Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0473/13
Data do Acordão:02/21/2018
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ANA PAULA LOBO
Descritores:CUSTOS
PRESTAÇÕES SUPLEMENTARES
SOCIEDADE GESTORA DE PARTICIPAÇÕES SOCIAIS
Sumário:I - Enquanto que a realização do capital social é obrigatória, as prestações suplementares têm carácter facultativo e dependem de expressa deliberação dos sócios, sendo também nesta medida clara a diferenciação entre as prestações suplementares e a obrigação de entradas para o capital social, como decorre, entre outros dos artigos 25.º a 30.º, 176.º n.º 1, al. a), 178.º e 179.º; 202.º a 208.º, 277.º e 285.º e 286.º do CSC.
II - Assim, constituindo quer o capital social quer as prestações suplementares contribuições dos sócios para o reforço do património da sociedade, estamos face a obrigações intrinsecamente distintas.
III - Mas, insere-se na capacidade e escopo lucrativo uma dada actividade quer efetue um aumento de capital (art. 25.º do CSC), prestações suplementares ou acessórias sem juros (art. 210 e 287.º do CSC) ou suprimentos sem juros (art. 243.º do CSC)?
IV - A A’…….. tem, também, como objecto a gestão de participações sociais, e, no estreito limite desse objecto social, para fomentar a concentração de empresas, entendeu o legislador conceder-lhe certos benefícios fiscais.
V - Ao decidir efectuar participações acessórias de capital a algumas das empresas participadas sem delas receber quaisquer juros e, para fazer esses financiamentos contraiu empréstimos onerosos junto de instituições financeiras, os encargos financeiros suportados por estes empréstimos estão conexionados com a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora da empresa participante que contraiu os empréstimos e pagou os encargos financeiros correspondentes.
VI - A gestão de participações sociais ocorre pela influência que os direitos de voto que a A’……… detenha na sociedade participada, a exercer em assembleia geral, influenciando as decisões de gestão da participada, pela aquisição de mais acções da sociedade participada, pela deliberação de aumento do seu capital social com o inerente incremento da capacidade de investimento, ou pelo reforço do capital próprio da participada, aumento das disponibilidades de tesouraria, entre outros. Sendo certo que a A’……….é um sócio da sociedade participada e a ela pode efectuar prestações suplementares, caso preencha os requisitos legais, a decisão de efectuar a prestação suplementar é exercício da sua actividade empresarial de gestão de participações sociais.
VII - Não é, ao nível da realização da prestação suplementar – por definição do sócio para com a sociedade – uma actividade de gestão da participada. O acto de gestão aqui em causa não é um acto de gestão da empresa participada, que se limita a sofrer na sua esfera jurídica as respectivas consequências.

Sumário elaborado nos termos do disposto no artº 663º, nº 7 do Código de Processo Civil
Nº Convencional:JSTA00070548
Nº do Documento:SA2201802210473
Data de Entrada:03/22/2013
Recorrente:A......, S.A.
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE COM 1 DEC VOT
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TTLISBOA
Decisão:PROVIDO
Área Temática 1:DIR FISC - IRC
Legislação Nacional:CIRC ART45 N3 ART23 ART59.
CSC ART210 ART287 ART213.
CSC ART5 ART25 - ART30 ART176 N1 A ART178 ART179 ART202 - ART208 ART277 ART285 ART286.
DL 215/89 DE 01/07 ART82 N2.
DL 198/01 DE 03/07 ART70
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC0246/12 DE 2002/07/10.; AC STA PROC01046/05 DE 2007/02/07.
Referência a Doutrina:LUÍS BRITO CORREIA - DIREITO COMERCIAL VOLII 1989 PÁG297.
Aditamento:
Texto Integral:
Recurso Jurisdicional
Decisão recorrida – Tribunal Tributário de Lisboa
. 28 de Novembro de 2012


Julgou parcialmente procedente a impugnação judicial nos seguintes termos:

A. reconheceu o direito da impugnante à dedução de retenções na fonte no montante de € 45.396,28, por referência ao exercício de 2007;
B. absolveu a entidade demandada do demais peticionado em juízo.


Acordam nesta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:


A…………., S.A., veio interpor o presente recurso da decisão supra mencionada, proferida no âmbito do Processo de impugnação n.° 304/11.7BESNT, tendo, para esse efeito formulado, a final da sua alegação, as seguintes conclusões:

1. No presente processo estão em causa as correcções feitas a uma sociedade integrante do grupo de que a recorrente é dominante ou consolidante, concretamente, a A’……….;

2. A referida A’………. tem como objecto social e, efectivo exercício, a actividade imobiliária, e a detenção e gestão de participações financeiras;

3. No âmbito da sua actividade de detenção e gestão de participações financeiras, a A’………. efectuou, em participadas suas, prestações acessórias sujeitas ao regime das prestações suplementares;

4. Para realizar essas prestações suplementares, a A’………. obteve crédito bancário, considerando a Administração Tributária, tese aceite na sentença recorrida, que os juros referentes a tal crédito não são, nos termos do art° 23°, do CIRC, custos fiscalmente aceites;

5. É entendimento firmado da jurisprudência e da doutrina, que a dedutibilidade fiscal de um custo depende, apenas, da existência de uma relação justificada entre tal custo e a actividade produtiva da empresa;

6. É, também, entendimento firmado da jurisprudência e da doutrina, que essa relação justificada entre o custo a actividade produtiva da empresa tem lugar quando as operações societárias se insiram no respectivo escopo;

7. Ora, o objecto social da A’………. é a gestão de participações sociais e é nesse estrito âmbito, que ela efectuou prestações suplementares;

8. As prestações suplementares constituem, para as entidades que as realizam — como a A’………. — um activo financeiro, reconhecido, contabilisticamente, como um custo adicional de investimento financeiro na sociedade participada — Normas Contabilísticas e de Relato Financeiro n° 13 (Interesses em Investimentos Conjuntos e Investimentos em Associadas), 15 (Investimentos em Subsidiárias e Consolidação) e 27 (Instrumentos Financeiros);

9. As prestações suplementares não são um passivo da entidade em quem foram realizadas, constituindo antes capitais próprios dessas sociedades — Norma Internacional de Contabilidade n° 32 e Norma Contabilística e do Relato Financeiro n°27;

10. Ao contrário do que é defendido na sentença recorrida, as prestações suplementares não são “acessórios” das participações sociais, sendo, aliás, tratadas, e bem, como componente do capital próprio, como decorre, de modo claro, do n° 3 do art° 45° do CIRC;

11. Por isso, nos termos do referido n° 3 do 45° do CIRC, tal como nas participações sociais, as perdas em prestações suplementares, apenas relevam, fiscalmente, 50%;

12. Assim, a A’………., ao realizar prestações suplementares, efectuou ou reforçou os seus investimentos financeiros, o que se insere, plenamente, no âmbito do seu objecto social;

13. Aliás, a própria Administração Tributária, no relatório da inspecção, reconheceu que se está perante um “activo financeiro” e ele “constitui uma fonte produtora de rendimento”, embora, de forma anómala, conclua pela não aceitação fiscal dos custos financeiros incorridos pela A'.......... por os rendimentos gerados por esse activo financeiro poderem não ocorrer;

14. A jurisprudência do Venerando Supremo Tribunal Administrativo tem recusado a aceitação, como custo fiscal, dos encargos financeiros referentes a crédito obtido para, com ele, se realizar empréstimos gratuitos a participadas, quando não faz parte do objecto social da sociedade a gestão de participações sociais;

15. A jurisprudência do Venerando Supremo Tribunal Administrativo, num caso de concessão de prestações acessórias, também recusou a aceitabilidade fiscal dos custos financeiros referentes ao crédito obtido para realizar tais prestações, também porque a sociedade que realizou as referidas prestações, não tinha como objecto a gestão de participações sociais;

16. Ora, não só a A’……….tem como objecto a gestão de participações sociais, como estão em causa, não puros financiamentos às participadas, mas sim a realização de prestações suplementares, isto é, realização de verdadeiros investimentos financeiros;

17. A doutrina tem assinalado que com as prestações suplementares há um reforço do capital próprio da participada e um incremento do valor do investimento financeiro feito pela sócia;

18. Esse activo financeiro, assim reforçado ou aumentado com as prestações, é uma fonte produtora de rendimentos pelo que, em termos de decisão de investimento, o confronto entre um desembolso inicial e os fluxos que o mesmo pode originar é idêntico em investimentos em activos físicos operacionais, na aquisição de uma participação de capital ou noutro tipo de investimento financeiro;

19. Por isso, assinala a doutrina, se a lógica económica da decisão e as formas de financiamento são idênticas, se, além disso, em todos esses casos se potenciou a obtenção de proveitos, não há razão para que os encargos financeiros sejam dedutíveis nuns casos e o não sejam em outros;

20. Nem se diga, como o faz a sentença recorrida, que os encargos financeiros em causa deviam ser imputados às sociedades participadas, uma vez que os quantitativos obtidos, através do recurso ao crédito, pela A’………. foram aplicados nas referidas participadas;

21. É que, o mesmo acontece quando uma participada aumenta o seu capital social e a participante efectua esse aumento, recebendo, em contrapartida acções, já que, também aqui, esses quantitativos são empregues e entregues à participada;

22. Mas, quer no aumento do capital social da participada, quer no aumento dos capitais próprios da participada, através de prestações suplementares, estamos perante investimentos financeiros feitos pelos sócios;

23. Os investimentos financeiros realizados pela A’………. são geradores de rendimentos, sejam dividendos, sejam mais-valias e, estas últimas, porque, a A’………., não é uma SGPS, são integralmente tributadas;

24. A correcta interpretação do art. 23° do CIRC não pode deixar de conduzir à aceitação fiscal dos custos incorridos pela A’………., na medida em que eles se inserem no seu objecto social e na sua actividade e são indispensáveis à obtenção de proveitos e à manutenção da fonte produtora.

25. A decisão recorrida incorreu, assim, em erro de julgamento, ao interpretar, nos termos em que o fez, o art° 23° do CIRC.

Requereu que dando provimento ao Recurso seja revogada a sentença recorrida e julgada procedente a impugnação.

Não foram apresentadas contra-alegações.
Foi emitido parecer pelo Magistrado do Ministério Público considerando dever o recurso ser julgado procedente.

A decisão recorrida considerou provados os seguintes factos:

A. A impugnante é a sociedade dominante de um grupo sujeito, em sede de IRC, ao Regime Especial de Tributação dos Grupos de Sociedades (RETGS), exercendo a atividade de construção de outras obras de engenharia civil (fls. 150 e 159 do processo administrativo tributário apenso).

B. A sociedade “A’………., S.A.” A’……….), que se encontra inserida no grupo referido no ponto antecedente, tem como objeto a gestão de participações, promoção e realização de investimentos e de empreendimentos imobiliários, na gestão de imóveis próprios e na prestação de serviços em tais áreas das suas atividades, bem como a compra, comercialização e revenda de prédios adquiridos para esse fim, (Doc. 3 da petição inicial).

C. No exercício de 2008, a “B………., S.A.” obteve em mais-valias fiscais, com intenção expressa de reinvestimento, o montante de € 52.021.802,42 (Doc. 5 da PI).

D. No exercício de 2007, a impugnante auferiu rendimentos da sociedade “Scutvias - Autoestradas da Beira Interior, S.A.,”, a título de remunerações de membro de órgão estatutário e a título de rendimentos de capitais, tendo sido retido imposto de rendimentos nos montantes de €8.618,00 e €40.900,28 (Doc. 7 da PI).

E. Estas retenções na fonte foram contabilizadas pela impugnante nos exercícios de 2008 (€4.122,00) e de 2009 (€40.900,28 + € 4.496,00), mas apenas foram objeto de dedução no exercício de 2008 (Docs. 7 a 12 da PI).

F. Em cumprimento da Ordem de Serviço n.° OI200908161, de 05/11/2009, a sociedade “A’………., S.A.” (A’……….) foi objeto de uma ação de inspeção em sede de IRC, ao exercício de 2007, constando do respetivo relatório de inspeção, datado de 10/08/2010 e junto a fls. 169/190 do PAT apenso, o seguinte:

IIIDESCRIÇÃO DOS FACTOS E FUNDAMENTOS DAS CORREÇÕES MERAMENTE ARITMÉTICAS
Na sequência da ação inspetiva realizada ao exercício de 2007, resultaram as seguintes correções fiscais:
III.1 – Não aceitação como custo fiscal dos encargos financeiros suportados com o financiamento das prestações acessórias
III.1.1 - Descrição dos factos:
No exercício de 2007 a A’………., S.A., desenvolveu a sua atividade na área da gestão de empreendimentos imobiliários e gestão de participações financeiras. Os resultados negativos de 11.336.358,93 euros, são justificados, em parte, pelos elevados custos financeiros suportados pelo sujeito passivo durante o exercício (...). Do quadro anterior destacam-se os custos com a remuneração dos capitais alheios (Juros suportados, custos da emissão de papel comercial, comissões) e as provisões relativas aos ajustamentos das participações do Banco Comercial Português e das empresas do grupo. O endividamento da empresa em 31/12/2007 era de 1.358.155.612,00 euros composto por:

- Conta 23- Empréstimos Obtidos 1.077.768.170,55
- Conta 25211- EGRP Empréstimos Obtidos c/p 280.387.441,45

Da análise efetuada às demonstrações financeiras da A’………., do ano de 2007, verificou-se que os financiamentos obtidos, foram utilizados para:
- Financiar a sua atividade de construção;
- Concessão de suprimentos às suas participadas;
- Aquisição direta de participações;
- Concessão de prestações acessórias
Da leitura do relatório de gestão, elaborado no dia 28 de março de 2008, verifica-se que o sujeito passivo considera participações nucleares a participação na ………… SGPS, SA, sociedade destinada à titularidade de participações em sociedades imobiliárias, ………. - SGPS, SA destinada à titularidade de participações em sociedades hoteleiras, …….- SGPS, SA sociedade destinada à titularidade de participações em sociedades ligadas à comercialização de combustíveis, …………., SA vocacionada para a comercialização de viaturas e B……… - SGPS, SA vocacionada para a titularidade de participações financeiras e participação em sociedades ligadas a concessões de serviços.
Ainda no âmbito das participações, eram consideradas participações qualificadas, a participação de 15,05% detida sobre a ................ SGPS, SA, sendo 10% por intermédio da B………… - SGPS, SA e 5,05% através da ........... - SGPS, SA, constituía ainda participação qualificada as 226.500.000 ações detidas do Banco Comercial Português, SA a que correspondia uma participação de 6,27%, detida diretamente ou indiretamente, através das empresas B……….. - SGPS, SA e ………, SA

III.1.2 - Descrição das operações
Da análise das demonstrações financeiras do exercício de 2007, verificou-se que a conta 415500000 — “Prestações Suplementares Investimentos Financeiros” evidenciava um saldo de 666.894.032,72 euros, decompondo-se da seguinte forma:


Empresas
% Participação
Valores
………. SGPS, SA
100%
151.000.000
…… SGPS, SA
100%
25.537.500
…… SGPS, SA
98,58%
19.500.000
…….SGPS, SA
100%
24.000.000
B…… SGPS, SA
100%
418.211.533
…….. SGPS, SA
100%
23.000.000
……….., SA
100%
5.645.000
Total
666,894.033
(Valores arredondados ao Euro)


As prestações suplementares/acessórias, nos últimos 3 anos tiveram a seguinte evolução:



Empresas
2005
2006
2007
    …SGPS, SA
77500,000
105,500,000
151.000.000
    ……. SGPS, SA
17.137.500
25.537500
25,537.500
    …. SGPS, SA
12.500.000
12.500000
19.500000
    …. SGPS, SA
23000.000
24000.000
24000.000
    B... SGPS, A
253.961,533
276.961.533
418211.533
    … SGPS, SA
0
0
23.000.000
    ……, SA
5.645,000
5.645000
5645000
    ……..
    0
120,000
0
    Total
389.744,033
450.264,033
666,894,033


Da análise feita aos movimentos contabilísticos que compõe esta rubrica, verificou-se que os suportes documentais dos referidos movimentos são atas do Conselho de Administração do sujeito passivo, onde são tomadas as deliberações para a concessão das respetivas prestações acessórias. A justificação apresentada pelo sujeito passivo quando questionado sobre a sua necessidade, foi que as mesmas foram efetuadas, com o objetivo das suas participadas adquirirem participações financeiras noutras sociedades, e ainda para reforço dos capitais próprios de outras participadas que se encontravam em risco de perda de metade do capital social, ficando enquadradas no artigo 35° do Código das Sociedades Comerciais.
De acordo com a leitura de algumas atas que serviram de suporte à contabilização das referidas prestações acessórias, constam as razões pelas quais foram concedidas as prestações acessórias:
Na ata n° 150 de 15 de junho de 2007, que teve como ponto único na ordem de trabalhos a “Realização de Prestações Acessórias em sociedade sua dominada”, as quais poderiam ir até ao montante máximo de 215.250.000,00 euros, é referido que a B..........., SA é uma sociedade gestora de participações sociais, tendo a necessidade de efetuar múltiplos investimentos para aquisições de participações sociais.
No parágrafo 8 da respetiva ata é ainda referido o seguinte: “Acresce que foi recentemente concedida autorização expressa pelo Banco de Portugal para que as participações e direitos de voto das empresas do Grupo A…….. pudessem ultrapassar no seu computo final na cadeia de imputações, os 5% do capital do “Banco Comercial Português, SA” considerando-se, deste modo as disponibilidades agora pretendidas para esses efeitos como estratégicas e duradouras ()”.
Na ata n.° 160 de 8 de novembro de 2007, que teve igualmente como ponto único na ordem de trabalhos a “Realização de Prestações Acessórias em sociedade sua dominada”, as quais poderiam ir até ao montante máximo de 48.000.000,00 euros, é referido que a …………. - SGPS, SA é uma sociedade gestora de participações sociais, tendo a necessidade de efetuar múltiplos investimentos para aquisições de participações sociais.
No parágrafo 8 da respetiva ata é referido o seguinte:
“Assim, o Conselho procedeu à avaliação da situação concreta e dos propósitos manifestados, no sentido do reforço da relevante participação da ………… na sociedade cotada ...............S.G.P.S, SA, tendo analisado os demais elementos disponibilizados sobre a matéria e deliberado por unanimidade, a realização de prestações acessórias de capital, sujeitas ao regime das prestações suplementares, ou seja, pecuniárias, sem qualquer vencimento de juros ou outras remunerações e apenas restituíveis desde que verificadas as condições previstas no Artigo 213° do Código das Sociedades Comerciais (…)”(Anexo 1 fls. 1 a 4).
Podemos assim concluir, apesar da dificuldade em relacionar de forma direta o endividamento do sujeito passivo, através da obtenção de empréstimos bancários e a emissão de papel comercial, com os investimentos financeiros realizados pelas participadas, que as prestações acessórias foram concedidas pela A’……… para que as sociedades participadas adquirissem participações financeiras noutras sociedades.

IIII.1.3-Enquadramento das operações face às normas fiscais de apuramento do lucro tributável.
III.1.3.1 - Enquadramento legal dos custos financeiros à luz do artigo 23° do CIRC
A principal questão durante a ação inspetiva, na área dos custos financeiros, consistiu em avaliar e saber se os custos financeiros suportados pela A’……… para financiar as prestações acessórias são ou não aceites fiscalmente, face ao disposto no n° 1 do artigo 23° do CIRC. (...) [O]s encargos financeiros suportados, não representam para a A’………, um gasto indispensável à realização dos proveitos sujeitos a imposto nem para a manutenção da sua fonte produtora, destinando-se apenas à eventual manutenção da fonte produtora das suas participadas e só nestas poderia ser considerado como custo.

III.1.3.2 Enquadramento legal nos termos do Regime Especial de Tributação do Grupo de Sociedades (RETGS)
Não relevando como custo fiscal os encargos financeiros suportados pela A’………com vista ao financiamento das prestações acessórias, há que analisar a questão num contexto do grupo fiscal em que estas sociedades estão inseridas, mais concretamente no grupo A…………. SA.
Este regime de tributação previsto no art. 63º do Código do IRC caracteriza-se pelo resultado fiscal do grupo corresponder à soma algébrica dos resultados fiscais individuais de cada empresa, os quais são apurados de acordo com as regras próprias que vigoram relativamente a cada entidade obviamente, sem prejuízo de todas as sociedades estarem sujeitas ao regime geral de tributação de IRC.
Ora sucede que as SGPS têm um regime próprio para o apuramento das mais-valias e menos-valias e encargos financeiros de acordo com o disposto no n.° 2 do art.° 31 do Estatuto Benefícios Fiscais, que determina que “As mais-valias e as menos-valias realizadas pelas SGPS e pelas SCR mediante a transmissão onerosa, qualquer que seja o titulo por que se opere, de partes de capital de que sejam titulares, desde que detidas por período não inferior a um ano e, bem assim, os encargos financeiros suportados com a sua aquisição, não concorrem para a formação do lucro tributável destas sociedades.”
A desconsideração como custos dos encargos financeiros para efeitos de determinação do lucro tributável consagrada no n.° 2 do artigo 31.° do EBF consubstancia um corolário do princípio geral da indispensabilidade dos custos segundo o qual a dedução fiscal é condicionada à sua conexão com a obtenção dos proveitos sujeitos a imposto e, do qual resulta que “se determinados custos estão relacionados com proveitos não sujeitos a imposto não são fiscalmente dedutíveis” princípio que informa o disposto no n.° 1 do artigo 23,° do CIRC, no qual se estabelece que se consideram “custos ou perdas os que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora”. Assim, caso os juros sob análise fossem apurados na esfera das participadas cuja natureza jurídica são Sociedades Gestoras de Participações Sociais (SGPS), quer porque a A’………. procedesse ao seu redébito quer por o financiamento bancário estar localizado nas empresas efetivamente beneficiárias do financiamento, em conformidade com a norma supracitada, os referidos encargos seriam fiscalmente dedutíveis nas empresas individualmente consideradas com as limitações quantitativas impostas pela referida norma e com os efeitos correspondentes no resultado fiscal do grupo. Ora, na verdade, é possível estabelecer um nexo de causalidade entre os juros suportados com o financiamento das prestações acessórias às suas participadas (na sua grande maioria SGPS) e os ganhos obtidos na venda dos ativos financeiros que incluem o valor de tais prestações (mais valias subsequentes). Para demonstrar este argumento, e a título meramente exemplificativo, veja-se o resultado obtido no primeiro trimestre de 2010 por parte do Grupo A………, no montante de mais de 90 Milhões de Euros o qual se deve, em grande parte (mais de 70 Milhões de Euros), ao resultado obtido na alienação da participação financeira na .... por parte da sua participada ………. SGPS SA, sendo que essa mais valia não deverá ter relevância fiscal por força do artigo 31º do EBF.
Estamos assim em presença de um rendimento gerado pelo Grupo A………, materializado por uma mais valia não tributada, a qual resulta da alienação, por parte de uma participada da A’………, de ativos financeiros que foram financiados através de prestações acessórias efetuadas pela A’……. sendo essas prestações financiadas através de capitais alheios com os consequentes encargos financeiros com relevância fiscal que daí resultam.
Em síntese, fica, desta forma e por tudo aquilo que foi dito no ponto anterior, demonstrado que os juros suportados pela A'......... para financiar as prestações acessórias em causa não podem ser tidos como respeitando a capitais alheios aplicados na exploração desta sociedade nem se encontram relacionados com a realização de proveitos ou ganhos sujeitos a imposto desta sociedade, pelo que não preenchem os requisitos e condições estabelecidas pelo artigo 23.° do CIRC para serem consideradas como custo para efeitos da determinação do lucro tributável da A’…….. conclusão espaldada na doutrina firmada pela jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo.

III.1 .3.3 Determinação dos custos não aceites fiscalmente
Para a determinação dos encargos financeiros não aceites para efeitos fiscais foi determinado o saldo médio das prestações acessórias concedidas durante o exercício de 2007 e utilizada a taxa de 5,38%, correspondente à taxa implícita dos empréstimos concedidos pela A’……….na concessão de suprimentos, de acordo com o elencado no Dossier de preços de transferência.
Nas páginas 16 e 29 do referido dossier é dito “A A’………., enquanto acionista de um conjunto de sociedades, financia a atividade operacional destas. Sempre que opção de financiamento recai na figura do empréstimo, a A’………. cobra juros que são determinados segundo padrões de mercado, na medida em que a taxa implícita corresponde a taxa média do financiamento obtido pela A’………. junto de instituições bancárias (...), “Relativamente às operações de financiamento concedidas pela A’………., o método adotado é, de igual modo o Preço Comparável de Mercado, tendo em consideração que a A’………. age como entidade centralizadora dos financiamentos junto do Mercado Bancário - pela dimensão e capacidade de financiamento - remunerando as operações financeiras que concede a entidades com que se relaciona à taxa que lhe foi debitada, a montante por instituições bancárias” (Anexo II fls. 1 a 2).
Por se considerar, e de acordo com aquilo que foi apresentado anteriormente, que a taxa referida no dossier de preços de transferência reflete os encargos financeiros que a A’………., teve de suportar com os financiamentos obtidos, vai ser a mesma utilizada para a determinação dos encargos financeiros não dedutíveis com o financiamento das prestações acessórias.
Deste modo e tendo obtido um saldo médio, de acordo com os elementos contabilísticos da A’………., das prestações acessórias de 545.185.128,61 euros (Anexo III fls. 1 a 4), foi apurado o montante global das correções dos encargos financeiros de:
545.185.128,61 x 0,0538 = 29,330.959,92 euros” (fls. 169/190 do PAT apenso).

G. Em cumprimento da Ordem de Serviço n.° OI201000278, de 26/03/2010, a impugnante foi objeto de uma ação de inspeção em sede de IRC, ao exercício de 2007, no âmbito da qual foram efetuadas correções à matéria coletável, de natureza meramente aritmética, no montante de € 29.330.959,92 (vinte e nove milhões, trezentos e trinta mil, novecentos e cinquenta e nove euros e noventa e dois cêntimos), decorrentes da ação inspetiva identificada no ponto F, e apurado imposto em falta no montante de € 6.998,95 (seis mil, novecentos e noventa e oito euros e noventa e cinco cêntimos) (fls. 155/212 do PAT apenso).

H. Do respetivo relatório de inspeção, datado de 18/11/2010 e constante de fls. 155/167 do PAT apenso, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, consta o seguinte:
“Da análise efetuada ao exercício de 2007, ao grupo A…….., S.A., resultaram correções ao lucro tributável do grupo a favor do Estado, no montante de € 29.330.959,92 resultantes dos procedimentos inspetivos efetuados na esfera individual das empresas que compõem o grupo. (...)
Retenções na fonte sobre rendimentos pagos por terceiros - €6.998,95
Relativamente às retenções na fonte que incidiram sobre rendas pagas por terceiros, deduzidas pela sociedade dominante, no campo 359 do quadro 10 da declaração de rendimentos modelo 22, verificou-se que, para algumas dessas retenções, não existia documento comprovativo das mesmas, necessariamente emitido pelas entidades que procederam à retenção na fonte na qualidade de substitutos tributários, maxime as declarações fiscais previstas para esse efeito no art.° 119°, n° 1 alínea b) do CIRS aplicável ex vi artigo 120º do CIRC, resultando imposto em falta no montante de € 6.998,95 (...)” (fls. 155/267 do PAT apenso).

I. Na sequência das correções efetuadas, foi emitida a demonstração de liquidação de IRC, contendo a liquidação n.° 20108310016092, de 03/12/2010, e a compensação n.° 201000006958122, de 07/12/2010, donde resultou o valor a pagar pela impugnante de € 6.829,86 (seis mil, oitocentos e vinte e nove euros e oitenta e seis cêntimos), com data limite de pagamento no dia 17/01/2011 (Doc. 1 da P.I fls. 142/143 do PAT apenso).


Questão objecto de recurso:

1- Dedutibilidade dos encargos financeiros suportados pela SGPS com o financiamento de prestações acessórias gratuitas a empresas participadas.


A impugnante, A………., SA integra e lidera um grupo de sociedades, estando sujeita ao Regime especial de Tributação dos Grupos de Sociedades sendo tributada em sede de IRC pela soma algébrica dos resultados de todas as sociedades que integram esse grupo. Uma das sociedades que integra esse grupo - A’………., SA (A’………), foi objecto de acção inspectiva levada a cabo pela Administração Tributária que conduziu a correcções aritméticas aos valores por esta declarados em sede de imposto sobre o rendimento de pessoas colectivas, relativamente ao ano de 2007.
Tal correcção ao resultado fiscal reflectiu-se, necessariamente, no resultado fiscal – resultado consolidado - do grupo de sociedade em causa. Tal correcção consistiu na não aceitação como custo fiscal do valor de 29 330 959,92€ de encargos financeiros suportados pela empresa A’………., SA., (A’……….) ao abrigo do disposto no artº 23º do Código de Imposto sobre o rendimento de pessoas colectivas.
A empresa A’………., SA (A’……….) detém participações sociais em várias sociedades que lhe conferem o domínio total nuns casos e noutros um domínio parcial variável entre 0,04% e 99,99%.
O seu objecto social abrange actividades imobiliárias e, a detenção e gestão de participações sociais. Em causa neste recurso está apenas esta segunda parte do seu objecto social – detenção e gestão de participações sociais -.
Não está em questão que a impugnante é a empresa que lidera o grupo de sociedades já identificado e que, segundo a sua opção, está a impugnante sujeita ao Regime especial de Tributação dos Grupos de Sociedades sendo tributada em sede de IRC, ou seja, pela soma algébrica dos resultados de todas as sociedades que integram esse grupo.
Do que se trata aqui é apenas da análise de uma dessas parcelas, aquela que é constituída pelo lucro tributável da empresa desse grupo - A’………. (A’……….).
Na situação em análise esta empresa (A’……….) contraiu empréstimos junto de instituições financeiras com vista, pelo menos parcialmente, a facultar, de forma gratuita, fundos a empresas de que era detentora de participações sociais para que estas, por sua vez, adquirissem participações sociais. Os encargos financeiros suportados com esses empréstimos, e outros meios de financiamento pela A’………., SA (A'......) foram deduzidos ao lucro tributável desta, influenciando necessariamente o resultado consolidado do grupo.
A impugnante invoca tratar-se de prestações acessórias que seguem o regime das prestações suplementares, sendo que não é importante para a decisão desta situação entrar na contenda doutrinária sobre a proibição legal, ou, ausência dela, quanto à admissibilidade da realização de prestações acessórias, de capital nas sociedades anónimas. Efectivamente o Código das Sociedades Comerciais não as prevê para este tipo de sociedades, quedando-se pela previsão de tais prestações no regime das sociedades por quotas, dividindo-se a doutrina sobre se a falta de previsão tem o efeito da impossibilidade legal da sua existência, ou não. Analisando a legislação fiscal que a elas - prestações suplementares - se referia, verifica-se que o artº 45.º, n.º 3, do CIRC, na versão em vigor até Dezembro de 2010, alterada pela L. 55-A/2010 de 31/12:

3 — A diferença negativa entre as mais-valias e as menos-valias realizadas mediante a transmissão onerosa de partes de capital, incluindo a sua remição e amortização com redução de capital, bem como outras perdas ou variações patrimoniais negativas relativas a partes de capital ou outras componentes do capital próprio, designadamente prestações suplementares, concorrem para a formação do lucro tributável em apenas metade do seu valor.

as considerava como componentes diversas do capital próprio, tomado este com o sentido de participações sociais – quotas, nas sociedades por quotas e acções nas sociedades anónimas -.
A legislação comercial, art.º 210.º do CSC, permite que os sócios realizem prestações suplementares, desde que tal esteja previsto no contrato de sociedade, mediante deliberação para esse efeito da assembleia geral, podendo admitir-se que igual faculdade se encontra prevista no art.º 287.º do CSC para as sociedades anónimas, ao referir-se a prestações acessórias.
De todo o modo, longe da contenda ao nível do direito comercial o certo é que o legislador fiscal, contempla, sem distinção entre sociedades por quotas e sociedades anónimas, a realização de prestações suplementares, cujo regime de tributação consta do art.º 45.º do CIRC, na redacção em vigor à data da tributação. Ali, optou por considerar como categorias diversas as prestações suplementares e as “partes de capital” (ações e quotas). Separou as partes de capital, de outras componentes de capital próprio, como as prestações suplementares.
As prestações suplementares como define Luís Brito Correia, in Direito Comercial, 2.º vol., 1989, p. 297 “são entradas em dinheiro que podem ser realizadas pelos sócios de sociedade por quotas para reforço do património desta, para além do capital social, não vencendo juros e podendo ser-lhes restituídas, as quais não se incluem no capital social da sociedade”.
A validade da deliberação dos sócios que imponha a realização de prestações suplementares depende dos seguintes requisitos:
1- Que o objecto da prestação seja dinheiro,
2- Que se encontre previsto no pacto social:
a. o montante global das prestações suplementares,
b. os sócios que ficam obrigados a efetuar tais prestações,
c. o critério de repartição das prestações suplementares entre os sócios a elas obrigados.
Tais prestações, por força do disposto no art.º 213.º do CSC, podem ser restituídas aos sócios desde que a situação líquida não fique inferior à soma do capital e da reserva legal, o sócio já tenha liberado a sua quota, e não tenha sido declarada a insolvência da sociedade. Este regime assegura os interesses dos credores por a restituição do seu valor não ocorrer se ou enquanto não permanecer ou não estiver reconstituído o capital social e, os interesses dos sócios que as realizam de as poderem vir a reaver. Enquanto que a realização do capital social é obrigatória, as prestações suplementares têm carácter facultativo e dependem de expressa deliberação dos sócios, sendo também nesta medida clara a diferenciação entre as prestações suplementares e a obrigação de entradas para o capital social, como decorre, entre outros dos artigos 25.º a 30.º, 176.º n.º 1, al. a), 178.º e 179.º; 202.º a 208.º, 277.º e 285.º e 286.º do CSC. Assim, constituindo quer o capital social quer as prestações suplementares contribuições dos sócios para o reforço do património da sociedade, estamos face a obrigações intrinsecamente distintas. Tal conclusão sai ainda reforçada pela análise do direito contabilístico que com ela absolutamente se conforma, pese embora não ser este o ramo adequado à definição dos institutos jurídicos. O direito contabilístico não tem como função a definição de conceitos ou institutos jurídicos, por o seu escopo ser servir de instrumento para proporcionar aos utilizadores económicos informação sobre a posição e desempenho financeiro das entidades ou empresas, que estes tomarão em linha de conta na tomada de decisões económicas ou de gestão. As demonstrações financeiras da realidade patrimonial de uma determinada entidade é feita tendo como objetivo permitir a um qualquer utilizador conhecer a respetiva posição e desempenho financeiros da empresa, com uma imagem verdadeira e apropriada da respectiva realidade patrimonial. No Sistema de Normalização Contabilística, é clara, a autonomização dos conceitos de partes de capital – reportado ao capital social - e capital próprio, como decorre, entre outros, dos arts. 6º-3/a) e b e 4; 7º-3/a) e b) e 8º-3/b) 11º 1/c) e 2.

Dúvidas não há que estamos em presença de prestações de capital que a A’………., SA efectuou a empresas suas participadas, assumindo ela os encargos financeiros correspondentes, que nos cumpre definir se têm que ser eles tidos como custos dedutíveis ao lucro tributável em sede de Imposto sobre o rendimento de pessoas colectivas. Para assim ser, a sociedade ao obter fundos (e pagar juros) para os entregar a uma sociedade participada sem qualquer remuneração causal e direta terá que estar, ainda, a exercer adequadamente a sua atividade com um ânimo lucrativo.
Mas, insere-se na sua capacidade e escopo lucrativo uma dada actividade quer efetue um aumento de capital (art. 25.º do CSC), prestações suplementares ou acessórias sem juros (art. 210 e 287.º do CSC) ou suprimentos sem juros (art. 243.º do CSC)?
Já antes constatamos que a circunstância de tal realidade empresarial ter um exacto enquadramento ao nível do direito comercial, ou antes, na vigência do POC ser contabilizada numa conta de capital, mantendo actualmente com o sistema de normalização contabilística (SNC) uma contabilização do mesmo tipo, não são elementos sequer indiciadores da sua dedutibilidade como custo em sede de IRC.
Contrariamente ao que consta das conclusões 7 a 9 do recurso, da qualificação contabilística das prestações suplementares não resulta a sua consideração como custo para efeitos de determinação do lucro tributável da empresa, pelo menos na sua totalidade. Como refere a impugnante – conclusão 11- sempre as prestações suplementares, concorreriam para a formação do lucro tributável em apenas metade do seu valor, apesar de serem contabilizadas como custo, pela totalidade. Ou seja, o direito fiscal só aceita que 50% de tais prestações suplementares possa ser tido como custo, definindo, depois, noutras normas se essa regra de concurso para a formação do lucro tributável em metade do seu valor, sofrerá, ou não, outras reduções. As regras contabilísticas não têm por objectivo definir critérios jurídicos de tributação, como acima referimos, destinando-se, exclusivamente a espelhar a situação financeira das empresas, mostrando-se, expressamente arredadas, neste caso, no art.º 45.º, n.º 3, pelo menos parcialmente.
A impugnante, conclusões 14 do recurso, invocando jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo refere que tem ele entendido que, quando está em causa uma SGPS, serão aceites como custo fiscal, os encargos financeiros referentes a crédito obtido para, com ele, a SGPS realizar empréstimos gratuitos ás participadas. Porém, o certo é que nunca o Supremo Tribunal Administrativo se pronunciou sobre uma situação idêntica à destes autos, analisando apenas a qualificação como custo fiscal de empréstimos gratuitos de empresas não SGPS a empresas por elas participadas.
Sendo igualmente certo que o Supremo Tribunal Administrativo, num caso de concessão de prestações acessórias, também recusou a aceitabilidade fiscal dos custos financeiros referentes ao crédito obtido para realizar tais prestações, referindo, entre muitas outras razões, que a sociedade que realizou as referidas prestações, não tinha como objecto a gestão de participações sociais.
Da análise dos referidos acórdãos, repetidamente mencionados nos autos, não pode concluir-se que o Supremo Tribunal Administrativo haja afirmado que, para que os empréstimos gratuitos ás sociedades participadas pudessem ser aceites como custo fiscal era condição necessária e suficiente que tal empréstimo fosse concedido por uma SGPS a empresas por elas participadas.
A A’………. tem também como objecto a gestão de participações sociais, e, no estreito limite desse objecto social, para fomentar a concentração de empresas, entendeu o legislador conceder-lhe certos benefícios fiscais.
O objecto social de gestão de participações sociais significa que uma empresa adquire ou aliena participações sociais de uma outra empresa e através desta actividade exerce actividade comercial, utilizando única e exclusivamente o poder de decisão sobre «a vida da empresa participada» que o valor das acções de que é titular lhe possam conferir. Isto é, se a empresa participada deve adquirir acções de outra sociedade, se deve contrair empréstimos para realizar tais aquisições, a SGPS tem o poder de concordar, votando favoravelmente tais decisões. Isto insere-se no objecto social de uma SGPS.
Se a A’………. houvesse contraído o empréstimo para adquirir participações sociais, os juros desse empréstimo seriam tidos fiscalmente por um custo por ela suportado. O capital do empréstimo não foi por ela directamente utilizado, mas entregue à sua participada sob a forma de prestação acessória com regime de prestação suplementar.

A actividade empresarial da A’………., cujo objecto social é, como sabemos, a gestão de participações, promoção e realização de investimentos e de empreendimentos imobiliários, na gestão de imóveis próprios e na prestação de serviços em tais áreas das suas atividades, bem como a compra, comercialização e revenda de prédios adquiridos para esse fim, desenvolve-se através de múltiplas operações decorrentes do uso e gestão dos seus recursos (que abrangem o capital e o seu rendimento). Nos seus recursos inscrevem-se os seus activos - os valores patrimoniais positivos, representativos de créditos, direitos ou bens de que a empresa é titular ou tem direito de vir a ser investido na titularidade - e os seus passivos que correspondem aos valores patrimoniais negativos, representativos de dívidas, obrigações, compromissos ou responsabilidades que, como dois pratos da balança contabilística permitem revelar o património da empresa. No desenvolvimento da actividade empresarial qualquer acto de gestão desencadeia uma operação que altera os elementos do Património da empresa fazendo oscilar a posição relativa dos seus activos em face dos seus passivos.

A A’………. participa na sociedade a quem cedeu o montante que lhe foi emprestado por entidade terceira e de que os juros estão aqui em discussão, sendo as acções da sociedade participada um dos seus activos financeiros - tipos específicos de bens como dinheiro, valores colocados em depósitos bancários e instrumentos patrimoniais de outras entidades como ações e outros valores mobiliáriosque, em obediência ao seu objecto social, pode gerir.

A gestão de participações sociais ocorre pela influência que os direitos de voto que a A’………. detenha na sociedade participada, a exercer em assembleia geral, influenciando as decisões de gestão da participada, pela aquisição de mais acções da sociedade participada, pela deliberação de aumento do seu capital social com o inerente incremento da capacidade de investimento, ou pelo reforço do capital próprio da participada, aumento das disponibilidades de tesouraria, entre outros. Sendo certo que a A’………. é um sócio da sociedade participada e a ela pode efectuar prestações suplementares, caso preencha os requisitos legais, o que aqui se não mostra em discussão, na esfera jurídica da A’………. a decisão de efectuar a prestação suplementar é exercício da sua actividade empresarial de gestão de participações sociais. Não é, ao nível da realização da prestação suplementar – por definição do sócio para com a sociedade – uma actividade de gestão da participada. O acto de gestão aqui em causa não é um acto de gestão da empresa participada, que se limita a sofrer na sua esfera jurídica as consequências, porventura muito benéficas – da decisão de gestão que os seus sócios, entre eles a A’………., adoptaram de efectuarem prestações suplementares.
Pese embora as prestações acessórias terem sido concedidas pela A’………. para que as sociedades participadas adquirissem participações financeiras noutras sociedadespara este efeito, é irrelevante o fim a que se destinava esse capital na sociedade participada - os juros suportados pela primeira para obter financiamento externo, posteriormente entregue à participada, foi feito no interesse da participante, numa consequência directa da sua actividade de gestão de activo financeiros – acções da participada - que é, pelo menos potencialmente produtora de rendimento para a participante, indirectamente através do êxito/fracasso que venha a decorrer das aquisições de participações sociais que a participada haja efectuado com esse dinheiro. Na verdade, trata-se de um acto de gestão intrinsecamente idêntico a um outro em que a A’………. contraísse um empréstimo para comprar uma máquina para a sua actividade industrial e de que estivesse a suportar os juros inerentes.
Não se cura aqui de saber se é ou não legítimo do ponto de vista da gestão empresarial tal empréstimo. O direito fiscal não pode desconsiderar um custo porque entende que a respectiva assumpção foi um mau acto de gestão, como também não pode considerar um custo apenas porque entende que foi um bom acto de gestão. O direito fiscal nada tem a ver com a gestão das empresas e relativamente a ela tem de manter apenas uma conduta de neutralidade.
Fala a recorrente de que se tratou de um investimento financeiro da SGPS na empresa participada. Trata-se de um investimento dado que houve a aplicação de um tipo de recurso (dinheiro) com a expectativa de receber algum retorno futuro superior, que, ainda que se não concretize, se mostra coberto pelo rico empresarial.
Acompanhamos a recorrente nas suas conclusões 17 e 18 quando refere que « a doutrina tem assinalado que com as prestações suplementares há um incremento do valor do investimento financeiro feito pela sócia; Esse activo financeiro, assim reforçado ou aumentado com as prestações, é uma fonte produtora de rendimentos pelo que, em termos de decisão de investimento, o confronto entre um desembolso inicial e os fluxos que o mesmo pode originar é idêntico em investimentos em activos físicos operacionais, na aquisição de uma participação de capital ou noutro tipo de investimento financeiro».
Assim, «se a lógica económica da decisão e as formas de financiamento são idênticas, se, além disso, em todos esses casos se potenciou a obtenção de proveitos, não há razão para que os encargos financeiros sejam dedutíveis nuns casos e o não sejam em outros».
Dispõe o artº 23º do Código de Imposto sobre o rendimento de pessoas colectivas que se consideram custos ou perdas os que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora.
Na falta de uma definição conceptual de custo fiscal ou, sequer de uma lista exaustiva dos custos fiscalmente dedutíveis, segundo este preceito legal haverá que eleger de todas os custos ou perdas suportadas pelo sujeito passivo e relevados na sua contabilidade aqueles que concorrerem para a formação do lucro tributável que ali se identificam com os gastos contabilísticos suportados pela empresa e indispensáveis à realização dos proveitos ou à manutenção da fonte produtora.
O artigo 23.º do CIRC usa a terminologia contabilística de gastos e proveitos, exigindo o estabelecimento de uma relação clara entre gastos e proveitos, de molde que estes surjam como consequência, directa ou indirecta, daqueles, a aferir ou na respectiva indispensabilidade à realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou à manutenção da fonte produtora.
Logo se revela que os custos previstos naquele artigo 23.º têm de se mostrar contabilizados e respeitar, desde logo, à própria sociedade contribuinte, isto é, que a actividade respectiva seja por ela própria desenvolvida, e não por outras sociedades.
Tal análise foi efectuada, por exemplo no ac. do Supremo Tribunal Administrativo de 07-02-2007, proferido no proc. n.º 01046/05:
«(...)as quantias controvertidas correspondem a juros de empréstimos bancários contraídos pela recorrente e aplicados no financiamento gratuito de uma sociedade sua associada.
Tais verbas não estão, pois, directamente relacionadas com qualquer actividade do sujeito passivo inscrita no seu objecto social, que é a fabricação de azulejos e não a gestão de participações sociais ou financiamento de sociedades de risco, nem sequer se reportam, ainda que indirectamente, à sua actividade.
Por outro lado, não se trata aqui de juros de capitais alheios aplicados na própria exploração, esses sim previstos como custos na alínea c) do n.º 1 do artigo 23.º do CIRC.
A mera possibilidade de poder vir a ter no futuro ganhos resultantes da aplicação desses capitais na sua associada não determina só por si que tais investimentos possam enquadrar-se no conceito de custos fiscais porque para isso era necessário que tais encargos fossem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora.».
Como antes já havia sido abordada no ac. do Supremo Tribunal Administrativo de 10 de Julho de 2002, proferido no proc. 0246/02:
«(...) Como resulta do Dec-Lei n° 495/88, de 30/12 - que estabelece o regime jurídico das Sociedades Gestoras de Participações Sociais, - o objecto destas é essencialmente a gestão de participações sociais de outras sociedades, traduzindo-se, assim, a sua actividade numa forma indirecta do exercício da actividade económica.
Pelo que as respectivas actividades são autónomas, tendo personalidade e capacidade tributária distintas que não são afectadas por eventual relação de domínio entre elas.
Assim, os custos previstos naquele artº 21 têm de respeitar à própria sociedade contribuinte, a se;
Ou de outro modo: a fonte produtora em causa é a da SGPS, não a das sociedades participadas;
Para que determinada verba seja considerada custo daquela é necessário que a actividade respectiva seja por ela própria desenvolvida, que não por outras sociedades ainda que em relação de domínio.
A não ser assim, como que era imputada à sociedade dominante o exercício da actividade da sua participada.».
Tendo o Supremo Tribunal Administrativo repetidamente afirmado que não podem constituir gastos dedutíveis, nos termos do artigo 23.º do CIRC, os encargos suportados com “empréstimos bancários contraídos para fazer face a prestações acessórias efectuadas a uma sociedade sua associada pelos quais não cobrou quaisquer juros”, o certo é que em todos os acórdãos se menciona, sem tratar a questão, que tal se verifica por não estarmos em face de SGPS, referindo o último acórdão citado que:
«Nem se vê que o caso contenha particularidades em relação às sociedades que, em geral, tenham parte significativa do capital de outras – fora as hipóteses de tributação, pelo lucro consolidado (artº 59º do CIRC na redacção originária)».
Mas neste caso, o que verdadeiramente importa é definir se nas as hipóteses de tributação, pelo lucro consolidado haverá que dar um diferente tratamento a estes mesmos custos com empréstimos bancários contraídos para fazer face a prestações acessórias efectuadas a uma sociedade sua associada pelos quais não cobrou quaisquer juros, dado que estamos perante uma SGPS que realizou tais operações e que se encontra enquadrada num grupo de sociedade sujeita ao regime especial Regime especial de Tributação dos Grupos de Sociedades.
Tal regime, à data do referido acórdão constante do artº 59º do Código de Imposto sobre o rendimento de pessoas colectivas, ocupa actualmente
os artigos 69º e segs. do Código de Imposto sobre o rendimento de pessoas colectivas e, antes, como actualmente, não se descortina em tal regime especial qualquer norma que permita concluir pelo estabelecimento de um regime, também de excepção, no que à matéria regulada no artº 23º do mesmo código diz respeito. Naturalmente que o legislador poderia tê-lo feito, como ocorre, nomeadamente, relativamente à dedução de prejuízos fiscais, mas não o fez, mantendo a dedutibilidade dos seus custos, confinada ao disposto no artigo 32.º, n.º 2 do Estatuto dos Benefícios Fiscais, aprovado pelo DL 215/89, de 1 de Julho, na redacção em vigor à data da liquidação.
O artº 70º refere, na redacção actual, dada pelo Decreto-lei n.º DL 198/2001, de 3 de Julho, que:
«1 — Relativamente a cada um dos períodos de tributação abrangidos pela aplicação do regime especial, o lucro tributável do grupo é calculado pela sociedade dominante, através da soma algébrica dos lucros tributáveis e dos prejuízos fiscais apurados nas declarações periódicas individuais de cada uma das sociedades pertencentes ao grupo.
2 — (Revogado pela Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro, com efeitos a partir do período de tributação que se inicia após 31 de Dezembro de 2010) O montante obtido nos termos do número anterior é corrigido da parte dos lucros distribuídos entre as sociedades do grupo que se encontre incluída nas bases tributáveis individuais».
Deste artigo resulta que primeiro haverá que apurar o lucro tributável nas declarações periódicas individuais de cada uma das sociedades pertencentes ao grupo para, num segundo momento ser apurado, o lucro tributável do grupo a calcular pela sociedade dominante e correspondente à soma algébrica dos lucros tributáveis e dos prejuízos fiscais individuais de cada uma das sociedades pertencentes ao grupo. O que não poderá ter outro sentido que não seja que cada sociedade individualmente considerada deverá deduzir ao seu lucro tributável os custos que, ao abrigo do disposto no artº 23º do Circ comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da sua fonte produtora.
Não se olvida que a empresa A’………., SA detém participações sociais em várias sociedades que lhe conferem o domínio total nuns casos e noutros um domínio parcial variável entre 0,04% e 99,99% e o seu objecto social abrange actividades imobiliárias e a detenção e gestão de participações sociais, entendida esta como envolvendo operações de financiamento das empresas participadas para melhor gerirem a sua carteira de títulos com vista a reforçarem a sua posição empresarial seja através do aumento do valor de mercado das suas próprias acções, seja evitando a depreciação do seu valor, seja efectuando operações financeiras e comerciais que possam gerar lucros, ou, pelo menos sejam susceptíveis de os gerar.
Quando decidiu efectuar participações acessórias de capital a algumas das empresas participadas sem delas receber quaisquer juros e, para fazer esses financiamentos contraiu empréstimos onerosos junto de instituições financeiras, os encargos financeiros suportados por estes empréstimos na empresa A’………., SA estão conexionados com a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora da empresa participante que contraiu os empréstimos e pagou os encargos financeiros correspondentes.
A lógica empresarial e de grupo de empresas frequentemente aconselhará que os empréstimos sejam contratualizados pela empresa dominante, tendencialmente aquela que, pela sua dimensão e prestígio, se encontra melhor posicionada para os obter junto das instituições bancárias com condições mais favoráveis. Nada na lei comercial o impede, competindo a análise desse procedimento às próprias empresas do grupo, sem que a Administração Tributária se possa imiscuir em tal opção empresarial, por o direito fiscal não impor comportamento diverso.
Refere a recorrente que não há diferença entre «o investimento financeiro» que realizou com as prestações suplementares e um aumento de capital das sociedades participadas em valor correspondente.
Cremos que a equivalência estabelecida entre uma e outra operação não é exacta tendo em conta a legislação comercial e fiscal aplicável. Desde logo porque no aumento de capital há a correspondente emissão de acções de que a SGPS passa a ser titular – adquire novas acções e isso inscreve-se no seu objecto social de gestão de participações sociais – que completamente se não verifica ao nível das prestações suplementares.
Para além disso, a verdade é que, havendo norma expressa indicativa de os encargos financeiros suportados com a aquisição de participações sociais, nestes casos, não concorrer para a formação do lucro tributável destas sociedades (SGPS) não há idêntica ou similar estatuição aplicável às prestações suplementares.
A sentença recorrida fez, pois, uma incorrecta análise da relação material controvertida à luz do direito vigente aplicável, pelo que deve ser revogada, na parte recorrida.


Deliberação

Termos em que acordam os Juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em conceder provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida na parte objecto de recurso, e, consequentemente, julgar parcialmente procedente a impugnação.

Custas pela recorrida que não suporta taxa de justiça dado não ter apresentado contra-alegações.


Lisboa, 21 de Fevereiro de 2018. – Ana Paula Lobo (relatora) – Dulce Neto – voto a decisão e parte substancial da sua fundamentação, embora considere que o cerne da questão reside apenas em saber se as despesas contraídas pela sociedade SGPS a favor de terceiros (prestações acessórias concedidas pela SGPS para que as sociedades participadas adquirissem participações financeiras noutras sociedades e consequentes encargos financeiros que suportou para o efeito) tiveram um genuíno interesse empresarial, ou seja, se essas despesas passam o teste da indispensabilidade aferida perante o objecto e escopo societário da empresa e a congruência económica da operação. Teste de indispensabilidade que, no caso, se mostra superado com êxito. - Francisco Rothes.