Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01574/03
Data do Acordão:12/02/2003
Tribunal:2 SUBSECÇÃO DO CA
Relator:ANTÓNIO MADUREIRA
Descritores:DIREITOS DE AUTOR.
PROJECTO DE ARQUITECTURA.
LUCRO CESSANTE.
DANO MORAL.
DANO NÃO PATRIMONIAL.
Sumário: I - É ilícita a modificação de um projecto de arquitectura de uma obra, sem consentimento do autor do projecto original, determinando o dever de indemnizar esse autor a execução dessa obra de acordo com o projecto modificado sem o seu consentimento (artigos 2.º, 9.º, 11.º, 15.º, n.º 2, 25.º e 60.º, n.º 2 do Código do Direito de Autor e Direitos Conexos -CDADC-, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 63/85, de 14 de Março, com as alterações introduzidas pela Lei n.º 45/85, de 17 de Setembro e pela Lei n.º 114/91, de 3 de Setembro).
II - Essa execução indevida não implica o dever de indemnizar por dano invocado a título de lucros cessantes, atribuído ao não recebimento dos honorários que seriam pagos pela elaboração dessa modificação, pois que o dono da obra não estava obrigado a adjudicar essa modificação ao Autor do projecto original, podendo até abrir um novo concurso para a elaboração de um novo projecto, pelo que, não tendo esse autor um direito subjectivo à adjudicação da elaboração das modificações, inexiste nexo de causalidade entre o alegado acto ilícito e o não recebimento dos honorários por um trabalho que não chegou a realizar, sendo certo que lhe foi pago o trabalho efectivamente executado.
III - Tendo-se, contudo, provado que, a reconhecer-se que a obra executada se tratava de uma ampliação do projecto de arquitectura dos autores, levaria a que os autores beneficiassem na sua vida profissional do respeito e publicitação do seu trabalho inerente a tal obra, com reconhecimento nos seus currículos, haveria lugar a indemnização por danos morais, danos esses que são os danos indemnizáveis consagrados no n.º 2 do referido artigo 60.º do CADC.
Nº Convencional:JSTA00060073
Nº do Documento:SA12003120201574
Data de Entrada:10/03/2003
Recorrente:ESTADO - A... E OUTRO
Recorrido 1:ESTADO - A...
Recorrido 2:OUTRO
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL.
Objecto:SENT TAC LISBOA DE 2002/11/11.
Decisão:NEGA PROVIMENTO.
Área Temática 1:DIR ADM CONT - RESPONSABILIDADE EXTRA.
Área Temática 2:DIR CIV - DIR OBG.
DIR PROC CIV.
DIR AUTOR.
Legislação Nacional:CPC96 ART273 N2 ART308 N1 ART655 ART669 N2 B ART690-A ART712 N1 A.
DL 48051 DE 1967/11/21.
CPA85 NA REDACÇÃO DA L 114/91 DE 1991/09/03 ART2 ART9 ART11 ART15 N2 ART25 ART56 ART60 N2.
CCIV66 ART494 ART496 N1 ART563.
Referência a Doutrina:LUIS FRANCISCO REBELO CÓDIGO DOS DIREITOS DE AUTOR E DOS DIREITOS CONEXOS ANOTADO PAG111.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam, em conferência, na 2.ª Subsecção da Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo:
1. RELATÓRIO
A... e ..., com os devidos sinais nos autos, propuseram, no Tribunal Administrativo de Círculo (TAC) de Lisboa, uma acção contra o Estado Português, para efectivação da sua responsabilidade civil extracontratual por actos ilícitos de gestão pública.
Por sentença de 11/11/2 002, foi a acção julgada parcialmente procedente, tendo o Estado sido condenado a pagar aos Autores, a título de danos não patrimoniais, a quantia de 39 903,83 euros, e sido absolvido quanto ao pedido relativo a danos patrimoniais.
Com ela se não conformando, interpuseram recurso para este STA os Autores e o Réu.
Nas suas alegações de recurso, os Autores formularam as seguintes conclusões:
1.ª) - Os AA entendem que deve o R. ser condenado a pagar, a título de danos patrimoniais, o montante correspondente aos lucros cessantes que aqueles tiveram e ficaram provados no ponto XLV, pág. 7, do douto acórdão, que ascendem a 17 797 992$00 - 88 776 euros.
Ao tal não atribuir, o douto acórdão fez incorrecta aplicação do disposto no artigo 483.º, n.º 1 do CC.
2.ª) - A título de danos não patrimoniais, deve o R. ser condenado a pagar ao AA a quantia de 25 000 000$00, correspondente aos prejuízos por estes sofridos, calculados na base da equidade.
3.ª) - A fixação do quantum indemnizatório é questão de direito.
Ao se quantificar em 8 000 000$00 os danos não patrimoniais, aplicaram-se de forma deficiente os critérios dos artigos 496.º, n.ºs 1 e 3 e 494.º do CC.
Nas suas contra- alegações, o Réu Estado formulou as seguintes conclusões:
1.ª) - Mantém-se o entendimento constante das alegações de recurso jurisdicional apresentadas pelo Réu Estado português, onde se defendeu que o projecto da arquitectura elaborado pela SGMJ, na sequência da alteração do programa, constitui um projecto novo. Pelo que, não existindo qualquer conduta ilícita por parte do Estado ou dos seus agentes, inexiste a obrigação de indemnizar.
Caso assim não seja entendido,
2.ª) - O projecto elaborado pelos AA. foi pago; estes não realizaram qualquer outro projecto para o Estado; o Estado não estava vinculado a construir o projecto elaborado pelos AA.; nem a adjudicar-lhes qualquer outro projecto novo ou de alterações.
3.ª) - Pelo que inexiste qualquer nexo de causalidade entre a alegada alteração do projecto e os montantes que estes teriam obtido caso esse projecto de alterações lhes tivesse sido adjudicado.
4.ª) - E, dispondo o Estado, nos quadros da SGMJ, de técnicos capazes e, nomeadamente, arquitectos, a elaboração de um novo projecto de arquitectura poderia ser, como o foi, elaborado pelos serviços, não tendo o R. de pagar pela sua elaboração quaisquer montantes. Pelo que não beneficiou o Estado do montante de 25 000 000$00.
5.ª) - Nem se encontram fundamentados os alegados prejuízos decorrentes de circunstâncias "como a perda do reconhecimento profissional dos AA."; "perda de benefício dos AA. na sua actividade profissional" e "circunstâncias como o reconhecimento nos círculos dos AA.", atenta a legada "má qualidade" do projecto implantado.
Nas alegações do seu recurso, o Réu Estado formulou as seguintes conclusões:
1.ª) - Evidenciou-se suficientemente a falta de fundamento para as respostas aos quesitos X, XIV, e XVIII a XXIII, devendo ser alteradas, dado constarem dos autos elementos suficientes para que a todos esses quesitos sejam dadas respostas de não provados.
2.ª) - Bem como a falta de fundamento para a resposta restritiva ao quesito XXXIV, a qual deverá ser alterada de modo a obter uma resposta afirmativa de provado.
3.ª) - A sentença recorrida não fez correcta apreciação dos factos provados, procedendo a errada análise da matéria e das conclusões que extrai das respostas dadas aos quesitos XI, XIII, XV a XVII e XXIV a XXVI, pelos fundamentos expostos.
4.ª) - Tal implicando se conclua que o projecto de arquitectura elaborado pela SGMJ, na sequência da alteração do programa, constitui um projecto novo elaborado para o mesmo objecto (Palácio da Justiça), sobre as mesmas circunstâncias de lugar, enquadramento e circunstâncias externas.
5.ª) - Pelo que, inexistindo qualquer conduta ilícita por parte do Estado ou dos seus agentes, inexiste a obrigação de indemnizar, ao contrário do decidido na sentença recorrida, a qual fez incorrecta aplicação dos artigos 2.º e 6.º do DL 48 051, de 21/11/67, e 487.º do CC..
6.ª) - Do mesmo modo e no que respeita à violação do Código do Direito de Autor e dos Direitos Conexos, (CDADC), não ficou demonstrada a violação dos citados artigos 11.º, 15.º e 60.º, pelo que a sentença recorrida fez errada aplicação das normas legais citadas.
Os Autores não contra-alegaram.
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Foram colhidos os vistos dos Exm.ºs Juízes Adjuntos, pelo que cumpre decidir.
2. FUNDAMENTAÇÃO
2. 1. OS FACTOS:
A sentença recorrida considerou provados os seguintes factos:
1. Os autores são arquitectos de profissão (A);
2. No desenvolvimento da sua actividade profissional, foram contactados pela Sociedade "..., Lda", para procederem à elaboração do projecto de arquitectura do edifício do Tribunal Judicial de Portimão (B);
3. A Secretaria Geral do Ministério da Justiça (SGMJ) celebrou com a referida “...” o contrato para elaboração do projecto geral de construção daquele Tribunal de Portimão com data de 26.10.1988, nos termos do escrito junto como doc. 3 a fls. 13 e sgs (C);
4. Nele figura a SGMJ como primeira outorgante e a ... como segunda outorgante, tendo convencionado, além do mais, que os estudos a elaborar pela segunda abrangeriam: “a) Projecto de Arquitectura; b) Projecto de Fundações e Estruturas; c) Projecto de Instalações Eléctricas; d) Projecto de Instalações de Águas e Esgotos (ponto l da cláusula primeira) (D);
5. E que a ... se obrigava a elaborar o projecto de acordo com o programa específico de áreas, o programa geral de funcionalidade das instalações, a planta de localização, e outros elementos que fossem julgados necessários, todos a fornecer pela SGMJ – ponto 3 da mesma cláusula (E);
6. O projecto de execução seria entregue (...) pelo segundo outorgante e pelo autor do projecto de especialidade, salvo nos casos em que o segundo outorgante fosse simultaneamente o seu autor – ponto 2 da cláusula 3a (F);
7. A ... seria responsável pelo projecto no seu conjunto e por cada uma das duas especialidades independentemente da autoria material destas, excepto quanto às mesmas especialidades no que respeita às respectivas qualidade e correcção técnicas – ponto l da cláusula 4a – (G);
8. Os técnicos autores de cada projecto de especialidade deveriam apresentar termo de responsabilidade, nos termos da legislação em vigor (ponto 2 da mesma cláusula) – (H);
9. Datada de 14.07.93, a SGMJ dirigiu à ... a carta/ofício, junta como doc. 9, a fls. 24, com a referência Proc. 169.3, cujo teor completo se dá por reproduzido, tendo como assunto “PALÁCIO DA JUSTIÇA DE PORTIMÃO (ampliação)” e se refere existir desadequação do projecto aprovado relativamente às necessidades dos serviços a instalar, dizendo pretender-se a constituição de eventual cave para estacionamento, a constituição do piso de entrada vazio para eventual futura instalação de serviços da DGRN, a repetição da actual solução de arquitectura do piso 2 com cinco pisos – (I);
10. E que, “considerando as implicações desta intenção em termos de concepção global, volumetria, alçados emergentes, etc., solicita-se a urgente comunicação de parecer do autor do projecto” – (J);
11. Os autores enviaram à SGMJ a carta datada de 05.08.93, junta como doc. 10, a fls. 25, na qual dizem responder ao ofício mencionado em I) e dizem, além do mais, ser de opinião que o referido projecto tem potencialidades para responder, em termos gerais, ao objectivo pretendido. Acrescentando ser de evitar a ampliação para 6 pisos mais cave, como preconizado na sugestão, devido às características formais do Edifício Projectado, assim como a envolvente urbana (...), manifestando-se no sentido da não inclusão do último piso, e de que a solução de cinco pisos mais cave para estacionamento constituiria a atitude mais correcta, podendo as áreas correspondentes aos 6 piso serem compensadas por uma nova configuração do piso térreo – (K);
12. Datada de 24.05.1994, a SGMJ dirigiu à ... o ofício 5223, junto como doc. 11, a fls. 26, que diz ser sequência de ofício 6889, de 14.07.93, e de reunião de 18.05.94, onde informa que a obra foi concursada com um novo projecto de estabilidade permitindo a construção de mais pisos para as necessidades dos serviços a instalar – (L);
13. Mais diz, inter alia, que ‘A articulação entre o projecto elaborado por V. Exªs. e o objecto da empreitada consta da Nota Prévia incluída no processo de concurso que se anexa ponto 2 – (M);
14. E que “Resulta de 2 que, para a gestão correcta da empreitada, se torna necessário elaborar um projecto de ampliação correspondente ao objecto da empreitada. Este projecto envolve: (...)" – os pontos 3.1, 3.2, 3.3. 3.4, 3.5, 3.6, e 3.7, que aqui se dão por reproduzidos, bem como a nota anexa, e que no essencial se referem a projecto geral de arquitectura, com reutilização das plantas dos antigos pisos l e 2. E elaboração de planta para nos novos pisos l e O, e arranjos exteriores, e bem assim projectos das especialidades instalações eléctricas e telefónicas (RITA), rede informática, águas e esgotos, detecção e extinção de incêndios, anti-intrusão, ar condicionado (...) – (N);
15. Foi enviada à SGMJ proposta de honorários referente ao projecto geral de arquitectura, junta como doc. 14, a fls. 31/32 - (O);
16. A SGMJ enviou à ... o ofício datado de 23.06.94, junto como doc. 15, a fls. 33, onde refere acusar a carta de 94.06.06, agradecendo a disponibilidade para a realização do projecto, e informando que o valor de honorários proposto era considerado muito elevado, o que impedia a sua adjudicação, pelo que seria assegurada internamente a realização do mesmo – (P)";
17. Os aqui autores enviaram ao Sr. Secretário Geral do M. J. a carta datada de 15.07.94, junta como doc. 16, a fls. 34, na qual dizendo-se autores do projecto de Arquitectura para o Palácio de Justiça de Portimão, e nessa qualidade, lamentarem informar que não autorizam que o referido projecto seja alterado por outros que não os próprios, sem o seu expresso consentimento – (Q);
18. Datada de 16.11.95, o Secretário Geral da SGMJ dirigiu ao Arq. ..., enquanto Presidente do Conselho Directivo Regional Sul (da Associação dos Arquitectos) o ofício 1081, de 16.11.95, junto como doc. 19, a fls. 41/42, cujo teor aqui se dá por reproduzido – (S);
19. Datada de 12.12.95, consta, dirigido ao Sr. Secretario Geral da SGMJ, o ofício junto como doc. 18, a fls. 38/39, subscrito por ..., enquanto Presidente do Conselho Directivo Regional Sul (da Associação dos Arquitectos), cujo teor aqui se dá por reproduzido – (S);
20. Com o n° 1767 e datado de 07.02.96, foi dirigido pelo Secretário Geral da SGMJ o ofício junto como doc. 20, a fls. 43/54, e dirigido a Arq. ... -Presidente do Conselho Directivo Regional Sul da Associação dos Arquitectos Portugueses, cujo teor se dá por reproduzido – (T); 21. A elaboração do projecto de arquitectura ficou a cargo dos aqui autores [resposta ao quesito 1°];
22. Houve contactos dos autores para com os Serviços do Ministério da Justiça, durante a fase de elaboração do projecto, e com eles foram ajustados pormenores, sendo que a Secretaria Geral do MJ dirigia a sua correspondência à “..., LDA’ – [2°];
23. O projecto de arquitectura foi elaborado pelos autores – [3°];
24. E foi por eles entregue e considerado conforme, sendo pago - [4°];
25. Tal proposta era moderada relativamente aos valores praticados no ramo e às tabelas em vigor – [6°];
26. A proposta enviada à SGMJ pela ... era no valor de 17.797.992$00 - [7°];
27. Tal proposta foi enviada à SGMJ pela ... e o seu valor de 27.890.000$00 era exagerado e excedia o que resultaria das Instruções em vigor para o cálculo de honorários respectivos - [8°];
28. Existe uma identificação praticamente total da implantação do projecto dos autores com o projecto que na data da petição estava a ser implantado - [10°];
29. A opção formal proposta pelos autores - articulação pela intersecção de dois volumes paralelepipédicos a 45° - mantém-se – [ 11.º];
30. Foi alterado (aumentado) o número de pisos - [12°];
31. O edifício manteve o mesmo sentido de orientação e posição do acesso principal – [13°];
32. Ao nível do rés-do-chão e apesar das alterações de programa introduzidas neste piso, toda a estrutura formal e funcional é idêntica, nomeadamente quanto ao átrio de acesso e sua localização – [14°];
33. Quanto à localização dos elevadores – [15°];
34. Quanto à localização da escada para o público - [16°];
35. Quanto à relação espacial destes dois acessos verticais - [17.º];
36. Toda a estrutura funcional e hierárquica – pública e privada – dos acessos e circulação aos diversos serviços se mantém – [18°];
37. A opção de inclusão de um pátio interior para iluminação e ventilação mantém-se, embora tendo reduzida a sua dimensão- [19°];
38. Ao nível do 1° andar mantém-se tudo o que foi referido para o rés-do-chão, excepto que ficou sem salas de audiências – [20°];
39. Ao nível dos 2.º,3°, 4.º e 5° andares, o programa é idêntico ao do 1° andar (Piso 02 – doc. n° 5) do projecto dos autores - [21°];
40. Também toda a estrutura formal e funcional é idêntica nomeadamente a localização das salas de audiência e a sua articulação é praticamente igual – [22.º];
41. Tal como nos outros pisos, a localização, modulação e dimensionamento dos gabinetes dos magistrados são idênticos - [23°];
42. A localização, dimensionamento e forma das secretárias é alterada, sendo que, no entanto, se mantém a articulação funcional com todos os serviços do piso, públicos e privados, estudada pelos autores – [24.º];
43. O edifício encontra-se revestido de mármores rosa e cinza, em contraste com os tubos de queda das águas pluviais em aço inoxidável, tal como no projecto dos autores – [25°];
44. Enquanto no projecto dos autores a memória descritiva demonstra como se foi sucessivamente chegando às diversas soluções arquitectónicas, a memória descritiva do projecto que estava a ser construído no local diz, no seu antepenúltimo parágrafo, que "A implantação e forma volumétrica do edifício foi mantida, ou seja está de acordo com o projecto de Estruturas concursado, tendo sido alterada apenas a organização dos espaços de modo a permitir a correcta funcionalidade dos Tribunais” – [26° e 27°];
45. Por não lhes ter sido adjudicado o trabalho de ampliação do projecto, os autores deixaram de auferir, pelo menos, 17.797.992 00 – [28°];
46. A reconhecer-se que se tratava de uma ampliação do projecto de arquitectura dos autores, o que está a ser levado a cabo na construção do Palácio da Justiça de Portimão levaria a que os autores beneficiassem na sua vida profissional do respeito e publicitação do seu trabalho inerente a tal obra – [29°];
47. Com reconhecimento nos seus currículos – [30°];
48. O Estado Português teria de pagar por um projecto de arquitectura, a começar de novo, valores actualizados nunca inferiores a 25.000.000$00 – [31°];
49. A SG do Ministério da Justiça elaborou com os seus próprios técnicos e a empresa “..., Lda” um projecto adequado às actuais necessidades e interesse público – [32°];
50. A obra foi concursada com o projecto de estabilidade apresentado pela ‘...”, sendo este projecto que está a ser (foi) executado – [33°];
51.Tal projecto é diferente do que fora produzido pela ..., designadamente quanto ao número de pisos, cércea total, volumetria, configuração e disposição interna de alguns espaços e compartimentos - [34.º].
2. 2. O DIREITO:
Tendo em conta os objectos dos dois recursos jurisdicionais interpostos da sentença recorrida e que o do Réu põe em causa a própria matéria de facto dada como provada, impõe-se, por uma questão de lógica, começar pelo conhecimento deste, pois que põe em causa os próprios pressupostos da sentença, com necessárias repercussões no conteúdo da mesma.
Assim:
A. Recurso do Recorrente Estado:
2. 2. 1.
O Réu Estado defende que deviam ter sido dadas respostas de não provado, em vez de provado, aos quesitos 10.º, 14.º e 18.º a 23.º e que, ao invés, devia ter sido dada como provada, em vez de não provada, a matéria constante do quesito 34.
De acordo com os preceitos conjugados dos artigos 669.º, n.º 2, alínea b), 712.º, n.º 1, alínea a) e 690.º-A, todos do CPC, as respostas aos quesitos apenas podem ser alteradas quando constem do processo documentos ou quaisquer outros elementos que, só por si, impliquem necessariamente decisão diversa da proferida ou quando dos autos constarem todos os elementos de prova que lhe serviram de base.
O artigo 690.º-A do CPC estabelece:
" 1. Quando se impugna matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Quais os pontos de facto que considera incorrectamente julgados;
b) Quais os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo de gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida."
A recorrente, no que respeita à alínea a) deste preceito, apontou as seguintes diferenças relativamente aos dois projectos:
Quesito 10.º:
"O projecto dos AA. "traduz-se" num edifício de dois andares que ocupam a totalidade da área de implantação ( + de 1200 m2) e um 3° piso recuado com menos de metade da área (560 m2); enquanto no projecto da SGMJ esse recuo é inverso, isto é, o piso 0 e o piso 1 são recuados, têm uma área de implantação de pouco mais de 1000 m2, e a partir do 2° piso o edifício avança, tendo uma área de cerca de 1300 m2 (vejam-se as respectivas plantas de implantação, desenhos 3 do projecto dos AA. e 2 do projecto da SGMJ).
Por outro lado e atentas as mesmas plantas, resulta uma diferente opção na implantação do edifício no terreno. Em particular na fachada de entrada do edifício, que é de nível no projecto dos AA. (está sensivelmente à cota 10) encontrando-se a uma cota mais elevada no projecto da SGMJ.
Isto é, enquanto o acesso no projecto dos AA. é de nível relativamente ao arruamento, o mesmo acesso no projecto da SG é feito sobre uma plataforma murada, 2m acima do arruamento."
Quesito 14.º:
"Constata-se da consulta da planta do Piso 01 do projecto dos AA. (desenho 4) que este piso está implantado directamente sobre o terreno e ocupa a totalidade da área de implantação do edifício. Enquanto no projecto da SGMJ, a planta do piso 0 está implantada sobre uma plataforma e ocupa apenas uma parte dessa área, uma vez que o edifício é recuado nos dois primeiros pisos (des. 4);
O átrio no projecto dos AA. tem 4 pilares que definem aberturas e se prolongam nos vários pisos e é iluminado superiormente por uma clarabóia quadrada, conforme o desenho 10. O projecto da SGMJ não tem pilares, nem aberturas, nem clarabóias;
Quanto à sua localização, sendo um átrio de acesso do público, é normal que em qualquer projecto, se encontre à entrada do edifício.
A implantação funcional do projecto dos AA tem no r/c o Tribunal de Trabalho, o Instituto de Reinserção Social e parte dos Tribunais de Círculo e de Comarca. A da SGMJ tem apenas o Tribunal de Trabalho, o que forçosamente, determina uma diversa implantação funcional."
Quesito 18.º:
"por exemplo, a circulação dos magistrados é comum com a das testemunhas e dos presos, no projecto dos AA.(desenho 4); enquanto no projecto da SGMJ esta circulação é independente ( desenhos 6, 7 e 8, respectivamente pisos 2, 3 e 4).
Aliás, as celas dos presos encontram-se no projecto dos AA. no mesmo piso e junto da sala de audiências, dos gabinetes e salas de testemunhas (desenho 4, piso 01 ); enquanto no projecto da SGMJ, se encontram na cave (desenho 03, piso -1 ), elemento que não será de somenos importância na orgânica de um Tribunal.
Os serviços do MP na solução da SGMJ estão todos concentrados no piso 1 e ocupam todo o piso, pelo que este não tem sala de audiências; sendo que, na solução dos AA. aí se prevêem 2 salas de audiências."
Quesito 19.º:
" Quanto à inclusão de um pátio interior nos dois projectos, refira-se em primeiro lugar que tal solução é normal e comum aos edifícios públicos e nomeadamente aos dos Tribunais, atendendo à profundidade da construção e por imposição das condições relativas à salubridade das edificações.
No entanto, as opções constantes dos dois projectos, no que a este item respeita, são manifestamente diferentes.
Assim, enquanto no projecto dos AA., o pátio é central, ajardinado e serve para iluminação e ventilação, além de constituir um elemento estético, de tal modo que tem gabinetes cujas janelas dão para esse pátio (desenhos 4 e 9); no projecto da SGMJ este é de menores dimensões e conforme referiram várias testemunhas, nomeadamente a Arq. ..., cuja inquirição se encontra registada na cassete junta aos autos a fls. 205, que em resposta a esta questão, referiu manter-se essa opção de inclusão de um pátio interior, um “pátio com jardim, no original, e agora um saguãozito”, sem condições de iluminação.
Bastando aliás confrontar, os desenhos 27 da SGMJ e o desenho 14 dos AA., ambos relativos aos alçados do pátio interior, para se concluir pela diversa concepção, localização e dimensões do referido pátio, cabendo-lhe, no projecto da SGMJ, mera função de ventilação e já não de iluminação, impossível aliás, atentas as suas dimensões reduzidas e o facto de corresponder a uma abertura de 6 andares, pouca luz chegando aos pisos inferiores (desenhos 4 e 28)."
Quesito 20.º:
"verifica-se que ao nível do 1 ° andar inexiste qualquer semelhança formal. A planta dos AA. ocupa toda a área de implantação do edifício; enquanto no projecto da SGMJ ocupa apenas parte dessa área, uma vez que ainda neste piso se mantém o recuo do edifício; O projecto da SGMJ no piso 02 (1° piso), não tem sala de audiências, aí se encontrando exclusivamente, os serviços do MP; tendo o projecto dos AA. duas salas de audiências, o que se mostra suficiente, a uma profunda alteração da estrutura formal e funcional deste piso;
Não tem o vazio do átrio de entrada, ao contrário do previsto no projecto dos AA.;
A circulação é feita em fachada, enquanto no projecto dos AA. existem divisões e gabinetes a percorrerem a fachada."
Quesitos 21.º, 22.º e 23.º:
"O mesmo se diga para os restantes pisos (2°, 3°, 4° e 5°) do projecto da SGMJ.
Uma vez que é a partir do piso 03 (2° andar) que no projecto da SGMJ a implantação passa a ocupar a área total, enquanto no projecto dos AA. este piso ocupa apenas 50% da área de implantação, havendo pois uma inversão das respectivas opções de implantação. Não havendo qualquer repetição do projecto dos AA., mas antes uma concepção nova, dado no projecto dos AA. não estarem previstos mais pisos.
Sendo que, conforme já referimos antes, é diversa a localização das salas de testemunhas, os acessos destas e dos presos às salas de audiências, a localização da escada de serviço, as soluções das instalações sanitárias, que estão agrupadas e localizadas em pontos diferentes do edifício."
Quesito 34.º:
"a resposta restritiva a este quesito, não reconheceu o tribunal a quo que o projecto da SGMJ fosse diferente do produzido pelos AA., nomeadamente, no que se refere à implantação, configuração e estilo arquitectónico, aspectos estes que entendemos de primordial importância na diferenciação dos dois projectos.
Assim, e no que se refere à diversa implantação e configuração do edifício prevista nos dois projectos e conforme já referimos sob 1. supra, dos elementos aí referidos, decorre não só, uma óbvia inversão da geometria dos volumes, mas também uma diversa relação do peão com o edifício. Num caso este abre-se directamente ao nível dos arruamentos, enquanto no outro, no da SGMJ, a primeira percepção do peão é de uma parede compacta de 2 metros, sem qualquer janela, devendo o peão subir umas escadas para aceder à plataforma de acesso ao edifício.
Assim, na solução dos AA. o edifício aparece como que ancorado no terreno, enquanto no projecto da SGMJ este está como que colocado sobre um pedestal.
Ainda relativamente à entrada no edifício, de referir que enquanto no projecto dos AA. a entrada do público é feita numa reentrância da fachada, na solução da SGMJ há um claro recuo da fachada em 2 pisos, criando uma área coberta para entrada de cerca de 250m2, que transmite uma imponência dessa entrada, inexistente no projecto dos AA.
No que respeita à opção formal de distribuição do edifício por 2 volumes, comparando as plantas respectivas, verificamos que embora esta seja comum aos 2 projectos, a sua leitura e efeito produzido é necessariamente diverso, no projecto dos AA. essa opção de intersecção é óbvia, existindo um volume, com 3 pisos e que comporta a entrada principal, que se destaca relativamente a um 2° volume, mais baixo, com 2 pisos que intercepta ou vem contra o volume mais alto; enquanto, no projecto da SGMJ, a continuidade da cércea não permite vislumbrar qualquer intersecção, antes induzindo a uma leitura de um volume único.
Passando à comparação dos estilos arquitectónicos, verificamos a diversidade de linguagens adoptadas na composição arquitectónica dos alçados, quer a nível do ritmo de fenestração, quer da linguagem de vãos.
Assim, passa-se duma estruturação quadrada e vertical no projecto dos AA., definida pelas janelas, a estereotomia da pedra, as aberturas sobre as galerias (desenhos 34 e 35), a cantaria da entrada, os suportes da platibanda e os pilares na fachada nordeste e sudeste (desenho 12), para uma estruturação rectangular e horizontal, no projecto da SGMJ, marcada pelas palas contínuas sobre janelas baixas e compridas; o desenho da platibanda, a ausência de estereotomia das cantarias, etc.(desenhos 23 a 27 ), bastando olhar os desenhos relativos à fachada principal dos dois projectos, para sentir a diferença de composição arquitectónica: num caso quadrada, vertical, com grandes áreas envidraçadas e no outro, rectangular e horizontal, com aberturas baixas e compridas, inseridas numa massa compacta de pedra.
Sendo certo que, conforme a resposta dada ao quesito XXV, os AA., no que respeita às fachadas e imagem exterior do edifício, apenas lograram provar semelhanças entre os dois projectos, em matéria de revestimento do edifício, mármores rosa e cinza, e a utilização de tubos de queda das águas pluviais em aço inoxidável. Elementos estes, insuficientes à qualificação de identidade das linguagens arquitectónicas utilizadas."
E, relativamente ao meio probatório de que faz depender a sua divergência e a pretendida alteração das respostas, indica os projectos de arquitectura elaborados pela Sociedade "... Ld.ª" e pela Secretaria- Geral do Ministério da Justiça, juntos aos autos.
Pelo que se considera que deu satisfação ao estabelecido no referido artigo 690.º-A do CPC.
Acontece que, conforme foi salientado, as respostas aos quesitos apenas podem ser alteradas quando constem do processo documentos ou quaisquer outros elementos que, só por si, impliquem necessariamente decisão diversa da proferida ou quando dos autos constarem todos os elementos de prova que lhe serviram de base.
O que, quanto a nós, se não verifica no caso sub judice.
Na verdade, começando pelos elementos de prova que serviram de base a essas respostas, verifica-se que foram os depoimentos das testemunhas ..., ..., ... e ..., todas arquitectos e consideradas com conhecimento das peças escritas e desenhadas, e bem assim do teor das memórias descritivas de fls 200-201 e das de fls 228 e segs, e ainda as diversas plantas e peças desenhadas constantes dos dossiers anexos aos autos (vd fls 306-310 dos autos).
Os depoimentos destas testemunhas não foram gravados (com excepção da testemunha ..., ouvida através de carta-precatória - cfr fls 202-203 dos autos) nem reduzidos a escrito, como se verifica da acta de audiência de julgamento de fls 218-223, pelo que só teria viabilidade a alteração pretendida se os documentos existentes impusessem, só por si, decisão diversa, o que, quanto a nós, se não verifica.
Na verdade, o tribunal goza do poder de livre apreciação das provas produzidas (artigo 655.º do CPC), provas essas que, assinala-se, se reportam, in casu, a matéria que se situa numa área de ciência, a arquitectura, com regras de carácter técnico muito específicas e em que a criatividade assume um papel relevante, o que nos leva a considerar que, não obstante as diferenças apontadas pelo recorrente Estado entre o projecto dos AA e o executado no Palácio da Justiça de Portimão, que se verificam efectivamente, não seja possível e correcto dar as respostas que foram dadas aos referenciados quesitos.
É que, apesar de terem ocorrido as alterações apontadas pelo Estado, alterações teria necessariamente que haver, pois que a sua introdução foi pedida aos AA, aquando da elaboração do projecto de ampliação. Simplesmente, como referem os AA, nas suas alegações de recurso, houve um trabalho criativo deles, ao qual chegaram através de um processo de encadeamento lógico, no qual foram introduzidas alterações de pormenor.
E, como se refere na douta sentença recorrida, há no projecto dos AA "um trabalho base de criação, uma concepção global, que, diremos nós, uma vez feita, criada a opção arquitectónica poderá, a partir daí ser difícil sair dessa vinculação, para quem surja de seguida".
Ora, as respostas dadas assentaram em depoimentos de técnicos da especialidade (arquitectos), que perante a análise de todos os elementos disponíveis e já apontados - teor das memórias descritivas de fls 200-201 e das de fls 228, bem como das diversas plantas e peças desenhadas constantes dos dossiers anexos aos autos - não tiveram dúvidas em considerar que havia um identificação praticamente total da implantação do projecto dos AA com o projecto que na data da petição estava a ser implantado.
E o mesmo aconteceu no Parecer junto, da autoria do Arquitecto ... (fls 293- 295), com um currículo assinalável no âmbito de grandes empreendimentos arquitectónicos e de actividade docente (fls 290-302), em que considera que "Um edifício é projectado e construído correctamente como "um todo"; não é uma simples concoção de elementos arbitrários aglomerados ao sabor das exigências particulares que compõem o seu programa. Articular, dar forma coerente e eficaz a essas exigências, e fazê-lo dentro das condições que se associam às regras e saberes da Arte, é a função do Arquitecto. Ao projectar um objecto arquitectónico, ele fá-lo em função de um programa. É certo que há muitos casos em que o "programa" tem de contar com uma pré-existência imposta (como a adaptação de um convento ou um quartel desactivado a outras funções), e tal situação tem características próprias.
Porém, um edifício a construir de raiz deve obedecer naturalmente e obviamente a um programa definido. Uma alteração do programa deve corresponder a uma revisão do projecto, que corresponde na prática a elaborar um projecto novo, ainda que sobre as bases do anterior, dado que as circunstâncias de lugar, enquadramento e condicionantes externas não se modificaram. E isso, naturalmente, implica que os projectistas que conceberam, estudaram e desenvolveram o projecto inicial sejam os que, pelo saber, soma de conhecimentos, imaginação e solução dos problemas iniciais de fundo envolvidos na elaboração do projecto, devem ser encarregados de introduzir as necessárias e requeridas alterações. Essa é uma prática universalmente reconhecida e que deveria ser sempre seguida, a não ser em casos de manifesta incapacidade ou incompetência."
Tendo, após estas e outras considerações, apontado vários vícios ao projecto implantado, que considera ser uma alteração do elaborado pelos AA.
Ora, estes conhecimentos, de natureza técnica extra-jurídica, não podem deixar de ser considerados, levando-nos a admitir, perante a análise dos documentos em causa, como não merecedoras de censura as respostas dadas, que, por isso, não devem ser modificadas.
Em face do exposto, improcedem as conclusões 1.ª e 2.ª das alegações de recurso do Estado.
2. 2. 2.
Alega também o Estado que a sentença recorrida não fez correcta avaliação dos factos provados, procedendo a errada análise da matéria e das conclusões que extrai das respostas dadas aos quesitos 11.º, 13.º, 15.º a 17.º e 24.º a 26.º, considerando que uma correcta análise dessa matéria não levaria a considerar-se que o Palácio da Justiça foi construído com base no projecto dos AA, mas sim com base num projecto novo, elaborado sobre as mesmas circunstâncias de lugar, enquadramento e condicionantes externas pela SGMJ, pelo que os seus agentes não cometeram qualquer acto ilícito, pelo que não incumbia sobre ele qualquer dever de indemnizar os Autores.
Fundamenta essa incorrecta interpretação nas seguintes razões:
"1º. No que respeita à opção formal de distribuição do edifício por 2 volumes (quesito XI), conforme já referimos supra, sob 7, verificamos que embora esta seja comum aos 2 projectos, a sua leitura e efeito produzido é necessariamente diverso, uma vez que no projecto da SGMJ, a continuidade da cércea não permite vislumbrar qualquer intersecção, antes induzindo a uma leitura de um volume único.
2º. Do mesmo modo que o facto do edifício manter o mesmo sentido de orientação e posição do acesso principal (quesito XIII), não permite extrair qualquer conclusão de identidade dos projectos, dado estar em causa a mesma planta de localização, sendo constantes aos dois projectos as circunstâncias de lugar enquadramento e condicionantes externas, que não se modificaram.
3º. Quanto à localização dos elevadores e das escadas (quesitos XV, XVI e XVII), tratando-se de um edifício público, parece-nos normal que os acessos públicos se encontrem localizados no átrio de acesso, pelo que estas questões não podem ser consideradas pertinentes à decisão da causa, sendo que caso se pretenda entrar numa discussão de detalhe, se terá de concluir pela existência de diferenças quer a níveis de medições quer desde logo o facto de num projecto estarem previstos 2 elevadores e no outro 3.
4º. Já relativamente à articulação funcional das secretarias, com todos os serviços do piso, tal como estudadas pelos autores (quesito XXIV), é de realçar que esta tem de ser sempre a mesma - entrada do público por um lado e acesso de serviço, por outro. Sendo que, no caso do projecto da SGMJ ainda tem o acesso ao arquivo, que no projecto dos AA. não existe.
De qualquer modo, para o efeito pretendido nesta acção, não será seguramente a identidade de articulação funcional das secretarias que permitirá concluir pela eventual identidade de projectos, mas antes, a sua localização, dimensionamento e forma, que conforme resulta deste mesmo quesito, foi alterada, não mostrando quaisquer semelhanças entre os dois projectos.
Com efeito, no projecto da SGMJ a secretaria é virada a Norte, e interior relativamente à fachada poente e tem forma em L, (desenho 6); enquanto no projecto dos AA. a secretaria do piso 2 é rectangular, virada a poente e desenrola-se em fachada, sendo menos acessível ao público (desenho 5) e a secretaria do piso 1 é mais pequena, iluminada pelo pátio e interior (desenho 4).
Pelo que, apenas da manutenção, em parte, da respectiva articulação funcional, não se pode retirar qualquer conclusão quanto à identidade ou dissemelhança dos projectos.
5.º E o mesmo se diga relativamente às conclusões tiradas da resposta dada ao quesito XXV, no qual, no que respeita às fachadas e imagem exterior do edifício, conforme referimos supra sob o ponto 7, os AA. apenas lograram provar semelhanças entre os dois projectos, em matéria de revestimento do edifício, mármores rosa e cinza, e a utilização de tubos de queda das águas pluviais em aço inoxidável. Elementos estes, insuficientes à qualificação de identidade das linguagens arquitectónicas utilizadas nas fachadas, as quais utilizam uma composição arquitectónica manifestamente diversa: num caso quadrada, vertical, com grandes áreas envidraçadas e no outro, rectangular e horizontal, com aberturas baixas e compridas, inseridas numa massa compacta de pedra.
Sendo esta linguagem utilizada nas fachadas, o elemento caracterizador e identificativo da obra arquitectónica, o qual implica uma distinta composição entre os dois projectos.
6º. Relativamente à resposta dada ao quesito XXVI, é aqui manifesta a contradição entre a matéria provada e a conclusão desta retirada.
Com efeito, conforme se refere na Memória Descritiva elaborada pela SGMJ e junta pelos AA. a fls. 200 e 201, conclui-se nesta memória descritiva, que “A implantação e a forma volumétrica do edifício foi mantida, ou seja está de acordo com o Projecto de Estruturas concursado”, projecto este que é o referido na al. L) da matéria considerada assente e na resposta dada ao quesito XXXIII, isto é, o projecto de estruturas elaborado pela ..., o referido novo projecto de estruturas, sendo aliás, impossível que aqui se referisse, ao contrário do que pretendem os AA., e foi entendido na sentença recorrida, ao projecto de estruturas ou ao projecto de arquitectura da ... ou dos AA., uma vez que, relativamente a estes não foi mantida qualquer volumetria, antes pelo contrário, a volumetria constitui a mais evidente diferença entre os dois projectos.
Assim, quando aí se refere que apenas foi alterada a “organização dos espaços de modo a permitir a correcta funcionalidade dos Tribunais”, está-se a referir, não a qualquer organização prevista no projecto de arquitectura dos AA., mas sim, à organização dos espaços esboçada no novo projecto de estruturas ou de estabilidade, elaborado pela ...."
Ora, quanto a esta matéria, teremos de começar por remeter para as considerações que fizemos no tratamento do pedido de alteração das respostas aos quesitos, ou seja, para o facto de estarmos perante matéria eminentemente técnica, no âmbito da ciência da arquitectura, com as consequências que daí extraímos.
E diremos, tendo em conta tudo o que já foi expendido e designadamente o que a esse respeito foi consignado na douta sentença recorrida, que, nesta matéria "mesmo perante um determinado programa com determinadas finalidades e exigências, a implantar num determinado local, com as consequentes condicionantes e enquadramento relacional com a envolvência e demais condicionantes geográficas e de orientação solar, há um trabalho base de criação, uma concepção global, que, diremos nós, uma vez feita, criada a opção arquitetónica poderá, a partir daí ser difícil sair dessa vinculação, para quem surja de seguida. Mas é precisamente nessa concepção, nessa opção arquitectónica, que reside o acto criativo por excelência e digno de tutela."
O que nos leva a considerar irrelevante que a continuidade da cércea, no projecto implantado pela SGMJ não permita vislumbrar a existência de dois volumes paralelepipédicos a 45º, que existiam efectivamente em ambos os projectos (quesito 11.º) e como não atendíveis as considerações feitas pelo recorrente, relativamente aos quesitos 13.º, 15.º, 16.º , 17.º e 24.º, na medida em que não afastam, de maneira alguma, o aproveitamento do projecto dos AA. Tinha que ser assim, diz o recorrente, ignorando a referenciada criatividade sempre presente em projectos desta natureza, por um lado, e não afastando, antes reforçando, por outro, que havia similitudes dos projectos, o que nos leva à defesa da posição de que se está perante um projecto dos AA., alterado pelo Réu.
Também as diferenças apontadas na matéria do quesito 25.º não permitem apontar para o não aproveitamento do projecto dos AA, pois que, apesar dessas diferenças, aquilo que se pode considerar a matriz das fachadas se manteve tal como no seu projecto inicial.
Finalmente, no que respeita à matéria do quesito 26.º, que, para, além de não originar qualquer contradição entre o que dela consta e o que foi considerado na sentença recorrida, pois que esta nunca refere que a memória descritiva do projecto implantado pela SGMJ coincidia com a memória descritiva do projecto de arquitectura elaborado pelos AA, mas apenas que, enquanto que na memória descritiva dos AA "se demonstra como se foi sucessivamente chegando às diversas soluções arquitectónicas", na memória descritiva do projecto que estava a ser construído no local apenas se referia que "A implantação e forma volumétrica do edifício foi mantida, ou seja, está de acordo como o projecto de Estruturas concursado" (fls 200-201), que era efectivamente o elaborado pela ... e não pela ..., pretendendo demonstrar apenas que não houve, como é normal, a indicação de como se chegou ao projecto final, porventura, por se ter partido do projecto dos AA (cfr., sobre esta matéria, o parecer de fls 293-295, que refere expressamente que constitui um vício evidente do processo seguido o submeter a um projecto de estrutura a fundamental organização, pois que aquele (projecto de Estruturas) é que deve ser uma resultante da organização dos espaços, que deve constar do projecto de arquitectura).
Donde resulta que tem cabimento considerar essa referência como mais um elemento a levar em conta para a consideração do aproveitamento do projecto dos AA pela SGMJ, aproveitamento esse que é expressamente defendido no Parecer do Presidente do Conselho Directivo Regional do Sul de fls 38-40 dos autos, que, após várias apreciações, considera que "salvo melhor opinião, e pela análise das peças desenhadas e demais documentação, se conclui tratar-se de um projecto de ampliação relativamente a um projecto inicial da autoria dos arquitectos ... e ..., para o mesmo local e com o mesmo dono da obra, embora haja alteração de programa (e não programa novo), que aliás não inviabilizou o lançamento do concurso de empreitada com base no projecto inicial." - fls 40.
Em face do exposto, é de considerar que a sentença recorrida, ao considerar que a SGMJ copiou o projecto dos AA, ou melhor, produziu nele alterações contra a sua vontade, não merece qualquer censura, pelo que improcedem as conclusões 3.ª e 4.ª das alegações de recurso do Estado.
2. 2. 3.
O Estado defende ainda não estarem verificados os pressupostos da responsabilidade civil extracontratual do Estado por actos ilícitos de gestão pública, regulada no Decreto-Lei n.º 48051, de 21/11/67, em virtude de se não verificar o requisito facto ilícito, por três ordens de razões, a saber: não houve apropriação de obra alheia; o artigo 60.º do CDADC apenas estabelece a obrigação de indemnizar no caso de falta de consulta dos autores do projecto; terem os AA dado o seu consentimento antecipado, conforme cláusula 10.ª do contrato celebrado e junto aos autos a fls 13 e sgs.
A falta de apropriação de obra alheia alicerça-a o Estado no facto de haver uma individualidade própria na obra construída pelo M. da Justiça, matéria que, porém, já foi afastada pela decisão sobre a matéria de facto, pelo que se julga improcedente esta questão.
No que respeita à inverificação do requisito facto ilícito, por não violação do artigo 60.º do CDADC, diremos que este requisito foi tratado desenvolvidamente na sentença recorrida, em termos que merece o nosso inteiro acolhimento e que também só foi questionado no que respeita à violação do referido preceito legal, pelo que só dela nos iremos ocupar.
Estatui este preceito:
"1. O autor do projecto de arquitectura ou de obra plástica executada por outrém e incorporada em obra de arquitectura, tem o direito de fiscalizar a sua construção ou execução em todas as fases e pormenores, de maneira a assegurar a exacta conformidade da obra com o projecto de que é autor.
2. Quando edificada segundo o projecto, não pode o dono da obra, durante a construção nem após a conclusão, introduzir nela alterações sem consulta prévia ao autor do projecto, sob pena de indemnização por perdas e danos.
3. Não havendo acordo, pode o autor repudiar a paternidade da obra modificada, ficando ao proprietário vedado invocar para o futuro, em proveito próprio, o nome do autor do projecto inicial."
Ora, de acordo com o decidido sobre a matéria de facto, diremos, acompanhando a sentença recorrida e concordando com a pormenorizada reflexão sobre ela feita, designadamente a relevância da matéria constante das respostas aos quesitos 10.º a 25.º e 34.º, que, não obstante as semelhanças e diferenças observadas, é de considerar que o projecto executado pela SGMJ foi o projecto dos AA, copiado e modificado sem autorização dos autores (alínea Q) da matéria assente).
E, como tal, houve violação do disposto nos artigos 2.º, 9.º, 11.º, 15.º, n.º 2, 25.º e 60.º, n.º 2 do CDADC, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 63/85, de 14 de Março, com as alterações introduzidas pela Lei n.º 45/85, de 17 de Setembro e pela Lei n.º 114/91, de 3 de Setembro pois que, contrariamente ao defendido pelo Estado, o dever de indemnizar não ocorre apenas nos casos de falta de consulta sobre as alterações dos autores do projecto, mas, por maioria de razão, também naqueles casos em que, tendo sido consultados, se opuseram, como se verificou no caso sub judice, e, não obstante essa oposição, foram introduzidas alterações (cfr., Luis Francisco Rebelo, in Código do Direito de Autor e dos Direitos Conexos, Anotado, pág. 111, que, sobre este assunto, escreveu: "Se o autor do projecto, consultado sobre as alterações, não lhes der o seu acordo, mas apesar disso elas forem introduzidas pelo dono da obra, poderá aquele repudiá-la e não será lícito a este invocar o nome do autor do seu projecto em seu proveito. Além disso, e nos termos gerais de direito, poderá, tal como no caso de falta de prévia consulta, exigir do proprietário indemnização por perdas e danos).
Finalmente, as modificações operadas no projecto dos AA não se reportam às situações previstas no artigo 10.º do contrato de fls 13 dos autos, que apenas abrange as obras interiores, imprevistas pela necessidade de adequar o aproveitamento do espaço às variações das necessidades públicas cuja satisfação houver de assegurar, o que não foi manifestamente o caso dos autos.
Pelo que improcedem também as conclusões 5.ª e 6.ª das alegações do recurso do Estado, ao qual terá, assim, de ser negado provimento.
B. Recurso dos Autores:
2. 2. 1. Danos materiais:
Defendem os Autores que, em face da matéria de facto dada como provada, deviam ser indemnizados na quantia de 17 797 992$00 - euros 88 776, a título de lucros cessantes.
A sentença recorrida não fixou essa indemnização por ter considerado não se verificar nexo de causalidade (outro dos requisitos exigidos para a ocorrência de responsabilidade civil extracontratual do Estado por actos ilícitos de gestão pública, cumulativamente com o facto ilícito, a culpa e o dano) entre o aproveitamento do seu projecto alterado e o não recebimento dessa importância, em virtude do Estado não estar obrigado a adjudicar-lhe a alteração do projecto, que eles não efectuaram, por um lado, e por os danos resultantes da alteração não autorizada previstos no artigo 60.º do CDADC serem apenas os danos de natureza moral, por outro.
Os AA assentam o seu alegado direito na matéria de facto provada sob o n.º 45 da sentença recorrida, segundo a qual, por lhes não ter sido adjudicado trabalho de ampliação do projecto, os AA deixaram de auferir, pelo menos, essa importância.
E consideram que se o Réu não tinha que lhes pagar fosse o que fosse antes de abusivamente alterar o seu projecto, mas uma vez alterado e utilizado, tudo se passou como se lhe tivesse adjudicado essa alteração, pelo que devia o Réu pagar-lhe essa importância, deduzida daquilo que despendeu com a alteração feita por outrém, pelo que, não tendo provado qualquer dispêndio, lhe devia pagar a totalidade dessa importância.
O réu Estado, por sua vez, defende a bondade da sentença recorrida, nesta parte.
Vejamos.
O que está em causa é o nexo de causalidade entre a alteração do projecto dos AA, não autorizada por estes, e a sua execução, na mesma obra para que tinham elaborado o projecto inicial, que lhes foi pago.
De acordo com o estabelecido no artigo 563.º do C.Civil, "A obrigação de indemnização só existe em relação aos danos que o lesado provavelmente não teria sofrido se não fosse a lesão."
Consagra este preceito a teoria da causalidade adequada na formulação negativa de Ennecerus/Lehmann, para a qual é necessário que os danos, apreciados segundo um juízo de prognose póstuma, sustentado em critérios de normalidade e razoabilidade e na experiência comum, possam ser considerados consequência normal da lesão, ou seja, que a acção ou omissão da Administração se mostre adequada à produção do dano, gerando fortes probabilidades de o originar.
Ora, no caso sub judice, como bem refere a sentença recorrida, o Estado não estava obrigado a adjudicar-lhes as alterações, podendo lançar mão de um novo concurso para a elaboração de um projecto novo. E também não estava impedido de prosseguir a execução do projecto alterado, ficando, contudo, obrigado a indemnizar os autores do projecto modificado ( n.º 2 do art.º 60º), indemnização que, porque se integra nos direitos pessoais dos seus autores, apenas cobre os danos não patrimoniais, e já não os lucros cessantes, em consequência de não terem sido encarregados do projecto.
Esta posição é, para nós, a mais consentânea com a lei, por um lado, pela inserção sistemática do preceito no capítulo VI do Código, que tem por epígrafe "os direitos morais", e cujo primeiro artigo, o artigo 56.º, estatui que "1 - Independentemente dos direitos de carácter patrimonial (...), o autor goza durante toda a vida do direito de reivindicar a paternidade da obra e assegurar a genuidade e integridade da obra, opondo-se a toda e qualquer mutilação, deformação ou outra modificação da mesma (...)”, donde se terá de extrair que a regulamentação feita nos artigos seguintes se reporta a direitos morais. Os patrimoniais serão assegurados nos termos gerais de direito, abrangendo os lucros cessantes, que poderão ocorrer em situações como, por exemplo, o da utilização de um projecto feito para uma obra nessa obra e noutra, só tendo sido pago uma vez (para a primeira), mas já não a sua utilização na obra para a qual foi elaborado o projecto, que foi pago, caso em que apenas haverá lugar a indemnização por danos morais, decorrentes da alteração e utilização do projecto original.
E, por outro, porque, não tendo o autor do projecto o direito subjectivo a que lhe fossem adjudicadas as modificações do projecto, não pode haver o direito a lucros cessantes, que dele teria de decorrer, sendo certo que, como também refere a sentença recorrida, não lhes foram sequer criadas expectativas, na medida em que a SGMJ lhes comunicou logo que considerava exagerados os honorários por eles apresentados, pelo que não os iria encarregar de proceder às modificações do projecto.
Não é, assim, de aceitar a tese dos AA de que a SGMJ podia proceder a novo concurso para a elaboração de um novo projecto, mas não o tendo feito, antes tendo executado o seu modificado, tudo se deve passar como se a modificação lhes tivesse sido adjudicada, pois que só no caso de existência de um direito subjectivo à adjudicação das modificações se podia extrair essa consequência em termos de lucros cessantes.
Como esse direito não existe, não se verifica nexo de causalidade entre os invocados lucros cessantes e a execução do seu projecto modificado.
De assinalar, finalmente, que o ponto 34 da matéria de facto dada como provada apenas assentou que os AA deixaram de receber a importância nele mencionada, por não lhes ter sido adjudicado o trabalho de ampliação do projecto dos autores, não contendo qualquer pronúncia, mesmo que implícita, sobre o nexo de causalidade entre o não recebimento dessa importância e a ilícita execução do projecto modificado, que, aliás, sempre seria irrelevante, por a determinação da verificação desse nexo ser uma questão de direito.
Improcede, assim, a conclusão 1.ª das alegações de recurso dos AA.
2. 2. 2. Danos morais:
Defendem os AA que os danos morais, fixados na sentença recorrida, em 39903,83 euros (8 000 000$00), devem ser fixados em 25 000 000$00, com base na equidade.
O Réu Estado começa, a este respeito, por questionar o aumento do pedido operado pelos Autores, que passou de 20 000 000$00, na petição, para 25 000 000$00 apenas nas alegações de direito, considerando ilegal essa ampliação, em face do estatuído nos artigos 273.º, n.º 2 e 308.º, n.º 1 do CPC.
Considerando, depois, não haver lugar a qualquer indemnização, com base nos fundamentos do seu recurso, para, finalmente, considerar que, a assim não ser entendido, é adequado o montante fixado na sentença recorrida.
Vejamos.
Concorda-se em absoluto com o decidido na sentença recorrida relativamente à verificação de todos os requisitos da responsabilidade civil extracontratual do Estado por actos ilícitos de gestão pública relativamente aos danos morais, como resulta do supra decidido, na parte em que foi posta em causa essa verificação, quer no recurso do Estado, quer no que respeita aos danos materiais peticionados pelos AA no seu recurso, pelo que se aceitando também que esses danos assumem uma gravidade que os colocam a coberto da tutela do direito (artigo 496.º, n.º 1 do C. Civil), o que está em causa é apenas o montante desses danos.
De acordo com o estabelecido no n.º 3 do referido artigo 496.º do C. Civil, o montante da indemnização será fixado equitativamente, tendo em atenção as circunstâncias referidas no artigo 494.º, que manda atender ao grau de culpabilidade do agente, à situação económica deste e do lesado e às demais circunstâncias do caso.
Os danos morais sofridos pelos AA pela execução do seu projecto modificado foram: "A reconhecer-se que se tratava de uma ampliação do projecto de arquitectura dos autores, o que está a ser levado a cabo na construção do Palácio da Justiça de Portimão levaria a que os autores beneficiassem na sua vida profissional do respeito e publicitação do seu trabalho inerente a tal obra" – n.º 46 da matéria de facto dada como provada, resultante da resposta ao quesito 29.º e "Com reconhecimento nos seus currículos" – n.º 47 dessa matéria, resultante da resposta ao quesito 30.°.
Só estes podem ser levados em conta, carecendo de relevância outros danos a que os AA se referem nas alegações de recurso.
O aludido reconhecimento devia ter sido feito, como resulta do que acima se decidiu.
E, em face daqueles danos, consideramos que se não apresenta desadequado o montante fixado na sentença recorrida.
Na verdade, o grau de culpa do Réu, que até se apresenta convencido da licitude do seu comportamento, não é de considerar acima do normal na maioria dos casos de ilegalidade.
A situação económica do lesante, tendo em conta que se trata do Estado, não é de considerar de significativa relevância, devendo-se levar em conta uma situação de normalidade. E, quanto à dos lesados, não está apurada, mas não será desiquilibrado admitir, tendo em conta os honorários constantes dos autos e a sua escolha para elaborar projectos da dimensão dos que estão em causa, que terão uma boa situação económica.
Quanto ao projecto em causa, é de reconhecer que respeitava a uma obra de dimensão assinalável, pelo que assinalável seria também, para a sua actividade profissional, o conhecimento público, de que tinham sido os AA que tinham elaborado o seu projecto.
Finalmente, não consideramos de grande relevância o facto do Estado gastar com a elaboração de um projecto novo o montante de 25 000 000$00 (n.º 48 da matéria de facto dada como provada), pois que se desconhece o que efectivamente gastou com as modificações introduzidas no projecto dos AA, bem como quanto lhes pagou pelo projecto inicial, sendo certo que, atentos os honorários que teria de pagar aos AA pela modificação do seu projecto (17.797.992$00 - ponto n.º 26 da matéria de facto dada como provada), teria apenas o ganho de 9.797.952$00, subtraído do que efectivamente gastou com as modificações a que procedeu através dos seus serviços.
Tudo ponderado, entendemos que o montante fixado pelo tribunal a quo se apresenta equilibrado e adequado ao ressarcimento dos danos resultantes da perda do benefício na vida profissional dos AA do respeito e publicitação do seu trabalho inerente a tal obra e do seu não enriquecimento curricular.
Improcedem, assim, as conclusões 2.ª e 3.ª das alegações de recurso dos AA, o que torna inútil conhecer da questão da ampliação do pedido suscitada pelo Réu Estado.
3. DECISÃO
Nesta conformidade, acorda-se em negar provimento a ambos os recursos, confirmando-se a sentença recorrida.
Custas pelos Recorrentes Autores, na proporção do seu decaimento.
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Lisboa, 2 de Dezembro de 2003.
António Madureira – Relator – São Pedro – Rosendo José