Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo | |
Processo: | 01793/07.0BEPRT 01409/17 |
Data do Acordão: | 07/01/2020 |
Tribunal: | 2 SECÇÃO |
Relator: | ANÍBAL FERRAZ |
Descritores: | OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO FISCAL |
Sumário: | Nos termos do artigo (art.) 8.º n.ºs 1 e 2 alínea (al.) e) da Lei Geral Tributária (LGT), estão sujeitas ao princípio da legalidade tributária, entre muitas outras componentes, as regras de procedimento e processo tributário. Corresponde isto a dizer, além do mais, que, no caso do processo tributário, os interessados/contribuintes têm de (estão obrigados a) formalizar as suas pretensões, de tutela jurisdicional, com respeito pela lei processual (e substantiva) aplicável, em particular, mediante a utilização das formas de processo disponibilizadas e apropriadas ao exercício, cabal e pleno, dos direitos que se arrogam, enquanto, os tribunais, da jurisdição tributária/fiscal, igualmente, ficam adstritos ao cumprimento dos pertinentes comandos legais, na admissão, instrução e julgamento de todas as ações que sejam chamados a decidir. |
Nº Convencional: | JSTA000P26154 |
Nº do Documento: | SA22020070101793/07 |
Data de Entrada: | 12/13/2017 |
Recorrente: | A…………….. – FORMAÇÃO PROFISSIONAL, LDA |
Recorrido 1: | INSTITUTO DE GESTÃO DO FUNDO SOCIAL EUROPEU, IP |
Votação: | UNANIMIDADE |
Aditamento: | |
Texto Integral: | ***
Acórdão proferido no Supremo Tribunal Administrativo (STA), com sede em Lisboa; # I. A…………….. - Formação Profissional, Lda., com os restantes sinais dos autos, recorre da sentença proferida, no Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) do Porto, em 18 de janeiro de 2017, que julgou improcedente oposição a execução fiscal, instaurada, pelo Serviço de Finanças de Matosinhos - 1, para cobrança de dívida, ao Instituto de Gestão do Fundo Social Europeu, I.P. (IGFSE, I.P.), no valor de € 45.599,27. A recorrente (rte) formalizou alegação, terminada com o seguinte quadro conclusivo: « 1. Como resulta dos articulados e documentos juntos aos autos, a recorrente candidatou-se e viu aprovada uma acção de formação com a denominação POEFDS, relativa a activos em situação pós-laboral, tendo a esse título direito a receber a quantia de € 25.755,80 proveniente do Fundo Social Europeu e € 15.453,47 da parte do Orçamento da Segurança Social. 2. A referida acção de formação decorreu entre os anos de 2005 e 2006, tendo no decurso da mesma sido dado o destino devido a todas as quantias entregues, com as quais se pagaram as bolsas devidas aos formandos, as horas de formação aos formadores e toda uma série de despesas aos fornecedores de bens e serviços necessários para levar a efeito esta acção de formação. 3. Pelo que, o comportamento da executada, ora recorrente, não integra o disposto no art. 35º do Decreto Regulamentar nº 12-A/2000, de 15 de Setembro, verificando-se o disposto no art. 176º, nº 1, c) do CPPT. 4. Sucede que, a executada reconheceu apenas que da quantia exequenda não estava regularizado o montante de € 4.043,29, exclusivamente por não ter recebido da entidade financiadora cerca de € 5.000,00. 5. Ora, o processo tributário existe para a tutela do interesse público, que consiste na realização da tributação de acordo com a lei, e, por esse motivo, todo o contencioso tributário se deve encontrar ordenado para proporcionar aos contribuintes uma tutela contra a possível violação dos seus direitos por parte da Administração. 6. Consequentemente, do princípio da legalidade fiscal decorre naturalmente o princípio da verdade material como objectivo do processo fiscal, sob pena de os órgãos da Administração, a quem cabe o cumprimento do imperativo constitucional extravasem as suas competências. 7. Razão pela qual, se afigura injusta, por violadora do princípio da verdade fiscal, que a presente execução se dirija contra a totalidade do montante aprovado e não o concretamente enviado para a realização da programada e aprovada formação. 8. Pelo exposto, deve o processo executivo ser julgado extinto por verificação da inexigibilidade de qualquer quantia do título executivo. 9. Ao decidir pela improcedência da pretensão da executada, violou o Mm.º Juiz “a quo” o princípio da legalidade e da verdade fiscal. Nestes termos e nos melhores de Direito, deve ser proferido acórdão que revogue a douta sentença recorrida e determine a extinção da execução, assim se fazendo JUSTIÇA! » * A recorrida (rda), Agência para o Desenvolvimento e Coesão, I.P. (Agência, I.P.) [antes, Instituto de Gestão do Fundo Social Europeu (IGFSE, I.P.)], contra-alegou e elencou as seguintes conclusões: « A - Versando o presente recurso jurisdicional sobre a matéria de direito constante da sentença proferida pelo tribunal “a quo”, a Recorrente deveria ter indicado as normas jurídicas violadas, o sentido com que, no seu entender, as normas que constituem fundamento jurídico da decisão deviam ser interpretadas e aplicadas, ou, caso entenda haver erro na determinação da norma jurídica que, no seu entendimento, devia ter sido aplicada, conforme estatui o nº 2 do artigo 639º do Código de Processo Civil (CPC); B - Ao invés, a Recorrente continua a invocar a pretensa ilegalidade do ato do Gestor do POEFDS que revogou o financiamento e determinou a obrigação de restituir o montante de € 43.117,73, que constitui a dívida exequenda no processo de execução fiscal nº 040020001001760, objecto da oposição em causa; C - A ilegalidade da dívida exequenda com fundamento na ilegalidade do ato que lhe deu origem, só pode ser arguida em sede de oposição, quando a lei não assegure meio judicial de impugnação ou recurso contra o ato, nos termos do disposto na alínea h) do nº 1 do artigo 204º do CPPT; D - A Recorrente ao considerar que o ato do Gestor do POEFDS é ilegal, por pretensamente violar o artigo 35º do Decreto Regulamentar nº 12-A/2000, de 15 de setembro deveria, em tempo útil, ter deduzido a competente ação administrativa especial, e se quisesse, a respetiva providência cautelar de suspensão de eficácia do mesmo; E - Uma vez que não utilizou os meios legais próprios para impugnar a decisão do Gestor do POEFDS, não podia vir, nos autos de oposição à execução, invocar a ilegalidade da dívida com fundamento em eventuais vícios do ato administrativo que lhe está subjacente; F - A sentença “a quo” não se encontra ferida de qualquer vício e interpretou e aplicou corretamente a lei, não merecendo, por isso, qualquer censura. Nestes termos e nos demais de Direito, que V. Exªs doutamente suprirão, rejeitando o recurso e confirmando a sentença recorrida, farão Venerandos Juízes Conselheiros a esperada Justiça.» * O Exmo. magistrado do Ministério Público emitiu parecer, concluindo que a sentença recorrida fez correta interpretação e aplicação das normas legais aplicáveis, pelo que, o recurso deve improceder. * Cumpridas as formalidades legais, compete conhecer e decidir. ******* # II. Na sentença, em sede de julgamento factual, expressou-se: « 1) Em 09/10/2006 foi proferido despacho pelo Gestor do Programa Operacional Emprego, Formação e Desenvolvimento Social (POEFDS) nos termos do qual foi revogada a decisão de aprovação do pedido de financiamento B n.º 5 - Ação Tipo 2.1.2.2 apresentado pela Oponente, com os fundamentos descritos na informação n.º 150/UARN de 29/09/2006, com a consequente restituição ao IGFSE dos valores pagos à Oponente no âmbito daquele programa (cfr. doc. de fls. 24 a 26 do suporte físico do processo). 2) Pelo ofício n.º 05844/UARN/2006 de 11/10/2006, recebido pela Oponente em 13/10/2006, foi esta notificada da decisão referida no ponto anterior (cfr. docs. de fls. 127, no verso, e 128 do suporte físico do processo). 3) Pelo ofício n.º 09264 de 21/11/2006, o Presidente do IGFSE notificou a Oponente para, no prazo máximo de 30 dias a contar da data da receção do ofício, proceder à restituição do montante em dívida de € 41.209,27, emergente da revogação dos apoios concedidos e nos termos do despacho da mesma entidade de 08/11/2006, a que acrescem € 1.908,46 de juros à taxa legal, tendo sido a Oponente advertida de que, “no caso de não cumprimento da obrigação de restituição no prazo referido, terá este Instituto de proceder à sua cobrança coerciva (…) através de execução fiscal” e de que “o presente ato de notificação do IGFSE consubstancia a execução da decisão do Gestor, que lhe foi comunicada pelo ofício n.º 5844, de 11/10/2006, dele não cabendo recurso tutelar, porém podendo ser objeto de impugnação no Tribunal Administrativo e Fiscal competente” (cfr. docs. de fls. 18 a 20 do suporte físico do processo). 4) Em 26/03/2007 o Presidente do IGFSE emitiu, em nome da Oponente, certidão de dívida no valor de € 41.209,27, proveniente de verbas indevidamente recebidas do Fundo Social Europeu (€ 25.755,80) e do Estado Português (€ 15.453,47), no âmbito do pedido de financiamento referido no ponto 1), acrescido de juros à taxa legal no valor de € 1.908,46, perfazendo o total de € 43.117,73 (cfr. doc. de fls. 17 do suporte físico do processo). 5) Pelo ofício n.º 02623 de 27/03/2007, o IGFSE requereu ao Serviço de Finanças de Matosinhos - 1 a instauração de execução fiscal contra a Oponente, com base na certidão de dívida referida no ponto anterior, tendo sido instaurado, em 11/04/2007, o processo executivo n.º 1821200701032810 para cobrança da quantia de € 43.117,73 (cfr. docs. de fls. 15 e 16 do suporte físico do processo). 6) A Oponente foi citada no âmbito do processo de execução fiscal em crise no dia 30/04/2007 (cfr. docs. de fls. 9, 30 e 31 do suporte físico do processo). 7) A petição inicial da presente oposição deu entrada no Serviço de Finanças de Matosinhos - 1 no dia 31/05/2007 (cfr. carimbo aposto a fls. 3 do suporte físico do processo). » *** Para julgar improcedente a presente oposição à execução fiscal, em que a rte assume a condição de executada, na sentença recorrida, foram alinhados os argumentos que seguem reproduzidos. « (…). A dívida exequenda nos presentes autos teve origem no ato administrativo praticado pelo Gestor do POEFDS, nos termos do qual foi revogada a decisão de aprovação do financiamento concedido à Oponente, com a consequente restituição das verbas por esta recebidas do Fundo Social Europeu (€ 25.755,80) e do Estado Português (€ 15.453,47), acrescida dos juros legais (cfr. pontos 1 e 4 dos factos provados).
Perante esta fundamentação límpida, esclarecedora e correta, do ponto de vista jurídico, a rte aponta-lhe erro de julgamento, por violação do princípio da legalidade e da verdade fiscal - cf. conclusões 5. a 7 e 9. A ausência de razão nesta crítica é tão objetiva e flagrante, acrescendo à formulação generalista do invocado princípio, que, sem delongas, entendemos só poder ser rejeitada. Nos termos do artigo (art.) 8.º n.ºs 1 e 2 alínea (al.) e) da Lei Geral Tributária (LGT), estão sujeitas ao princípio da legalidade tributária, entre muitas outras componentes, as regras de procedimento e processo tributário. Corresponde isto a dizer, além do mais, que, no caso do processo tributário, os interessados/contribuintes têm de (estão obrigados a) formalizar as suas pretensões, de tutela jurisdicional, com respeito pela lei processual (e substantiva) aplicável Que o versado princípio, na sua expressão máxima, restrita, assegura, em conformidade com a Constituição, emanada da Assembleia da República ou do Governo, devidamente autorizado por aquela., em particular, mediante a utilização das formas de processo disponibilizadas e apropriadas ao exercício, cabal e pleno, dos direitos que se arrogam, enquanto, os tribunais, da jurisdição tributária/fiscal, igualmente, ficam adstritos ao cumprimento dos pertinentes comandos legais, na admissão, instrução e julgamento de todas as ações que sejam chamados a decidir. Deste modo, tal como se encontra, perfeitamente, explicado e justificado pela decisão recorrida, a rte, para conseguir “uma tutela contra a possível violação dos seus direitos por parte da Administração”, bem como, que a “presente execução (não se dirigisse) contra a totalidade do montante aprovado e não concretamente enviado para a realização da programada e aprovada formação”, tinha de ter lançado mão de outro processo (ação administrativa (especial)) que não a utilizada oposição à execução fiscal, sendo, neste momento, impossível colmatar essa falha mediante o mecanismo da convolação da forma processual usada na devida, por imperativo legal. Aliás, registe-se que esta exigência e forma de proceder nem deveria constituir surpresa para a rte, porquanto, como resulta do ponto 3) dos factos provados, inscritos na sentença recorrida, na notificação que recebeu, em ordem a efetuar a restituição do valor em dívida, foi informada e expressamente advertida de que “o presente ato de notificação do IGFSE consubstancia a execução da decisão do Gestor, que lhe foi comunicada pelo ofício n.º 5844, de 11/10/2006, dele não cabendo recurso tutelar, porém podendo ser objeto de impugnação no Tribunal Administrativo e Fiscal competente”. ******* # III. Destarte, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, acordamos negar provimento ao recurso. * Custas a cargo da recorrente. * [Elaborado em computador e revisto, com versos em branco] Lisboa, 1 de julho de 2020. – Aníbal Augusto Ruivo Ferraz (relator) – Maria Isabel São Pedro Caeiro – Francisco António Pedrosa de Areal Rothes. |