Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01420/18.0BEAVR
Data do Acordão:11/21/2019
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ASCENSÃO LOPES
Descritores:REVISTA
MATÉRIA DE FACTO
FALTA
PRESSUPOSTOS
Sumário:I) O erro na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais da causa não pode ser objecto de revista, salvo havendo ofensa de uma disposição expressa de lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou que fixe a força de determinado meio de prova.
II) Mas esta excepção, que permitiria a revista, não é o caso dos autos, onde o que se expressa é uma discordância da recorrente quanto à existência de indícios de uma actuação dolosa que a mesma defende existir a partir de determinadas práticas da recorrida que alega consistiam em através de registos contabilísticos de contratos fictícios alterar os resultados financeiros da sociedade e que conduziram à insuficiência do património, mas que o acórdão recorrido não deu como assente no probatório.
III) Não se mostram pois reunidos os pressupostos do recurso de revista ao abrigo do artº 150º do CPTA.
Nº Convencional:JSTA000P25209
Nº do Documento:SA22019112101420/18
Data de Entrada:10/22/2019
Recorrente:AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Recorrido 1:A......,LDA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam, em conferência, nesta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo

1 – RELATÓRIO

A AT – Autoridade Tributária e Aduaneira, vem nos termos dos artigos 144º e 150.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), interpor para este Supremo Tribunal, recurso de revista, do acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo Norte, no processo nº 1420/18.0BEAVR, no dia 9 de Maio de 2019 que negou provimento ao recurso e manteve a decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro que por sua vez julgou procedente a reclamação intentada por A………., Ldª.

Inconformada com a decisão, vem apresentar alegações formulando as conclusões seguintes:
«a) O acórdão proferido pelo TCA Norte considerou que a AT “não demonstrou, como impõe a norma vertida na última parte do n.º 4 do artigo 52.º da LGT, que a ora recorrida teve uma atuação conducente ao depauperamento da sua situação patrimonial com intenção de provocar uma diminuição das garantias dos credores, ou seja, dolosamente dirigida à dissipação do património.”
b) Considerou não estar demonstrado que os factos colhidos pela inspeção são de suficientes para concluir que a referida insuficiência económica, e consequente insuficiência de bens, se deveu àqueles factos ou à atuação descrita no relatório inspetivo.
c) Não se encontrando na fundamentação da AT qualquer relação de causalidade entre a atuação da contribuinte e a situação de insuficiência patrimonial em que se encontra.
d) Ou seja, o ónus da prova que impendia sobre a AT não se considerou verificado.
e) Entende a Fazenda Publica, em consonância com o parecer do Digníssimo Magistrado do Ministério Público, que a AT demonstrou a existência de fortes indícios de que a atuação da Reclamante levou a uma condição económica debilitada provocando a insuficiência de bens para garantia da dívida exequenda.
f) Assim sendo, cremos que a AT cumpriu o ónus da prova sobre a verificação do requisito em causa para a não concessão da dispensa de prestação de garantia.
g) Decorre da interpretação dos artigos 52.º da LGT e 170.º do CPPT que, para a AT deferir o pedido de dispensa de prestação de garantia é necessário cumprir os seguintes requisitos:
- A prestação de garantia causar prejuízo irreparável ao sujeito passivo;
- Se demonstre a manifesta falta de meios económicos revelada pela insuficiência de bens penhoráveis para o pagamento da dívida exequenda e acrescido;
- E que essa inexistência ou insuficiência não seja imputável a conduta dolosa do executado
h) O acórdão recorrido fez, salvo o devido respeito, uma errada interpretação e aplicação do artigo 52.º, n.º 4 da LGT, conjugado com o artigo 170.º CPPT.
i) Com a recente alteração legislativa introduzida pela LOE de 2017, o órgão de execução fiscal passou a estar incumbido de demonstrar a existência de “fortes indícios de que a insuficiência ou inexistência de bens se deveu a atuação dolosa do interessado”.
j) Assim, é visível, pela letra do referido artigo, que cabe à AT o ónus da prova da atuação dolosa, desonerando-se, portanto, o executado do ónus da prova que sobre ele impendia no regime anterior.
k) Consideramos que a lei circunscreve os moldes para a aplicação dos termos do n.º 4 do artigo 52.º da LGT na existência de indícios de uma atuação dolosa, e não de factos que comprovem tal atuação assim qualificada.
l) Na verdade, na informação de dispensa parcial da garantia são apresentados factos apurados no âmbito da inspeção externa que demonstram uma atuação, por parte da Reclamante, que se pode caracterizar como indiciariamente dolosa.
m) Verificamos que a sociedade participava ativamente em negócios dissimulados, por via de contratos fictícios, e adulterando de tal forma os seus registos contabilísticos que tornariam inviável uma prossecução da sua atividade de forma consentânea com o respetivo objeto social, incorrendo em obrigações pecuniárias a nível fiscal que sabia não conseguir satisfazer, como veio a acontecer.
n) Desta forma, através da análise do Relatório da Inspeção (Ordens de Serviço n.ºs OI201600774, OI201600755 e OI201602243), facilmente encontramos os aludidos indícios, que mostram a intenção dolosa, por parte do gerente, em alterar os resultados financeiros da sociedade e que conduziram à insuficiência do património.
o) Assim, a AT demonstrou que tais práticas podem constituir fortes indícios de que a insuficiência do património se deveu a atuação dolosa da interessada, pois sem esse tipo de conduta, os valores arrecadados com as vendas efetivas das viaturas teriam dado entrada na empresa, e integrando o seu património e/ou lucro, daria uma liquidez suscetível de regularizar atempadamente os impostos respetivos ou mesmo que assim não fosse, poderia possuir património suficiente para a prestação de garantia.
p) Factos estes que, segundo consta no relatório inspetivo, poderão configurar o crime de burla, previsto no artigo 217.º do Código Penal, assim como o crime de fraude fiscal previsto e punido pelo artigo 103.º do Regime Geral das Infrações Tributárias.
q) Considerando o tribunal a quo que não é de aceitar os indícios de crimes de fraude fiscal para a atuação dolosa na insuficiência de património, devemos perguntar-nos então, quais seriam os indícios que poderiam aceitar-se?
r) Temos de recorrer ao conceito de indícios suficientes para depois considerar se a prova recolhida pela AT foi considerada como válida para o cumprimento do ónus da prova.
s) O Tribunal da Relação de Coimbra já se pronunciou quanto ao mesmo e considerou como sejam indícios suficientes os elementos que, relacionados e conjugados, persuadem da culpabilidade do agente, fazendo nascer a convicção de que virá a ser condenado.
t) Como sejam indícios os vestígios, suspeitas, presunções, sinais, indicações, suficientes e bastantes para convencer de que há uma qualquer “realidade” e de que alguém determinado é o responsável, de forma que, logicamente relacionados e conjugados formem um todo persuasivo da culpabilidade.
u) De acordo com vertido no anterior ponto, entendemos que a AT relacionou todos os “vestígios” do seu conhecimento, conjugando-os entre si por forma a considerar que a atuação do sujeito passivo ao longo dos anos em análise levou à insuficiência ou inexistência de bens.
v) Consideramos que neste conceito não está em causa a culpa do gerente na insuficiência de bens da sociedade devedora originária, para efeitos de uma reversão, mas apenas a recolha de indícios fortes de que a insuficiência ou inexistência de bens se deveu a atuação dolosa do requerente.
w) Mais recentemente temos o acórdão proferido em 03 de agosto de 2018, processo n.º 00268/18.6BEAVR, onde refere que “A recolha dos (fortes) indícios não é equivalente à prova da existência dos factos indiciados, nem configura uma acusação criminal ao contrário do que sugere o Recorrido. Não é de factos provados, mas sim de indícios que fala a lei. E estes são os factos a partir dos “quais se procurará extrair, com o auxílio das regras de experiência comum, da ciência ou da técnica, uma ilação quanto aos factos indiciados. A conclusão ou prova não se obtém directamente, mas indirectamente, através de um juízo de relacionação normal entre o indício e o tema de prova” – cfr. Alberto Xavier, “Conceito e Natureza do Acto Tributário”, pág. 154; também neste sentido, entre outros, o acórdão do TCAN, de 26/04/12 (processo nº 00964/06.0BEPRT)”.
x) Torna-se importante responder à seguinte questão: quais os documentos, informações ou outros elementos que possam ser considerados suficientes e válidos como prova para que a AT cumpra o ónus da prova que impende sobre si na que diz respeito aos fortes indícios de que a insuficiência ou inexistência de bens se deveu à sua atuação dolosa?
y) Entendemos que o ónus da prova se bastará com a reunião de elementos que configurem ou potenciem indícios de que a atuação do sujeito passivo tornou o cumprimento das obrigações fiscal impossível, impossibilitando a apresentação de garantias às dívidas tributárias.
z) Para a concretização deste ónus, a AT recolheu uma série de fortes indícios relativos à gestão patrimonial e financeira da reclamante que indiciam da sua responsabilidade pela insuficiência patrimonial para satisfazer esse pagamento.
aa) A questão aqui em análise é suscetível de repetição em inúmeros casos, tendo em consideração que o ónus da prova impõe à AT uma análise constante de pedido de dispensa de garantia e a verificação da atuação dolosa na inexistência ou insuficiência de património.
bb) Esta questão jurídica em si, pela sua relevância jurídica ou social, mas também, pelo facto de se mostrar bastante pertinente decisão sobre a matéria, sendo necessária a intervenção desse STA, a fim de ser julgada, definitivamente e de forma uniforme, em julgamento ampliado de revista.
Termos pelos quais e, com o douto suprimento de V. Exas., deve ser admitido o presente recurso de revista e, analisando do mérito do recurso, deve ser dado provimento ao mesmo, revogando-se o douto acórdão recorrido, com todas as legais consequências.»

A recorrida, A…………, Ld.ª não apresentou contra alegações.

O Ministério Público emitiu parecer, sendo que atenta a sua extensão se apresenta por súmula:
«1. O presente recurso de REVISTA vem interposto ao abrigo do disposto no artigo 150º do CPTA, com base na necessidade de uma melhor aplicação do direito e da intervenção do STA como órgão de cúpula, em ordem a uma aplicação uniforme do direito.
Para tanto alega a Recorrente FP que «A questão que se pretende ver melhor analisada pelo tribunal “ad quem” no presente recurso de revista é, pois, a de saber como se concretiza o ónus de prova que impende sobre a AT para a demonstração dos “fortes indícios de que a insuficiência ou inexistência de bens se deveu a atuação dolosa do interessado.”
Mais se invoca que «….A questão em análise, mostra-se tratada pelo TCA Norte, em sentido contrário ao sufragado na decisão recorrida, como se pode ver pela análise do acórdão proferido em 03 de agosto de 2018, processo n.º 00268/18.6BEAVR».
Mais se invoca que o acórdão recorrido fez uma errada interpretação e aplicação do disposto no artigo 52º, nº4, da LGT, em conjugação com o disposto no artigo 170º do CPPT.
Para tanto alega que «através da análise do Relatório da Inspeção (Ordens de Serviço n.ºs OI201600774, OI201600755 e OI201602243), facilmente encontramos os aludidos indícios, que mostram a intenção dolosa, por parte do gerente, em alterar os resultados financeiros da sociedade e que conduziram à insuficiência do património», pois a «sociedade participava ativamente em negócios dissimulados, por via de contratos fictícios, e adulterando de tal forma os seus registos contabilísticos que tornariam inviável uma prossecução da sua atividade de forma consentânea com o respetivo objeto social, incorrendo em obrigações pecuniárias a nível fiscal que sabia não conseguir satisfazer, como veio a acontecer» (alíneas m) e n) das conclusões do recurso).
Conclui, assim, que a AT satisfez o ónus probatório relativo à atuação dolosa da executada causadora da insuficiência ou inexistência de bens subjacente ao pedido de dispensa de garantia.
E termina pedindo a revogação do acórdão recorrido.
2. Nos termos do art. 150º, nº1, do CPTA, das decisões proferidas em 2ª instância pelo Tribunal Central Administrativo pode haver, excecionalmente, recurso de revista para o Supremo Tribunal Administrativo, "quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental" ou "quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito".
(…)
1 No acórdão recorrido, a questão decidenda foi enunciado nos seguintes termos:
«A única questão que cumpre apreciar e decidir é a de saber se a sentença recorrida enferma de erro de julgamento ao ter concluído que a factualidade alegada pela entidade administrativa é manifestamente insuficiente para que se dê como verificada a existência de fortes indícios de que a insuficiência de bens se deveu a actuação dolosa da executada (cf. artigo 52º, n°4, parte final da LGT), e, nesse pressuposto, ter decidido pela procedência da reclamação judicial, anulando o despacho da Directora Adjunta da Finanças de Aveiro, proferido em 22 de Outubro de 2018, que indeferiu o pedido de dispensa (parcial) de prestação da garantia formulado pela executada/reclamante».
Tendo o TCA Norte concluído pela inexistência desse erro de julgamento ao considerar que:
«O nexo de causalidade, elemento essencial em qualquer tipo de responsabilidade civil, é que nos permite estabelecer a relação entre a conduta e o resultado, sendo através dele que podemos verificar de que modo a conduta da executada se repercutiu na situação de insuficiência de bens. E naturalmente que o nexo de causalidade só pode estabelecer-se por referência à data em que se pretende a dispensa de prestação da garantia. Só que da factualidade alegada pela administração tributária nenhuma consta que demonstre, ainda que indiciariamente, a verificação desse nexo causal entre a conduta imputada ao contribuinte/executada e a situação de insuficiência do património social, nomeadamente nada consta sobre a situação patrimonial da empresa nos anos em causa no RIT e a existente na data do pedido da dispensa da prestação de garantia e se houve (ou não) alteração da mesma, e qual, entre essas datas».
E nessa medida confirmado o julgamento da 1ª instância, no sentido da “falta de demonstração por parte da administração tributária (sobre quem recai o ónus da prova) do pressuposto previsto na última parte do nº4 do artigo 52º da LGT”.
2.2 Da exposição dos fundamentos do recurso apresentados pela Recorrente e dos fundamentos subjacentes ao julgamento efetuado no acórdão recorrido resulta que a divergência da Recorrente com as instâncias respeita à questão de saber se existem ou não “fortes indícios” de que a insuficiência ou inexistência de bens invocada no pedido de dispensa de prestação de garantia por parte da executada, se deve a “atuação dolosa do interessado” e que nos termos do segmento final do nº4 do artigo 52º da LGT afasta a possibilidade de dispensa da prestação de garantia.
Para a Recorrente está suficientemente indiciada que essa situação de insuficiência patrimonial da executada tem a sua origem nas diversas irregularidades e omissão de proveitos detetados em ação inspetiva e objeto de relatório por parte dos Serviços de Inspeção; Já para as instâncias, não ficou demonstrada a relevância ou repercussão dos factos relatados na ação inspetiva no património da executada em termos de concluir que tenham sido essas irregularidades e omissões contabilísticas a causa da situação de insuficiência patrimonial à data do pedido de dispensa parcial de garantia.
2.3 Ora, do confronto da argumentação aduzida em sede de alegações de recurso e no acórdão recorrido não se vislumbra a invocada necessidade de intervenção do STA, como órgão de cúpula, em vista de uma melhor aplicação do direito. Com efeito e desde logo não se alcança, nem a Recorrente o demonstra, qual a divergência de direito entre o acórdão recorrido e o acórdão do mesmo TCA de 03/08/2008, proferido no proc. nº 00268/18.6BEAVR, que mereça a intervenção uniformizadora do direito por parte do STA. Por outro lado é patente que a divergência da Recorrente com o acórdão recorrido assenta na relevância que a mesma atribui às irregularidades e omissões na contabilidade da executada identificadas no relatório de inspeção como causa da sua situação de insuficiência patrimonial para fazer face à prestação de garantia exigível para efeitos de suspensão da execução fiscal. Ora, essa divergência assenta essencialmente em juízos de facto e de valor sobre as consequências dessas operações na atual situação patrimonial da empresa, os quais não são passiveis de apreciação em sede de recurso de revista, como decorre do nº4 do artigo 150º do CPTA supra transcrito, sendo certo que essa divergência não tem subjacente qualquer “ofensa de uma disposição expressa de lei que exija certa espécie de prova par a existência do facto ou que fixe a força de determinado meio de prova”.
Por outro lado não se deteta na fundamentação aduzida no acórdão recorrido, na apreciação que fez da questão em análise ou da sua abordagem, qualquer erro que reclame a intervenção excecional do STA em vista de uma boa administração da justiça.
Afigura-se-nos, assim, que não se mostram reunidos os requisitos de admissão do recurso de revista.»

Colhidos os vistos legais, cumpre proceder à apreciação liminar sumária a que se refere o nº5 do artigo 150.º do CPTA.
2- Fundamentação de facto

O Acórdão do Tribunal Administrativo Norte deu como assente a seguinte matéria de facto:
1. O serviço de finanças de Vagos instaurou contra a Reclamante o processo de execução fiscal n.°0183201801005413, ao qual foram apensos os processos, também instaurados contra a Reclamante, 0183201801005421, 0183201801005430, 0183201801005448, 0183201801005456, 0183201801005464, 0183201801005472, 0183201801005480, 0183201801005499, 0183201801005502, 0183201801005537, 0183201801005545, 0183201801005553 0183201801005561, 0183201801005570, 0183201801005600, 0183201801005618, 0183201801005642, 0183201801005685, 0183201801005715, 0183201801005723, 0183201801005758, 0183201801005766, 0183201801005790, 0183201801005804, 0183201801005839, 0183201801005847, 0183201801005871, 0183201801005880, 0183201801005910, 0183201801005944, 0183201801005979, 0183201801005987 dívidas, no montante total de € 674.094,49, provenientes de IVA referente a períodos entre 2013 e 2015 - cfr. documentos, que se dão por integralmente reproduzidos, a fls. 137 a 140 e 378 a 653 do SITAF;
2. A Reclamante apresentou impugnação judicial, tendo por objeto as dívidas em cobrança nos processos de execução fiscal referidos no ponto anterior, a qual segue os seus termos sob o n.º 541/18.18.3BEAVR - cfr. teor da informação a fis. 229 a 231 do SITAF;
3. A Reclamante, visando a suspensão dos processos de execução fiscal referidos no ponto 1, dirigiu ao Chefe do serviço de finanças de Vagos um pedido de dispensa total ou parcial de prestação de garantia, oferecendo como garantia veículos automóveis pertencentes à própria Reclamante, bem como um imóvel e um veículo automóvel, ambos propriedade do sócio gerente, e invocando que:
“[...] não tem condições de prestar qualquer outro tipo de garantia.
[...] consultou o seu Banco para uma possível garantia bancária, o que lhe foi liminarmente recusado.
[...] Não possui quaisquer outros rendimentos, ou é detentor de qualquer património susceptível de oferecer como garantia ou penhora.
[...] não tem culpa na falta de meios para prestação de garantia sobre o montante dado à execução, pois não desbaratou nem onerou património [...]“ — cfr. documento, que se dá por integralmente reproduzido, a fls. 214 a 215 do SITAF;
4. Ao requerimento referido no ponto anterior, a Reclamante juntou um documento emitida pela Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de Vagos, CRL, mediante a qual esta entidade bancária comunica o indeferimento da concessão da garantia solicitada — cfr. documento, que se dá por integralmente reproduzido, a fls. 217 do SITAF;
5. O montante da garantia a prestar para suspensão dos processos de execução é de € 870.530,84 — cfr. teor da informação a fls. 281 a 284 do SITAF;
6. O serviço de finanças de Vagos efetuou a penhora de 11 veículos que se encontram registados em nome da Reclamante e atribuiu-lhes o valor global de € 264.868,79 — cfr. teor da informação a fls. 214 a 216 do SITAF;
7. Em 09.10.2018, o serviço de finanças de Vagos elaborou um parecer no sentido de estarem reunidas as condições para a concessão da dispensa de prestação de garantia e no qual é indicado que:
“[...] Pela consulta aos elementos existentes neste serviço de Finanças, verifica-se que em nome da executada não existem quaisquer bens imóveis.
Relativamente aos veículos automóveis, foram efetuadas penhoras de todos os que se encontravam na titularidade da requerente [...].
[...] Pelos elementos conhecidos neste serviço, não existem indícios de que [...] a insuficiência de bens decorra de actuação dolosa do interessado, desconhecendo este serviço o relatório de inspeção que se encontra na origem dos processos de execução fiscal […]” - cfr. documento, que se dá por integralmente reproduzido, a fls. 214 a 216 do SITAF;
8. Em 18.10.2018, foi elaborada informação na Direção de Finanças de Aveiro, da qual consta, além do mais, o seguinte:
O SF efetuou diligências no sentido de averiguar a existência ou não de bens penhoráveis.
Constatou por consulta às aplicações informáticas, nomeadamente o SIPE que:
- As viaturas conhecidas à executada foram todas penhoradas, que no seu total não valerão mais do que 264.868,79 [...].
- Não possui imóveis ou embarcações.
- Existem indícios de valores penhoráveis em entidades bancárias.
- Relativamente aos bens do seu sócio gerente, apurou o Serviço de Finanças, que os mesmos se encontram onerados.
[...] da leitura do [...] relatório [de inspeção] o qual é do conhecimento da executada, julgamos estar devidamente demonstrado que a requerente, no exercício da sua atividade comercial, atuou utilizando diversos procedimentos, nomeadamente, ocultação de transações/vendas e recebimentos, o que levou à dissipação do património empresarial e à irregularidade na entrega do imposto devido ao estado. Nesse sentido, pode dizer-se que tais práticas constituem fortes indícios de que a insuficiência do património se deveu a atuação dolosa da interessada.
Sem esse tipo de conduta, os valores arrecadados com as vendas efetivas das viaturas teriam dado entrada na empresa, integrando o seu património/lucro, o que lhe daria uma liquidez suscetível de regularizar atempadamente os impostos respetivos ou, pelo menos, assegurar a existência de património suficiente ou capacidade de prestação de garantia
Pelo anteriormente descrito, tendo em consideração o comportamento da executada e da sua gerência, o pedido de dispensa total ou parcial de isenção de prestação de garantia, deverá ser indeferido. [...]” — cfr. documento, que se dá por integralmente reproduzido, a fls. 281 a 284 do SITAF;
9. Do referido Relatório de Inspeção referido no ponto anterior consta, além do mais, o seguinte:
“[...] Constata-se, da análise ao quadro 1-B, um aumento do valor dos inventários, desde 2012 até 2014, para mais do dobro, tendo descido em 2015, para quase metade do valor do ano anterior.
Da análise efetuada, averiguou-se que o aumento exponencial do valor do inventário se ficou a dever á venda de viaturas sem a emissão da respetiva fatura, nos anos de 2012 a 2014. Assim, com o objetivo de proceder ao acerto do inventário, em janeiro de 2015 o sujeito passivo procedeu à faturação das viaturas alienadas nos anteriores sem a emissão da respetiva fatura, o que justifica a descida do valor dos inventários no ano de 2015. Pese embora tal facto, [...] foram identificadas outras viaturas vendidas por este sujeito passivo sem a emissão da correspondente fatura.
[...] a margem bruta sobre as vendas que é já muito baixa, apresenta um decréscimo de quase um ponto percentual, sendo este um dos motivos que esteve na origem do procedimento inspetivo.
Conforme se demonstrará adiante, este indicador está longe de refletir as margens de comercialização efetivamente praticadas, uma vez que o expediente utilizado para realizar, poupança fiscal “consistiu essencialmente em suportar as compras de viaturas com documentos que não refletem os efetivos custos e contornos dos negócios realizados, com implicações ainda mais gravosas no regime do IVA.
[...] conforme se demonstrará adiante, os recursos gerados pela atividade são muito superiores aos evidenciados pelas demonstrações financeiras, daí as entradas de fluxos financeiros via, passivo “que mais não serão do que parte dos proventos efetivamente realizados com a atividade, e que permitem financiar, entre outros, o nível de stock de viaturas (sempre superior a 1 milhão de euros). A que será de adicionar o saldo de fornecedores, uma vez que, sendo as aquisições pagas maioritariamente a pronto, o saldo evidenciado por esta rubrica também não será efetivo.
[...] na análise aos documentos contabilísticos do sujeito passivo, às informações das declarações aduaneiras de veículos e às informações e documentos remetidos pelas autoridades fiscais francesas e alemãs, no âmbito da colaboração administrativa intracomunitária, verificaram-se as seguintes situações:
• Desconformidade entre os efetivos fornecedores das viaturas e os indicados nos documentos de suporte às compras registadas na contabilidade do sujeito passivo (que na sua maioria são declarações de venda de particulares);
• Desconformidade no preço de compra das viaturas constante dos documentos remetidos pelas autoridades fiscais francesas e alemãs que, regra geral, é inferior ao constante dos documentos de suporte às compras registadas na contabilidade, e cuja diferença ronda os € 5.000,00 por viatura;
• Desconformidade no número de quilómetros das viaturas constante dos documentos remetidos pelas autoridades fiscais francesas e alemãs que, regra geral, são inferiores nos documentos existentes na contabilidade do sujeito passivo, os quais serviram de base à legalização das mesmas junto das entidades oficiais, e cuja diferença ronda os 100.000 km por viatura;
• Desconformidade no regime de IVA aplicável, uma vez que na contabilidade do sujeito passivo, as compras foram consideradas como tendo sido efetuadas a particulares ou pelo regime especial da margem, quando efetivamente se tratam de aquisições intracomunitárias efetuadas pelo regime normal das transações intracomunitárias de bens. Este expediente destinou-se, entre outros, a “legitimar” a liquidação do IVA apenas sobre a margem de comercialização em vez de incidir sobre o valor total de venda posterior da viatura, originando enorme perda de receita fiscal, mormente em sede de IVA.
Da análise efetuada, concluiu-se que a maioria dos documentos de suporte às compras de viaturas usadas no mercado intracomunitário, registadas na contabilidade da A……… Lda., os quais serviram de base à legalização das mesmas em Portugal, se tratavam de documentos forjados, com o objetivo de fuga aos impostos mas também na obtenção de vantagens financeiras aquando da venda dos veículos, fazendo crer aos futuros adquirentes que as viaturas tinham um valor de mercado superior ao seu valor real.
Detetaram-se, assim, indícios claros de fuga aos impostos por parte do sujeito passivo, e atendendo aos presumíveis valores de fuga em sede de IRC e IVA, tal prática configura o crime de fraude fiscal, previsto no artigo 103.º do RGIT.
Para além disso, os indícios da adulteração da quilometragem detetados nos veículos adquiridos no mercado intracomunitário, por parte da empresa A……, Lda., poderão configurar ainda o crime de burla, previsto no artigo 217.º do Código Penal.
[...] comparando as faturas de venda emitidas pela ………. e as declarações de venda constantes da contabilidade da A…….., verificou-se que o preço de venda da viatura constante da declaração de venda é sempre superior ao valor de venda constante da fatura emitida pela ……….., havendo também divergência no n.º de quilómetros da viatura.
De acordo com os processos de legalização das viaturas em Portugal, verificou-se que a mesma foi efetuada com base nas já referidas, “Déclaration de Cession D’un Véhicule”, aparentemente falsas.
[...] Ora, tendo em conta tudo o já exposto, designadamente o facto de a maior parte das declarações de venda de particulares se encontrarem preenchidas manualmente, com o mesmo tipo de letra (o que indicia terem sido preenchidas pela mesma pessoa), a existência na contabilidade de declarações de venda de viaturas por supostos particulares que afinal foram adquiridas pelo sujeito passivo ou outras entidades portuguesas a empresas francesas, verifica-se agora, pelas informações enviadas pelas autoridades francesas, relativas aos proprietários das viaturas constantes das bases de dados do registo automóvel, que na maior parte dos casos o último proprietário em França não coincide com o vendedor constante da declaração de venda existente na contabilidade do sujeito passivo.
Para além da não conformidade entre os vendedores das viaturas constantes das declarações de venda existentes na contabilidade e os últimos proprietários registados em França, existe também divergências nas datas de venda. [...].
Conclui-se, assim, que apesar de notificado para o efeito, o sujeito passivo não apresentou documentos comprovativos do pagamento das aquisições de viaturas no estrangeiro, uma vez que o numerário não cumpre tal desiderato. Também não apresentou outros elementos que comprovem a efetiva aquisição aos reais fornecedores e pelos custos efetivamente suportados, não conseguindo assim, contrariar as conclusões no sentido da falta de aderência à realidade da maior parte das faturas e outros documentos de suporte à aquisição de viaturas existentes na sua contabilidade. [...] Portanto, conforme descrição dos factos anteriormente apresentada, tendo-se apurado fortes indícios de que grande parte dos documentos que serviram de base ao registo das compras daquelas viaturas não titulam as reais operações efetuadas, e não tendo o sujeito passivo, mesmo depois de notificado para o efeito, comprovado de forma inequívoca o contrário, os gastos suportados com a aquisição das referidas viaturas não poderão ser aceites fiscalmente, nos termos dos artigos referidos. [...] Conforme exposto, foram recolhidos fortes indícios de que muitas das Notas de Aquisição que suportam os registos contabilísticos das compras de viaturas usadas em território nacional não refletem o negócio realizado, quer quanto ao valor, quer em alguns casos quanto aos intervenientes (vendedores), tendo as mesmas sido preenchidas pelo Sr. A……… sem conhecimento do suposto vendedor, tendo procedido igualmente à falsificação da assinatura constante das mesmas. O objetivo desta prática é o de ocultar o real negócio efetuado, evitando a ligação da venda de uma viatura à retoma, de forma a poder alterar quer o valor de venda declarado da nova viatura, quer o valor atribuído à retoma.
[...] Durante o procedimento inspetivo foram detetadas diversas situações de ocultação de vendas de viaturas (e respetivas compras), o que constitui infração ao artigo 20.°, n.º 1 do CIRC.
Tais situações foram detetadas maioritariamente na análise às respostas recebidas dos anteriores proprietários de viaturas adquiridas pelo sujeito passivo, os quais vieram referir que deram determinada viatura como retoma na compra de outra viatura, relativamente à qual não existe qualquer registo na contabilidade da empresa A…………………
[...] o sujeito passivo praticou as seguintes infrações:
- Adulterou documentos de compras de viaturas, efetuadas quer no mercado intracomunitário, quer no mercado nacional, com o objetivo de sobreavaliar os valores reais de aquisição, aumentando assim os custos das mercadorias vendidas, e reduzindo, consequentemente as margens de comercialização obtidas na venda das viaturas [...];
- Deduziu, para efeitos de determinação do lucro tributável, despesas não documentadas [...];
- Deduziu, para efeitos de determinação do lucro tributável, despesas suportadas por documentos que não cumprem os requisitos de dedutibilidade fiscal [...];
- Omitiu rendimentos, quer através da manipulação das vendas declaradas, faturando viaturas por valor inferior ao valor real do negócio, quer através da não faturação de viaturas por si vendidas
- Aplicou indevidamente o regime especial dos bens em 2 mão na transmissão de viaturas
- Não procedeu à liquidação de IVA relativo a vendas de viaturas omitidas na contabilidade [...];
- Deduziu IVA relativo a aquisição de serviços de construção civil, IVA mencionado indevidamente pelo prestador dos serviços nas faturas por si emitidas [...].verificaram-se situações que nos levaram a concluir que a maioria dos documentos de suporte às compras de viaturas usadas no mercado intracomunitário, registadas na contabilidade da A………. Lda, e que serviram de base à legalização das mesmas em Portugal, se tratavam de documentos forjados, com o objetivo de fuga aos impostos.
Para além disso, detetaram-se, também, indícios claros da adulteração da quilometragem dos veículos adquiridos no mercado intracomunitário, por parte da empresa A………, Lda., com o objetivo da obtenção de vantagens financeiras aquando da venda dos veículos, fazendo crer aos adquirentes que as viaturas tinham um valor de mercado superior ao seu valor real, o que poderá configurar ainda o crime de burla [...].
Detetaram-se, assim, indícios claros de fuga aos impostos por parte do sujeito passivo, e atendendo aos valores de fuga em sede de IRC e IVA, tal prática configura o crime de fraude fiscal [...]. Assim, foi feita participação ao Ministério Público, nos termos do artigo 35º do RGIL por indícios da prática de fraude fiscal na aquisição de viaturas usadas no mercado intracomunitário.
Na sequência, foi instaurado no Departamento de Investigação e Ação Penal (DIAP) de Aveiro, o Processo de Inquérito n.º 98/17.2T9AVR, para apuramento dos factos [...]. - cfr. documento, que se dá por integralmente reproduzido, a fls. 49 a 111 e 114 a 133 do SITAF;
10. Por despacho de 22. 10.201$, proferido sob a informação referida no ponto 8, foi decidido não autorizar a dispensa de prestação de garantia — cfr. fls. 280 do SITAF;
11. Para comunicação da decisão referida no ponto anterior, foi remetido à Reclamante um ofício por correio registo com aviso de receção, o qual foi assinado em 26.10.2018 — cfr. documentos a fls. 279 e 285 do SITAF;
12. Em 02.11.2018, a Reclamante apresentou a petição inicial da presente reclamação — cfr. averbamento a fls. 8 do SITAF.

Vejamos se no caso se verificam os pressupostos do recurso de revista previsto no artigo 150°, n° 1 do CPTA.
Dispõe este preceito sob a epígrafe “Recurso de Revista”:
1 – Das decisões proferidas em segunda instância pelo Tribunal Central Administrativo pode haver, excepcionalmente, revista para o Supremo Tribunal Administrativo quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental ou quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito.
2 – A revista só pode ter como fundamento a violação de lei substantiva ou processual.
3 – Aos factos materiais fixados pelo tribunal recorrido, o tribunal de revista aplica definitivamente o regime jurídico que julgue mais adequado.
4 – O erro na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais da causa não pode ser objecto de revista, salvo havendo ofensa de uma disposição expressa de lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou que fixe a força de determinado meio de prova.
5 – A decisão quanto à questão de saber se, no caso concreto, se preenchem os pressupostos do n.º 1 compete ao Supremo Tribunal Administrativo, devendo ser objecto de apreciação preliminar sumária, a cargo de uma formação constituída por três juízes de entre os mais antigos da secção de contencioso administrativo.

Decorre expressa e inequivocamente do n.º 1 deste artigo a excepcionalidade do recurso de revista em apreço, sendo a sua admissibilidade condicionada não por critérios quantitativos mas por um critério qualitativo – o de que em causa esteja a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental ou quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito – devendo este recurso funcionar como uma válvula de segurança do sistema e não como uma instância generalizada de recurso.
E, na interpretação dos conceitos a que o legislador recorre na definição do critério qualitativo de admissibilidade deste recurso, constitui jurisprudência pacífica deste Supremo Tribunal Administrativo - cfr., por todos, o Acórdão deste STA de 2 de abril de 2014, rec. n.º 1853/13 -, que «(…) o preenchimento do conceito indeterminado de relevância jurídica fundamental verificar-se-á, designadamente, quando a questão a apreciar seja de elevada complexidade ou, pelo menos, de complexidade jurídica superior ao comum, seja por força da dificuldade das operações exegéticas a efectuar, de um enquadramento normativo especialmente intricado ou da necessidade de concatenação de diversos regimes legais e institutos jurídicos, ou quando o tratamento da matéria tem suscitado dúvidas sérias quer ao nível da jurisprudência quer ao nível da doutrina. Já relevância social fundamental verificar-se-á quando a situação apresente contornos indiciadores de que a solução pode constituir uma orientação para a apreciação de outros casos, ou quando esteja em causa questão que revele especial capacidade de repercussão social, em que a utilidade da decisão extravasa os limites do caso concreto das partes envolvidas no litígio. Por outro lado, a clara necessidade da admissão da revista para melhor aplicação do direito há-de resultar da possibilidade de repetição num número indeterminado de casos futuros e consequente necessidade de garantir a uniformização do direito em matérias importantes tratadas pelas instâncias de forma pouco consistente ou contraditória - nomeadamente por se verificar a divisão de correntes jurisprudenciais ou doutrinais e se ter gerado incerteza e instabilidade na sua resolução a impor a intervenção do órgão de cúpula da justiça administrativa e tributária como condição para dissipar dúvidas – ou por as instâncias terem tratado a matéria de forma ostensivamente errada ou juridicamente insustentável, sendo objectivamente útil a intervenção do STA na qualidade de órgão de regulação do sistema.».
No caso dos autos, considera-se que a recorrente não obstante o intentar, não logra demonstrar, na sua alegação, a verificação dos pressupostos do recurso excepcional de revista.
Mas vejamos melhor:
Como se destaca no parecer do Mº Pº, supra destacado, e que aqui voltamos a citar, por merecer a nossa inteira concordância “(…) é patente que a divergência da Recorrente com o acórdão recorrido assenta na relevância que a mesma atribui às irregularidades e omissões na contabilidade da executada identificadas no relatório de inspeção como causa da sua situação de insuficiência patrimonial para fazer face à prestação de garantia exigível para efeitos de suspensão da execução fiscal. Ora, essa divergência assenta essencialmente em juízos de facto e de valor sobre as consequências dessas operações na atual situação patrimonial da empresa, os quais não são passiveis de apreciação em sede de recurso de revista, como decorre do nº4 do artigo 150º do CPTA supra transcrito, sendo certo que essa divergência não tem subjacente qualquer “ofensa de uma disposição expressa de lei que exija certa espécie de prova par a existência do facto ou que fixe a força de determinado meio de prova(..)”

Para a recorrente o tribunal recorrido fez errada interpretação do disposto no artº 52º nº 4 da LGT conjugado com o artº 170º do CPPT e a aventada questão de saber como se concretiza o ónus de prova que impende sobre a AT para a demonstração dos “fortes indícios de que a insuficiência ou inexistência de bens se deveu a actuação dolosa do interessado”, não tem a relevância para poder ser apreciada neste STA uma vez que por um lado a lei estabelece o valor probatório dos vários meios de prova e daí que para salvaguarda de qualquer erro na sua apreciação, a prova possa ser reapreciada na segunda instância, mas nunca neste STA que só julga em sede de revista. E daí que os acórdãos desta formação de apreciação preliminar dos recursos de revista tenha vindo sistematicamente a expressar que por disposição expressa da lei – cfr. o n.º 4 do artigo 150.º do CPTA – o erro na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais da causa não pode ser objecto de revista, salvo havendo ofensa de uma disposição expressa de lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou que fixe a força de determinado meio de prova, o que não é o caso dos autos onde o que se expressa é uma discordância da recorrente quanto existência de indícios de uma actuação dolosa que a mesma defende existir a partir de determinadas práticas da recorrida que alega consistiam em através de registos contabilísticos de contratos fictícios alterar os resultados financeiros da sociedade e que conduziram à insuficiência do património, mas que o acórdão recorrido não deu como assente no probatório. Ora o que o Tribunal recorrido fez foi uma apreciação casuística dos elementos de prova contidos no processo. designadamente os aportados pela ora recorrente tendo concluído, no caso em concreto e a final, pela não verificação desses fortes indícios, retirando depois as consequências jurídicas daí decorrentes.
Assim sendo não nos é submetida questão que pela sua relevância jurídica ou social tenha importância fundamental ou a sua admissão seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito, sendo certo que a mera discordância quanto ao decidido, não pode levar à admissão da revista pois que esta só pode ter por fundamento a violação da lei substantiva ou processual, não se evidenciando de forma absolutamente patente essa violação da interpretação ora questionada
Acresce que esta referência ou dissidência interpretativa do supra referido preceito da LGT, (artigos 52.º nº 4 da LGT em correspondência com o artº 170.º do CPPT) que a ora recorrente pretendia ver revista por este STA também não se afigura, de forma manifesta, de especial complexidade ou relevo ou como tendo sido decidida de forma ostensivamente errada ou juridicamente insustentável, que justifique a revista por esta formação de Juízes do STA funcionando como um duplo grau de jurisdição. Assim, em concordância com o parecer supra destacado do Sr. Procurador Geral Adjunto, neste STA, cuja fundamentação para aqui se aporta, o recurso não será admitido, dada a não verificação dos respectivos pressupostos legais.

4- Decisão:
Pelo exposto, acorda-se em não admitir o presente recurso, por se julgar não estarem preenchidos os pressupostos do recurso de revista excepcional previstos no n.º 1 do artigo 150.º do CPTA.

Custas pela recorrente.

Lisboa, 21 de Novembro de 2019. - Ascensão Lopes (relator) - Isabel Marques da Silva - Francisco Rothes.