Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo | |
Processo: | 01251/06.0BEBRG |
Data do Acordão: | 10/28/2020 |
Tribunal: | 2 SECÇÃO |
Relator: | FRANCISCO ROTHES |
Descritores: | ANULAÇÃO PARCIAL ACTO DIVISÍVEL JUROS COMPENSATÓRIOS |
Sumário: | I - O acto tributário, enquanto acto divisível, tanto por natureza como por definição legal, é susceptível de anulação parcial. II - O critério para determinar se o acto deve ser total ou parcialmente anulado passa por aferir se a ilegalidade afecta o acto tributário no seu todo, caso em que o acto deve ser integralmente anulado, ou apenas em parte, caso em que se justifica a anulação parcial. III - Se a liquidação de juros compensatórios apenas enferma de falta de fundamentação relativamente aos últimos três meses a que se refere, só nessa parte deve ser anulada, pois a conformação do acto após essa anulação resulta de uma mera operação aritmética, não demandando a prática de novo acto tributário. |
Nº Convencional: | JSTA000P26592 |
Nº do Documento: | SA22020102801251/06 |
Data de Entrada: | 06/30/2020 |
Recorrente: | AT- AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA |
Recorrido 1: | A......................., LDA |
Votação: | UNANIMIDADE |
Aditamento: | |
Texto Integral: | Recurso jurisdicional da sentença proferida no processo de impugnação judicial com o n.º 1251/06.0BEBRG Recorrente: Autoridade Tributária e Aduaneira Recorrida: A…………………………, Lda.” 1. RELATÓRIO 1.1 O Representante da Fazenda Pública junto do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga recorreu para o Tribunal Central Administrativo Norte da sentença por que aquele Tribunal, julgando procedente a impugnação judicial deduzida pela sociedade acima identificada, anulou, por falta de fundamentação, a liquidação de juros compensatórios relativa à não retenção na fonte de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS) dos anos de 2001 e 2002. 1.2 O recurso foi admitido, para subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo e a Recorrente apresentou as alegações de recurso, com conclusões do seguinte teor: «1. O fundamento do art. 35.º/9 da LGT que motiva e justifica a decisão de julgar procedente (na totalidade) a impugnação não é extensível às liquidações de juros compensatórios impugnadas na parte em que as mesmas respeitam aquele normativo. 2. Essas liquidações, face às notas demonstrativas respectivas, mostram-se, em conformidade com as exigências do n.º 9 do art. 35.º da LGT. 3. Essas liquidações apenas enfermam de erro / ilegalidade na medida em que o total a pagar não resulta demonstrado nos termos do art. 35.º, n.º 9 da LGT, sendo anulável o excesso não explicado. 4. Assim sendo, terá o M.mº Juiz [do Tribunal] a quo cometido erro de julgamento e aplicado inadequadamente o n.º 9 do art. 35.º da LGT. Termos em que, concedido provimento ao recurso, deve a douta sentença recorrida ser revogada e a impugnação julgada parcialmente procedente». 1.3 Não foram apresentadas contra-alegações. 1.4 O Tribunal Central Administrativo Norte declarou-se incompetente em razão da hierarquia para conhecer do presente recurso e declarou que a competência para o efeito é do Supremo Tribunal Administrativo. 1.5 Recebidos os autos neste Supremo Tribunal Administrativo, foi dada vista ao Ministério Público e a Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer no sentido de que seja negado provimento ao recurso, remetendo para anterior parecer proferido nos autos pelo Representante do Ministério Público junto do Tribunal Central Administrativo Norte, com a seguinte fundamentação: «[…] Em causa estão as liquidações de juros compensatórios relativos à falta de retenção de IRS dos anos de 2001 e 2002. 1.6 Cumpre apreciar e decidir. * * * 2. FUNDAMENTAÇÃO 2.1 DE FACTO A sentença recorrida deu como provados os seguintes factos: «1- A impugnante foi objecto de uma acção de fiscalização, levada a cabo pela Administração Tributária, através da Inspecção Tributária de Viana do Castelo, iniciada a 19 de Julho de 2005 e concluída a 2 de Novembro do mesmo ano. 2- Em Dezembro de 2005 foi a impugnante notificada do relatório da Inspecção Tributária, a coberto do ofício n.º 17243, de 2 de Dezembro de 2005. 3- Porque tal relatório não vinha acompanhado dos documentos nele mencionados e que serviram de base às correcções efectuadas pela Inspecção Tributária, foram os mesmos solicitados por certidão, requerida em 3 de Janeiro de 2006, isto é, dentro do prazo de 30 dias previsto no n.º 1 artigo 37.º do CPPT. 4- Em 24 do mesmo mês de Janeiro a Administração Tributária notificou a impugnante da sua intenção de indeferir aquele pedido. 5- Em 7 de Fevereiro de 2006, a impugnante manifestou a sua discordância com os fundamentos invocados pela Administração Tributária para justificar o projectado indeferimento. 6- Aceitando os argumentos da impugnante, a Administração Tributária acabou por fornecer-lhe fotocópias dos pretendidos documentos, que recebeu via CTT em 26 de Junho de 2006. 7- As liquidações em causa nos autos apenas explicam o cálculo relativamente a 8 meses (Fevereiro a Setembro). 8- A Administração Tributária fez constar das notas de liquidação a seguinte “NOTA: Para consultar, na totalidade, as demonstrações da liquidação deverá dirigir-se a um Serviço de Finanças”. 9- Os valores parciais constantes das questionadas liquidações, as respectivas somas não coincidem com o valor total constante das mesmas, isto é, a liquidação respeitante ao ano de 2001 tem o valor de 1.658,79 €, mas a soma das parcelas é igual a 1.281,75 € enquanto a liquidação respeitante ao ano de 2002 tem o valor de 1.651,44 €, mas a soma das parcelas é igual a 1.240,49 €». * 2.2 DE FACTO E DE DIREITO 2.2.1 A QUESTÃO A APRECIAR E DECIDIR 2.2.1.1 Na sequência de uma acção de inspecção, a AT liquidou adicionalmente IRS que considerou não ter sido retido na fonte e respectivos juros compensatórios, sendo estes que estão em causa no recurso. 2.2.1.2 A sentença julgou procedente a impugnação judicial com base na invocada falta da fundamentação e anulou as liquidações impugnadas. 2.2.1.3 Inconformada com a sentença, a Fazenda Pública dela recorreu para este Supremo Tribunal. 2.2.1.4 Assim, a questão a apreciar e decidir é a de saber se a sentença recorrida padece de erro de julgamento na medida em que anulou as liquidações impugnadas na totalidade, o que passa por saber i) se esses actos apenas em parte estão viciados por falta de fundamentação e, na afirmativa, ii) se são divisíveis. 2.2.2 DA FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO E DA DIVISIBILIDADE DOS ACTOS 2.2.2.1 Como ficou dito, impõe-se sindicar a sentença relativamente ao vício de falta de fundamentação das liquidações de juros compensatórios, que a Recorrente apenas aceita ter-se verificado relativamente aos juros relativos aos meses de Outubro, Novembro e Dezembro de 2001 e 2002 (parte em que a sentença transitou em julgado), mas já não relativamente aos demais meses desses anos. 2.2.2.2 Será que a falta de fundamentação da liquidação dos juros compensatórios no período em causa determina a anulação total da liquidação ou, como sustenta a Recorrente, o Tribunal se deve ficar pela anulação do acto na parte inquinada pelo vício? 2.2.3 CONCLUSÕES Preparando a decisão, formulamos as seguintes conclusões: * * * 3. DECISÃO Em face do exposto, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo acordam, em conferência, conceder provimento ao recurso, revogar a sentença na parte recorrida e ordenar que os autos regressem ao Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, a fim de aí prosseguir a impugnação judicial, relativamente à parte em que os actos impugnados não foram anulados, com o conhecimento dos demais vícios que a Impugnante lhes assacou na petição inicial e cujo conhecimento foi considerado prejudicado na sentença recorrida. Custas pela Recorrida, que ficou vencida no recurso e que não paga taxa de justiça neste Supremo Tribunal porque não contra-alegou o recurso [cfr. art. 527.º do Código de Processo Civil, aplicável ex vi da alínea e), do art. 2.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário]. * Lisboa, 28 de Outubro de 2020. – Francisco António Pedrosa de Areal Rothes (relator) – Joaquim Manuel Charneca Condesso – Paulo José Rodrigues Antunes. |