Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01549/13
Data do Acordão:06/18/2014
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:FRANCISCO ROTHES
Descritores:OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO FISCAL
ERRO NA FORMA DE PROCESSO
REJEIÇÃO LIMINAR
PETIÇÃO INICIAL
INEXIGIBILIDADE DA DÍVIDA EXEQUENDA
PORTAGEM
FALTA DE NOTIFICAÇÃO
DECISÃO DE APLICAÇÃO DE COIMA
Sumário:I - O erro na forma do processo afere-se pelo ajustamento do meio processual ao pedido que se pretende fazer valer, pelo que, se o pedido formulado em juízo pelo executado é de que seja extinta a execução fiscal, é adequado o meio processual de oposição à execução fiscal.
II - Questão diferente é a de saber se na petição inicial foram alegados fundamentos válidos de oposição, questão que se situa no âmbito da viabilidade do pedido e já não da propriedade do meio processual, sendo que ser for manifesto que não foi alegada fundamento algum dos admitidos no n.º 1 do art. 204.º do CPPT, verifica-se motivo para a rejeição liminar da petição inicial nos termos da alínea b) do n.º 1 do art. 209.º do CPPT.
III - A falta de notificação da liquidação das taxas de portagem, bem como a falta de notificação da decisão administrativa de aplicação da coima, porque determinam a inexigibilidade das dívidas que tenham origem nesses actos, integram, em abstracto, o fundamento de oposição à execução fiscal previsto na alínea i) do art. 204.º, n.º 1, do CPPT.
IV - A rejeição liminar da petição inicial com fundamento na alínea b) do n.º 1 do art. 204.º do CPPT só deve ocorrer em situações em que seja manifesta, evidente, a inexistência de fundamento admissível de oposição.
Nº Convencional:JSTA00068789
Nº do Documento:SA22014061801549
Data de Entrada:10/08/2013
Recorrente:A....
Recorrido 1:INST DA MOBILIDADE E DOS TRANSPORTES, I.P.
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TT1INST LISBOA
Decisão:PROVIDO
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - EXEC FISCAL / OPOSIÇÃO.
Legislação Nacional:CPPTRIB99 ART204 N1 ART209 N1 B I.
L 25/2006 DE 2006/06/30 ART10 ART12.
RGCO ART55 N3 ART61 N1.
CPC96 ART3 N3.
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC063/10 DE 2010/03/03.; AC STA PROC0212/12 DE 2012/05/16.; AC STA PROC0765/10 DE 2011/02/24.; AC STA PROC01145/11 DE 2012/03/28.
Referência a Doutrina:ALBERTO DOS REIS - CODIGO DE PROCESSO CIVIL ANOTADO 3ED PAG373 PAG288-289.
JORGE DE SOUSA - CODIGO DE PROCEDIMENTO E DE PROCESSO TRIBUTARIO ANOTADO E COMENTADO 6ED VOLIII PAG502 PAG441-442 PAG495-496 PAG599.
Aditamento:
Texto Integral: Recurso jurisdicional da decisão proferida no processo de oposição à execução fiscal com o n.º 1110/12.7BEBRG

1. RELATÓRIO

1.1 A…….. (a seguir Executada, Oponente ou Recorrente), citada pelo Serviço de Finanças de Braga 1 para a execução fiscal instaurada contra ela pelo “Instituto de Infra-Estruturas Rodoviárias - IP” (INIR) para cobrança de taxa de portagem, coima e custos administrativos liquidados em virtude da prática de contra-ordenação, apresentou oposição junto do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga.
Alegou, em síntese, (i) a incompetência do Serviço de Finanças de Braga 1 para exercer as funções de órgão da execução fiscal, (ii) a prescrição do procedimento contra-ordenacional, (iii) a ilegalidade da liquidação das taxas de portagem, (iv) a falta da notificação a que aludem os arts. 10.º e 12.º, n.º 2, da Lei n.º 25/2006, de 30 de Junho, com a consequente violação do direito de audição e defesa do arguido, que determina a nulidade do procedimento, (v) a violação do princípio da proporcionalidade, por o valor exigido à Oponente ser superior ao quádruplo das taxas aplicadas e, finalmente, (vi) apesar de ser a proprietária do veículo, não foi ela quem o conduziu quando da passagem das portagens, o que tudo, a seu ver, justifica a extinção da execução fiscal, que pediu.

1.2 A Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga julgou o Tribunal incompetente em razão do território e ordenou a remessa do processo ao Tribunal Tributário de Lisboa, que considerou ser o competente para conhecer da oposição à execução fiscal.

1.3 Recebidos os autos no Tribunal Tributário de Lisboa, a Juíza deste Tribunal rejeitou liminarmente a petição inicial com fundamento no erro na forma do processo e na impossibilidade de convolação para o meio processual adequado, que considerou ser o recurso judicial da decisão de aplicação da coima, da competência dos tribunais comuns.

1.4 Inconformada, a Oposição interpôs recurso da decisão, que foi admitido, para subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito suspensivo.

1.5 A Recorrente apresentou as alegações, que resumiu em conclusões do seguinte teor:

«1- A aqui Recorrente deduziu oposição à execução fiscal n.º 0361201011040055 e apensos, que correu e corre os seus termos no Serviço de Finanças de Braga 1, em 19 de Março de 2012.

2- A referida execução fiscal diz respeito à cobrança de taxas de portagem, coimas e custos administrativos, resultantes da prática de contra-ordenação prevista e punida pelos artigos 5.º a 7.º da Lei 25/2006, de 30 de Junho, no valor total de 8.167,36 €.

3- A Recorrente alegou na sua oposição, em suma, a incompetência do Serviço de Finanças de Braga 1 para exercer as funções de órgão de execução fiscal, a prescrição do procedimento de contra-ordenação, a ilegalidade da liquidação das taxas, a falta de notificação prevista nos artigos 10.º e 12.º da Lei 25/2006 de 30 de Junho, e a consequente violação do direito de audição e defesa, a violação do princípio da proporcionalidade e a ilegitimidade por não ter praticado as infracções que deram origem às taxas e coimas, nos termos do artigo 204.º, n.º 1, a. b) do CPPT.

4- Em 19 de Março de 2012, a Recorrente dá entrada da oposição no Serviço de Finanças de Braga 1, que remete a Oposição ao Tribunal Fiscal de Braga.

5- Em 3 de Setembro de 2012 a Oponente é notificada da douta promoção, proferida em 6 de Julho de 2012, juntamente com a douta sentença, proferida no dia 31 de Agosto de 2012, do TAF de Braga.

6- O digno Magistrado do Ministério Público, junto do TAF de Braga, emite parecer no sentido da remessa dos autos ao TAF de Lisboa, com base na excepção dilatória de incompetência territorial do TAF de Braga.

7- E nesse sentido também foi a decisão daquele tribunal, baseando-se na conjugação do art. 5.º, n.º 1 do ETAF, do art. 12.º, n.º 1, e dos arts. 150.º e 151.º, n.º 1 do CPPT, entendendo assim que, estando em causa a cobrança coerciva de taxas de portagem, coimas e custos administrativos, a competência para decidir a oposição à execução fiscal é atribuída ao Tribunal Tributário de 1.ª instância do área onde correr a execução, ou seja, ao tribunal da área onde tiver corrido o processo de aplicação da coima.

8- Considerando que, o Órgão que exerce funções de Órgão de execução fiscal é o INIR, cuja sede se situa em Lisboa, logo, a competência para decidir a presente oposição cabe ao TAF de Lisboa, que tem jurisdição na área da sede do órgão de execução fiscal. (art. 17.º-A da Lei n.º 25/2006 de 30 de Junho), actuando aqui o Serviço de Finanças de Braga 1 apenas como mero Órgão deprecado.

9- Na douta sentença é também referido que, entretanto, a Lei n.º 64.º-B/2011 de 30 de Dezembro, alterou a redacção do artigo 17.º-A da Lei 25/2006 de 30 de Junho, onde se passou a ler agora que “Compete à administração tributário promover, nos termos do Código de Procedimento e Processo Tributário, a cobrança coercivo dos créditos compostos pela taxa de portagem, coima e custos administrativos e dos juros de mora devidos”.

10 - Considera também aquele tribunal que a presente alteração apenas se aplica aos processos instaurados a partir da entrada em vigor da Lei n.º 64-B/2011 (OE/2012), ou seja, a partir de 1 de Janeiro de 2012, não tendo portanto aplicação à oposição apresentada pela Recorrente, uma vez que deu entrada antes da referida alteração, pelo que se a Oposição da Recorrente tivesse dado entrado a partir de 1 de Janeiro de 2012, aquele tribunal seria o competente paro decidir da oposição.

11- Portanto, o TAF de Braga julga-se incompetente em razão do território para apreciação dos presentes autos e determina a remessa dos mesmos ao TAF de Lisboa por entender ser esse o tribunal territorialmente competente para conhecer a presente Oposição.

12- Remetidos os autos de oposição ao TAF de Lisboa, em 2 de Outubro de 2012, vem o mesmo rejeitar liminarmente os autos de oposição, decidindo que os fundamentos alegados pela Recorrente em sede de oposição à execução não constituem fundamentos previstos no art. 204.º do CPPT.

13- Entende o Tribunal a quo que, no caso em apreço, estão em causa infracções às normas estradais (coima aplicada pelo INIR pela passagem de portagem, sem pagamento) devendo a Recorrente recorrer judicialmente para os Tribunais Comuns, nos termos dos artigos 59.º, 55.º, n.º 3 e 61.º, n.º 1 do Regime Geral das Contra Ordenações, com as alegações suscitadas na sua Oposição, uma vez que os Tribunais Administrativos e Fiscais padecem de incompetência absoluta, por falta de jurisdição para a apreciação de recursos de contra-ordenação, cuja coima seja aplicada pelo INIR.

14- Considera o Tribunal a quo que, a ora Recorrente apresentando oposição em vez de recurso de contra-ordenação, está-se perante erro na forma de processo, que só pode conduzir à convolação da petição respectiva em petição de recurso de contra-ordenação, se para tal puder ser aproveitada, nos termos dos artigos 97.º, n.º 3 da LGT, 98.º, n.º 4 do CPPT e 199.º do CPC.

15- Decidindo o Tribunal a quo pela nulidade de todo o processo, e não sendo a convolação possível, rejeita liminarmente a petição.

16- O Tribunal a quo ao decidir como decidiu, salvaguardando o devido respeito, não fez a correcta e adequada aplicação do direito.

SENÃO VEJAMOS:

17- A Recorrente foi citada postalmente pelo Serviço de Finanças de Braga 1, dos vários processos de execução fiscal, agora apensados num único processo (036120101 1040055).

18 - Nas referidas citações pode-se ler: “Fica por este meio citada, nos termos do artigo 189.º e 190.º do CPPT, de que foi instaurado neste serviço de Finanças o processo de execução Fiscal à margem referido, para cobrança da dívida exequenda e acrescido. No mesmo prazo poderá requerer o pagamento em prestações nos termos do artigo 196.º do CPPT, a dação em pagamento nos termos do artigo 201.º do CPPT ou ainda deduzir oposição com os fundamentos previstos no artigo 204.º da CPPT.
Decorrido o prazo antes referido sem que a dívida exequenda e acrescido tenha sido paga, ou tenha sido prestada garantia que suspensa a execução nos termos dos artigos 169.º e 199.º do CPPT, prosseguirá a processo com a penhora de bens ou direitos existentes no seu património, de valor suficiente para a cobrança da dívida”.

19- Face à cominação legal prevista nas citações a Recorrente, apresentou, em 23 de Março de 2012, Oposição à execução, que lhe estava a ser movida pelo Serviço de Finanças Braga 1.

20- Na verdade, foi por meio destas citações que a Recorrente tomou conhecimento, pela primeira vez, da existência das dívidas, tendo inclusive a Recorrente alegado na sua Oposição, para além de outros fundamentos, a falto de notificação a que aludem os artigos 10.º e 12.º, n.º 2, da Lei 25/2006 e a consequente violação do direito de audição e de defesa do arguido.

21- Atendendo ao facto de que, ali oponente, desconhecia a existência daquelas dívidas, quando foi citada das mesmas, não mais poderia fazer, perante a cominação legal expressa nas mesmas citações, pelo facto de não apresentar Oposição, do que lançar mão da Oposição à Execução naqueles processos de execução fiscal que lhe estavam a ser movidos pelo Serviço de Finanças de Braga 1, para defender-se, alegando factos e invocando o direito que não autoriza a cobrança e inviabiliza a respectiva execução.

22- Por outro lado, e atendendo ao que diz o artigo 17.º-A da Lei n.º 25/2006, de 30 de Junho, onde se lê: “Compete ao Instituto de Infra-Estruturas Rodoviárias, I.P., adoptar as medidas necessárias para que, quando ocorra o não pagamento em conformidade com o disposto no art. 16.º, haja lugar à execução do crédito composto pela taxa de portagem, coima e custos administrativos, a qual segue, com as necessárias adaptações, os termos dos artigos 148.º e seguintes do Código do Procedimento e de Processo Tributário

23- Entende a ora Recorrente que, o legislador quando define que a execução de créditos composta pela taxa de portagem, coima e custas administrativas deve seguir a tramitação dos artigos 148.º e seguintes, do CPPT (Título IV, Capítulo I - Disposições Gerais, Secção I - Do Âmbito), que o meio de reacção e defesa à execução fiscal das referidas dívidas, apenas poderá ser efectuada através da oposição à execução, prevista no art. 203.º e ss. (Secção VI).

24- Aliás, em nenhuma parte da Lei 25/2006, de 30 de Junho, diz que a competência para conhecer do litígio dos presentes autos é dos Tribunais Comuns, como decidiu o Tribunal a quo.

25- Importa também realçar o disposto no artigo 176.º da Lei n.º 55-A/2010 (OE/2011), que autoriza o Governo a proceder à aprovação de um regime especial de execução dos créditos de que o Instituto de Infra-Estruturas Rodoviárias, LP., seja titular, desde que originados pela falta de pagamento de taxas de portagem, que em seguida se transcreve:


Artigo 176.º
Autorização legislativa relativa ao regime especial de execução
de créditos pelo Instituto de Infra-Estruturas Rodoviárias, I. P.
1 - Fica o Governo autorizado a proceder à aprovação de um regime especial de execução dos créditos de que o Instituto de Infra-Estruturas Rodoviárias, I. P., seja titular, desde que originados pela falta de pagamento de taxas de portagem em infra-estruturas rodoviárias.
2 - A autorização referida no número anterior é concedida com o seguinte sentido e extensão:
a) Estabelecer um regime especial de execução para cobrança coerciva de taxas de portagem, coimas e custos administrativos, que garanta o respeito pelos princípios do contraditório, da proporcionalidade, da eficiência, da praticabilidade, da simplicidade e do duplo grau de decisão;
b) Simplificar as formalidades do procedimento;
c) Atribuir competência exclusiva ao tribunal tributário de 1.ª instância da área da sede do órgão de execução;
d) Aceitar a garantia bancária como único meio de suspensão da execução;
e) Dispensar a cobrança de juros de mora;
f) Adequar os fundamentos da oposição à execução;
g) Rejeitar a possibilidade de pagamento em prestações ou de dação em pagamento;
h) Afastar o arresto como forma de garantia de pagamento.

26- E a autorização estabelecida no n.º 1 deste artigo tem, nomeadamente, como objectivo atribuir competência exclusiva ao tribunal tributário de 1.ª instância da área da sede do órgão de execução. (Alínea c), n.º 2 do artigo 176.º da Lei n.º 55-A/2010 (OE/2011)).

27- Assim como, e de acordo com a alínea f) do mesmo preceito legal, adequar os fundamentos da oposição à execução.

28- Pese embora, tal regime ainda não tenha sido implementado, entende a Recorrente que é clara vontade do legislador que sejam os tribunais tributários, os tribunais a terem competência exclusiva sobre a presente matéria.

29- Aliás, também o TAF de Braga, decidiu nesse sentido, como acima já se expôs, que apenas se achou incompetente territorialmente.

30- Por outro lado, o Tribunal a quo entende também que os fundamentos alegados pela Recorrente em sede de Oposição não são subsumíveis aos fundamentos que constam do artigo 204.º do CPPT.

31- A recorrente discorda dessa interpretação do Tribunal a quo.

32- A recorrente alega, na sua petição, a incompetência do serviço de Finanças de Braga 1 para exercer as funções de órgão de Execução Fiscal.

33- Entende a ora Recorrente que tal falta de competência constitui fundamento de oposição subsumível à alínea i) do n.º 1 do artigo 204.º do actual CPPT.

34- Invoca, também, a Recorrente a prescrição do procedimento de contra-ordenação, nos termos do artigo 16.º-A da Lei 25/2006, de 30 de Junho, fundamento subsumível na alínea d) do artigo 204.º do CPPT.

35- A recorrente invoca a ilegalidade da liquidação das taxas cobradas, fundamento este previsto na alínea h) do n.º 1 do artigo 204.º do CPPT.

36- E por último a Recorrente defende a sua legitimidade, uma vez que não é aquela a devedora, pois não é responsável pelo pagamento da dívida, assegurando que quando o carro transpunha as portagens não era ela que conduzia a viatura, fundamento que está previsto na alínea b) do n.º 1 do artigo 204.º da CPPT.

37- O carácter taxativo do artigo 204.º, do Código de Procedimento e Processo Tributário, não pode implicar a rejeição liminar da oposição a esta execução fiscal, assim como também não pode implicar o impedimento de defesa do sujeito passivo/Oponente.

38- Os argumentos vertidos pelo Oponente têm força suficiente para, por si só, independentemente da inclusão em qualquer uma das alíneas do artigo 204.º, do Código de Procedimento e Processo Tributário, implicarem a procedência desta oposição.

39- O carácter taxativo dos fundamentos da oposição à execução fiscal não pode implicar uma restrição do acesso ao direito e aos Tribunais.

40- Se assim for, esta norma legal viola, de forma flagrante, o disposto no artigo 20.º, da Constituição da República Portuguesa.

41- Os direitos da Recorrente necessitam de tutela urgente, uma vez que, todos os seus bens, móveis, viatura e reembolso de IRS relativo ao ano de 2011, encontram-se penhorados à ordem deste processo de execução fiscal.

42- A Oponente é um sujeito passivo que, de boa fé, sempre cumpriu as suas obrigações tributárias.

43- A interpretação dada pela douta sentença ao artigo 204.º, do Código de Procedimento e Processo Tributário, transforma, aquela norma legal, num impedimento formal ao acesso ao direito por parte da Oponente.

44- Porque impede o acesso aos Tribunais para defesa dos direitos da Oponente, tendo a oposição por si apresentada sido rejeitada liminarmente, por falta de fundamento legal, o artigo 204.º, do Código de Procedimento e Processo Tributário, é inconstitucional.

45- Aquela norma legal viola o disposto nos artigos 13.º e 20.º da Constituição da República Portuguesa.

46- A aqui Recorrente não foi notificada para os efeitos previstos nos artigos 10.º e 12.º, n.º 2 do diploma legal a que se vem fazendo referência, o que expressamente se invoca.

47- Consequentemente, à Recorrente foi coarctado o direito de proceder voluntariamente ao pagamento da taxa de portagem e aos custos administrativos associados, ou no direito de proceder ao pagamento voluntário da coima, liquidada pelo mínimo reduzido em 50%, da taxa e portagem em dívida e dos custos administrativos associados.

48- Para além disso, e também por força da falta dessas notificações, foi a aqui Oponente impedida de apresentar defesa nos termos do artigo 13.º do já referido diploma legal, o que expressamente se invoca e argui.

49- Ora, a violação do direito de audição e defesa da arguida, consagrada no referido artigo 13.º, acarreta, no caso, a nulidade do procedimento e bem assim a violação de um direito consagrado na Constituição da República Portuguesa,

50- Pelo que se requer que seja reconhecida a nulidade do procedimento e da inconstitucionalidade material, decorrente da violação do direito de audição e de defesa da arguida.

Termos em que, dando provimento ao presente recurso e revogando a douta decisão em análise, farão V. Exas. Sábios Conselheiros, como habitualmente, JUSTIÇA» (Porque usamos o itálico nas transcrições, os excertos que estavam em itálico no original surgem aqui em tipo normal.).

1.6 Não foram apresentadas contra-alegações.

1.7 Recebidos os autos neste Supremo Tribunal Administrativo, o Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de que seja concedido provimento ao recurso, revogada a decisão recorrida e substituída por outra que admita a oposição à execução fiscal e determine a sua prossecução, com a notificação do INIR para contestar, com a seguinte fundamentação, aduzida após fazer o ponto da situação processual:

«(…) Para se decidir pela rejeição liminar da petição de oposição a Mma. juiz [do Tribunal] “a quo” considerou que os fundamentos invocados não eram subsumíveis a nenhuma das alíneas do n.º 1 do artigo 204.º do CPPT, mas antes constituíam fundamentos de recurso da decisão de aplicação da coima, e que não era possível a convolação do processo, uma vez que os tribunais administrativos e fiscais padeciam de incompetência absoluta, por falta de jurisdição para apreciação dos recursos de contra-ordenação cuja coima seja aplicada pelo INIr, a qual é atributo dos tribunais comuns.
Afigura-se-nos, contudo, que a decisão merece censura. Com efeito, pese embora a Recorrente na sua petição de oposição se insurja no essencial contra a legalidade da decisão que lhe aplicou a coima e que deu origem à quantia exequenda, certo é que a mesma se insurge igualmente contra o facto de nunca ter recebido qualquer notificação no referido processo e designadamente que tenha sido notificada para efectuar o pagamento da coima, nos termos do artigo 12.º da Lei n.º 25/2006, de 30 de Junho.
Ora, tal fundamento é subsumível no fundamento previsto nas alíneas e) ou i) do n.º 1 do artigo 204.º do CPPT, uma vez que a falta de notificação da liquidação da quantia exequenda conduz à inexigibilidade da dívida. É certo que tal inexigibilidade da dívida não foi expressamente mencionada pela Recorrente, que relevou a falta de notificação como violação do direito de defesa, mas tal facto não inibe o tribunal de enquadrar tal facto no fundamento de inexigibilidade da dívida. De resto, se a Recorrente nunca chegou a ser regularmente notificada em sede de processo de contra-ordenação, designadamente da decisão de aplicação da coima, esta decisão não pode ter-se tornado definitiva e caso decidido, não podendo, assim, constituir título executivo. Conforme resulta da alínea b) do art. 162 do CPPT, “só podem servir de base à execução fiscal... certidão de decisão exequível proferida em processo de aplicação das coimas”. Ora não sendo definitiva a decisão proferida no processo de contra-ordenação, a mesma não constitui título executivo e nessa medida a dívida não é exigível.
Em face do exposto, afigura-se-nos que os factos invocados pela Recorrente na sua petição, embora aparentemente direccionados para a questão da validade da decisão de aplicação da coima, por falta de responsabilidade da Recorrente na prática da contra-ordenação que lhe está subjacente, também comportam o seu enquadramento na inexigibilidade da dívida por falta de notificação da decisão de aplicação de coima, o qual é subsumível na alínea i) do n.º 1 do artigo 204.º do CPPT».

1.8 Colheram-se os vistos dos Juízes Conselheiros adjuntos.

1.9 A questão que cumpre apreciar e decidir é a de saber se o Tribunal Tributário de Lisboa decidiu correctamente ao rejeitar in limine a petição inicial de oposição à execução fiscal por erro na forma do processo insusceptível de sanação mediante convolação para o meio processual próprio. Como procuraremos demonstrar, cumpre também indagar se, tal como considerou a Juíza daquele Tribunal, a Oponente não alegou fundamento subsumível a alguma das alíneas do n.º 1 do art. 204.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT).


* * *

2. FUNDAMENTOS
2.1 DE FACTO

2.1.1 A decisão recorrida não fixou factualidade alguma, o que bem se compreende porque se trata de uma rejeição liminar, ou seja, uma decisão que não entrou no mérito da causa, motivo por que também não entrou na apreciação e discussão da matéria de facto, designadamente com a produção de prova sobre os fundamentos que poderiam relevar para a decisão de fundo.

2.1.2 Com interesse para a decisão a proferir, cumpre ter presente o seguinte circunstancialismo processual:

a) O “Instituto de Infra-Estruturas Rodoviárias - IP” (INIR) instaurou contra A……… diversas execuções fiscais, que prosseguem apensadas sob o n.º 036120101104044, para cobrança de dívida proveniente de taxas de portagem, coimas e custos, no total de € 8.167,36;

b) A Executada foi citada para os termos da execução fiscal e deduziu oposição à execução fiscal junto do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga;

c) O Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga declarou-se incompetente em razão do território e ordenou a remessa do processo ao Tribunal Tributário de Lisboa, que considerou ser o competente para conhecer da oposição à execução fiscal;

d) Recebidos os autos no Tribunal Tributário de Lisboa, a Juíza deste Tribunal rejeitou liminarmente a petição inicial.

2.2 DE FACTO E DE DIREITO

2.2.1 A QUESTÃO A APRECIAR E DECIDIR – A REJEIÇÃO LIMINAR DA PETIÇÃO INICIAL

Como resulta do que ficou já dito, a Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Lisboa rejeitou liminarmente a petição inicial por entender que:

a) os fundamentos aí invocados – que elencou como «[a] legalidade do procedimento contra-ordenacional, o conhecimento da prescrição do procedimento contra-ordenacional, a legalidade da liquidação das taxas de portagem, a discussão da decisão da fixação da coima, da sua desproporcionalidade, o apuramento de quem era o condutor do veículo que passou portagens sem as pagar» – não constituem fundamento de oposição à execução fiscal, que estão previstos no art. 204.º do CPPT, mas de recurso de contra-ordenação;

b) ao apresentar oposição à execução fiscal em vez de recurso de contra-ordenação «está-se perante erro na forma do processo», sendo inviável a convolação para o meio processual próprio porque «os tribunais administrativos e fiscais padecem de incompetência absoluta, por falta de jurisdição, para apreciação de recursos de contra-ordenação, cuja coima seja aplicada pelo INIR», cabendo essa competência aos tribunais comuns, atento o disposto nos arts. 55.º, n.º 3 e 61.º, n.º 1, do Regime Geral das Contra-Ordenações (RGCO), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de Outubro.

A Oponente discorda desse entendimento e, por isso, recorre do despacho de rejeição liminar para este Supremo Tribunal Administrativo. Em síntese, considera que, porque não foi notificada nos termos do disposto nos arts. 10.º e 12.º, n.º 2, da Lei n.º 25/2006 e apenas com a citação no processo executivo tomou conhecimento daquelas dívidas, tem a possibilidade de invocar toda a defesa em sede de oposição à execução fiscal, sendo aliás que a competência para conhecer do “litígio dos autos” é do tribunal tributário de 1.ª instância da área da sede do órgão da execução fiscal (cfr. conclusões 20 a 29) e que, ademais, invocou diversos fundamentos admissíveis de oposição à execução fiscal e previstos no n.º 1 do art. 204.º, n.º 1, do CPPT, a saber: (i) a incompetência do Serviço de Finanças de Braga 1 para exercer as funções de órgão da execução fiscal, que é subsumível à alínea i) daquele preceito legal (cfr. conclusões 32 e 33), (ii) a prescrição do procedimento contra-ordenacional, subsumível à alínea d) do mesmo preceito (cfr. conclusão 34), (iii) a ilegalidade da liquidação das taxas de portagem, que integra a previsão da alínea h), sempre do mesmo art. 204.º, n.º 1 (cfr. conclusão 35), do CPPT e (iv) a ilegitimidade decorrente de não ser ela a condutora do veículo quando ele transpôs as portagens, o que integra a previsão da alínea b), ainda do mesmo artigo (cfr. conclusão 36). Mais considera que, independentemente da inclusão dos fundamentos invocados em qualquer das alíneas do n.º 1 do art. 204.º do CPPT, os mesmos «têm força suficiente para, por si só, […] implicarem a procedência desta oposição», sob pena de se haver de concluir pela inconstitucionalidade daquela norma por violação do acesso ao direito (cfr. conclusões 37 a 45), tanto mais que a Oponente, porque não foi notificada nos termos dos arts. 10.º e 12.º, n.º 2, da Lei n.º 25/2006, se viu impedida, quer de proceder ao pagamento voluntário das taxas de portagem e respectivos custos administrativos, quer de proceder a esse pagamento e ao das coimas, liquidadas pelo mínimo, violação que também contraria o direito constitucional previsto no art. 20.º da Constituição da República Portuguesa (cfr. conclusões 46 a 50).
Assim, cumpre-nos agora, em sede de recurso, verificar se a Juíza do Tribunal Tributário de Lisboa decidiu correctamente ao rejeitar in limine a petição inicial de oposição à execução fiscal por erro na forma do processo insusceptível de sanação mediante convolação para o meio processual próprio e se, tal como considerou a Juíza daquele Tribunal, a Oponente não alegou fundamento subsumível a alguma das alíneas do n.º 1 do art. 204.º do CPPT, questão esta que, como procuraremos demonstrar nada tem a ver com a nulidade por erro na forma do processo.

2.2.2 DO INDEFERIMENTO LIMINAR

Como é sabido o indeferimento liminar só terá lugar quando for de todo impossível o aproveitamento da petição inicial, uma vez que o princípio da pronúncia sobre o mérito se sobrepõe a questões formais que não interfiram e ponham em causa o mesmo. Assim, o despacho de indeferimento liminar só admissível quando a improcedência da pretensão do autor for tão evidente e, razoavelmente, indiscutível, que torne dispensável assegurar o contraditório (Princípio do contraditório, hoje entendido, não na sua dimensão negativa, de direito de defesa, oposição ou resistência à actuação alheia, mas na sua dimensão positiva, de direito de influir activamente, no desenvolvimento e no êxito do processo, é um dos mais elementares princípios que enformam todo o direito adjectivo e também o processo tributário. Para maior desenvolvimento quanto ao princípio do contraditório, designadamente com aprofundados considerandos de natureza doutrinal e citação de jurisprudência, vide o seguinte acórdão desta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
– de 3 de Março de 2010, proferido no processo n.º 63/10, publicado no Apêndice ao Diário da República de 24 de Março de 2011 (http://www.dre.pt/pdfgratisac/2010/32210.pdf), págs. 445 a 451, também disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/1f4bfa574b6a7515802576e10040e44b?OpenDocument.) (cfr. art. 3.º, n.º 3, do CPC) e inútil qualquer instrução e discussão posterior, isto é, «quando o seguimento do processo não tenha razão alguma de ser, seja desperdício manifesto de actividade judicial» (Cfr. ALBERTO DOS REIS, Código de Processo Civil anotado, Coimbra Editora, 3.ª edição – reimpressão, vol. II, pág. 373.).
Daí que a jurisprudência tenha vindo a afirmar que o despacho de indeferimento liminar, dada a sua natureza “radical”, na medida em que coarcta à partida toda e qualquer expectativa de o autor ver a sua pretensão apreciada e julgada, encontrando a sua justificação em motivos de economia processual, deve ser cautelosamente decretado (Neste sentido, entre muitos outros, os seguintes acórdãos desta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
– de 4 de Março de 2009, proferido no processo n.º 786/07, publicado no Apêndice ao Diário da República de 30 de Abril de 2009 (http://www.dre.pt/pdfgratisac/2009/32210.pdf), págs. 344 a 348, também disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/dc17d39856877bcd80257576004b9488?OpenDocument;
– de 24 de Fevereiro de 2011, proferido no processo n.º 765/10, publicado no Apêndice ao Diário da República de 11 de Agosto de 2011 (http://www.dre.pt/pdfgratisac/2011/32210.pdf), págs. 278 a 280, também disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/d034d9b7a45de4a780257847005945e7?OpenDocument;
– de 16 de Maio de 2012, proferido no processo n.º 212/12, publicado no Apêndice ao Diário da República de 8 de Outubro de 2013 (http://dre.pt/pdfgratisac/2012/32220.pdf), págs. 1385 a 1394, também disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/9c9052a8ef3af76980257a0600525f28?OpenDocument.).
Será que no caso sub judice estão verificados os requisitos para a rejeição liminar da petição inicial?
É o que veremos adiante, tendo em conta que, apesar de a Juíza do Tribunal Tributário de Lisboa ter reconduzido o erro na forma do processo à falta de alegação de fundamento válido de oposição à execução fiscal, a análise a efectuar deverá considerar essa fundamentação sob a dupla vertente que nela está ínsita.

2.2.3 DO ERRO NA FORMA DO PROCESSO

Como temos vindo a dizer inúmeras vezes, é pelo pedido que se afere a adequação do meio processual utilizado ao fim por ele visado: se o pedido formulado pelo autor não se ajusta à finalidade abstractamente figurada pela lei para essa forma processual ocorre o erro na forma do processo (Se o pedido formulado pelo autor não se ajusta à finalidade abstractamente figurada pela lei para essa forma processual ocorre o erro na forma do processo (cf. ALBERTO DOS REIS, Código de Processo Civil Anotado, volume II, Coimbra Editora, 3.ª edição – reimpressão, págs. 288/289. No mesmo sentido, RODRIGUES BASTOS, Notas ao Código de Processo Civil, volume I, 3.ª edição, 1999, pág. 262, e ANTUNES VARELA, Revista de Legislação e Jurisprudência, ano 100.º, pág. 378).).
No caso, a Executada lançou mão da oposição à execução fiscal e formulou pedido de extinção da execução. Assim, a nosso ver, não subsiste dúvida alguma de que o meio processual escolhido é o adequado para esse pedido, sendo mesmo o pedido típico da oposição à execução fiscal (A oposição, em regra, visa a extinção, total ou parcial, da execução fiscal. Pode também ter por objecto a suspensão da execução: é o caso em que a exigibilidade da dívida seja determinada por motivo meramente temporário, como, v.g., concessão de uma moratória (como as que têm vindo a suceder nos diplomas que prevêem regimes especiais de regularização de dívidas), existência de processo de falência ou de insolvência ou recuperação de empresas, ter sido decidida, por via administrativa, a suspensão da eficácia do acto de liquidação ou a própria suspensão da execução. Neste sentido, JORGE LOPES DE SOUSA, Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado,Áreas Editora, 6.ª edição, volume III, anotação 39 ao art. 204.º, pág. 502, de onde extraímos os exemplos referidos.).
A Juíza do Tribunal Tributário de Lisboa considerou verificado o erro na forma do processo mas, salvo o devido respeito, para aferir a verificação dessa nulidade usou, não o critério da adequação ao pedido formulado, mas, ao invés, atentou nas causas de pedir invocadas, que considerou não integrarem fundamento admissível de oposição à execução fiscal.
É certo que, como temos vindo a dizer noutras ocasiões, a jurisprudência, designadamente a deste Supremo Tribunal, tem vindo a adoptar uma posição de grande flexibilidade na interpretação do pedido quando, em face das concretas causas de pedir invocadas, se possa intuir – ainda que com recurso à figura do pedido implícito – qual a verdadeira pretensão de tutela jurídica. Mas isso não autoriza que, no método para aferir da verificação do erro na forma do processo, se substitua o pedido, enquanto elemento determinante para apurar a propriedade processual, pela causa de pedir.
Para saber se ocorre ou não erro na forma do processo é preciso atentar no pedido que foi formulado, na concreta pretensão de tutela jurisdicional que o contribuinte visa obter; já saber se as causas de pedir aduzidas podem ou não suportar esse pedido é matéria que se situa no âmbito da procedência. Por isso, com o fundamento de que as causas de pedir invocadas não são adequadas ao pedido formulado poderá decidir-se no sentido da improcedência da acção (eventualmente, até do indeferimento liminar da petição inicial), mas não no sentido da verificação do erro na forma do processo. Parafraseando o acórdão desta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo de 28 de Março de 2012, proferido no processo com o n.º 1145/11 (Publicado no Apêndice ao Diário da República de 18 de Abril de 2013 (http://dre.pt/pdfgratisac/2012/32210.pdf), págs. 402 a 409, também disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/4ee18297540be732802579df0033cd10?OpenDocument.), a circunstância de as causas de pedir gizadas não constituírem, porventura, fundamentos válidos de oposição à execução fiscal, não constitui motivo para dar por verificada uma nulidade processual por erro na forma de processo, mas, ao invés, motivo para a improcedência do pedido com base nessa causa de pedir.
Ou seja, manifestamente, o indeferimento liminar não pode encontrar justificação no erro na forma do processo, que não se verifica.
Nessa parte, o recurso deverá ser provido.

2.2.4 DA MANIFESTA IMPROCEDÊNCIA DA OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO FISCAL POR FALTA DE INVOCAÇÃO DE FUNDAMENTO VÁLIDO

Questão diversa é a de saber se os fundamentos invocados na petição inicial são admissíveis como fundamentos de oposição à execução fiscal ou se, pelo contrário, não foi alegado algum dos fundamento admitidos no n.º 1 do art. 204.º do CPPT, o que configura motivo de rejeição liminar da petição inicial, nos termos do disposto no art. 209.º, n.º 1, alínea b), do CPPT.
Desde logo, note-se que não podemos acompanhar a Recorrente na alegação de que, porque não foi oportunamente notificada nos termos dos arts. 10.º e 12.º, n.º 2, da Lei n.º 15/2006, devem agora admitir-se em sede de oposição, sem restrição alguma, todos os fundamentos de defesa, designadamente os que respeitam à liquidação das taxas de portagem e à legalidade da decisão administrativa de aplicação da coima.
Na verdade, é inequívoca a natureza taxativa dos fundamentos da oposição à execução fiscal, sem prejuízo do carácter aberto da previsão da alínea i) do n.º 1 do art. 204.º do CPPT, sendo que essa «taxatividade dos fundamentos de oposição não implica uma restrição aos direitos fundamentais de acesso aos tribunais, à tutela judicial efectiva e ao recurso contencioso, uma vez que a impugnação de actos lesivos é permitida sempre que a lei não assegurar um meio de os impugnar contenciosamente, como expressamente se refere na alínea h) do n.º 1» (Cfr. JORGE LOPES DE SOUSA, ob. cit., III volume, anotação 2 ao art. 204.º, págs. 441/442. ).
Assim, afigura-se-nos manifesto que a Oponente não poderá discutir nesta sede nem a legalidade da liquidação da taxa (designadamente, nas suas vertentes da legitimidade passiva) nem a legalidade da decisão administrativa de aplicação das coimas. Poderia fazê-lo, isso sim, na sede própria, sendo que os respectivos prazos não se abririam sem que fosse notificada das respectivas decisões. Mas, essa eventual falta de notificação não lhe abre a possibilidade de impugná-las em sede de oposição à execução fiscal, possibilidade prevista na alínea h) do n.º 1 do art. 204.º do CPPT apenas relativamente às situações em que, porque as dívidas exequendas não resultam de acto administrativo ou tributário, a lei não assegura meio judicial de impugnação ou recurso contra o acto de liquidação e já às situações em que a lei o assegure, mas o sujeito passivo não tenha podido utilizá-lo por falta de notificação (Cfr. JORGE LOPES DE SOUSA, ob. cit., III volume, anotação 37 a) e b) ao art. 204.º, págs. 495/496.).
Por isso, também não releva aqui a alegação da Recorrente no que respeita à competência para apreciar da legalidade da decisão de aplicação da coima, se aos tribunais comuns se aos tribunais tributários.
A referida falta de notificação poderá relevar, isso sim, como fundamento da inexigibilidade da dívida exequenda, como veremos adiante.
Por outro lado, também não serve como fundamento de oposição à execução fiscal a alegada falta de responsabilidade da Oponente pelas dívidas exequendas por não ser ela o condutor do veículo que deu origem às taxas e coimas.
«Esta invocada ilegitimidade (da pessoa citada, por não ter sido, durante o período a que respeita a dívida exequenda, a possuidora do bem que a originou) constituindo embora fundamento de oposição à execução fiscal, nos termos da al. b) do nº 1 do art. 204º do CPPT, só pode verificar-se em relação aos tributos incidentes sobre o uso ou fruição dos bens.
O que não acontece com as coimas ora em execução.
Por um lado, as taxas de portagem não são originadas pela propriedade ou pela posse do veículo (em termos de ser essa posse que faz determinar o sujeito passivo daquela relação jurídica tributária, não obstante este, porventura, já não ser o proprietário ou o possuidor do veículo). A obrigação tributária nasce por via da utilização da via rodoviária (e não pela posse daquele veículo em especial). Por outro lado, a dívida exequenda reporta-se, não apenas às ditas taxas, mas, também às próprias coimas em que a oponente veio a ser condenada nos respectivos processos de contra-ordenação.
Ora, […] a exigibilidade destas quantias, rectius, os fundamentos da condenação no processo de contra-ordenação fiscal, só poderiam ser discutidos no âmbito do respectivo processo de contra-ordenação, podendo a recorrente interpor recurso judicial da decisão de aplicação de coima (arts. 80.º do RGIT e 59.º do RGCO), e nunca em sede de oposição à execução fiscal (cfr., entre outros, os acs. desta Secção do Supremo Tribunal Administrativo, de 1/10/2008, rec. n.º 408/08 e de 25/11/2009, rec. n.º 0812/09)»(Cfr. acórdão da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo de 18 de Junho de 2013, proferido no processo n.º 1276/12, publicado no Apêndice ao Diário da República de 15 de Abril de 2014 (http://dre.pt/pdfgratisac/2013/32220.pdf), págs. 2759 a 2764, também disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/04942147b4a5202980257baa004daea4?OpenDocument.).
Em suma, a invocada ilegitimidade da Oponente também não é subsumível ao fundamento de oposição constante da alínea b) do n.º 1 do art. 204.º do CPPT.
Mas, a nosso ver, existem outros fundamentos alegados relativamente aos quais se não pode afirmar que não constituam, em abstracto, fundamento de oposição à execução fiscal.
Referimo-nos, desde logo, às invocadas faltas de notificação, quer para identificação do condutor, quer para pagamento voluntário das coimas.
Ora, como bem salientou o Procurador-Geral adjunto neste Supremo Tribunal Administrativo, tal fundamento é subsumível à alínea i) do n.º 1 do art. 204.º do CPPT, uma vez que a falta de notificação da liquidação da dívida exequenda determina a inexigibilidade desta e se «[é] certo que tal inexigibilidade da dívida não foi expressamente mencionada pela Recorrente, que relevou a falta de notificação como violação do direito de defesa, […] tal facto não inibe o tribunal de enquadrar tal facto no fundamento de inexigibilidade da dívida» (No sentido de que não releva a qualificação jurídica dos factos efectuada pelo oponente, atenta a regra do art. 5.º, n.º 3, do Código de Processo Civil, vide JORGE LOPES DE SOUSA, ob. cit., III volume, anotação 10 ao art. 209.º, pág. 559.).
Citando o parecer do Ministério Público, «os factos invocados pela Recorrente na sua petição, embora aparentemente direccionados para a questão da validade da decisão de aplicação da coima, por falta de responsabilidade da Recorrente na prática da contra-ordenação que lhe está subjacente, também comportam o seu enquadramento na inexigibilidade da dívida por falta de notificação da decisão de aplicação de coima, o qual é subsumível na alínea i) do n.º 1 do artigo 204.º do CPPT».
Referindo-se a este fundamento de oposição à execução fiscal, ensina JORGE LOPES DE SOUSA, «trata-se de uma disposição com carácter residual em que serão enquadráveis todas as situações não abrangidas pelas outras alíneas do mesmo número, em que existir um facto extintivo ou modificativo da dívida exequenda ou que afecta a sua exigibilidade» ( Ob. cit., volume III, nota 38 a) ao art. 204.º, pág. 498.).
Por outro lado, a Oponente também invocou a incompetência do Serviço de Finanças de Braga para instaurar a execução fiscal, sendo que o despacho recorrido não se pronunciou.
Tudo isto desaconselha a decisão de rejeição liminar ao abrigo do disposto na alínea b) do n.º 1 do art. 209.º do CPPT, que, de acordo com o que deixámos referido em 2.2.2, está reservada para as situações em que seja manifesto que a prossecução da acção constitui um desperdício de meios.
Assim, concedendo provimento ao recurso, revogaremos a decisão de rejeição liminar e ordenaremos que os autos regressem ao Tribunal Tributário de Lisboa para aí prosseguirem, se a tal nada mais obstar.

2.2.5 CONCLUSÕES

Preparando a decisão, formulamos as seguintes conclusões:
I - O erro na forma do processo afere-se pelo ajustamento do meio processual ao pedido que se pretende fazer valer, pelo que, se o pedido formulado em juízo pelo executado é de que seja extinta a execução fiscal, é adequado o meio processual de oposição à execução fiscal.
II - Questão diferente é a de saber se na petição inicial foram alegados fundamentos válidos de oposição, questão que se situa no âmbito da viabilidade do pedido e já não da propriedade do meio processual, sendo que ser for manifesto que não foi alegada fundamento algum dos admitidos no n.º 1 do art. 204.º do CPPT, verifica-se motivo para a rejeição liminar da petição inicial nos termos da alínea b) do n.º 1 do art. 209.º do CPPT.
III - A falta de notificação da liquidação das taxas de portagem, bem como a falta de notificação da decisão administrativa de aplicação da coima, porque determinam a inexigibilidade das dívidas que tenham origem nesses actos, integram, em abstracto, o fundamento de oposição à execução fiscal previsto na alínea i) do art. 204.º, n.º 1, do CPPT.
IV - A rejeição liminar da petição inicial com fundamento na alínea b) do n.º 1 do art. 204.º do CPPT só deve ocorrer em situações em que seja manifesta, evidente, a inexistência de fundamento admissível de oposição.

* * *

3. DECISÃO

Face ao exposto, os juízes desta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo acordam, em conferência, em conceder provimento ao recurso, revogar a decisão recorrida e ordenar que os autos regressem à 1.ª instância, para aí prosseguirem, se a tal nada mais obstar.


Sem custas.
Lisboa, 18 de Junho de 2014. - Francisco Rothes (relator) - Aragão Seia - Casimiro Gonçalves.