Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:02381/15.2BELRS 01165/17
Data do Acordão:06/17/2020
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:FRANCISCO ROTHES
Descritores:CONTRIBUIÇÃO FINANCEIRA
BANCO
INCONSTITUCIONALIDADE
Sumário:I - A Contribuição sobre o Sector Bancário tem natureza jurídica de contribuição financeira.
II - As normas que aprovam o regime jurídico da Contribuição sobre o Sector Bancário não enfermam de inconstitucionalidade orgânica, nem material, não violando os princípios constitucionais da legalidade, da não retroactividade, da tutela da confiança e da segurança jurídica, da igualdade, capacidade contributiva e equivalência.
Nº Convencional:JSTA000P26075
Nº do Documento:SA22020061702381/15
Data de Entrada:10/25/2017
Recorrente:A......, S.A.
Recorrido 1:AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Recurso jurisdicional da sentença proferida no processo de impugnação judicial com o n.º 2381/15.2BELRS (1165/17)

1. RELATÓRIO

1.1 A sociedade acima identificada recorreu para o Supremo Tribunal Administrativo da sentença do Tribunal Tributário de Lisboa, que julgou improcedente a impugnação judicial por ela apresentada na sequência do indeferimento tácito da reclamação graciosa que deduziu contra a autoliquidação da Contribuição sobre o Sector Bancário (CSB) relativamente ao ano de 2015.

1.2 O recurso foi admitido, a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo e a Recorrente apresentou as alegações, com conclusões do seguinte teor:

«(a) Julgou o Tribunal a quo improcedente a impugnação apresentada pelo Recorrente em termos imediatos contra o indeferimento tácito da reclamação contra a autoliquidação da Contribuição sobre o Sector Bancário por si efectuada em 5 de Março de 2015, no montante de € 2.884.257,38, e, mediatamente, contra a autoliquidação em causa, na qual foi igualmente pedido o reconhecimento do direito a juros indemnizatórios, e condenou o Recorrente em custas.

(b) O Recorrente considera que a sentença recorrida enferma de erro relativamente a soluções de direito nela consignadas.

(c) Invocou o Recorrente nos presentes autos a (falta de) sustentação formal constitucional da regulamentação pelo Governo, através de portaria, de elementos essenciais da Contribuição sobre o Sector Bancário, como as taxas e a determinação da matéria colectável, do que decorre a respectiva inconstitucionalidade orgânica por violação do princípio da reserva de lei previsto no artigo 165.º da Constituição da República Portuguesa e, em conformidade, torna ilegal a decisão que é objecto imediato da presente impugnação e a liquidação mediatamente contestada.

(d) Em cumprimento do disposto na alínea i) do número 1 do artigo 165.º da Constituição da República Portuguesa, é da exclusiva competência da Assembleia da República a “[c]riação de impostos e sistema fiscal e regime geral das taxas e demais contribuições financeiras a favor das entidades públicas”, expressão da vertente formal do princípio da legalidade fiscal, também designado por princípio da reserva de lei formal, que exige uma intervenção de lei parlamentar, seja ela uma intervenção material que fixe a própria disciplina dos impostos ou o regime geral das taxas e das contribuições financeiras, ou uma intervenção de carácter formal que autorize o Governo a estabelecer essa disciplina.

(e) Em sentido material, o princípio da legalidade fiscal, também designado por princípio de reserva de lei material, exige que a lei (entenda-se, Lei da Assembleia da República ou decreto-lei autorizado do Governo), seja completa no que respeita aos elementos essenciais dos impostos, isto é, a incidência, a taxa, os benefícios fiscais e as garantias dos contribuintes, em cumprimento do disposto no número 2 do artigo 103.º da Constituição.

(f) A concepção tripartida dos tributos, que passou a relevar, ao lado das taxas e dos impostos, as contribuições financeiras, foi reflectida na Constituição da República Portuguesa pela revisão constitucional de 1997, que introduziu na alínea i) do número 1 do artigo 165.º a referência às “demais contribuições financeiras a favor das entidades públicas.

(g) Estas contribuições apresentam um carácter híbrido, na medida em que não reflectem nem a comutatividade directa e imediata típica das taxas, nem o carácter unilateral inerente aos impostos. Estão em causa, outrossim, tributos que visam compensar benefícios potenciais e difusos dos respectivos sujeitos passivos.

(h) É geralmente aceite que o alcance da reserva de lei formal é distinto consoante esteja em causa a criação ou alteração de um imposto, por um lado, ou a criação ou alteração de uma taxa ou contribuição financeira, por outro, já que neste último caso aquela norma apenas sujeita à reserva de lei formal o respectivo regime geral.

(i) Até à presente data, e sem prejuízo de terem decorrido 20 anos desde a revisão constitucional que introduziu a redacção vigente, não foi aprovado o regime geral das contribuições financeiras, o que tem levado a maioria da doutrina a considerar que, na ausência de um tal regime geral, tais tributos deverão ser tratados, para efeitos de aplicação do princípio da reserva de lei, como impostos.

(j) Considerou o Tribunal a quo a respeito da respectiva qualificação no âmbito da classificação tripartida prevista na Constituição da República Portuguesa, aliás em consonância com a posição assumida pelo Recorrente nos presentes autos, que a Contribuição sobre o Sector Bancário é uma contribuição financeira, mas, contrariamente ao defendido pelo Recorrente, considerou que não é aplicável a reserva de lei invocada pelo Recorrente e que, mesmo que o fosse, tal reserva se bastaria no caso concreto com a intervenção parlamentar traduzida na aprovação do Regime que cria a contribuição sobre o sector bancário.

(k) O Tribunal Constitucional já foi chamado por diversas vezes a pronunciar-se sobre a conformidade constitucional da fixação de elementos essenciais de tributos qualificados como contribuições financeiras mediante decreto-lei não autorizado ou portaria, tendo no acórdão n.º 539/2015, de 20 de Outubro de 2015, que baseia a decisão do Tribunal a quo, tomado expressamente, pela primeira vez, posição sobre a divergência doutrinal relativa à inconstitucionalidade orgânica das contribuições financeiras face à inexistência de um regime geral aprovado pela Assembleia da República e no caso de inexistência de lei parlamentar prévia que defina, em concreto e de forma suficientemente densificada, o respectivo regime. Na decisão em causa o Tribunal Constitucional pronunciou-se no sentido de não ser aplicável qualquer reserva de lei.

(l) O Recorrente considera que a posição assumida pelo Tribunal Constitucional no acórdão em análise e adoptada pelo Tribunal a quo, que na prática se traduz em defender que a inexistência de um regime geral de contribuições financeiras é “irrelevante” do ponto de vista da conformidade constitucional das normas que regulam os elementos essenciais de uma contribuição, corresponde, de facto, a esvaziar de conteúdo a parte final da alínea i) do número 1 do artigo 165.º da Constituição da República Portuguesa, ou seja, é fazer da mesma letra morta, como se a circunstância de inexistir, até à data, um regime geral das contribuições financeiras, fosse afinal uma “carta branca”, uma autorização parlamentar em aberto, para o Governo legislar nessa matéria como se nenhuma reserva de lei existisse.

(m) Uma interpretação conforme à Constituição da República Portuguesa exige, necessariamente, a conclusão inversa: a inexistência do regime geral das contribuições financeiras a que alude da alínea i) do número 1 do artigo 165.º em análise implica antes que a definição adequada dos respectivos elementos essenciais se encontre sujeita ao crivo, mais rigoroso, da Assembleia da República.

(n) De outra forma, haveria que concluir que, na prática, a intervenção do legislador constitucional no sentido de expressamente consagrar a figura das contribuições redundou, afinal, numa menor protecção dos contribuintes contra a actuação do Governo, que se encontraria liberto de qualquer constrangimento a este nível formal.

(o) É que cumpre não esquecer que, tal como a liquidação e cobrança de impostos, também os actos tributários relativos a contribuições financeiras constituem restrições ao direito de propriedade dos respectivos sujeitos passivos, interferências essas sobre um direito fundamental e que, nessa exacta medida, não podem deixar de estar sujeitas ao princípio fundamental de “no taxation without representation”.

(p) Negar a aplicação do princípio da reserva de lei formal, como faz o Tribunal a quo sustentando a sua posição no acórdão do Tribunal Constitucional antes referido, conduziria assim à subversão do princípio da legalidade fiscal que dá substância à reserva de lei, a pretexto de uma facilitação do processo normativo que transformaria a Contribuição sobre o Sector Bancário no tributo “que o Governo quiser” ou “que o Governo for querendo”.

(q) Note-se, por outro lado, que o pretexto invocado pelo Tribunal Constitucional no acórdão em causa – a facilitação do processo normativo – esbarra desde logo na realidade, já que não existe constância do pretenso pano de fundo de bloqueio da acção governativa, que em qualquer hipótese nenhum Governo terá sentido necessidade de ultrapassar, propondo à Assembleia da República um regime geral das contribuições financeiras.

(r) Mais: a posição do Tribunal Constitucional no acórdão em referência constitui um incentivo a que nenhum Governo tome qualquer iniciativa neste âmbito, já que a manutenção da situação actual corresponde à inexistência de qualquer regime geral que balize a sua actuação em matéria de contribuições financeiras.

(s) Por outro lado, a inexistência de reserva de lei e a afirmada competência concorrente do Governo e da Assembleia da República em matéria dos elementos essenciais das contribuições financeiras geraria uma desigualdade ao nível da representação dos contribuintes a elas sujeitos, ora directamente, mediante emanação do órgão que directamente os representa (a Assembleia da República), ora indirectamente, mediante emanação do órgão que apenas indirectamente os representa (o Governo).

(t) Não procede assim, não pode proceder, a conclusão do Tribunal a quo no sentido da inaplicabilidade da reserva de lei formal à criação e alteração de contribuições financeiras.

(u) E não procede igualmente a conclusão que o Tribunal a quo aponta a título subsidiário, a de que, ainda que se aplicasse a reserva de lei invocada pelo Recorrente não se verificaria qualquer inconstitucionalidade orgânica, já que a lei da Assembleia da República que criou a Contribuição sobre o Sector Bancário contém os elementos essenciais do tributo, apenas remetendo “alguma densificação” dos mesmos para portaria.

(v) Tal conclusão é errada, porque, apesar de a Contribuição sobre o Sector Bancário ter efectivamente génese parlamentar, a Assembleia da República demitiu-se notoriamente da sua função conformadora, tolerando ao Governo uma latitude manifestamente excessiva em confronto com o princípio da emanação parlamentar da competência tributária.

(w) Atente-se em especial nas taxas da Contribuição sobre o Sector Bancário, em que o legislador parlamentar não fixou, sequer indiciou, nas suas quatro intervenções neste âmbito os critérios de decisão normativa a ter em conta na fixação efectiva da taxa, tendo por outro lado permitido a fixação em concreto de taxas balizadas por limites de grande e crescente amplitude, numa atribuição de poderes totalmente discricionários ao Governo

(x) E tão discricionários são os poderes conferidos pela lei que o Governo nem sequer se sentiu na obrigação de enunciar, e muito menos de justificar, os critérios seguidos a respeito das taxas que em concreto foram sendo fixadas dentro da margem (por regra no limite máximo) concedida pela lei,

(y) Do exposto resulta que, efectivamente, e contrariamente à conclusão do Tribunal a quo, o Regime que cria a contribuição sobre o sector bancário não “vai para além da mera criação do tributo, dali constando os seus elementos essenciais”. Estes, nomeadamente taxa, apenas são definidos por portaria, mediante poderes discricionários atribuídos ao Governo, o que altera a conclusão a título subsidiário do Tribunal a quo.

(z) Acresce que a Portaria n.º 121/2011, de 30 de Março, tem um conteúdo inovatório ao determinar a base de incidência objectiva da referida contribuição.

(aa) Neste contexto, há que concluir, seguindo uma formulação do Tribunal Constitucional, que não estão “suficientemente recortados” por lei parlamentar alguns dos elementos essenciais da Contribuição sobre o Sector Bancário, como a incidência e a taxa, pelo que a conclusão do Tribunal a quo a título subsidiário está viciada de erro de julgamento.

(bb) Conclui assim o Recorrente que são organicamente inconstitucionais as normas que regulamentaram a Contribuição sobre o Sector Bancário, por violação do princípio da reserva de lei previsto na alínea i) do número 1 do artigo 165.º da Constituição da República Portuguesa, o que determina a anulabilidade da liquidação objecto mediato da presente impugnação, devendo a sentença recorrida ser revogada neste passo, por erro de julgamento.

(cc) Argumentou o Recorrente nos presentes autos que as normas que introduziram e regulamentaram a Contribuição sobre o Sector Bancário são, para além de organicamente inconstitucionais, materialmente inconstitucionais por não serem identificáveis as prestações presumidas cuja provocação ou aproveitamento se podem dizer seguros quanto ao grupo que o Recorrente integra e prováveis quando referidos ao Recorrente, prestações estas cuja compensação justificaria conceptualmente (e em termos constitucionais) a imposição de contribuições.

(dd) Com efeito, seja potencial, presumido ou mais ou menos difuso, certo é que constitucionalmente se impõe a existência de um benefício para o sujeito passivo de uma contribuição financeira, benefício esse que deve ser pelo menos perceptível e comprovável, de uma forma que não é comparável à total inexistência de sinalagma e totalmente solidarista de um imposto, dada a existência de uma “relação de troca”.

(ee) A legitimidade constitucional de uma contribuição financeira pressupõe então uma equivalência jurídica de grupo, a qual depende da verificação de três requisitos – a homogeneidade de grupo, a responsabilidade de grupo e a utilidade de grupo – sendo bastante a inobservância de qualquer um dos mesmos para originar uma lesão do princípio da capacidade contributiva.

(ff) Por outro lado, o princípio da equivalência deve ser sempre funcionalizado pelo princípio da proporcionalidade. Benefícios manifestamente diferentes não podem proporcionar o mesmo encargo, encargo algum deveria resultar de benefícios inexistentes.

(gg) A esta luz, a conformação com o parâmetro constitucional exige como critério mínimo uma susceptibilidade de aproveitamento pelos sujeitos passivos do tributo dos benefícios que o mesmo pretende remunerar, e é justamente essa susceptibilidade de aproveitamento que o Recorrente considera inexistir no caso da Contribuição sobre o Sector Bancário.

(hh) O Tribunal a quo não aceitou a conclusão do Recorrente, julgando não ser violado o princípio da equivalência.

(ii) Na interpretação que o Recorrente julga ser lícito retirar da fundamentação de direito do Tribunal a quo na sua conclusão de que a Contribuição sobre o Sector Bancário não é materialmente inconstitucional, a decisão baseia-se nos vários objectivos do tributo que são identificados.

(jj) Aponta o Tribunal a quo como dois dos múltiplos objectivos da Contribuição sobre o Sector Bancário os de “proteger os trabalhadores do sector financeiro” e de “proteger os mecanismos de segurança social”, de facto limitando-se a repetir as afirmações efectuadas pelo Governo quando da criação da Contribuição sobre o Sector Bancário, que o Recorrente considera incompreensíveis; qualquer que seja a interpretação que lhes deva ser dada, não vê o Recorrente em que possam tais alegados objectivos relevar na demonstração pretendida pelo Tribunal a quo relativamente à existência de prestações públicas aproveitáveis pelos sujeitos passivos da Contribuição sobre o Sector Bancário.

(kk) Considera também o Tribunal a quo ser objectivo da Contribuição sobre o Sector Bancário o de “aproximar a carga fiscal suportada pelo sector financeiro da que onera o resto da economia” e de “fazer o sector financeiro contribuir de forma mais intensa para o esforço de consolidação das contas públicas”.

(ll) O Tribunal a quo aceita assim, acriticamente, a conclusão subjacente àquela enunciação de objectivos (que recebe do legislador), qual seja a de que o “sector financeiro” não suporta o “esforço fiscal” que lhe competiria, em violação de um princípio de igualdade vertical, o que já seria por si só condenável, porque não substanciada em factos e dados que a confirme, sendo até por eles contrariada.

(mm) Em qualquer hipótese, o objectivo identificado pelo Tribunal a quo é dogmaticamente incompatível com os princípios constitucionais aplicáveis às contribuições financeiras, que não são, não podem ser, aptas à modelação da repartição da carga fiscal e à calibração do esforço de consolidação das contas públicas, já que (conforme anteriormente se concluiu) a única justificação constitucionalmente admissível é a da compensação da provocação ou aproveitamento presumidos de prestações públicas que se encontram disponíveis de forma segura para o grupo homogéneo de sujeitos passivos da mesma.

(nn) A utilização (que no caso da Contribuição sobre o Sector Bancário é confessada pelo legislador, note-se) de uma contribuição financeira para acudir a uma putativa míngua do esforço fiscal incidente sobre um determinado grupo de contribuintes constitui uma evidência gritante da total desconformidade com o princípio da equivalência de que a Contribuição sobre o Sector Bancário enferma.

(oo) Em consequência, não procede a conclusão do Tribunal a quo de que, por ter como objectivo o de “aproximar a carga fiscal suportada pelo sector financeiro da que onera o resto da economia” e de “fazer o sector financeiro contribuir de forma mais intensa para o esforço de consolidação das contas públicas”, a Contribuição sobre o Sector Bancário não é materialmente inconstitucional.

(pp) Aparentemente perfilhando o “discurso oficial” sobre as causas da crise que precedeu a sua introdução, segundo o qual a mesma radica primacialmente no comportamento do sector financeiro, o Tribunal a quo parece aderir ao pretexto “correctivo” (senão mesmo punitivo) da Contribuição sobre o Sector Bancário, que visaria condicionar tal comportamento, fazendo-lhe subjazer também o objectivo de “obviar a riscos sistémicos do sector financeiro”, o de “prevenção de riscos sistémicos”, o de “promover a assunção de riscos na tomada de decisões” (formulação que o Recorrente julga ser lícito corrigir para “[dissuadir d]a assunção de riscos na tomada de decisões” e o de “evitar o recurso aos mecanismos de resolução de crises”.

(qq) Mais uma vez, o Tribunal a quo não fundamenta em que medida é que a consideração de eventuais fins extra-tributários como o referido justificaria a Contribuição sobre o Sector Bancário à luz do princípio da equivalência, tomando-a assim materialmente constitucional.

(rr) O Recorrente aceita que a indução de um comportamento pode ser o objectivo e – assumindo que seja devidamente gizado e implementado – a consequência da aplicação de um tributo, mas tal não consubstancia certamente uma prestação eventual ou presumida que o sujeito passivo possa provocar ou da qual possa aproveitar.

(ss) Por outro lado, não se vislumbra qualquer conexão entre tal alegada pretensão de dissuasão do risco (em si mesma muitíssimo discutível, em função da evolução do real papel do Fundo de Resolução nacional) e um benefício potencial, indirecto ou difuso para o respectivo sujeito passivo, porque não é admissível uma acepção “paternalista” do papel do legislador, à luz da qual a dissuasão do risco constituiria como que “um bem em si mesmo” e a não assunção de comportamentos de risco uma vantagem para o sujeito passivo que caberia a este último retribuir, como que remunerando os “conselhos” do Estado.

(tt) Não seria menos absurdo pretender surpreender uma suposta prestação pública na condução do sujeito passivo à adopção de um comportamento conducente à mitigação da sua carga tributária (no caso da Contribuição sobre o Sector Bancário, através da redução do passivo e do valor nocional dos instrumentos derivados fora do balanço), já que em tal cenário toda e qualquer contribuição financeira seria automática e auto-poieticamente justificada.

(uu) Por fim, se o objectivo da Contribuição sobre o Sector Bancário é efectivamente o de “obviar a riscos sistémicos do sector financeiro”, o de “prevenção de riscos sistémicos”, o de “[dissuadir d]a assunção de riscos na tomada de decisões” e o de “evitar o recurso aos mecanismos de resolução de crises”, nomeadamente, e tal como se conclui da base da incidência do tributo, a assunção de passivo, não se vê como é que a alteração dos “comportamentos de risco” no sentido pretendido pelo legislador, mediante a redução do passivo pode justificar, como de facto justificou, um aumento da taxa que não numa concepção pura de obtenção de receita fiscal, por forma a compensar a diminuição da receita resultante da redução da base tributável.

(vv) Em consequência, não procede a conclusão do Tribunal a quo de que, por ter como objectivo “obviar a riscos sistémicos do sector financeiro”, a “prevenção de riscos sistémicos”, “[dissuadir d]a assunção de riscos na tomada de decisões” e “evitar o recurso aos mecanismos de resolução de crises”, a Contribuição sobre o Sector Bancário não é materialmente inconstitucional.

(ww) Por fim, considera o Tribunal a quo que a Contribuição sobre o Sector Bancário tem como objectivo reunir “condições para fazer face a riscos sistémicos associados ao sector financeiro”, “cobrir os custos de medidas que pretendem minimizar o impacto na estabilidade económica e financeira”, “permitir um mecanismo que permita prestar apoio financeiro à aplicação das medidas de resolução que venham a ser adoptadas pelo Banco de Portugal” e “ajudar a pagar os custos de crises futuras no sector financeiro”.

(xx) Procurando retirar das afirmações do Tribunal a quo a este respeito um sentido coerente com o contexto em que as mesmas são feitas, o da justificação constitucional da Contribuição sobre o Sector Bancário, o Recorrente admite que neste passo se pretende concluir que as instituições financeiras que enquanto sujeitos passivos suportam a Contribuição sobre o Sector Bancário beneficiam do apoio financeiro do Fundo de Resolução nacional a medidas de resolução e ou estão na origem da necessidade de aplicação, pelo Banco de Portugal, de medidas de resolução da sua competência e que as “necessidades” subjacentes a tais medidas são “específicas de um sector de actividade”, o financeiro, e não “genéricas”, o que justifica a conformação do tributo como contribuição.

(yy) No entanto, tal raciocínio pressupõe inevitavelmente e desde logo que se descortine na arquitectura das medidas de resolução (que, simplificadamente, o Fundo de Resolução nacional visaria financiar) uma ou mais prestações públicas cuja provocação ou aproveitamento sejam “seguros” quanto ao grupo dos sujeitos passivos da Contribuição sobre o Sector Bancário, ainda que apenas “prováveis” para cada um desses sujeitos individualmente considerados, incluindo o Recorrente.

(zz) Ora, a única “segurança” que parece existir a este respeito depõe precisamente no sentido inverso, em termos concretos, e a própria noção de “probabilidade” encontra-se arredada do circunstancialismo que, em termos teóricos, pode motivar a disponibilização de apoio financeiro pelo Fundo de Resolução nacional, aquele ao qual a receita da Contribuição sobre o Sector Bancário se encontra consignada.

(aaa) É que à data a que se reporta o tributo mediatamente impugnado nos presentes autos não era possível ao Recorrente (como continua a não ser possível) beneficiar do apoio financeiro em que se materializa a componente pecuniária essencial da actividade do Fundo de Resolução nacional, já que a actividade desta entidade se limitou e limitar-se-á no futuro com grande probabilidade à detenção e financiamento/garantia/alienação do B…….., S.A., instituição de transição criada em resultado da aplicação de uma medida de resolução ao B1…….., S.A., e à detenção e financiamento/garantia da C……, S.A., veículo de gestão de activos criados na sequência da aplicação de medidas de resolução ao D……….., S.A.

(bbb) Aliás, é muito questionável a legalidade do próprio envolvimento do Fundo de Resolução nacional no financiamento das medidas de resolução referidas, atenta a data e os termos em que tal envolvimento se verificou, e mais questionável é ainda a legalidade do prolongamento de tal envolvimento que se pretende implementar através da assunção, pelo Fundo de Resolução, de uma obrigação de capitalização contingente no âmbito da venda do B……., S.A., nos termos tornados públicos pelo comunicado do Banco de Portugal de 31 de Março de 2017.

(ccc) E, não menos importante, é notório o avolumar de indícios de que, pelo menos na primeira das situações referidas (e a mais representativa em termos de volume), a alegada necessidade e a opção do Banco de Portugal pela aplicação de medidas de resolução não decorreu da materialização do risco sistémico a que o Tribunal a quo pretenderá referir-se pela adopção de condutas de arrojo destemperado, mas da conjugação de práticas ilícitas (incluindo práticas criminalmente ilícitas) e do deficiente exercício de poderes de supervisão por parte do Banco de Portugal, ou pelo menos de insuficiência dos mesmos por inabilidade, legislativa ou de outro tipo, com a inerente responsabilidade das várias entidades públicas e do próprio Estado através da tutela do sector financeiro, factos esses que envolvem toda a comunidade, muito para além do sistema bancário.

(ddd) Mas, ainda que não se atentasse ao contexto histórico concreto e se privilegiasse o enquadramento normativo teórico, sempre cumpriria reconhecer que a disponibilização de apoio financeiro pelo Fundo de Resolução nacional não pode ser considerada provável para nenhum dos sujeitos passivos que integram o grupo onerado com a Contribuição sobre o Sector Bancário, porque, por definição, a intervenção do Fundo de Resolução nacional deveria ocorrer em situações absolutamente disruptivas, que se pretende e se espera serem “improváveis”, sendo o apoio financeiro que o mesmo faculta como que uma rede de protecção contra situações imprevistas.

(eee) Ora, a configuração da Contribuição sobre o Sector Bancário enquanto fonte de receita de um acervo patrimonial limitado e estanque que a dedica ao apoio financeiro a entidades em situações de tal modo excepcionais que o podem facilmente esgotar, como é o caso do Fundo de Resolução nacional, inviabilizando qualquer hipotética possibilidade de utilização pelas demais, não se revela compaginável com uma figura jurídica que reclama segurança na faculdade de acesso e probabilidade na sua efectivação.

(fff) E, ainda que se relativize a dita exigência de probabilidade de fruição da prestação pública por cada um dos indivíduos que integram o grupo, cumprirá, pelo menos, examinar a situação sob a égide do princípio da proporcionalidade, havendo que concluir inevitavelmente pela existência de uma desproporção manifesta e flagrante entre o ónus que impende sobre cada sujeito passivo da Contribuição sobre o Sector Bancário e a virtualmente nula utilidade que pode extrair do bem público que assim financia.

(ggg) A esta luz, é manifesto que não existe no caso da Contribuição sobre o Sector Bancário a bilateralidade indirecta, o sinalagma difuso, em suma, a equivalência jurídica de grupo que poderia, em tese, justificar a respectiva imposição.

(hhh) Por outro lado, a figura da contribuição financeira pressupõe conceptualmente a mensurabilidade da magnitude da provocação ou do aproveitamento das prestações públicas presumidas.

(iii) E, não se podendo exigir neste âmbito uma equivalência económica, a sujeição ao crivo do princípio da proporcionalidade de qualquer contribuição financeira acarreta forçosamente a susceptibilidade de uma aferição, ainda que grosseira, da medida dos encargos motivados ou dos benefícios auferidos, ainda que presuntivamente, sob pena de a bitola da proporcionalidade se tornar letra morta, preocupação que está claramente arredada da configuração da Contribuição sobre o Sector Bancário, já que, mesmo que se pudesse aceitar que a respectiva base tributável se molda à medida do risco gerado (o que manifestamente não se pode), é patente no tributo o alheamento a qualquer ponderação do aproveitamento potencial, indirecto ou difuso.

(jjj) Por outro lado, a receita angariada através da Contribuição sobre o Sector Bancário não poderá em qualquer hipótese acudir às necessidades afirmadas pelo Tribunal a quo, porque a actuação do Fundo de Resolução nacional está limitada às medidas que sejam adoptadas relativamente a um universo muito restrito de instituições, que não inclui o Recorrente nem as principais instituições de crédito nacionais.

(kkk) E tais necessidades são necessidades financeiras públicas gerais inerentes à prossecução de fins do Estado, sendo actualmente o Fundo de Resolução nacional dotado de recursos que não visam responder a quaisquer potenciais eventos futuros que afectem de forma específica um determinado “grupo homogéneo relevante”, mas antes reagir a posteriori a carências estritamente financeiras resultantes de factos já passados, concretos e de enorme relevância, com responsabilidade evidente e indesmentida de várias entidades públicas e do próprio Estado através da tutela do sector financeiro, factos esses que envolvem toda a comunidade, muito para além do sistema bancário.

(lll) O normativo regulatório europeu em vigor torna assim inverosímil que os maiores contribuintes da Contribuição sobre o Sector Bancário – as instituições de crédito nacionais, nas quais se inclui o Recorrente – venham a poder sequer presumível ou hipoteticamente a beneficiar do financiamento de medidas de resolução efectivamente sustentadas na Contribuição sobre o Sector Bancário que pagam.

(mmm) Constata-se assim o desprezo pelos critérios da responsabilidade de grupo e da utilidade de grupo, já que não apenas não se demonstra nem se pode demonstrar qualquer contributo do sistema financeiro, como um todo, para as situações que estão na origem das medidas de resolução adoptadas pelo Banco de Portugal – de natureza profundamente distinta da mera concretização do risco sistémico inerente ao sector financeiro – como não se demonstra nem se pode demonstrar qualquer medida de relação com o putativo aproveitamento presumido (e muito menos seguro) pelos sujeitos passivos da Contribuição sobre o Sector Bancário.

(nnn) Toma-se assim gritante a ausência de conexão da Contribuição sobre o Sector Bancário com qualquer hipotético aproveitamento dos bens ou serviços públicos pelo sujeito passivo, tanto porque é seguro que não lhe serão proporcionados quaisquer benefícios, como porque nenhuns encargos ocasiona.

(ooo) O Recorrente considera, por outro lado, que não se pode afirmar neste âmbito, como implicitamente faz o Tribunal a quo, que “os riscos sistémicos associados ao sector financeiro” são um problema privativo desse mesmo sector, visando a Contribuição sobre o Sector Bancário satisfazer “necessidades específicas deste sector” e, como tal, a este sector, e não aos “contribuintes em geral”, competiria suportar os custos das medidas de resolução.

(ppp) Com efeito, não merecendo para o Recorrente discussão que o risco financeiro de natureza sistémica afecta a economia e, necessariamente, toda a vida em sociedade, que, por motivos de natureza vária, se encontram umbilicalmente dependentes do sector financeiro, é ilegítima a sua conceptualização como um problema privativo desse mesmo sector, ou ainda mais particularmente do sistema bancário.

(qqq) Nem se afirme, como faz o Tribunal a quo a diversos passos da fundamentação da sua decisão, a existência de “duas economias”: a “economia real” e “o sistema financeiro”, que seria, ao que parece, uma economia ou irreal, ou fictícia, ou inexistente, ou abstracta, ou imaginária, ou outra qualificação antagónica que logicamente se imporia.

(rrr) É que o sector financeiro faz parte da economia e toda a economia – no limite, toda a comunidade – beneficia e sofre com os seus sucessos e malogros, do mesmo modo que a conduta dos demais agentes produtivos e dos consumidores condiciona o desempenho do sector financeiro.

(sss) Como tal, e a menos que se aceite uma reconfiguração da Contribuição sobre o Sector Bancário como instrumento punitivo – o que, de todo o modo, eximiria a generalidade dos sujeitos passivos da respectiva incidência –, é insustentável a percepção, que parece perpassar a sentença recorrida, de que competiria ao sector bancário suportar os custos por si alegadamente gerados no desempenho das funções que a Constituição da República Portuguesa lhe reconhece.

(ttt) Assim, à luz do princípio da equivalência é no mínimo incerto – e, portanto, certamente não “seguro” – que seja o sector financeiro o beneficiário principal das medidas de resolução originadas pelos “riscos sistémicos do sector financeiro”.

(uuu) Afirma também o Tribunal a quo que a Contribuição sobre o Sector Bancário tem o objectivo de “obviar o contágio das demais entidades que integram o conjunto dos sujeitos passivos” da Contribuição sobre o Sector Bancário, desta forma implicitamente afirmando que os sujeitos passivos do tributo beneficiam indirectamente das medidas de resolução adoptadas relativamente a outras instituições de crédito, porque tais medidas “evitam o contágio” que de outro modo ocorreria e implicitamente concluindo que para um sujeito passivo da Contribuição sobre o Sector Bancário é mais vantajoso (i) o apoio a uma instituição concorrente objecto de uma medida de resolução, tendo em vista evitar um “contágio” que o prejudique directamente, do que (ii) a inexistência de tal apoio, em termos tais que redunde na dissolução e liquidação do património da instituição concorrente, permitindo ao dito sujeito passivo não só poupar verbas muito significativas que despenderia no pagamento da Contribuição sobre o Sector Bancário, como captar clientes, recursos e operações até então na esfera da instituição dissolvida.

(vvv) Mas aquela conclusão não é líquida, sobretudo quando reportada a instituições de grande dimensão, como é o caso do Recorrente e era aliás o caso do B1…….., S.A.

(www) Mais: o apoio prestado no âmbito de medidas de resolução pode inclusivamente gerar incentivos desalinhados e mesmo perversos quanto à possibilidade de comportamento (anti) concorrencial das instituições que dele beneficiam, em prejuízo dos seus concorrentes.

(xxx) E, ainda que se admita o interesse colectivo do sector financeiro na manutenção da estabilidade enquanto objectivo ideal, é pelo menos inverosímil que exista um “interesse homogéneo” daquele grupo no modo como a mesma é alcançada e muito menos uma percepção uniforme de quanto se está disposto a suportar no plano tributário para a assegurar.

(yyy) Já no que se refere ao benefício para a comunidade como um todo, o próprio legislador (nacional e da União Europeia, note-se) parece não ter dúvidas, uma vez que a aparelhagem jurídica que construiu nesta matéria não coloca à consideração do sector financeiro a decisão de apoiar, ou não, determinada instituição e, em conformidade, gerar os custos a que o Tribunal a quo pretenderá referir-se.

(zzz) É assim notório que inexiste uma verdadeira para comutatividade (ainda que difusa), na medida em que a repartição dos encargos resultantes de uma tarefa do Estado beneficia muito mais do que o círculo restrito dos sujeitos passivos da Contribuição sobre o Sector Bancário (se é que não beneficia apenas quem não o integra...), o que toma evidente a falta de equivalência e, por inerência, a desproporcionalidade da mesma, sendo tais flagrantes violações dos princípios da equivalência e da proporcionalidade bastantes para fundamentar um juízo de inconstitucionalidade material da Contribuição sobre o Sector Bancário.

(aaaa) Em consequência, não procede a conclusão do Tribunal a quo de que, por ter como objectivo reunir “obviar o contágio das demais entidades que integram o conjunto dos sujeitos passivos”, a Contribuição sobre o Sector Bancário não é materialmente inconstitucional.

(bbbb) Demonstrada que fica a falta de razão que assiste ao Tribunal a quo nos diferentes pontos da sustentação da posição que assumiu, cabe concluir (ou antes, sistematizar a conclusão que já foi sendo demonstrada) quanto ao verdadeiro fundamento da Contribuição sobre o Sector Bancário: a obtenção de receita fiscal junto do “sector financeiro”.

(cccc) E aquele objectivo não foi escondido nem dissimulado – antes foi sempre afirmado – pelo legislador quando da criação da Contribuição sobre o Sector Bancário e quando da alteração (sempre no sentido do aumento) das taxas previstas no Regime que cria a contribuição sobre o sector bancário.

(dddd) Conclui assim o Recorrente que a Contribuição sobre o Sector Bancário carece de justificação com base no princípio da equivalência, o que torna o Regime que cria a contribuição sobre o sector bancário e a Portaria n.º 121/2011, de 30 de Março, materialmente inconstitucionais, inconstitucionalidade esta que se reflecte na decisão imediatamente impugnada e na liquidação que é objecto mediato da presente impugnação, devendo a sentença recorrida ser revogada, por erro de julgamento, com as legais consequências.

(eeee) O Recorrente considera que, por ter procedido à autoliquidação que contesta e ao pagamento do valor autoliquidado em obediência à posição pública e conhecida da Administração Tributária a propósito da questão controvertida, lhe assiste o direito a juros indemnizatórios nos termos do número 1 do artigo 43.º da Lei Geral Tributária, devendo tal direito ser aqui reconhecido.

Nestes termos, e nos mais de Direito que Vossas Excelências suprirão, deve o presente recurso ser dado como procedente, por provado e, em consequência, ser revogada a decisão recorrida, por ilegal, e substituída por outra que determine a procedência total da impugnação, com as legais consequências».

1.3 Não foram apresentadas contra alegações.

1.4 Recebidos os autos neste Supremo Tribunal Administrativo, foi dada vista ao Ministério Público e o Procurador-Geral-Adjunto emitiu parecer no sentido de que o recurso não merece provimento, com a seguinte fundamentação:

«Questões decidendas:

1. Natureza do tributo designado por Contribuição sobre o sector bancário (art. 141.º Lei n.º 55-A/2010, 31 Dezembro)
2. Violação do princípio da legalidade fiscal (arts. 103.º n.º 2 e 165.º n.º 1 al. i) CRP)
3. Violação do princípio da igualdade e do princípio da equivalência (art. 13.º CRP)

Primeira questão decidenda (natureza do tributo designado por Contribuição para o sector bancário – art 141.º Lei n.º 55-A/2010, 31 Dezembro).
A solução da questão deve ponderar as características específicas do tributo sob análise e a sua subsunção aos conceitos normativos das figuras do imposto e da contribuição Financeira densificados pelos contributos da jurisprudência e da doutrina.
O imposto define-se como prestação pecuniária unilateral, imposta coactivamente pelo Estado ou por uma entidade pública, sem carácter sancionatório, visando a obtenção de receitas para a satisfação de necessidades públicas; tem como pressuposto a capacidade contributiva, revelada através do rendimento, da sua utilização ou do património (art. 4.º n.º 1 LGT).
“As contribuições financeiras constituem um tertium genus de receitas fiscais, que poderão ser qualificadas como taxas colectivas, na medida em que compartilham em parte da natureza dos impostos (porque não têm necessariamente uma contrapartida individualizada para cada contribuinte) e em parte da natureza das taxas (porque visam retribuir o serviço prestado por uma instituição pública a certo círculo ou certa categoria de pessoas ou entidades que beneficiam colectivamente de uma actividade administrativa” (Gomes Canotilho/Vital Moreira, em Constituição da República Portuguesa anotada I vol., pág. 1095, 4.ª ed., Coimbra Editora).
As contribuições distinguem-se especialmente das taxas porque não se dirigem à compensação de prestações efectivamente provocadas ou aproveitadas pelo sujeito passivo, mas à compensação de prestações que apenas presumivelmente são provocadas ou aproveitadas pelo sujeito passivo, correspondendo a uma situação de bilateralidade genérica.
Preenchem este requisito as situações em que a prestação poderá beneficiar potencialmente um grupo homogéneo ou um conjunto diferenciável de destinatários e aquelas em que a responsabilidade pelo financiamento de uma tarefa administrativa é imputável a um determinado grupo que mantém alguma proximidade com as finalidades que através dessa actividade se pretendem atingir (...)
(Acórdão Plenário do Tribunal Constitucional n.º 539/2015; com construção teórica semelhante Sérgio Vasques Manual de Direito Fiscal Almedina 2014 p. 223).
A comunicação da Comissão Europeia ao Conselho Europeu, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Banco Central Europeu- Fundos de resolução de crises nos bancos [2010] transmitiu as conclusões extraídas da Cimeira do 0-20 de Pittsburg, de Setembro 2009 e do Conselho do ECOFIN, 18 Maio 2010,nos seguintes termos:
“A Comissão apoia a criação de fundos de resolução de crises ex ante, financiados por uma taxa sobre os bancos (...), que facilitem a resolução de crises nos bancos em dificuldades, de forma que evitem o contágio e que permitam a liquidação de um banco de forma ordeira e num prazo que evite a venda urgente dos activos («princípio da previdência»).
(...) A função dos fundos de resolução será contribuir para o financiamento da resolução ordeira das dificuldades em que se encontra uma entidade financeira.
Devem estar disponíveis para a resolução dos problemas dos bancos, independentemente da sua dimensão e do seu grau de interligação”.
Nesta sequência o relatório do Orçamento de Estado para o ano 2011 refere a “criação de uma contribuição para o sector bancário na linha daquelas que foram já introduzidas noutros Estados Membros [União Europeia],com o propósito de aproximar a carga fiscal suportada pelo sector financeiro da que onera o resto da economia e de o fazer contribuir de forma mais intensa para o esforço de consolidação das contas públicas e de prevenção de riscos sistémicos, protegendo também, assim, os trabalhadores do sector e os mecanismos de segurança social”
O regime da contribuição para o sector bancário (CSB) consta do art. 141.º Lei n.º 55- A/2010, 31 Dezembro (Lei OGE 2011),tendo sido prorrogado pelo art. 182.º Lei n.º 64-B/2011, 30 Dezembro (Lei OGE 2012), pelo art. 252.º Lei n.º 66-B/2012, 31 Dezembro (Lei OGE 2013), pelo art. 226.º Lei n.º 83-C/2013, 31 Dezembro (Lei OGE 2014), pelo art. 235.º Lei n.º 82-B/2014, 31 Dezembro (Lei OGE 2015)
A sua regulamentação consta da Portaria n.º 121/2011,30 Março alterada pela Portaria n.º 77/2012, 26 Março pela Portaria n.º 64/2014, 12 Março e pela Portaria n.º 176-A/2015, 12 Junho
O DL n.º 31-A/2012, 10 Fevereiro introduziu alterações no Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras (RGICSF) e procedeu à criação de um Fundo de Resolução com o objectivo de prestar apoio financeiro à aplicação de medidas de resolução adoptadas pelo Banco de Portugal, constituindo uma das suas fontes de receitas a Contribuição para o sector financeiro (art. 153.º-B e 153.º-F n.º1 al. a) RGICSF). A CSB não se destina à satisfação de necessidades genéricas de financiamento do Estado; antes à prevenção de riscos sistémicos no sector bancário, resultantes de imparidades excessivas reveladas nos balanços das instituições do sector que, pondo em causa o seu regular financiamento, afectem a imprescindível relação de confiança com os clientes.
O tributo sob análise dirige-se a um grupo homogéneo de destinatários constituindo a compensação de uma eventual intervenção do Fundo de Resolução na capitalização de qualquer instituição do sector em dificuldades financeiras, da qual as todas as instituições do sector serão beneficiárias, por via da eliminação ou minoração de qualquer risco sistémico.
Em consequência a natureza de contribuição financeira surge claramente afirmada, sendo de recusar a tese da recorrente segundo a qual o tributo em causa tem a natureza de imposto.

Segunda questão decidenda: violação do princípio da legalidade fiscal (arts. 103.º n.º 2 e 165.º n.º 1 al. i) CRP).
Assumindo a natureza de contribuição financeira (pelos motivos enunciados na solução da primeira questão) a CSB não está sujeita a reserva de lei formal, expressa na imperatividade de lei da Assembleia da República ou de decreto-lei do Governo, com credencial parlamentar (arts. 165.º n.º 1 al. i) e 198.º n.º 1 al. b) CRP).
A ausência de aprovação de um regime geral das contribuições financeiras não é impeditiva da aprovação pelo Governo de contribuições financeiras individualizadas, sem prejuízo de a Assembleia da República poder revogar, alterar ou suspender os respectivos diplomas (acórdãos Tribunal Constitucional n.ºs 70/2014, 20 Março 2014; 365/2008, 2 Julho 2008; 539/2015, 20 Outubro 2015-Plenário).
No caso concreto o regime jurídico da CSB (RCSB) foi criado por lei da Assembleia da República (art. 141.º Lei n.º 55-A/2010, 31 Dezembro - Lei OGE 2011), dela constando a incidência subjectiva e objectiva e as margens de variação das taxas aplicáveis a cada uma das componentes da base de incidência objectiva (arts. 2.º, 3.º e 4.º).
A Portaria n.º 121/2011,30 Março limitou-se à densificação das características essenciais do regime jurídico (base de incidência, taxas, regras de liquidação, de cobrança e de pagamento),cumprindo a missão regulamentar prescrita no próprio regime jurídico da CSB constante da Lei da Assembleia da República (art. 8.º RCSB).
Neste contexto:
- as normas constantes dos arts. 3.º, 4.º e 8.º do RCSB não enfermam de inconstitucionalidade material, por violação do princípio da legalidade fiscal (art. 103.º n.º 2 CRP);
- os arts.4.º e 5.º da Portaria n.º 121/2011, 30 Março não enfermam de inconstitucionalidade orgânica, por violação do princípio da reserva de lei formal (art. 165.º n.º 1 al. i) CRP)

Terceira questão decidenda: violação do princípio da equivalência e do princípio da proporcionalidade
O princípio da igualdade, aplicado ao domínio tributário, declina-se na sua dupla vertente:
- igualdade perante a lei fiscal, no sentido da inexistência de qualquer discriminação dos cidadãos face às leis fiscais;
- igualdade tributária ou igualdade de sacrifícios, expressa em igualdade horizontal (significando que os titulares das mesmas formas de riquezas devem ser tributados em termos iguais) e em igualdade vertical (significando que o sacrifício dos encargos fiscais deve ser repartido em função dos rendimentos de cada um)
A observância do princípio da igualdade tributária traduz-se num resultado positivo do teste de adequação das normas tributárias aos critérios da capacidade contributiva e da equivalência.
O princípio da igualdade, tendo como corolário no domínio dos impostos o princípio da capacidade contributiva, declina-se no domínio das taxas e contribuições financeiras como princípio da equivalência.
Aplicado às contribuições financeiras este princípio significa que deve haver uma relação de equivalência entre a prestação da entidade pública e o valor do benefício obtido ou do custo provocado pelos sujeitos passivos destas figuras tributárias; equivalência não sinalagmática, na medida em que as contribuições financeiras respeitam a feixes de prestações difusas que apenas podemos presumir provocadas ou aproveitadas por certos grupos de contribuintes (acórdão Plenário do Tribunal Constitucional n.º 539/2015, 20 Outubro 2015).
A análise do caso concreto, à luz das antecedentes considerações teóricas, compreende a enunciação das seguintes premissas, de cuja conjugação claramente resulta que os elementos essenciais da CSB observam o princípio da equivalência:
1.ª a CSB atinge igualmente todas as instituições de crédito do sector bancário a operar em Portugal, independentemente de a sua sede principal e efectiva se situar em território português (art. 2.º RCSB; art.2.º Portaria n.º 121/2011, 30 Março) – universalidade da lei.
2.ª a modulação da carga tributária em função dos maiores ou menores riscos sistémicos provocados pela actuação dos sujeitos passivos, expressão da observância de um critério de proporcionalidade na construção da estrutura sinalagmática, está presente no desenho da base de incidência objectiva do tributo: incidindo a CSB sobre o valor do passivo apurado e aprovado e sobre o valor nocional dos instrumentos financeiros derivados é indiscutível que, embora a taxa não seja progressiva, o valor da contribuição a pagar por cada sujeito passivo é directamente proporcional à intensidade do risco sistémico que a sua actuação pode provocar, directamente associada à dimensão do passivo e, consequencialmente, à dimensão da lesão resultante do eventual incumprimento das suas responsabilidades para com terceiros, depositantes ou titulares de produtos financeiros emitidos ou garantidos pelas instituições de crédito (art. 4.º Portaria n.º 121/2011, 30 Março).
Neste contexto as normas que definem a incidência subjectiva e objectiva e as taxas da CSB, constantes do RCSB (art. 141.º Lei n.º 55-A/2010, 31 Dezembro - Lei OGE 2011) não violam o princípio da equivalência, corolário do princípio da igualdade, nem a sua funcionalização pelo princípio da proporcionalidade».

1.5 Cumpre apreciar e decidir.


* * *

2. FUNDAMENTAÇÃO

2.1 DE FACTO

O Juiz do Tribunal Tributário de Lisboa deu como provados os seguintes factos:

«A) O impugnante é uma instituição de crédito (não controvertido);

B) Em 5 de Março de 2015, o impugnante apresentou, junto dos serviços da Administração Tributária, a declaração modelo 26, referente à autoliquidação da Contribuição sobre o Sector Bancário do ano de 2015, no valor de € 2.884.257,38, tendo declarado os seguintes montantes:
Base 1 da Contribuição € 4.119.016.124,51 x 0,07% = € 2.883.311,29
Base II da Contribuição €315.361.908,91 x 0,00030% = € 946,09
(cfr. fls. 32 dos autos);

C) Na mesma data, o impugnante procedeu ao pagamento da autoliquidação da Contribuição sobre o Sector Bancário referida na alínea antecedente, através da guia de liquidação n.º 26000006950 (cfr. fls. 33 dos autos);

D) Em 9 de Março de 2015, o impugnante apresentou reclamação graciosa da autoliquidação referida nas alíneas antecedentes, autuada sob o n.º 3085201504002180, do Serviço de Finanças de Lisboa 3 (cfr. capa e fls. 2 a 4 do procedimento de reclamação graciosa apenso aos autos);

E) Em 24 de Março de 2015, foi emitida pela Divisão de Gestão e Assistência Tributária da Unidade dos Grandes Contribuintes da Autoridade Tributária e Aduaneira a informação n.º 65-AIR2/2015, com o projecto de decisão da reclamação graciosa referida na alínea antecedente, com o seguinte teor, em transcrição parcial:
«(…) 19. Sobre a matéria em análise, a nova “contribuição” criada pelo art. 141.º da Lei n.º 55-A/ 2010, de 30 de Março, cuja regulamentação foi introduzida pela Portaria n.º 121/2011, de 30 de Março, refira-se sucintamente, a criação desta taxa teve na sua origem vários aspectos discutidos na Cimeira de Pittsburg, de Setembro de 2009, e no Conselho “ECOFIN”, de 18 de Maio de 2010, nos quais se afirmou que deveria ser esse sector a pagar os encargos que ele próprio gera, através da criação de um imposto sobre bancos.
Aliás,
16. Alguns Estados, como, por exemplo, a Alemanha e a Suécia, decidiram que as receitas provenientes deste imposto seriam afectas a “Fundos de Resolução de Crises Administrativas” geridos por organismos executivos independentes.
Neste sentido,
17. Com o duplo propósito de reforçar o esforço fiscal exigido ao sector financeiro e, bem assim de eliminar ou diminuir os riscos sistémicos que lhe estão associados, o Orçamento de Estado para o ano 2011, no art. 141.º da respectiva Lei, criou a denominada “Contribuição Sobre o Sector Bancário”, cujo regime legal se encontra complementado de acordo como preceituado na Portaria n.º 121/2011, de 30 de Março.
Contudo,
18. De acordo com as alegações proferidas pela Contribuinte, ora Reclamante, recorde-se, é invocado que o acto tributário praticado está ferido de ilegalidade em razão da sua pretensa inconstitucionalidade invocada em vários sentidos.
Porém,
19. Não lhe assiste qualquer razão.
Com efeito,
20. Interessa, por isso, para além do princípio da não retroactividade da lei fiscal, trazer aqui à colação, por um lado, o disposto no n.º 2 do art. 103.º da Constituição da República Portuguesa, o qual consagra expressamente que “(...) os impostos são criados por lei, que determina a incidência, a taxa, os benefícios fiscais e as garantias dos contribuintes”, e, por outro, a alínea i) do n.º 1 do art. 165.º, igualmente da nossa Lei Fundamental, o qual, por sua vez, estabelece que é da exclusiva competência da Assembleia da República legislar sobre (…) a criação de impostos e sistema Fiscal”, mais, segundo o n.º 2 do mesmo artigo, “leis de autorização legislativa devem definir o objecto, o sentido, a extensão e a duração da autorização, a qual pode ser prorrogada”.
Ora,
22. Quanto à alegada violação do princípio da não retroactividade da lei fiscal, vertido no art. 103.º da Constituição da República Portuguesa, não vislumbramos como, atento o momento da verificação do facto tributário, se possa arrazoar, invocando um pretenso dissídio com tal postulado constitucional.
23. Por sua vez, no que concerne à invocada inconstitucionalidade material e orgânica, não se pode olvidar que, numa primeira linha, cabe ao aplicador de leis expressamente reportadas a determinados factos, analisar os caracteres de tais leis, a sua natureza e fundamento, e o seu enquadramento na ordem geral da política financeira, expressa ou implicitamente revelada nas manifestações do Governo ou da Assembleia da República, concluir sobre a alteração ou não de determinada legislação e a sua conformidade
24. Na verdade, é a lei, no seu mais amplo sentido (compreendendo as leis parlamentares, os decretos leis, os decretos-regulamentares, as portarias e os despachos normativos), que constitui o meio formal de expressão das normas jurídicas.
Pelo que,
25. É de manual que a adopção de um ou de outro tipo de forma legal varia e depende do grau do interessado objecto disciplinado ou consagrado pela norma ou do grau e gravidade do seu efeito perante as pessoas por elas afectadas ou perante a própria sociedade em que elas se integram.
Destarte,
26. Através de uma adequada ponderação dos interesses em causa, e atendendo que a própria Administração Tributária se limitou a fazer a interpretação das normas aplicáveis aos factos, sempre sobre o espectro do princípio da legalidade, somos de parecer que, em nossa opinião, f ao que até aqui foi dito não subsistem razões atendíveis para os termos e efeitos de anulação do ato tributário ora colocado em crise pela Contribuinte, ora Reclamante. (…)» (cfr. fls. 21 a 26 do procedimento de reclamação graciosa apenso aos autos);

F) Sobre a informação parcialmente transcrita na alínea antecedente recaiu despacho, em 30 de Março de 2015, do Director da Unidade dos Grandes Contribuintes, de concordância com o teor da informação parcialmente transcrita na alínea antecedente e subsequentes pareceres que a confirmaram, e promoção da notificação do reclamante para o exercício do direito de audição prévia (cfr. fls. 20 do procedimento de reclamação graciosa apenso aos autos);

G) Pelo ofício n.º 1113, de 30 de Março de 2015, o impugnante foi notificado para exercer o direito de audição prévia relativamente ao projecto de decisão de reclamação graciosa (cfr. fls. 27 e 28 do procedimento de reclamação graciosa apenso aos autos);

H) Pela informação no 84-AIR2/2015, de 22 de Abril de 2015, da Divisão de Gestão e Assistência Tributária da Unidade dos Grandes Contribuintes, foi proposto indeferir a reclamação graciosa apresentada, por, em síntese, na ausência de outros elementos susceptíveis de colocar em causa as conclusões anteriormente propostas, se ter considerado a permanência da validade dos pressupostos que, de facto e de direito, alicerçaram o projecto de decisão (cfr. fls. 30 e 31 do procedimento de reclamação graciosa apenso aos autos);

I) Por despacho, sem data, do Director da Unidade dos Grandes Contribuintes, de concordância com as conclusões e informação referida na alínea antecedente, foi indeferida a reclamação graciosa (cfr. fls. 29 do procedimento de reclamação graciosa apenso aos autos)».


*

2.2 DE DIREITO

2.1.1 AS QUESTÕES A APRECIAR E DECIDIR

As questões a apreciar e decidir que se prendem com a natureza jurídica da CSB e a alegada violação dos princípios constitucionais da legalidade, por violação da reserva de lei formal e por não cumprimento do comando constitucional do art. 103.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa (CRP), da irretroactividade da lei fiscal, da capacidade contributiva e da equivalência foram já circunstanciadamente analisadas e apreciada a conformidade constitucional dos diplomas que regem a tributação aqui em causa, no acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 19 de Junho de 2019, proferido no processo n.º 2340/13.0BELRS (683/17) ( Disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/02054caa615575e88025845c00509985.) em julgamento ampliado desta Secção de Contencioso Tributário, realizado ao abrigo do disposto no art. 148.º do Código de Processo dos Tribunais Administrativos, que tem vindo a ser seguido nos muitos processos em que se tem discutido a CSB, designadamente no acórdão de 3 de Julho de 2019, proferido no processo com o n.º 2135/15.6BEPRT (901/17) (Disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/388c36aa399b98c380258433004c40f6.).
Porque esse julgamento ampliado visa «assegurar a uniformidade da jurisprudência», porque concordamos integralmente com a fundamentação expendida nos dois referidos arestos e tendo também em conta a regra do n.º 3 do art. 8.º do Código Civil, remeteremos para a fundamentação aí expendida, ao abrigo da faculdade que nos é concedida pelo n.º 5 do art. 663.º do Código de Processo Civil (CPC), aplicável ex vi da alínea e) do art. 2.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT).
Assim, cumpre negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida, com a fundamentação expendida nos referidos acórdãos, dispensando a junção de cópia porque indicamos onde os mesmos se encontram publicados.

2.1.2 DA DISPENSA DO REMANESCENTE DA TAXA DE JUSTIÇA

Cumpre agora averiguar da possibilidade de dispensar o Recorrente do pagamento do remanescente da taxa de justiça devida pelo presente recurso, ao abrigo do disposto no n.º 7 do art. 6.º do Regulamento das Custas Processuais (RCP).
Embora se nos afigure que não está verificado o requisito de menor complexidade – que, relativamente à complexidade da causa tem sido o parâmetro usado por este Supremo Tribunal para a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, que assume carácter excepcional –, o montante da taxa de justiça devida, a nosso ver, é manifestamente desproporcionado em face do concreto serviço prestado nos presentes autos, pondo em causa a relação sinalagmática que a taxa pressupõe, tanto mais que as questões suscitadas já tinham sido jurisdicionalmente apreciadas no acórdão para cuja fundamentação se remeteu.
Assim, dispensaremos na totalidade o pagamento do remanescente da taxa de justiça nesta sede de recurso.

2.2.3 CONCLUSÕES

Preparando a decisão, formulamos as seguintes conclusões:
I - A Contribuição sobre o Sector Bancário tem natureza jurídica de contribuição financeira.
II - As normas que aprovam o regime jurídico da Contribuição sobre o Sector Bancário não enfermam de inconstitucionalidade orgânica, nem material, não violando os princípios constitucionais da legalidade, da não retroactividade, da tutela da confiança e da segurança jurídica, da igualdade, capacidade contributiva e equivalência.


* * *

3. DECISÃO

Em face do exposto, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo acordam, em conferência, em negar provimento ao recurso e confirmar a decisão recorrida, com a presente fundamentação.

Custas pela Recorrente, que ficou vencida, com dispensa do remanescente da taxa de justiça [cf. art. 527.º, n.ºs 1 e 2, do CPC, aplicável ex vi da alínea e) do art. 2.º do CPPT e art. 6.º, n.º 7, do RCP].


*

Lisboa, 17 de Junho de 2020. – Francisco Rothes (relator) – Aragão Seia – Paulo Antunes.