da República Portuguesa, Anotada, Vol. 1, 4ª edição revista, Coimbra Editora, Janeiro de 2007, Anotação IV ao art. 34º, p. 541.)
A sentença recorrida decidiu, pois, nesta parte, de acordo com a lei aplicável, não ocorrendo o erro de julgamento que a recorrente lhe imputa, por violação dos arts. 174º nº 2, 176º a 178º e 269º, nº 1 al. a), do CPPenal ou dos arts. 2º, 3º/2, 9º, 32º/8 e 62º da CRP.
Não se verifica assim qualquer nulidade com efeitos invalidantes no ato tributário como invoca a Recorrente, motivo pelo qual se impõe a confirmação também nesta parte da sentença recorrida.

Quanto à invalidade do procedimento inspetivo a que se refere a ordem de serviço nº 01 2007 01879.
Igualmente nesta parte se nos afigura não assistir razão à Recorrente. Com efeito, não há qualquer invalidade ou irregularidade na realização dos dois procedimentos inspetivos, uma vez que, como se considerou na sentença recorrida, têm fins e âmbitos diversos. Enquanto o primeiro foi realizado ao abrigo da alínea b) do nº 1 do artigo 12º do RCPIT, visando o cumprimento dos deveres legais de informação no âmbito de processo-crime, que tinha como arguido um dos sócios-gerentes da impugnante, o segundo foi realizado ao abrigo da alínea a) do mesmo preceito legal e visou a confirmação do cumprimento das obrigações fiscais da impugnante. Estamos perante dois procedimentos inspetivos distintos e bem definidos, tendo apenas em comum o facto de os elementos contabilísticos da impugnante serem igualmente relevantes para o apuramento da responsabilidade penal a efetivar no inquérito-criminal.
Também esta questão foi apreciada por este Supremo Tribunal no recurso anteriormente referido tendo-se ai concluído:
Na verdade, (i) apesar de só poder haver um procedimento externo de fiscalização respeitante ao mesmo sujeito passivo ou obrigado tributário, imposto e período de tributação, salvo se houver decisão, fundamentada com base em factos novos, mas sem prejuízo do apuramento da situação tributária do sujeito passivo por meio de inspecção ou inspecções dirigidas a terceiros com quem mantenha relações económicas (nº 3 do artigo 63º da LGT); (ii) apesar de o procedimento de inspecção poder ser, quanto ao âmbito, geral ou polivalente (quando tiver por objecto a situação tributária global ou conjunto dos deveres tributários dos sujeitos passivos ou dos demais obrigados tributários) ou ser parcial ou univalente (quando abranja apenas algum ou alguns tributos ou algum ou alguns deveres dos sujeitos passivos ou dos demais obrigados tributários); (iii) apesar de, quanto à extensão, poder englobar um ou mais períodos de tributação; (iv) e apesar de os seus fins, âmbito e extensão poderem ser alterados durante a sua execução, mediante despacho fundamentado da entidade que o tiver ordenado, devendo ser notificado à entidade inspeccionada (cfr. os arts. 14º e 15º do RCPIT), o que é verdade é que, no caso, conforme resulta do Probatório, o procedimento inspectivo iniciado com a credencial OI.2005.09731 foi um procedimento de mera informação e com um âmbito e extensão diferentes do procedimento de inspecção a que se refere a ordem de serviço OI.2007.01879. Ou seja, foi após a conclusão daquele procedimento inspectivo que se iniciou este procedimento ora questionado, com fim, âmbito e extensão diferentes daquele outro.
Aliás, relativamente à restrição «factos novos» constante do nº 4 do art. 63º da LGT, devem considerar-se, como ponderam Diogo Leite Campos, Benjamim Silva Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa «aqueles que chegaram ao conhecimento da administração tributária após a primeira acção de fiscalização e não apenas os objectivamente supervenientes» sendo esta «a única interpretação que assegura um alcance útil apreciável a esta disposição, já que os factos que são objecto de acções de fiscalização são normalmente referentes a períodos de tributação anteriores ao tempo em que ocorrem aquelas e, por isso, não são factos objectivamente supervenientes». (Lei Geral Tributária, Anotada e comentada, 4ª Edição, 2012, Encontro da Escrita Editora, Anotação 5 ao art. 63º, p. 549.)
E assim sendo, e porque, como diz a sentença recorrida, a alteração do procedimento inspectivo por parte da entidade que o tiver ordenado é uma faculdade que a esta assiste e que, além do mais, pressupõe não só a pertinente fundamentação como também que o procedimento ainda esteja em execução, então, é de concluir que, no vertente caso, porque os procedimentos foram sucessivos (e não simultâneos - pois que o segundo começou após a conclusão do primeiro), também não se pode dizer que a AT deveria ter alterado o primeiro em vez de iniciar o segundo ou que, não tendo optado por eventual alteração, haja violado o disposto nos citados normativos e ocorra ilegalidade da liquidação adicional.
Carece, assim, de fundamento a invocada violação dos princípios da legalidade, proporcionalidade e da boa-fé, que aliás não é sequer concretizada pela Recorrente.

Em suma, a sentença recorrida não enferma dos erros de julgamento que a recorrente lhe imputa, improcedendo, assim, as Conclusões do recurso.

Nestes termos acorda-se em, negando provimento ao recurso, confirmar a sentença recorrida.
Custas pela recorrente.
D.n.

Lisboa, 24 de Outubro de 2018. – Aragão Seia (relator) – Dulce Neto – Pedro Delgado.